Modernidade; pós-modernidade: descontinuidade ou ruptura?

Por Leonildo Dutras de Oliveira | 14/05/2012 | Filosofia

Falar de um elemento lúdico que caracterize o nosso tempo como pós-moderno é extremamente arriscado, do ponto de vista da história das ideias. Então, a partir das premissas alavancadas, do ponto de vista filosófico, iremos descrever primeiramente aquilo que nos cabe decidir. Colocando a modernidade como uma sucessão de eventos aleatórios, circulados em função da filosofia e o que foi produzido a partir desta.

Não veremos a modernidade como um acontecimento histórico, mas como um manancial de pensamento, que floresceu a partir da morte da subjetividade (alimentada por dogmas católicos) foi a partir da morte do subjetivismo religioso e o auge da razão, que levou o homem a crer que teria alcançado um novo patamar histórico.

Temos no iluminismo uma força altamente autônoma, que nos diz: somos nós homens, em todas as faculdades exemplares da verdade. A razão é o combustível que alimenta e move o conhecimento. Todo o subjetivismo medieval, com sua falsa moral caiu por terra, agora, a razão (carregada de sentido metafísico) guiará o homem a um novo saber, em busca pela sua mais meticulosa revelação ontológica, e com isso, conduziu o homem para uma nova moral. Nascendo os poetas e morrendo a arte barroca. Nesta nova conjuntura não tem mais espaço para a caricatura dos nossos rostos, somos apenas representação metafísica da razão, um Ser apenas enquanto Ser, provado pela viabilidade de uma eminente ontologia. Agora o desenho e o contorno são a anatomia da alma e dos corpos como cópia imperfeita do mundo das ideias metafísicas. Também morreram todos os que viam a sua imagem no deus do otimismo, saiu o Deus religioso e entra o deus cartesiano, mas, não deixa de ser platônico (e vamos construir um novo conhecimento). Como forma de projetar o homem em busca de sua própria verdade tanto no além quanto no mundo dos conceitos metafísicos.

Este homem moderno era extremamente ligado aos dogmas da razão, e por seus dogmas mataria ou morreria. Tinha uma personalidade hostil, se achava (em uma posição estratégica) acima de tudo, querendo sempre estar com o olhar voltado para o alto (mas, mesmo assim, continuava vivendo em função de uma subjetividade material), desta forma, o homem, passou para o topo da pirâmide existencial. Deus passou a ser apenas um mero instrumento da razão, serviçal da vontade e do desejo do próprio egoísmo humano.

Outro aspecto a se destacar deste homem, foi o fato de ter sido criado alguns conceitos deste amplo universo que pejorativamente chamam de sociedade, a partir de uma ética voltada para o auto, temos uma ética centrada na ideia e não na ação. Os platônicos conseguiram desqualificar Aristóteles. Uma ética mal acabada e pior ainda quando é posta em ação, ficando centrada apenas no discurso. Este homem pensou tanto e não criou seus próprios valores éticos, não inventou uma nova forma de vida, para salvar-se de si mesmo.

No século XVIII, foi proclamada a morte da metafísica. Eis que a metafísica não morrera completamente, pois, o seu idealismo (como forma de estabelecer um padrão exato de conhecimento) ainda permanece enraizado nos dogmas abstratos do pensamento cartesiano, mas, o cientificismo por outro lado, falhou. Pois, tentou ocupar o lugar da metafísica, usando os mesmo métodos. Passando o cientificismo à substituir os dogmas da metafísica, deixando de ser uma alternativa viável para a construção do conhecimento.

A nossa sociedade, e até mesmo alguns filósofos, acometidos da mais pura irresponsabilidade, ainda tentam raciocinar (filosofar) a partir de uma ontologia. Ressuscitando Platão, Descartes Santo Agostinho e até mesmo uma psicanálise repleta de teorias de auto-ajuda dos desenvolvimentistas psicanalíticos e poucos práticos do ponto de vista filosófico (não que eles não tenham mais utilidade).

Deste feito, surge à filosofia das estruturas, tanto da linguagem quanto do pensamento (seja ele racional ou analítico), a priori. E, Nietzsche foi o grande expoente, abrindo caminho para o surgimento (posteriormente) de uma Filosofia da Linguagem ou para o próprio Estruturalismo enquanto método de analise filosófico da formação estrutural dos acontecimentos, conceitos e da própria linguística.

Então, como podemos constatar que a modernidade foi um fracasso? Podemos entender que o fracasso se deu pela substituição de dogmas apenas. De um lado, saiu de cena o dogma católico, com seu subjetivismo teológico, e do outro, um projeto de razão mal sucedido entrou na vida do homem, como se fosse um dogma, feroz, voraz. Pior, ainda mais excludente.

A modernidade, do ponto de vista epistemológico foi um fracasso. Por que, fora dos padrões estéticos do mundo europeu não teve como sobreviver ou desenvolver-se por completa. Como prova incontestável, temos um mundo divido em blocos, estes blocos estão sumariamente capitaneados ora por forças militares, ora por forças e poderios de monopólios de mercados, com isso, gerando milhares de excluídos nos continentes mais atrasados (pobres e famintos). Todos estes artefatos históricos são incontestavelmente uma herança maldita da modernidade, guiados primeiramente por uma metafísica dogmática e ontológica bastarda da filosofia e posteriormente, por um cientificismo idealista (causando grandes fissuras nos movimentos culturais e nas contraculturas), podemos citar como conseqüência de todo este aparato ultraconservador, a Guerra Fria, pois, em nome de uma razão de ser ou de um absolutismo dogmático (países capitalistas) ou cientificismo social (países socialistas), construídos como verdade absoluta, iriam destruir o mundo com suas ogivas nucleares.

Simbolicamente, a modernidade foi escrava da razão, sofreu os estigmas e o cisma filosófico do “penso, logo existo”, do excesso racionalidade metafísico ou da própria ciência quanto à formação de sua identidade, seja ela econômica, política ou religiosa. Diante disto, vemos a razão construindo igrejas (simbolicamente) e o pensamento político-religioso da Europa, nascendo à razão de homem se tornar um ser de muitas crenças e de um total pessimismo na vida e força de vontade. Pessimista de sua própria situação, não é a toa que Nietzsche proclama aos quatro cantos, que o homem nascera póstumo, será?

Premeditadamente, a década de 30 do século passado ficou inacabada, do ponto de vista histórico, foi sob este estigma que surgiu o pós-modernismo, como um processo de ruptura entre o que ainda estava por terminar. Nasceu sob a cisma do ocidente, com todos os estigmas e pessimismo do movimento passado.

Foi um conservadorismo, uma forma de proteger a futura geração do que ainda restava de moderno, uma tentativa desesperada de pular o espaço, criando uma descontinuidade histórica, pois, não possuía nenhum mecanismo, nenhum acontecimento filosófico ou até mesmo histórico que rompesse com o período moderno.

Lingüisticamente podemos afirmar que o pós-moderno enquanto situação prontamente elaborada por mudanças filosófica é uma situação real, que ultrapassou pensamento moderno. Nasce um novo ciclo, principalmente do ponto de vista histórico; pois, abastece com riqueza de detalhes os achados arqueológicos da contemporaneidade, mas, para os filósofos fica muito complicado, analisar os conceitos e encontrar um ponto de mutação, ebulição ou ruptura.

Para alguns, falar da modernidade ou pós-modernidade é uma Odisséia, um desafio, da forma como é posta este ponto de fissura, daí a dificuldade de não aceitarem um tendência de ruptura com os paradigmas da modernidade. Esta medida de recusa é estabelecida pela falta de caracterização conceitual de uma época, em que pese à força das rupturas e das constantes mudanças sem que percebamos, por isso, existe uma insegurança a este respeito. É um tanto arriscado, falar da pós-modernidade, se não conseguimos definir ainda o que é moderno.

Mas, de fato, o moderno foi rompido, se não pela filosofia, mas, pela ciência, não pelo fato de esta ter se tornada autônoma, mas, pelo fato de ter gerado uma escravidão a partir de seus próprios conceitos, e por fim, ter entrado com força na vida das pessoas como se fosse um dogma.

Estamos presenciando, a substituição da razão filosófica, pela racionalidade e o equilíbrio científico, a mãe ciência é demasiadamente platônica, quer ditar com a força de seus dogmas, todos os aspectos da vida pós-moderna. É por isso, que guerras são declaradas como torpedos de paz, o homem de seu tempo é fraco.

Em contraposição ao avanço da ciência, como ponto de equilíbrio e idealismo puro e da própria filosofia, emerge das cinzas de Lutero o protestantismo, um cristianismo agora mais voraz, maculado pela cede de poder, em busca de sua terra prometida e demarcando fronteiras. Os templos nascem da noite para o dia, é a prosperidade neo-pentecostais. Antes, tínhamos a figura da Igreja ou até mesmo de Lutero, agora temos o pastor, que faz toda encenação teatral, vendendo o paraíso alheio. Manifestam pelas ruas, o seu desejo imenso de que tudo dê errado, mas, esbarram em si mesmo, pois, vendem um Deus do equívoco. Macularam a verdade, envenenaram a fonte de vida eterna. O homem (religioso) pós-moderno, tem como característica a fabricação de um Deus, conforme as suas necessidades, seus caprichos e seu ego.

Outro fator que podemos destacar como marcante e preponderante para o fim da modernidade, e o surgimento da condição pós-moderna, foi a morte do capitalismo, em todos os sentidos. A antiga forma de gerar lucro, que se baseava na acumulação do capital, foi substituída dolorosamente pelas grandes estruturas (patrimônios simbólicos), estamos vendo, que o capital, como forma de gerar lucros não mais resistira até meados da década de 30, pois, fracassou e sucumbiu diante dos movimentos sociais e, por conseguinte, com o nascimento do socialismo como estrutura de Estado. Então podemos dizer que Cuba e a emergente China, são exemplos claros de que o capitalismo não mais existe, apenas, devemos apostar as nossas fichas agora nas engrenagens das estruturas, sejam elas: econômicas, militares ou até mesmo sociais. O capitalismo não mais é baseado no acúmulo de capital, agora o que interessa é a força da estrutura, seja ela política, militar ou social. Não podemos negligenciar as estruturas sociais, como mentoras de poder e afago de sopro estrutural, pois, estamos vendo uma sociedade organizada em blocos, principalmente em locais periféricos, onde a pobreza é predominante.

A sobrevivência de Cuba, mesmo que em estado de coma, nos mostra que o capital foi derrotado, principalmente, quando o mundo se torna globalizado e ele, o capital, não se tomou uma dimensão universal.

Mesmo a indústria criando formas de nos manter dependente dela, o capitalismo (com base no capital) não revigorou ou se realinhou no tempo, não modificou a sua atuação e foi aos poucos perdendo a sua indenidade e força. Hoje, podemos dizer que as estruturas, fonte de sustento do capitalismo, estão corrompidas pelo processo de globalização. Vivemos na era das grandes tecnologias de mídias (Comunicações e Informações/Televisão, internet e etc.), com a força da comunicação, formamos uma legião de rebeldes.

As mudanças são imediatas. As mídias estão revolucionando o mundo, mas, ao mesmo tempo, gerando dependência. Os mercados emergentes, não são tão emergentes como pensam! Crescem de acordo com os interesses dos mais ricos e estão à mercê das crises e mais crises, são vulneráveis, preservam e ainda não sabem lidar com a própria natureza, seu processo de produção também sofre as conseqüências do atraso e da exploração, segue em ritmo lento todo o processo de desenvolvimento, ainda podemos compará-lo e enquadrá-lo como mecanismos do atraso e primitivos. Desta forma, o desenvolvimento científico, artístico, político e econômico segue a via de fato e regras da racionalização imposta, diante dos interesses escusos dos mais desenvolvidos. Portanto, a crise que se instaurou na Europa (e depois ultrapassou as barreiras para todo o Ocidente), são reflexos dos ditames e processos excludentes das estruturas de capitais, capitaneadas pelo processo político e o monopólio nos mercados, em todo o mundo.

Enquanto revoluções acontecem no Oriente médio, o Ocidente acompanha quase que ao vivo, mas, a era das tecnologias aplicáveis, são submetidas aos ditames éticos dos homens. Na década de 90, do século passado, acompanhamos ao vivo uma guerra, foi à vitória do absurdo e a derrota da ética, dos valores. A partir de então, o homem pós-moderno se deu conta da dimensão e da ruptura de valores e conceitos em relação à modernidade. Começamos a vivenciar a era da ‘metamorfose ambulante’, onde os valores passariam a ser condicionados por dimensões abstratas, e os homens, ficariam trancados em suas selvas de pedra, com medo de si mesmo, demonstrando toda fraqueza e toda superficialidade.

Podemos dizer que estamos vivendo a pós-modernidade, por que a cada dia que passa, ocorrem grande transformações (bruscamente) de tal forma que sentimos as conseqüências e ficamos ainda mais dependentes das quinquilharias tecnocratas. Tais conseqüências Interferem nos padrões de vida e até mesmo nos conceitos de sociedade. Com o mundo globalizado, tudo vira um turbilhão de incertezas.