MEIO AMBIENTE DO TRABALHO, ACIDENTE DO TRABALHO E RESPONSABILIDADE OBJETIVA
Por Cristiano Paulo de Oliveira | 20/12/2010 | DireitoA quem ainda estranhe o tema Meio Ambiente do Trabalho, já que "meio ambiente" por si só remete a todo o meio em que a vida pulsa; a fauna e a flora. Impossível não ouvir falar desta sem que se lembre de preservação da natureza, da proteção das florestas, da água, do ar. Principalmente nesta época em que se falam tanto das alterações climáticas, ondas de calor e chuvas torrenciais, a natureza respondendo ao Homem tantos anos de degradação.
E qual é o sentido deste "meio ambiente" no Trabalho?
De fato é compreensível tamanha confusão, já que o legislador trabalhista preocupou-se com a proteção do trabalhador, no que diz respeito a sua saúde no seu local de labor, ou seja, somente naquele local preciso, muito bem definido e delimitado pela prestação de serviços. No entanto, de forma literal Meio Ambiente envolve um lugar mais amplo, capaz de envolver não só o local de trabalho, mas o todo que externamente o cerca, que o envolve.
A proteção ao Meio Ambiente do Trabalho possui status constitucional, já que está presente em importantes artigos de nossa Constituição, senão vejamos :
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação. (Grifo meu)
Temos como o destaque a valorização do trabalho humano, não no sentido da remuneração, mas da co-existência com dignidade e respeito, de acordo com o que estabelece vários princípios, dentre eles a defesa de um meio ambiente saudável, orientando a uma forma de tratativa diferenciada conforme a possibilidade de impacto ao meio, face aos procedimentos necessários para tanto.
Destaque para o impacto ambiental dos processos de elaboração e prestação de produtos e serviços que venham afetá-lo, cuja responsabilidade deve ser atribuída ao responsável direto, no qual se encontra presente nesta cadeia o empregador, cujo empregado se encontra diretamente ligado a estas atividades e, portanto, merece proteção.
Desta feita, o Artigo 1º, inciso III da Carta Magna, aborda o Princípio Fundamental da Dignidade da Pessoa Humana, reafirmando este importante ensinamento na valorização de uma vida segura e sadia que deve ser atribuída aos principais atores deste impacto ora produzido, senão o trabalhador.
Ainda temos o Artigo 200, inciso VIII também da Constituição da República no qual estabelece ao Sistema Único de Saúde a competência além de outras atribuições a colaborar com a proteção do meio ambiente, em que se compreende o do trabalho. Taxativamente incluindo o Meio Ambiente do Trabalho na definição geral de Meio Ambiente, encerrando qualquer tipo de discussão contrária.
Não obstante, há que se demonstrar o que ensina todo o capítulo previsto em nossa Carta Maior, qual seja o artigo 225 e seus incisos, precisamente:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá - lo para as presentes e futuras gerações.
(...)
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
Ora, a todos é garantida um meio ambiente saudável, cuja existência nesta forma é essencial a qualidade de vida, extensiva ao meio ambiente do trabalho, com obrigação de defesa por parte do Poder Público, assim como toda a coletividade, inclusive através da promoção através da Educação em todos os níveis de ensino.
Diante destes aspectos constitucionais, vemos que tamanha importância da proteção do Meio Ambiente do Trabalho, no que diz respeito não só ao trabalhador em seu ambiente exclusivo de prestação de serviços, mas perante todo o meio que o cerca, já que trata de um direito fundamental.
De acordo com o Professor Júlio César de Sá da Rocha :
"O meio ambiente do trabalho representa todos os elementos, inter-relações e condições que influenciam o trabalhador em sua saúde física e mental, comportamento e valores reunidos no lócus do trabalho, caracterizando-se, pois, como a soma das influências que afetam diretamente o ser humano, desempenhando aspecto chave na prestação e performance do trabalho."
A proteção deste meio ambiente em prol do trabalhador é extremamente necessária, uma vez submetido algum tipo de infortunística, seja ocasionada pela falta de proteção aos incidentes decorrentes do ambiente laborativo ou do meio ambiente que o cerca, venha encontrar sempre o amparo necessário, mesmo naqueles de cunho psicológicos, conforme nos ensina o renomado Professor Júlio César de Sá da Rocha :
"No que diz respeito às relações humanas no meio ambiente do trabalho, são cada vez mais importantes as análises acerca dos elementos psicológicos como a pressão para desempenho da atividade, que desencadeia a depressão e distúrbios emocionais. O meio ambiente de trabalho constitui-se em espaço de concretização das relações de trabalho. Na realidade uma noção de um lócus onde se presta o trabalho humano requer uma necessária correlação sobre a atividade desempenhada, condições e performance do trabalho, bem como, sobre os riscos que podem ocasionar efeitos físicos, psíquicos e sociais sobre o ser humano trabalhador".
A partir desta citação, vemos que o ambiente do trabalho não significa, novamente, limitação ao seu aspecto objetivo, mas também no que tange a subjetividade dos aspectos psicológicos e atemporais.
Como não poderia ser diferente, a falta da preparação de nossos empresários, motivado pelo descaso do poder público torna o ambiente de trabalho um local muito aquém de um mero sustento da família e de desenvolvimento pessoal; a perda de uma vida saudável.
Ora, se o ambiente de labor não se submete aos controles necessários que possam indicar uma condição saudável de trabalho, estaremos diante de que tipo de ambiente?
O foco passou a ser o lucro, por meio da produtividade em demasia, exagerada, da mão-de-obra sem qualificação (porque é envolve custos nesta preparação); na falta dos Equipamentos de Proteção Individual (justamente por ser caro); do plano de ação e desenvolvimento dos trabalhadores (porque é considerado por muitos empresários "mera bobagem"). Sem falar no constante e crescente mercado da informalidade, sem controle, sem acesso a Justiça, sem qualquer tipo de orientação, mesmo que seja de apenas sentido.
Alinhado a falta de uma política de proteção ao Meio Ambiente do Trabalho, em um sentido mais objetivo, qual seja através do próprio Governo, mediante ações interventivas e preventivas em todos os ramos laborais, para por fim, depararmos com os Acidentes do Trabalho, nosso próximo tema.
ACIDENTE DO TRABALHO
O saudoso Professor Octaviano Bueno Magano ensinou que: "Acidente do trabalho é o evento verificado no exercício do trabalho de que resulte lesão corporal, perturbação funcional ou doença que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho" .
Trata-se do evento ocorrido no exercício das atividades laborativas, capazes de ocasionar ao empregado, àquele que presta os serviços, que vende sua força de trabalho lesões corporais capazes de causar desde a perda da funcionalidade, total ou parcial e nos piores casos a própria morte. Levando ao seio da família a ruptura de um dos fortes laços desta importante entidade, e que se encontra protegida pela Constituição Federal de 1988, senão vejamos : "Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado."
Da mesma forma, o Acidente do Trabalho também recebeu proteção da nossa Carta Magna, através de um seguro contra acidentes e de uma indenização, sob as expensas do empregador de modo a garantir ao empregado ou a sua família, no caso de óbito, uma forma de compensação pelos danos sofridos. Vejamos na íntegra :
Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XXVIII ? seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;
Logo após a promulgação da Constituição de 1988, a Lei 8.213/91 , fixou o conceito de Acidente de Trabalho, senão vejamos:
Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
Em tempo, os segurados especiais de que trata este artigo são o produtor rural, o seringueiro e o pescador artesanal, cuja proteção aos acidentes de trabalho, também lhe foram estendidas.
O conceito de Acidente do Trabalho se confunde com o da Causalidade Direta, de acordo com os ensinamentos do i. magistrado Dr. Sebastião Geraldo de Oliveira , qual seja:
Na causalidade direta o nexo fica caracterizado quando o acidente ocorre "pelo exercício do trabalho a serviço da empresa". Nota-se uma vinculação imediata entre a execução de tarefas e o acidente ou doença que afetou o empregado. O acidente típico e as doenças ocupacionais estão enquadrados nessa modalidade de nexo causal.
O nexo de causalidade ou nexo causal é tão somente o elo entre atividade laboral e o acidente do trabalho ou doença ocupacional, nada mais do que uma "ponte" entre ambos, uma "corrente" que se amolda e torna capaz de definir com relevância a sua participação na definição do sinistro.
É preciso ressaltar que um ambiente do trabalho deve ser voltado para a segurança dos empregados, assim como o todo que o envolve, oferecendo um ambiente saudável, sem riscos, que atenda todas as normas e exigências da Segurança do Trabalho, promovendo, desta forma, com o bem estar laborativo.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA
A Responsabilidade Objetiva é também conhecida como a Teoria do Risco, uma vez que basta ao autor demonstrar o dano e a relação de causalidade para atribuição desta responsabilidade, esclarecendo que "basta que haja o dano e o nexo de causalidade para surgir o dever de indenizar, sendo irrelevante a conduta culposa" .
A Responsabilidade Subjetiva, por sua vez, exige a confirmação de três pressupostos essenciais, qual sejam o Dolo, a Culpa do Empregador e o Nexo Causal; lembrando que haverá dolo quando este ou um de seus prepostos praticarem com intenção o manifesto desejo de prejudicar ou lesionar algum direito do trabalhador.
Na Culpa, não há como prever o resultado final da conduta, que pode surgir por uma ação ou omissão, ao passo que não existe a vontade de prejudicar o obreiro; não esta configurada a intenção de prejudicar direito alheio.
Quanto ao Dolo, não só deseja o resultado, como contribui para que aconteça.
O grande Mestre Caio Mário nos traz um aspecto histórico, que não pode ser esquecido:
A insatisfação com a teoria subjetiva tornou-se cada vez maior, e evidenciou-se a sua incompatibilidade com o impulso desenvolvimentista de nosso tempo. A multiplicação das oportunidades e das causas de danos evidenciaram que a responsabilidade subjetiva mostrou-se inadequada para cobrir todos os casos de reparação. Esta, com efeito, dentro na doutrina da culpa, resulta da vulneração de norma preexistente, e comprovação de nexo causal entre o dano e a antijuridicidade da conduta do agente. Verificou-se, como já ficou esclarecido, que nem sempre o lesado consegue provar estes elementos. Especialmente a desigualdade econômica, a capacidade organizacional da empresa, as cautelas do juiz na aferição dos meios de prova trazidos ao processo nem sempre logram convencer da existência da culpa, e em conseqüência a vítima remanesce não indenizada, posto se admita que foi efetivamente lesada. Impressionados com esta situação, juristas da maior envergadura se rebelaram contra os termos restritivos do art. 1.382 do Código Napoleão (Gaston Morin, Saleilles, Josserand, Georges Ripert), e por via de processo hermenêutico entraram a buscar técnicas hábeis a desempenhar mais ampla cobertura para a reparação do dano. E assim veio a nascer a doutrina objetiva, cujo surgimento foi historiado no Capítulo II. Essas circunstâncias que revelaram a insuficiência da teoria da culpa são mencionadas por todos os autores, como Agostinho Alvim menciona (Da Inexecução das Obrigações, nº 196, p.293 da ed. de 1965; Antônio Chaves, Tratado, vol. III, nº 67; Wilson Melo da Silva, Responsabilidade sem Culpa, nº 9 e segs.).
O emérito jurista destaca a insatisfação geral com a Teoria da Responsabilidade Subjetiva, destacando pontos importantes de diferenciação no que tange a possibilidade da aplicação da justiça, como a desigualdade econômica e a capacidade de organização empresarial. Destacando, inclusive, a consequência do trabalhador, lesionado em seu ambiente de trabalho sem direito a ser indenizado pelo dano sofrido.
Diversas ações trabalhistas são propostas todos os dias na busca de alguma reparação por danos morais, materiais e estéticos, pelo número considerável de casos de acidentes/doenças relacionado à execução das atividades laborais, seja ocasionadas dentro ou fora do Meio Ambiente de Trabalho do empregador, mas que também possa ocorrer em virtude dele.
Por isso a necessidade de se manter um Ambiente de Trabalho saudável, que quer dizer, livre de todos os riscos possíveis a saúde do trabalhador.
É preciso destacar que nossa Constituição, através do Artigo 225, § 3º promove a defesa do meio ambiente por meio da aplicação da Teoria da Responsabilidade Objetiva, no que merece atenção:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
(...)
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Conforme destacado em epígrafe, o Meio Ambiente do Trabalho está constitucionalmente incluído no conceito geral de Meio Ambiente, através do artigo 200, inciso VIII :
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da Lei:
(...)
VIII ? colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.
A análise deve ser realizada de forma extensiva, no qual temos que a Teoria da Responsabilidade Objetiva deve ser aplicada àqueles que causarem dano ao meio ambiente, lembrando que o meio ambiente do trabalho faz parte do conceito geral, conforme nossa Carta Maior.
Diante do exposto, esta Teoria possui um campo de atuação muito amplo, bastando muito mais interpretações e discussões neste sentido, para que possa realmente fazer a diferença, até que torne possível concretizar um Meio Ambiente do Trabalho livre dos principais riscos a saúde do trabalhador.
CONCLUSÃO
Analisando o Meio Ambiente de Trabalho, garantido constitucionalmente, não há sombra de dúvidas quanto à responsabilidade do empregador, em que pese à obediência as Normas de Segurança no Trabalho; o cumprimento da carga horária legal; fornecimento dos EPIs (Equipamento de Proteção Individual) de acordo com as normas de validade e utilização e fiscalização do trabalho por pessoas habilitadas, como Técnicos e Engenheiros de Segurança, observando sempre as Normas Regulamentadoras de proteção ao empregado.
Contudo, conforme o exposto, preciso destacar que o Meio Ambiente do Trabalho está incluso na definição constitucional de Meio Ambiente, portanto, a Teoria da Responsabilidade Objetiva deve ser aplicada sob todos os seus aspectos.
O Acidente do Trabalho, sendo aquele que ocorre pelo exercício das atividades laborais, do qual o empregador se aproveita de todo o bônus, deve também ser submetido a arcar também com o ônus que dali advém, já que estamos nos referindo de algo muito mais amplo do que uma relação contratual, estamos falando de um ser humano.
A merecida atenção a sua proteção deve ser algo a ser sempre incentivado, porque desta forma estaremos estendo a sua família, a sua história de vida, a sua dignidade e vontade. Pois são estes trabalhadores que conduzem a economia do país e como tal devem ser respeitados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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MAGANO, Octaviano Bueno. Lineamentos da Infortunística. São Paulo: José Bushatsky, 1976.
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional / Sebastião Geraldo de Oliveira. 3. ed. rev., amp. e atual. São Paulo: LTr, 2007.
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