MITOLOGIA E PSICANÁLISE
Por Andressa S. Silva | 28/07/2015 | PsicologiaRESUMO
Este trabalho foi elaborado por meio de revisão bibliográfica após a leitura e estudos do conteúdo disponível na plataforma da Fatec. Tem por objetivo descrever uma proposta de definição de mito e mitologia, sua utilização na psicanálise, em suas origens e no Brasil. Para isso, foi realizada leitura de material selecionado para o tema, interpretação e elaboração do trabalho para obtenção de nota na disciplina de mitologia do curso de Psicanálise Clínica (modalidade EAD) da instituição FATEC.
Palavras-chave: Psicanálise; Mitologia.
INTRODUÇÃO
Mito é uma narrativa simbólica, uma fábula acerca de Deuses, criaturas fantásticas ou heróis que representa as forças da natureza e os aspectos da vida humana.
Os povos primitivos elaboraram os mitos para passar, a princípio verbalmente, de geração em geração, aspectos que justificassem (ou não) comportamentos (cultura), como o incesto, a sabedoria, a arrogância, o amor, a união (casamento), entre outros.
Era um período anterior a qualquer explicação do mundo filosófica (baseada na razão) ou científica. Assim, a forma de transmitir tais informações para as outras gerações foi a utilização de mitos.
O conjunto dos mitos de um determinado povo é denominado mitologia. Assim, pode-se falar em mitologia grega, romana, nórdica, egípcia, celta, africana, etc.
Freud utilizou-se da mitologia grega em alguns de seus conceitos (como o complexo de Édipo), mas foi Jung quem deu maior atenção à mitologia na base da psicanálise.
No Brasil, os ensinamentos de Jung foram divulgados, principalmente, por Nise da Silveira, sua aluna, pessoa importante na reforma psiquiátrica brasileira.
MITOLOGIA
Para definir mitologia faz-se mister, primeiro, uma definição de mito.
Todas as histórias que encontramos com o caráter fantástico protagonizadas por diferentes seres (Deuses, heróis, titãs, etc.) é o que comumente chamamos de mito. Na verdade, a palavra mito vem do grego “mythos”, que significa história.
Fundamentalmente, o mito sempre foi uma história muito popular na tradição oral, ou seja, que se espalha de boca em boca até os nossos dias. Em muitas ocasiões eles estão associados com os grandes autores da antiguidade clássica. Os mitos dos deuses gregos, as aventuras dos grandes eróis como Hércules ou Ulisses, ou as histórias fantásticas do Minotauro, os Ciclopes e outros, fazendo parte da história cultural dos povos, que as receberam como parte de um importante legado.
Existem mitos de todos os tipos e estruturas. Há aqueles que tentam explicar de forma simples e para o povo a criação do mundo, outros abordagem aos menos letrados as divindades religiosas, o aparecimento do homem, etc. Basicamente, os mitos têm uma vertente religiosa, já que diferentes comunidades os acolheram para explicar as constantes perguntas que o homem levantava a respeito da vida e tudo que existe em torno dele.
Mas, além destas histórias fantásticas, onde a metáfora altera a realidade em imagens atraentes e agradáveis, sendo muito próprio o uso da palavra e do termo mito para definir o que parece inatingível. Talvez, as histórias tentem aproximar a definição do mito dos grandes heróis de cada cultura.
Certamente, em algum momento ouvimos falar de alguém em particular como um mito, alguém que na sua atividade, principalmente as artes ou esportes, se mostraram como verdadeiros mestres, sendo admirados pelas pessoas. É por isso que também usamos a palavra mito, para dar-lhe um caráter de admiração.
O conjunto dos mitos de um povo é denominado de mitologia. Teve grande influência social para povos primitivos, visto que era a única maneira de transmitir informações de geração em geração. Tais informações contemplavam orientações sobre comportamentos aceitáveis (ou não), justificativas para amizades ou inimizades, explicações sobre a origem do mundo, o seu funcionamento e a relação homem/natureza.
O valor dos mitos teve declínio a partir das tentativas racionais de explicação do mundo (cosmos). Estas tentativas tiveram origem na Grécia antiga, e deram origem ao conhecimento que hoje denominamos filosófico. O primeiro filósofo reconhecido da história foi tales, da cidade de Mileto, a quem Aristóteles atribuiu o início das investigações racionais para os problemas do mundo físico.
Entretanto há correntes que pretendem manter (ou resgatar) os conhecimentos míticos, considerando que o surgimento de um novo tipo de conhecimento não anula o conhecimento anterior. Correntes como a Bruxaria tradicional ou o neopaganismo (wicca) utilizam os mitos em seus rituais contemporâneos.
MITO E PSICANÁLISE
A psicanálise pode ser entendida como o método terapêutico criado por S. Freud (1856-1939, neurologista austríaco), empregado em casos de neurose e psicose, que consiste fundamentalmente na interpretação, por um psicanalista, dos conteúdos inconscientes de palavras, ações e produções imaginárias de um indivíduo, com base nas associações livres e na transferência.
Em diversos momentos de sua teoria, Freud recorreu aos mitos e às referências e metáforas mitológicas (gregas) para abordar e explicar as origens, preenchendo lacunas teóricas que surgiam quando era levado a teorizar para além do que lhe parecia formalizável conceitualmente. Temos por exemplo, através do conceito de recalque originário (inauguração da clivagem psíquica), do conceito de complexo de Édipo (ponto chave da organização libidinal), do mito original da horda primitiva (nascimento da cultura), da teoria das pulsões (definida por Freud como mitológica), da hipótese filogenética (tempo herdado e pré-individual).
Entretanto, o psicanalista que mais se ateve aos mitos na elaboração de seus conceitos foi Jung, discípulo de Freud, que aparentemente tinha uma visão mais esotérica da psique humana, sendo esta visão repudiada por Freud em 1913, levando a um rompimento entre ambos.
De acordo com Jung, é nos mitos que se encontra o material privilegiado para analisar os mistérios da alma, os acontecimentos anímicos, que posteriormente denominou de arquétipos. “Nos mitos e contos de fada, como no sonho, a alma fala de si mesma e os arquétipos se revelam em sua combinação natural como formação, transformação, eterna recriação do sentido eterno”.
A interpretação dos mitos na narrativa Junguiana só faz-se possível quando leva-se em consideração o conceito de inconsciente coletivo.
De acordo com Jung, é a camada mais profunda da psique humana, topograficamente dividida em Ego (consciente), inconsciente pessoal (camada intermediária) e inconsciente coletivo (camada mais profunda). Ele é constituído pelos materiais que foram herdados, e é nele que residem os traços funcionais, que seriam comuns a todos os seres humanos. O inconsciente coletivo também tem sido compreendido como um arcabouço de arquétipos.
O inconsciente coletivo complementa o inconsciente pessoal, e muitas vezes se manifesta na produção de sonhos. Assim, enquanto alguns dos sonhos têm caráter pessoal e podem ser explicados pela própria experiência individual, outros apresentam imagens impessoais e estranhas, que não são associáveis a conteúdos da história do indivíduo. Esses sonhos são então produtos do inconsciente coletivo, que nesse caso atua como um depósito de imagens e símbolos, que Jung denomina arquétipos. Dele também se originam os mitos. No entanto, sendo o inconsciente coletivo algo que foi e está sendo continuamente elaborado a partir das experiências obtidas pelos seres, o acesso individual às informações contidas no inconsciente coletivo pode ser uma forma de explicar o mecanismo de operação de alguns dos fenômenos psíquicos incomuns que foram considerados desde o princípio da psicologia junguiana. Por outro lado, isso corresponde a introduzir mais do que arquétipos nesta estrutura psíquica universal, que pode conter igualmente dados fundamentais de operação dos fenômenos naturais, que se manifestam como leis das descrições químicas e físicas da natureza e da biologia.
Em síntese, o inconsciente coletivo da psicologia analítica pode ser um modelo adequado para a compreensão dos fenômenos mentais, segundo Jung. E este está diretamente associado aos mitos.
No Brasil, a representante mais notável da teoria junguiana foi Nise da Silveira (Maceió, 15 de fevereiro de 1905 — Rio de Janeiro, 30 de outubro de 1999), uma renomada médica psiquiatra brasileira.
Dedicou sua vida à psiquiatria e manifestou-se radicalmente contrária às formas agressivas de tratamento de sua época, tais como o confinamento em hospitais psiquiátricos, eletrochoque, insulinoterapia e lobotomia.
Por meio do conjunto de seu trabalho, Nise da Silveira introduziu e divulgou no Brasil a psicologia junguiana interessada em seu estudo sobre as mandalas, tema recorrente nas pinturas de seus pacientes. Por isso escreveu em 1954 a Jung, iniciando uma proveitosa troca de correspondências.
Jung a estimulou a apresentar uma mostra das obras de seus pacientes que recebeu o nome "A Arte e a Esquizofrenia", ocupando cinco salas no "II Congresso Internacional de Psiquiatria", realizado em 1957, em Zurique. Ao visitar com ela a exposição, a orientou a estudar mitologia como uma chave para a compreensão dos trabalhos criados pelos internos.
CONCLUSÃO
A mitologia foi criada por povos primitivos com o intuito de explicar o mundo físico e as relações humanas. Numa época pré-filosófica e pré-científica, os relatos fantásticos foram a maneira encontrada pelos povos para a transferência dessas informações a gerações posteriores.
A psicanálise, em sua origem, utilizou-se da mitologia, em especial a grega, para a construção de conceitos e as tentativas de explicação da psique humana, como o Complexo de Édipo (Freud) ou os arquétipos (Jung).
No Brasil, a teoria junguiana foi divulgada principalmente por Nise da Silveira, que teve, por orientação do próprio Jung, a sugestão de estudar mitologia para a melhor compreensão das obras de arte criadas por seus pacientes.
REFERÊNCIAS
ROUDINESCO, E; PLON, M. Dicionário de Psicanálise. Trad. Vera Ribeiro e Lucy Magalhães. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.
ZIMERMAN, DE. Fundamentos Psicanalíticos: teoria, técnica e clínica. Porto Alegre: Artmed, 1999. (Reimpressão 2010).