MIGUEL PALAMARCZUK, UM POETA ESQUECIDO
Por Renato Ladeia | 15/10/2019 | CrônicasEncontrei por acaso a Ludmila Palamarczuk, filha do amigo poeta e farmacêutico, Miguel Palarmaczuk e quis saber se ele havia deixado alguma coisa publicada ou um bom arquivo com suas poesias. Li pouca coisa do Miguel, mas o seu amigo mais próximo, Paulo Célio Duarte, também poeta, conhecia alguns versos de memória e o classificava como genial. Não havia ciúmes com relação aos versos do amigo, mas admiração e respeito.
Infelizmente tudo o que o Miguel escreveu foi perdido nos escaninhos do esquecimento, pois quando ele faleceu em 2008, tudo o que havia em seu quarto, em um sítio em Mairiporã, foi jogado ao lixo, pois segundo o caseiro, estava tudo mofado. Os versos que o Paulo recitava, também se foram com ele, pois ele também partiu antes do combinado em 2012. Só mesmo os familiares próximos teriam sensibilidade para guardar papeis mofados, mas chegaram muito tarde ao local.
Conheci o Miguel através do Paulo quando frequentávamos a paróquia de Vila Palmares, onde o Padre Rubens Chasseroux promovia encontros festivos de todos aqueles que se opunham à ditadura militar no final dos anos 1960. Éramos todos jovens, inexperientes e indecisos sobre o que fazer com a vida que tínhamos pela frente. Miguel era um jovem inquieto e sensível, que escrevia com desenvoltura seus poemas sob forte influência dos concretistas. Lembro-me de que participou de um concurso de poesia que promovi através do Diretório Acadêmico da Faculdade de Filosofia de Santo André. Na comissão julgadora, estavam os professores de língua e literatura portuguesa da instituição, incluindo a amiga Marisa Dea, que provavelmente não deve se lembrar do evento. Miguel levou o primeiro lugar e o Diretor Cultural, Milton Eto, ficou encarregado de entregar o prêmio (em dinheiro) na sua farmácia em Diadema.
Pacita que não vejo desde aquela época, hoje faz parte dos meus contatos pelo Facebook e disse ter datilografado alguns poemas do Miguel e os têm de memória. Tomara que ela consiga transcrevê-los para que possamos pelo menos divulgá-los numa página da Internet.
Paulo Célio Duarte tinha todos os seus escritos em um arquivo bem organizado e talvez por precaução, deixou comigo uma cópia que guardarei até não sei quando ou até o desaparecimento da plataforma que utilizo atualmente.
Essa história do Miguel me remete à lembrança do meu avô. Quando ele faleceu, já com mais de oitenta anos, seus livros e objetos também foram jogados no lixo, pois morava com seu genro e este não se interessou em preservar as suas coisas. Meu avô era farmacêutico prático e fabricava comprimidos fitoterápicos para as dores e doenças de pessoas carentes no interior de São Paulo nos anos 1930 e 1940. Ficamos, como a família do Miguel, sem conhecer suas ideias e pesquisas.
Entre nós não há a tradição de valorizar os poetas e tampouco a poesia. Os árabes amam os seus poetas, cujos versos estão presentes até nas paredes dos palácios. Os russos, como escreveu o também poeta Boris Pasternak, autor do clássico romance Doutor Jivago, "O povo russo ama os seus poetas e no funeral do Jivago, havia gente de todas as classes sociais".
Miguel nos intervalos entre o aviar uma receita e outra, devia escrever seus versos sobre o balcão de sua farmácia contemplando os passantes pela rua ou observando as prateleiras repletas de medicamentos. Com seu DNA polonês e pela profissão, devia ser bem organizado, mas esqueceu de que versos não têm valor para os olhares incultos e tudo o que escreveu ficou para as calendas.