MESMA INFRAÇÃO DE TRÂNSITO, MAS MEDIDAS DISTINTAS

Por Eduardo Veronese da Silva | 18/02/2011 | Direito

MESMA INFRAÇÃO DE TRÂNSITO, MAS MEDIDAS DISTINTAS


Eduardo Veronese da Silva

Todo ano, no período de férias escolares, aumenta-se consideravelmente o número de acidentes automobilísticos nas estradas e rodovias brasileiras, principalmente com vítimas fatais. Comprova-se que em grande parte desses sinistros, o motivo se deu por falhas humanas. Entre elas, destacam-se: ultrapassagens arriscadas em locais proibidos; excesso de velocidade; falta de manutenção dos veículos, como exemplo, pneus carecas, balanceamento e alinhamento de direção, regulagem de freios etc. Não se pode esquecer, as péssimas condições das estradas e rodovias estaduais e federais.
No entanto, quando se trata dos acidentes que ocorrem em áreas urbanas, além dos fatores apresentados, outros contribuem significativamente para esse cometimento. Nesse caso, vale registrar alguns: a ingestão de bebidas alcoólicas ou uso de outra droga psicoativa (maconha, cocaína etc.); disputas de corridas em via pública (os "rachas" ou "pegas"); veículos em fuga pelo cometimento de delitos (roubo, seqüestro-relâmpago, homicídio); pessoas inabilitadas para dirigir veículos automotores. Quanto a esta última, será apresentado dois acidentes ocorridos recentemente na Grande Vitória/ES, resultando na morte de 4 (quatro) pessoas, mas que, por enquanto, o desfecho jurídico aplicado aos autores dos homicídios, se deu de forma totalmente distinta.
No final do ano passado, duas irmãs (Jamile 30 anos e Joyce 27 anos) morreram em decorrência da imprudência de um motorista inabilitado para conduzir veículos automotores. Elas estavam no Fiesta vermelho (de Joyce), conduzido pelo estudante de Direito Guilherme Queiroz, 21 anos, que perdeu o controle da direção e bateu o veículo contra um poste na Avenida Cesar Hilal, em Vitória/ES.
Segundo relato dos policiais do Batalhão de Trânsito da PMES, o automóvel estava a 120 km/h e o grupo havia acabado de sair de uma boate localizada na Reta da Penha às 5h da manhã, confirmando que o condutor não tinha habilitação (CNH). Matéria jornalista trouxe a informação de que o carro pertencia a Joyce, mas por ter ingerido bebida alcoólica, teria pedido (ou ele se ofereceu) para que o conduzisse. Presume-se que além de não possuir Habilitação ele também tenha feito uso de bebida alcoólica, tendo em vista que freqüentava constantemente a boate.
O outro acidente aconteceu no mês corrente (11/02/11), numa ladeira do bairro Jardim Tropical, no município da Serra/ES. Coincidências à parte, as duas vítimas eram do sexo feminino, porém, duas inocentes criancinhas retornando da escola. Destaca-se desse acidente que o motorista do veículo (um trator), Ezequiel de Paula Eduardo, também não possuía habilitação (igualmente a Guilherme). No dia do acidente, relatou aos policiais que perdeu o controle de direção do veículo e atropelou as vítimas, Renata e Raiane, de 9 e 10 anos, respectivamente.
A primeira vítima morreu na local do acidente, enquanto que sua amiga Raiane, dias após. A primeira pergunta feita por sua mãe inconformada e em total desespero foi: "Como pode um motorista sem habilitação pegar uma máquina para dirigir?" O sentimento dela, transfere-se para toda sociedade, como sendo de grande tristeza e de tamanha revolta.
Oportunamente questiona-se: porque nesses dois casos, com mesma infração de trânsito cometida por ambos condutores (dirigir sem estar devidamente habilitado) e circunstâncias fáticas e resultados graves (acidentes automobilísticos com vitimas fatais), teve interpretação e aplicação jurídica distinta? Vale lembrar que Guilherme Queiroz responde o processo em liberdade e Ezequiel de Paula encontra-se preso.
Não se trata de fazer pré-julgamento sem o conhecimento dos fatos relatados no processo, mas ouve-se dizer que teria sido em decorrência das condições sócio-econômicas de seus autores. Guilherme é estudante de direito, enquanto que Ezequiel o retrato fiel da massa popular brasileira, um pobre assalariado.
Vale lembrar que existem circunstâncias agravantes que "deveriam" pesar em desfavor de ambos condutores, sem nenhum privilegio legal para um ou outro, haja vista que vidas foram ceifadas quatro vidas. Como também, circunstâncias que poderiam servir como atenuantes.
Nesse caso, destaca-se que no primeiro acidente, o autor e vitimas estavam saindo de uma boate e, a princípio, teriam feito uso de drogas inebriantes (o que pode ser comprovado ou não por exames clínicos). No segundo caso, o autor estava exercendo uma atividade trabalhista para uma pessoa física ou jurídica (não se questiona aqui se a atividade seria ilegal ou não).
Sem dar maior profundidade ao assunto, o artigo coloca em evidência às inúmeras interpretações que podem ser usadas por nossas autoridades judiciárias e jurídicas (delegados de policia e juízes de direito), para aplicar a lei conforme suas convicções acerca dos fatos e circunstâncias carreadas no processo.
Deve ficar claro que nos dois casos os motoristas não possuíam habilitação para dirigir e mesmo que esse não tivesse sido o motivo para a ocorrência dos acidentes, o fato é que resultou na morte de duas belas moças e duas lindas crianças. Estima-se que esse aspecto seja fundamental no sopesar dos julgadores desse trágico acontecimento, pois o maior bem jurídico foi violado ? o direito a vida. Caso contrário, arrisca-se fazer uso do seguinte trocadilho: "o mesmo peso, mas duas medidas".


EDUARDO VERONESE DA SILVA
Bacharel em Direito ? FABAVI/ES
Especialista em Direito Militar ? UCB/RJ
Subtenente da PMES
Contato: (27) 9863.9443