MENS SANA IN CORPORE SANO
Por sebastião maciel costa | 10/11/2023 | EducaçãoMens sana in corpore sano
("mente sã em corpo são"). No contexto, a frase é parte da resposta do autor à questão sobre o que as pessoas deveriam desejar na vida (tradução livre). No limiar de novos tempos, quando a inteligência artificial avança cada vez mais sobre a fragilidade do ser humano, enquanto ente supremo na natureza viva, há de se reconhecer que, quanto mais se investe em tecnologia mais próximo se fica do signo dos códigos, dos símbolos e do automatismo que, aos poucos vai substituindo a essência do raciocínio lógico, a reflexão que enobrece, das habilidades movidas à consciência do saber de quem sabe porque aprendeu com emoção, resiliência e, acima de tudo, cm o sentimento recheia a razão de razões de ser.
À guisa de ilustração, na prática, a criança, o adolescente, o jovem, o adulto executivo não se permitem exercitar a mente para explicar um resultado matemático, ele recorre às calculadoras no celular que inevitavelmente lhe fornece resultados exatos, imediatos, e dir-se-ia, sem o exercício da mente que, fica livre para outros afazeres nessa ou naquela plataforma, pouco confiável, mas envolvente. Não se recorre mais ao dicionário para obter verbetes que ampliam sua visão sobre o pesquisado, por oferecer em uma mesma página, um sem-número de outras expressões que encantam, atraem e instruem; vão ao google: olhou copiou colou.... esqueceu.
Em se discutindo a capacidade reflexiva do homem do nosso tempo, em comparação com as alternativas disponíveis no passada, era o que existia, não nos compete julgar se o comportamento daquela época estaria adequado e o de hoje não esteja, tudo tem o seu tempo, seu ritmo sua dinâmica, suas causas e consequências. O que se chama atenção é que com o passar dos tempos as crianças estão cada vez mais dependentes no tocante a serem o que precisam ser, diante das situações que os adultos criaram em nome da ciência, da conquista, da tecnologia e da evolução. Evolução: quem de fato, tem evoluído, o ser humano em si mesmo, ou seus inventos?
Cabe recorrer a uma ilustração vivenciada em um espaço bem distante da realidade de uma determinada senhora, no alto dos seus 70 anos. Ela não conhecia muito bem a tecnologia impostas pelos bancos, mas ela precisava movimentar os seus parcos recursos com o que estava ao seu alcance. Chegando no caixa automático, boleto na mão, começou a seguir as instruções da máquina. Sim, era a máquina que comandava a operação. Ela viu uma linha vermelha a quem ela devia mostrar o documento, mais precisamente o código de barras. Como não foi ágil bastante, ela começou a “ler” o código de barras, não pelos números mas pelas barras: “ um grossa, duas finas; duas grossas, três finas; uma fina, duas grossas.... e nada. Ela desistiu. Não fora dada a ela a condição de entender como seria a leitura do código.
Desanimada, foi diretamente ao caixa para resolver um outro problema: ela precisa, mesmo sem ter conseguido efetuar o pagamento automático, levar para casa algum dinheiro em espécie. E vem aí um diálogo que nos leva refletir sobre a capacidade que tem o ser humano de ser hábil a partir do que conhece e ser inábil no que precisa ser conhecido. Mas que nem sempre se alcança os resultados esperados porque o corpo pode estar são, saudável e preparado para resolver os problemas, mas a mente que se alienou e repousou, esperando que o HD externo aja por ela. Muito cômodo, mas pouco louvável já que aliena, isola, desmerece, aniquila, por assim dizer. Vejamos: A senhora entregou seu cartão bancário ao caixa do banco e disse: — Eu gostaria de sacar R$ 50,00. O caixa disse a ela: — Para saques inferiores a R$ 100,00, por favor, use o caixa eletrônico. A senhora queria saber o porquê... O caixa devolveu seu cartão bancário e falou: — Essas são as regras, por favor, saia, se não houver mais nada. Há uma fila de clientes atrás de você. A senhora ficou em silêncio por alguns segundos e devolveu o cartão ao moço do caixa e disse: - Por favor, me ajude a retirar todo o dinheiro que eu tenho na conta. O caixa ficou surpresa, quando verificou o saldo da conta. Ele acenou com a cabeça, positivamente, inclinou-se e respeitosamente disse à senhora: — A senhora tem R$ 1.300.000,00 em sua conta, mas o banco não dispõe tanto dinheiro no momento. A senhora poderia marcar uma hora e voltar amanhã? A senhora, então, perguntou quanto ela poderia retirar imediatamente. A caixa respondeu que qualquer quantia até R$ 5.000,00. — Bem! Por favor, faça um saque de R$ 3.000,00 em notas de R$ 50,00 agora. O caixa gentilmente entregou R$3.000,00 em notas de R$ 50,00, de forma amigável e com um sorriso para ela. Afinal, era uma cliente vip, como se diz. A senhora guardou R$50,00 na bolsa e pediu ao caixa para depositar R$2.950,00 de volta em sua conta. Moral da história no primeiro comentário.
Observa-se uma marca de lições dadas pela senhora acima. No primeiro momento em que tentou pagar o boleto com o código de barras, a máquina não foi acolhedora o suficiente para envolve-la, atende-la na sua necessidade. E nem podia. A inteligência artificial tem seus propósitos estabelecidos pelos elementos estruturais, digamos corporais. Ali se fez valer o número, a programação, o viés puramente frio, mecânico que faz do homem, o seu objeto. A senhora se sentiu só. A ela não fora dada em seu tempo a necessária instrução “ensinada” com o intuito de elevá-la, mas “decifra-me ou devoro-te”. Se não houve sanidade por parte da máquina, houve frustração por parte da senhora. Naquele momento, ela sentiu a necessidade da empatia, do afago, do ser humano que a atendesse.
No segundo momento, houve o embate entre dois “corpos” aparentemente sãos, mas não houve a constatação de duas mentes sãs. A senhora, já minimizada pela experiência anterior, ansiou pelo acolhimento do caixa ao vivo e cores. Frustrou-se, expôs-se, mostrou competência, habilidade, reflexão, conhecimento numérico e linguístico. constatou como o ser humano trata o outro: a partir da conta bancária, como se diz. Fez o que queria, em detrimento da opinião insensível do caixa que pretendia manipulá-la em nome de regras. A senhora provou, para si mesma e para os outros, que a lógica passa pela capacidade de reflexão, de conhecimento e domínio da situação.
Trazendo todo o enfoque da discussão para a forma como muitas crianças estão sendo criadas, não para entender o mundo mas esperando que o mundo entenda que ela existe e precisa ser respeitada. Formula-se um questionamento: Entre o cuidar do corpo, da segurança e do bem-estar que a maioria das famílias dedicam aos seus filhos, na busca de um corpo são, como tem sido trabalhado o fortalecimento da mente, da alma, do espírito, do ser humano que precisa estar apto a enfrentar o mundo do porvir? De que forma os nossos adolescentes estão sendo fortalecidos na fé, na auto-estima e na capacidade de pensar por si mesmos sem ir de encontro às regras sociais que têm sido cada vez mais conflitantes?
As famílias têm dedicado os seus melhores momentos à formação dos seus filhos, seja no recôndito do lar, seja na sociedade, na escola, nas ruas... E nas redes sociais? De que forma, os pais que precisam trabalhar para a manutenção dos seus filhos em todos os compromissos que a pauta impõe, têm mantido a mente sã, para formação de mentes sãs que vão encontrar na rua, opiniões contrárias às suas, normalmente influenciado o adolescente aa hábitos nocivos à boa formação moral pautada em valores éticos e positivos? Acredita-se ser o grande desafio do século: competir com as redes sociais, as telas, os influenciadores digitais, o linguajar de baixo nível, os esportes de pouca qualidade vital onde se pensa no físico, no financeiro, no ter, no enfrentamento, no desafiar.... E onde se aprende a ser? Em casa, na escola, na rua, nos livros, no comando ou no exemplo.
O mundo começa dentro de casa. A educação é domiciliar já foi aprovada e comprovada como eficaz em numerosos países. É reconhecida ou regulamentada em mais de 60 países nos cinco continentes, Esse rótulo domiciliar não restringe a educação apenas no seio da família. Mas é ali que ela nasce, cresce, se solidifica e, manda pra o sistema educacional, pessoas fortes no corpo, na mente e na forma de ver o mundo e agir. Nessa perspectiva, podemos recorrer ao período em que as crianças do Brasil ficaram presas em casa por conta da última pandemia. Quando a COVID-19 chegou, ela tirou a criança da escola, para mantê-la segura e optou pelo ensino em casa. Foi uma experiência pioneira nos nossos tempos. Agora, urge uma reflexão: o que elas aprenderam a ser nesses anos? Elas saíram mais fortes em corpo ou em mente? Saíram mais saudáveis, mais fortes, mais positivas, mais preparadas mais decididas? Mesmo após o retorno às escolas, ela continua esta caminhada “educacional” do filho, ou delega à escola tal papel?
Existe a liberdade da família no tipo de educação a ser dada aos seus filhos. Educação. À escola, cabe a escolarização. Isso está baseado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, Artigo 26, e no Código Civil Brasileiro, Artigo 1.634. Quando se obtêm bons resultados na educação dada pelas famílias, o papel da escola se expande e, aliados: família, escola e estudante, os resultados são gratificantes para toda a sociedade. “O que você faz fala tão alto que eu não consigo ouvir o que você diz”. Essa expressão cobra de nós adultos, pais ou professores, formadores de mentes sãs, posicionamentos firmes, sem molestar, sem desafiar, sem enfrentar, mas ouvindo, apoiando, criando condições para que pelas nossas mãos passem pessoas que farão a diferença, no futuro. As crianças nos fazem pessoas melhores. E pessoas melhores cuidam melhor do corpo e da mente daqueles que esperam o melhor da vida
· Sebastião Maciel Costa