MOTIVAÇÃO DOS ATOS PUNITIVOS DISCIPLINARES (Felipe Genovez)
Por Felipe Genovez | 22/02/2018 | DireitoO art. 140, do RJUSPC/União (Lei 8.112/1990) encerra muito bem da obrigatoriedade de se motivar todo ato administrativo que venha a culminar em punibilidade, isto é: " O ato de imposição da penalidade mencionará sempre o fundamento legal e a causa da sanção disciplinar". Como fundamento legal, deve-se entender as disposições estatutárias infringidas.
“O ato punitivo mencionará sempre os fundamentos da penalidade”. O art. 50, da Lei Federal n. 9.784, de 29.01.99 e que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, aplicada subsidiariamente (art. 24, incisos XI e XVI, CF/88), preconiza que “Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I – neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses; II – imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; III – decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública; IV – dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatória; V – decidam recursos administrativos; VI – decorram de reexame de ofício; VII – deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais; VIII – importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo. Par. 1o A motivação deve ser explicita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato. Par. 2o Na solução de vários assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos interessados. Par. 3o A motivação das decisões de órgãos colegiados e comissões ou de decisões orais constará da respectiva ata ou de termo escrito”.
Sobre a motivação do ato administrativo, doutrina Diógenes Gasparini que: "o motivo pode estar, ou não, na lei. Se constante de lei, a prática do ato dependerá da efetiva ocorrência da situação prevista. (...) se, ao contrário, não houver orientação legal, o agente público poderá escolher uma situação de fato para, à vista dela, praticar ato administrativo. A validade desse ato, no entanto, dependerá da existência efetiva do motivo, se explicitado(...)"(in “Direito Administrativo”, 4a edição, Ed. Saraiva, SP, 1995).
A obrigatoriedade da existência, no mundo real, dos motivos alegados e que determinam a prática do ato administrativo, como requisito de sua validade, acabou por dar origem à teoria dos motivos determinantes. Por essa teoria só é válido o ato se os motivos enunciados efetivamente aconteceram. Desse modo, a menção de motivos falsos ou inexistentes vicia irremediavelmente o ato praticado, mesmo que não exigidos por lei. A esse respeito, doutrina o festejado jurista Celso Antonio bandeira de Mello que, “...de acordo com essa teoria, os motivos que determinaram a vontade do agente, ou seja, os fatos que serviram de suporte à sua decisão integram a validade do ato e que a invocação de motivos de fato falsos, ou inexistentes vicia o ato, mesmo quando a lei não haja estabelecido, antecipadamente, os motivos que ensejariam a prática do ato (...) não se confundem motivo e móvel. Aquele, o motivo, indica uma situação de fato ou de direito, objetiva. Este, o móvel expressa o propósito, a intenção do agente do ato” ( (in Elementos do Direito Administrativo, Ed. Revistas dos Tribunais, SP, 1980, p. 45).
“O móvel é aquilo que o agente deseja. Tampouco se confundem o motivo e a motivação do ato administrativo. O motivo, como vimos, é a situação fática ou legal, objetiva, real, empírica, que levou o agente à prática do ato. A motivação é a enunciação, decisão ou explicitação do motivo. É a narrativa do motivo. Normalmente é a motivação apresentada sob a forma de considerandos" (in Direito Administrativo, Saraiva, 3a. Ed., 1983, ps. 70/71/72).
A Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina (LC 197/2000) prevê que: “As decisões referentes à imposição de pena disciplinar constarão do prontuário do infrator com menção dos fatos que lhe deram causa”.
JURISPRUDÊNCIA:
ATO ADMINISTRATIVO – MOTIVAÇÃO – PODER DISCRICIONÁRIO – LIMITES:
“Para que a motivação do ato administrativo cumpra sua finalidade, não basta simplesmente que se manifeste segundo uma fórmula qualquer. Ao contrário, a fim de evitar que o administrador se valha de expressões vagas ou omita elementos essenciais, que possam ter influído na configuração do ato, é mister o atendimento a certos requisitos sem os quais a motivação pouco valerá. A doutrina menciona a congruência, a exatidão, suficiência e a clareza. Congruência significa que os motivos, normas e razões invocadas devem aparecer como premissas das quais se extraia logicamente a conclusão, ou seja, o conteúdo do ato. Havendo contradição entre esse dois pólos, a ação administrativa estará viciada. Exatidão quer dizer que as razões de direito devem corresponder aos textos invocados, e que os motivos fáticos devem ser verídicos. Havendo inexatidão, ou a intenção do administrador se mostrará fraudulenta, ou denunciará erro de direito ou de fato, novamente remetendo ao problema das nulidades. Outro requisito de relevo é a suficiência, significando que a administração deve dar idéia completa do processo lógico e jurídico percorrido até a decisão (...). A suficiência não significa, contudo, longos discursos justificativos. Desde que a motivação permita identificar os aspectos fundamentais levados em consideração pelo agente público, o conveniente é que seja ela sucinta (...). Pode-se acrescentar, também, que a motivação deva ser clara, ou seja, por meio dela o interessado terá o perfeito conhecimento do processo lógico jurídico que conduziu o agente à decisão’ (Motivação e Controle do Ato Administrativo, Belo Horizonte: Del Rey, 1992, cap. III, n. 7, pp. 121-122)” (STJ, Corte Especial, MS n. 5.626, DF, data da dec.: 04.09.02).
Motivação de ato administrativo:
“Sentença criminal – falta de análise de uma das teses (principais) da defesa – nulidade decretada de ofício – precedentes – É nula a sentença que, não obedecendo os requisitos do art. 381, do CPP, não analisa todas as teses apresentadas pelas partes, especialmente uma das principais formuladas pela defesa, mesmo porque não há fundamentação implícita contra o réu” (Apel. Crim. 99.017815-3, Seara, Rel. Des. Niton Macedo Machado, DJ 10.509, de 28.7.2000, p. 6).
“(...) Justificado, embora sucintamente , o módico aumento na pena-base, face dos maus antecedentes do acusado, não há que falar em ausência, de fundamentação capaz de nulificar a sentença” (Revisão Criminal, Joinville, Rel. Des. Francisco Borges, DJ n. 10.510, de 21.07.2000, p. 9).
Ato punitivo – verdade real – certeza acerca da culpabilidade:
“(...) ‘No processo criminal, máxime para condenação, tudo deve ser claro como a luz, certo como a evidência, positivo como qualquer expressão algébrica. Condenação exige certeza absoluta, fundada em dados objetivos indiscutíveis, de caráter geral, que evidenciem o delito e a autoria, não bastando a alta probalidade desta ou daquele. Não pode, portanto, ser a certeza subjetiva, formada na consciência do julgador, sob pena de se transformar o princípio do livre convencimento em arbítrio’ (RT 619/267) (...)” (Apel. Crim. 00.009939-2, Itajaí, Rel. Des. Álvaro Wandelli, DJ n. 10.504, de 21.07.2000, p. 14).
Motivação de ato administrativo:
"...o que torna exigente a motivação quando importou explicitamente pela lei, é a necessidade de sua existência como meio para aferir-se a consonância do ato com as condições e finalidades normativas previstas para ele. A motivação é um instrumento de garantia dos administrados. Donde há de ser considerada indispensável nos casos em que a ausência de motivação contemporânea ao ato impeça ulterior certeza de que foi expedido segundo os exatos termos e requisitos da lei 'Ato Administrativo e Direito Administrativo, RT, 1981, p. 77)' (...)" (Rel. Des. Norberto Ungharetti, no MS 2.335, da Capital).
"Inconfundíveis, na técnica jurídico-processual, são ausência de fundamentação e fundamentação sucinta. Assim, se a fundamentação do ato decisório é sucinta, insuficiente ou mesmo, a juízo do apelante, medíocre, a conseqüência daí a extrair-se e, quando muito, a sua reforma, não ostentando ela, no entanto, eiva de nulidade, posto que, na forma da lei, somente as sentenças das quais se ausentem uma fundamentação mínima são nulas..." ( ACv nº 96.007945-9, de Criciúma. Rel. Des. Trindade dos Santos. DJ nº 10.416, de 14.03.2000, p. 14).
“(...) Não apenas é nula a sentença a que falta relatório, mas também o é aquela que o faz incompleto, omitindo pontos que lhe são essenciais, como a suma (fundamentos) da inicial e da resposta do réu, e que, principalmente, deixa de os analisar na motivação (...)” (Apel. Cível em MS 98.000425—0, Chapecó, Rel. Des. Gaspar Rubik, DJ 10.154, de 17.02.99, pág. 6).
"(...) Não é nula a sentença, ainda que concisa, que enfrenta todas as teses defensivas, sendo desnecessários comentários e exames minuciosos sobre cada um dos depoimentos colhidos na instrução (...)" (Embargos de Declaração na Apel. Crim. 98.01425-9, Ibirama, Rel. Des. Nilton Macedo Machado, DJ 10.247, de 05.07.99, pág. 20).
"(...) O controle jurisdicional do motivo do ato administrativo é ponto relevantíssimo, no direito administrativo, porque na motivação, ou na explicitação do motivo, pode ocorrer ilegalidade, abuso de poder ou desvio de poder. O mesmo ato discricionário, que, em regra geral, dispensa motivação, pode ser submetido a controle jurisdicional, quando seu editor resolve, por exceção motivá-lo ( CRETELLA JÚNIOR, José. Controle Constitucional do ato administrativo. Rio de Janeiro: 1998/227). O princípio da motivação do ato administrativo constitui moderna tendência dos países democráticos. O motivo e a motivação do ato administrativo têm sido examinados pelo Poder Judiciário, sendo pacífico, no direito brasileiro jurisprudencial, o entendimento de que o motivo ilegal, mesmo de ato discricionário, é suscetível de revisão jurisdicional, uma vez que se a administração motiva o ato torna a medida sujeita à apreciação judicial (...) Assim, todo ato administrativo, para ser válido, necessita de motivação, ou seja, da enunciação dos motivos nos quais a conduta administrativo está estribada." ( AC nº 97.011638-1, de Dionísio Cerqueira, rel. Des. Carlos Prudêncio, DJ nº 10.476, de 12.06.2000, p. 24).
“Autoridade Julgadora pode encampar parecer de autoridade pública inferior como fundamentação da decisão. Aliás, é possível adoção de parecer que se reporte a outro, desde que haja motivação controlável a posteriori. A isso a doutrina designa o nome de ‘Motivação não contextual’, ‘motivação aliunde’ ou ‘motivação per relationem’. Não há, pois, falta de fundamentação na decisão da autoridade julgadora cuja fundamentação consista em remissão aos fundamentos de peça produzida por outro agente público (como o parecer) ou o relatório final da Comissão” (Precedentes: STF, RMS 24526. STJ, MS 14973; MS 9657).