Narcisismo

Por Reinaldo Müller (Reizinho) | 10/09/2011 | Crônicas

Narcisismo

Na mitologia grega, Narciso era um jovem bonito e vaidoso que rejeitou os avanços das ninfas Eco e Aminia. Aminia, ferida em seu orgulho, amaldiçoou o jovem, desejando que nunca possuísse o objeto de seu amor.

Um dia, Narciso curvou-se para beber água de uma fonte. Vendo sua própria face refletida na água, enamorou-se dela. Narciso foi tão atraído por sua própria imagem que freqüentemente voltava à fonte para se contemplar. Vendo-se na água, procurou abraçar sua própria imagem e afogou-se na tentativa.

Naquele lugar, segundo a lenda, brotou uma nova flor que toma o nome de seu criador infeliz ? Narciso.

Foi Freud que acrescentou o termo narcisismo ao vocabulário da psicologia para designar amor à própria imagem e a etapa do desenvolvimento na qual a criança faz do próprio eu o objeto principal de seu amor.

Essas idéias originaram muitos estudos que descrevem e analisam o perfil distinto da personalidade narcisista. Segundo o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-IV) da Associação Psiquiátrica Americana, narcisistas são pessoas arrogantes e convencidas que têm fantasias magníficas sobre si mesmos.

Eles superestimam seu sucesso, precisam ser constantemente admirados e sempre esperam tratamento preferencial. Os narcisistas estão convencidos de que merecem mais do que recebem. Preocupam-se em ter boa aparência e manter-se jovens. Não são sensíveis às necessidades e aos problemas dos outros. Com pouca tolerância para crítica, freqüentemente reagem com fúria a ofensas reais ou imaginárias. Tendem a ser do sexo feminino mais do que do masculino.

Em suma, os narcisistas focalizam a si mesmos, fascinados com sua personalidade e seu corpo, "com um individualismo atroz que carece de valores morais e sociais e se desinteressa por qualquer questão que não sejam eles mesmos...

Os narcisistas de ambos os sexos exibem orgulhosamente suas curvas atraentes ou seus grandes músculos, gabando-se de suas fantásticas proezas. Vemo-los andando pelas ruas vestidos sedutoramente segundo a moda, provocando admiração e inveja.

Vemo-los nas praias exibindo seus corpos maravilhosamente bronzeados. Seguem a última moda, gastam muito dinheiro com perfumes e maquiagem, e adotam várias dietas e terapias a fim de serem mais atraentes.

Este individualismo centrado em si procura apenas gratificação própria e prazer. O desejo de bem-estar e de divertir-se eclipsa tudo o mais. Insensibilidade e indiferença dominam a atitude do narcisista para com o resto do mundo e os interesses ou necessidades dos outros.

Importantes questões filosóficas, religiosas, econômicas ou políticas despertam uma curiosidade apenas superficial. O que importa é o conforto e uma bela aparência, preservar o nível de vida e gratificar o eu.

Assim o narcisista vive apenas no presente e não se preocupa com o passado ou com o futuro. A filosofia de "faça o que lhe dá prazer", "não se preocupe", "seja feliz", "fodam-se os outros" e "divirta-se" torna-se o princípio que lhe governa a vida.

A cultura do narcisismo é a celebração da aparência física, o triunfo do espelho e o culto da própria imagem.

A despeito de seu êxito, o narcisismo tem um componente trágico que não pode ser olvidado ? a maldição de Aminia: a incapacidade de amar outra pessoa...

Os narcisistas estão enamorados do espelho, procurando descobrir sua própria imagem nos outros. Estão condenados à insatisfação perpétua.

A vida para eles é uma experiência absurda que os deixa com um vazio interior e os faz sofrer; tal é "a estratégia vazia" do narcisismo.

O drama de Narciso, a ausência de sentimento e transcendência, inexoravelmente, condena a pessoa à solidão e à auto-destruição.

O mito é implacável e fatal. Parece não haver solução possível...

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