NEPOSTISMO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Por Larissa de Jesus Lima Araújo | 22/06/2018 | Direito

Larissa de Jesus Lima Araújo[1]

Segundo Canotilho (1992, p. 352), “os princípios constitucionais, longe de configurarem meras recomendações de caráter moral ou ético, consubstanciam regras jurídicas de caráter prescritivo, hierarquicamente superiores às demais e ‘positivamente vinculantes’”.

Levando-se em conta a Súmula Vinculante nº 13, nomear parente colateral de terceiro grau, afronta a Constituição Federal, pois, constitui-se tal violação quando se trata de “cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício em cargo em comissão ou de confiança, ou ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”. É, pois, ato inconstitucional.

O Supremo Tribunal Federal, a respeito da afronta ao princípio da Igualdade pela prática de nomeação de parentes, proferiu decisão de mérito nesse sentido, através do voto do relator Ministro Carlos Ayres Brito, no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 12/2006:

[...] III – o princípio da igualdade, por último, pois o mais facilitado acesso de parentes e familiares aos cargos em comissão e funções de confiança traz consigo os exteriores sinais de uma prevalência do critério doméstico sobre os parâmetros da capacitação profissional (mesmo que não seja sempre assim). Isto sem mencionar o fato de que essa cultura da prevalente arregimentação de mão-de-obra familiar e parental costuma carrear para os núcleos familiares assim favorecidos uma super-afetação de renda, poder político e prestígio social.

A Administração Pública deve tratar a todos os indivíduos “sem discriminações, benesses, favoritismos, perseguições, simpatias ou qualquer animosidade pessoal, política ou ideológica”, de modo que não interfira na atividade administrativa, nem mesmo com interesses pessoais ou de grupos de qualquer tipo. Assim, o interesse público é que deve ser sopesado sempre, e somente em nome dele a Administração poderá realizar tratamento desigual entre seus administrados (GALVÃO, 2012, p. 4).

Nesse mesmo viés, o Supremo Tribunal Federal nos autos do Recurso Extraordinário nº 579.951-4/RN, no voto do Relator Ricardo Lewandowshi, entendeu que a prática do nepotismo viola também o princípio da impessoalidade:

Além de ofensiva à moralidade administrativa, a nomeação de parentes para cargos e funções que não exigem concurso público, como já se viu acima, fere o princípio da impessoalidade e, por extensão, o basilar princípio da isonomia, porque prevalece o nefasto “QI”, o popular “quem indica”, mencionado pelo Ministro Marco Aurélio em seu voto pioneiro sobre o nepotismo, na ADI 1.521/RS, em que o Plenário indeferiu pedido de medida cautelar para suspender a eficácia de dispositivos da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, que traziam normas vedando a contratação de parentes de autoridades públicas.

O gestor não pode se levar por interesses pessoais na nomeação do secretário de arrecadação, uma vez que, não pode visar interesse particular em detrimento da gestão pública.

Logo, há que se falar no princípio da Eficiência, pois segundo o Ministro Ricardo Lewandowshi (Recurso Extraordinário nº 579.951-4/RN), “a forma do provimento dos cargos que os parentes ocupam, se deu em detrimento de outros cidadãos igualmente ou mais capacitados para o exercício das mesmas funções, gerando a presunção de dano à sociedade como um todo”.

No tocante ao princípio da eficiência o supracitado Ministro diz mais:

E no mais das vezes, a nomeação de parentes, dada absoluta inapetência destes para o trabalho e o seu completo despreparo para o exercício das funções que alegadamente exercem, vulnera também o princípio da eficiência, introduzido pelo constituinte derivado no caput do art. 37 da Carta Magna, por meio da EC 19/1998, num evidente desvio de finalidade, porquanto permite que o interesse privado, isto é, patrimonial, no sentido sociológico e também vulgar da expressão, prevaleça sobre o interesse coletivo.

 

Portanto, além da violação ao princípio da eficiência exposta pelo Ministro, aduz também que pode ocorrer desvio de finalidade.

 Em outras palavras, constituiu ato de nomeação viciado por desvio de finalidade, sendo passível de nulidade por meio do controle de constitucionalidade. Sendo imprescindível que a produção administrativa obedeça aos preceitos constitucionais, sob pena de nulidade (SILVA, 2004, p. 46 - 47).

Tem-se que analisar cuidadosamente o caso concreto para apontar a caracterização de nepotismo, assim como se houve atos que atentem contra os princípios da administração pública, e ainda se houve dano, dolo ou má-fé por parte do agente. “A existência por si só do ato caracterizador de nepotismo, não é suficiente à caracterização do ato ímprobo. É imprescindível que seja constatado a ocorrência de dano ao erário, enriquecimento ilícito, dolo ou má-fé por parte da autoridade nomeante” (RIBEIRO SILVA, 20[?]).

Para Alberto Ferracini (1997, p. 16) “entende-se por ato de improbidade má qualidade, imoralidade, malícia. Juridicamente, lega-se ao sentido de desonestidade, má fama, incorreção, má conduta, má índole, mau caráter”.

A autora Maria Sylvia Zanella di Pietro (2002, p. 688-689) discorre acerca da inexistência de ato de improbidade administrativa quando se fazem ausentes a má-fé ou dolo por parte do agente nomeante:

O enquadramento na lei de improbidade administrativa exige culpa ou dolo por parte do sujeito ativo. Mesmo quando algum ato ilegal seja praticado, é preciso verificar se houve culpa ou dolo, se houve um mínimo de má-fé que revele realmente a presença de um comportamento desonesto. A quantidade de leis, decretos, medidas provisórias, regulamentos, portarias torna praticamente impossível a aplicação do velho princípio de que todos conhecem a lei. Além disso, algumas normas admitem diferentes interpretações e são aplicadas por servidores públicos estranhos à área jurídica. Por isso mesmo, a aplicação da lei de improbidade exige bom-senso, pesquisa da intenção do agente, sob pena de sobrecarregar-se inutilmente o Judiciário com questões irrelevantes, que podem ser adequadamente resolvidas na própria esfera administrativa. A própria severidade das sanções previstas na Constituição está a demonstrar que o objetivo foi o de punir infrações que tenham um mínimo de gravidade, por apresentarem consequências danosas para o patrimônio público (em sentido amplo), ou propiciarem benefícios indevidos para o agente ou para terceiros. A aplicação das medidas previstas na lei exige observância do princípio da razoabilidade, sob o seu aspecto de proporcionalidade entre meios e fins. (...) Sem um mínimo de má-fé, não se pode cogitar da aplicação de penalidade tão severas como a suspensão dos direitos políticos e a perda da função pública.

 

Como discorreu acima di Pietro, a Constituição estabelece sanções severas pelo cometimento de tal crime, pois as atitudes do agente neste possuem a capacidade de causar danos graves ao erário ou trazer benefícios ao agente ou terceiros, não correspondendo estas, portanto, consequência e objetivo da nomeação pelo agente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, 1992.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14 ed. São Paulo: Atlas, 2002.

FERRACINE, Alberto. Improbidade Administrativa. Julex Edições, 1997.

GALVÃO, Rafael Silva Paes Píres. Ação civil pública de responsabilização pela prática de ato de improbidade administrativa. Disponível em: . Acesso em: 12 out 2016.

RIBEIRO SILVA. Parecer Jurídico. Disponível em: . Acesso em: 12 out 2016.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

[1] Aluna do 8° período noturno do curso de Direito, da UNDB.

Artigo completo: