MATRIZES EPISTEMOLÓGICAS: POSITIVISMO, FENOMENOLOGIA E MATERIALISMO.

Por Márcio Issler | 04/07/2017 | Educação

No presente texto, propõe-se abordar a concepção de Sujeito, Sociedade e Educação, nas três matrizes epistemológicas: Positivismo; Fenomenologia; Materialismo. Destaca-se, a importância de se conhecer as diversas matrizes como norteadoras das pesquisas atuais. A respeito do positivismo, seu pensamento influenciou, e ainda influencia pesquisas no campo educacional, pois, sua visão privilegia as ciências físicas e naturais, por meio de métodos e técnicas; a fenomenologia, voltada para a existência do ser humano como ele realmente é, a ideia de ser no mundo criado pela consciência. E o materialismo enquanto ciência a construção social do conhecimento, da realidade e do movimento, entendendo que as complexidades dos fatores interferem direta ou indiretamente a sociedade procuramos então apresentar brevemente essas três matrizes epistemológicas.

AUGUSTO COMTE

Nascido na franca no ano de 1789, Augusto Comte iniciou seus estudos em 1804, como instrutor preparando-se para escola primária. Afastou-se das ideias de Saint-Simon, mestre da escola politécnica, passando a elaborar princípios de sua ciência positiva.

Obteve sucesso com a publicação de Plano dos trabalhos científicos necessários para reorganizar a sociedade, e, mais tarde, de seu Sistema de política positiva.

Na elaboração de sua filosofia que culminou em uma religião teve ligação com a escritora francesa Clotilde de Vaux (que morreu em 1846).

Teve como ideia central de reorganizar a sociedade francesa pós-revolução, afirmando-se ser um anarquista das idéias. Tomou por base a ciência, vendo em seu positivismo a única maneira de reorganizar a sociedade.

SOBRE O POSITIVISMO

O positivismo se compõe essencialmente duma filosofia e duma política, necessariamente inseparáveis, uma constituindo a base, a outra a meta dum mesmo sistema universal, onde a inteligência e a sociabilidade se encontram intimamente combinados.

Seu pensamento então pode ser devido em três preocupações: filosofia da história, na qual se encontra as bases da filosofia positiva, (teológico, metafísico, positivo); a fundamentação e classificação das ciências (matemática, astronomia, física, química...); e a elaboração de uma disciplina especifica que estuda os fatos sociais, a Sociologia. Sua evolução se deu em três grandes períodos, a saber: positivismo clássico; o empiriocriticismo, e o neopositivismo (TRIVIÑOS, 1987 p. 33).

EDUCAÇÃO POSITIVISTA

A educação na teoria positivista é entendida como uma doutrina educativa, redentora e universal, Bergo, (1983) afirma que:

Se a pretensão do positivismo é regenerar a humanidade, a educação aparece como o ponto de unidade do sistema. A primeira característica é o autoritarismo educacional, subordinando a inteligência individual à sociabilidade herdada do primeiro elemento educativo: a mulher. A educação intelectual define-se como apropriação individual dos valores do conhecimento, mas submetida à marcha do espírito humano (p. 56).

A educação proposta por Comte prioriza assim a reorganização da sociedade capitalista que se pode chegar a uma sociedade de valores, apontando como base a Ordem como constituinte para que o Progresso atinja seu êxito.

Em augusto Comte, vemos o grande esforço para a construção de uma identidade nacional, para tanto é possível visualizarmos tal ação ao longo do ensino de história baseado em grandes heróis da história. O Brasil teve seus heróis inventados: O mártir da independência, o grande general que combateu na guerra do Paraguai, esses são o foco central do ensino de História do Brasil (RUCKSTADTER, 2005).

 

RELAÇÃO – SUJEITO

No positivismo é mérito a elevação do sujeito, dentro do processo de construção do conhecimento, tendo como método percorrer o caminho que leva reprodução, ou aplicações racionais (técnicas), para a manipulação e para o controle.

A relação entre sujeito-objeto acontece de modo unilateral, pois o sujeito não interfere no objeto, o pesquisador apenas observa, e constata os resultados que podem ser obtidos do objeto por meio de comparações estatísticas e objetivas.

A relação sujeito-objeto é trabalhada de maneira dicotomizada com a intenção de garantir a isenção de juízos de valor, que viriam contaminar os resultados da pesquisa. A posição positiva é a de que seria possível uma manipulação objetiva do objete, que na perspectiva de que ele se impõe ao sujeito que o teria apenas que retratar, quer na perspectiva de que a sua manipulação não precisa deixar no objeto a marca do sujeito e da sociedade (CARVALHO, 2010, p. 10).

De fato se pensarmos nas contribuições do positivismo tem em mente que a união entre a ciência e da técnica, foi de suma importância para o espiritual e material do país, influenciando diretamente a vida social, a política, bem como as relações educacionais de outros povos.

SOCIEDADE

            Em relação à sociedade esta “só existia sociedade na medida em que seus membros partilhavam de um corpo de pensamento e sentimentos coerentemente construído e que refletia a etapa de desenvolvimento da humanidade” (SUPERTI, 1998, p. 1).

Para Comte,

De acordo com nosso autor, não eram as instituições, as relações materiais e estrutura hierárquica que constituíam o núcleo da sociedade humana, mas sim o conjunto de idéias, representações e crenças que formavam a maneira de pensar unanimemente partilhada por todos no grupo, ou seja, que engendrava o consenso, unindo os homens em uma dada ordem. E por ser assim, tanto a superação da crise como a reorganização da sociedade não podiam ocorrer com a limitação das ações sobre as instituições, era preciso uma reforma intelectual que atingisse o modo de pensar, de representar a vida social (SUPERTI, 1998, p. 1).

Portanto, para Augusto Comte, não se tratava apenas de compreender e entender a sociedade na forma como esta colocada, mas sim em realizar com auxilio da educação uma nova ordem social que pudesse chegar a seu desenvolvimento pleno.

FENOMENOLOGIA

A fenomenologia teve seu auge com o matemático e filósofo Edmund Husserl, entendendo que o ser humano esta cercado por coisas que relativizam o conhecimento. Husserl por meio da ideia da intencionalidade percorreu o caminho do sentido das coisas como uma manifestação imediata na percepção imanente. No que tange a intencionalidade esta é pensada como capaz de superar em um ponto o relativismo das mediações para fornecer um ponto de partida seguro, embora o desenvolvimento hermenêutico não esteja assegurado (MARTINS, 1992, p. 50).

EDUCAÇÃO

 

Em relação à educação a fenomenologia parte para o vivido da educação (dados empíricos, provisórios). Assim a educação e a vivencia são inseparáveis, pois, são dadas a cada passo. A experiência fenomenológica na educação cria possibilidades para que a percepção do ser humano se desenvolva e este se eduque.

Na fenomenologia e educação é entendida como parte do ser humano que demonstra suas características essenciais em formação. “O ser humano está sendo” (JOSGRILBERG, 2015, p. 9). 

Portanto, é intrínseco a educação possuir uma dimensão social, presente nas diversas culturas, pois entendemos que somos natureza, mas natureza transformada culturalmente (JOSGRILBERG, 2015).

Conforme anteriormente dito a educação tem como função auxiliar na releitura do mundo, orientando assim ao ser humano a uma nova forma de perceber a natureza e tudo que a transforma seja socialmente ou culturalmente.

RELAÇÃO SUJEITO-OBJETO

 

O sujeito-objeto na fenomenologia acontece mediante as trocas, em um encontro entre a consciência e as coisas, se constituindo assim a relação como verdadeiro conhecimento. Nem a consciência se constitui sozinha ao conhecimento, nem as coisas ao mundo.

Na relação sujeito-objeto existe uma separação dicotômica, pois,

a ideia fundamental e básica da fenomenologia é a noção de intencionalidade. Essa intencionalidade é da consciência, que sempre esta dirigida a um objeto. Isso tende ao reconhecimento do principio de que não existe objeto sem sujeito, embora a fenomenologia eleve a importância do sujeito no processo de construção do conhecimento (CARVALHO, 2010, p. 13).

 

O fenômeno sempre será o objeto de investigação fenomenológica, sendo que por fenômeno, devemos ter como compreensão, tudo o que é passível de manifestação, que se desvela se colocando a mostra na consciência do sujeito que o questiona. Portanto um dos questionamentos feitos pela fenomenologia esta em discutir a objetividade científica, defendida anteriormente pelo positivismo na relação entre o sujeito que conhece e o fenômeno a ser conhecido.

SOCIEDADE

Um dos objetivos de Husserl era buscar o fundamento das coisas “voltar às coisas mesmas” ou ao mundo da vida. Portanto o fenômeno veio para que a sociedade fosse denunciada e que esta pudesse estreitar e não distanciar-se com ocorria entre o mundo da vida e o da ciência (TRIVIÑOS, p. 43).

Para o fenomenólogo “o real não é o mundo visto pelos olhos das ciências, mas aquilo que eu experiencio, aquilo que eu vivo” (Martini, 1999), pois nesse sentido o questionamento principal em relação à forma como a sociedade vem se desenvolvendo esta em a ciência ter pouco a oferecer em questões referentes à humanidade, deixando de lado questões essenciais ao ser humano e a sociedade, existindo uma distância entre o mundo que é experienciado com o mundo cientifico.

Portanto, com a leitura da matriz fenomenológica busca-se reaprender o mundo da forma como ele nos aparece como ele é deixar e fazer ver por si mesmo aquilo que se mostra, tal como se mostra a partir de si mesmo (Martini, 1999). Compreendendo assim que não se trata de abandonar a razão ou mesmo a ciência, mas em redescobrir o mundo sem os olhos técnicos ou mesmo científico.

 

MATERIALISMO (HISTÓRICO DIALÉTICO)

Entende-se como a aplicação da teoria desenvolvida por Karl Marx, ou seja, o estudo da evolução das sociedades, dos modos de produção de bens materiais, condicionantes da vida social, intelectual e política, que estão em plena interação com a base material da sociedade.

Ambos Marx e Engels afirmam que “a história de todas as sociedades do passado é a história da luta de classes” no decorrer de todo processo histórico, das relações econômicas que evoluíram segundo uma luta dialética entre os que detêm os meios de produção e os trabalhadores explorados esta o materialismo histórico dialético. (BORGES; DALBERIO, 2007, p. 7).

O materialismo dialético não só tem como base de seus princípios a matéria, a dialética e a pratica social, mas também aspira ser a teoria orientadora da revolução do proletariado (TRIVIÑOS, 1990, p. 51)

O materialismo histórico é a ciência filosófica do marxismo que estuda as leis sociológicas que caracterizam a vida da sociedade, de sua evolução histórica e da prática social dos homens, no desenvolvimento da humanidade. O materialismo histórico significou “uma mudança fundamental na interpretação dos fenômenos sociais que, até o nascimento do marxismo, se apoiava em concepções idealistas da sociedade humana” (TRIVIÑOS, 1990, p. 51).

Dessa forma, o pesquisador que adere à matriz materialismo histórico dialético, “deve ter presente em sua estrutura de pensamento – visão de mundo - uma concepção dialética da realidade natural e social e do pensamento, a materialidade dos fenômenos e que estes são possíveis de conhecer” (Triviños 1990, p. 73).

O SUJEITO-OBJETO

Para o materialismo dialético existe uma relação (dialética) dos polos contrários, que produz o desenvolvimento ou mesmo o movimento do científico, por não compreender que exista um método sem o objeto. Portanto o sujeito aprende em constante movimento entendido aqui como o movimento do real, buscando capturar no plano da razão algumas categorias já existentes neste movimento.

Assim em meio a este movimento de contrários é possível apreender aquilo que não esta dado, mas que com auxilio dos sentidos  podemos descobrir. Para tanto é preciso que seja feita uma reconstrução do real ao nível do pensamento, o objeto não existe sem o sujeito e vice-versa.

Em Marx, temos o sujeito parte que integra a natureza, mas que não se confunde com ela, pois,

o homem é um ser natural porque foi criado pela própria natureza, porque depende da natureza, de sua transformação, para sobreviver. Por outro lado, o homem não se confunde com a natureza, o homem diferencia-se da natureza, já que [a] usa (...) transformando-a conscientemente segundo suas necessidades e, nesse processo, faz-se homem. Assim, Marx, a um só tempo, identifica e distingue homem e natureza, e naturaliza e humaniza o homem e a natureza (Andery & SÉRIO, 1999, p. 403).

O sujeito aqui é entendido em sua integração com a natura “que o homem constrói e transforma a si mesmo e a própria natureza”, ao mesmo tempo em que, a natureza se humaniza “e o homem na sua relação com ela deixa de ser um produzido puro para se tornar um produzido produtor do que o produz” (ANDERY & SÉRIO, 1999, p. 403).

O sujeito em Marx é compreendido como um ser genérico, isto é, como ser que opera sobre o mundo, sobre os outros sujeitos e sobre si mesmo, enquanto espécie que luta por sua sobrevivência.

Contudo, não é limitado apenas à sobrevivência, pois busca transformar a sociedade e a natureza, se sentido capaz de realizar tal transformação porque se reconhece e reconhece ao outro nesse processo.

Portanto, brevemente compreendemos que o sujeito nesta matriz teórica é compreendido como uma espécie natural, que se diferencia das outras espécies de animais não somente por sua atividade produtiva consciente, que não é determinado por suas necessidades imediatas, mas por pensa-las em longo prazo.

 

EDUCAÇÃO

 

            O conceito de educação no materialismo tem suas raízes no empirismo positivista, pois em um primeiro momento, quando realizamos uma análise do objeto e o descrevemos, é a partir desse momento de observação que se realiza a abstração do objeto, sua conceituação geral, universal e científica.

            Já em um segundo momento temos uma inversão, pois este volta-se o racionalismo idealista, com determinações abstratas que  retornam ao nível do concreto.

            Nesse sentido entendemos que “o primeiro passo reduziu a plenitude da representação a uma determinação abstrata; pelo segundo, as determinações abstratas conduzem à reprodução do concreto pela via do pensamento” (MARX, 1973).

            Tal retorno, posteriormente será vinculado à filosofia tendo como realidade material, configurando-se assim como uma pedagogia Marxista.

            A educação não é pensada de forma independente ou desvinculada da realidade material, mas dentro das relações materiais devem ser pensadas dentro do processo de educação.

            Por isso “o materialismo histórico como base do processo educacional e a crítica à concepção de educação burguesa que não considera os educandos como homens concretos, síntese das relações sociais, mas como homens abstratos” (HELTON, 2009, p. 3).

          A educação é uma tarefa histórica da emancipação do homem, de sua libertação das ilusões ou ideologias, tendo como finalidade mostrar-lhes os fundamentos sociais, gerando assim uma práxis revolucionária para modificar o mundo.

            Assim a educação fundamenta-se na análise do processo histórico, como ponto de partida para á critica a burguesia, para uma práxis libertadora.

SOCIEDADE

 

            Nessa matriz teórica a sociedade é entendida como uma estrutura organizada na qual existem oprimidos e opressores. Para compreendermos a sociedade é preciso lembrar que esta é caracterizada pelo movimento de pensamento que circula pela materialidade histórica presente na vida dos homens e que de certa forma organiza a vida social.

            Portanto pensarmos na sociedade para o materialismo é também pensarmos nos desenvolvimentos dos meios de produção, que se sucederam ao longo dos séculos, no chamado desenvolvimento das forças produtivas, bem como nas relações de produção desenvolvidas pelos homens, sendo que para que para esta sociedade ser transformada é necessária uma educação para a transformação, tendo como ponto de partida a situação atual.

CONCLUSÃO

 

Ao longo do texto podemos perceber as contribuições das três matrizes epistemológicas, Positivismo, Fenomenologia e Materialismo. Tais matrizes estudadas são parte integrante da academia, presente nas pesquisas na área de educação.

É, portanto importante que tenhamos tal conhecimento para que possamos entender o passado a fim de que no mundo contemporâneo possamos estabelecer relações que são de suma importância para a educação.

Referências

 

ANDERY, M. A. & SÉRIO, T. M. A Prática, a História e a Construção do Conhecimento: Karl Marx (1818 – 1883). In: ANDERY, M. A. et al. Para Compreender a Ciência: Uma Perspectiva Histórica. São Paulo: EDUC / Espaço e Tempo, 1999.

BERGO, Antonio Carlos. O positivismo: caracteres e influência no Brasil. Reflexão, Campinas, ano VIII, n. 25, p. 47-97, jan./abr. 1983.

CARVALHO, Janete Magalhães. A visão de ciência e de metodologia de pesquisa em diferentes perspectivas e/ou escolas filosóficas. Cadernos de Pesquisa em Educação- PPGE-UFES. Vitória; v.16 n. 32; p. 8-28. Jul/dez. 2010. Disponível em: <http://periodicos.ufes.br/educacao/article/view/4403/3445> acesso em: 15 de jun de 2016.

HELTON, Sales. Marxismo e Educação. Centro de Mídia Independente CMI. 2009 disponível em: <http://www.midiaindependente.org/pt/red/2009/08/451443.shtml> Acesso em 21 de jun de 2016

JOSGRILBERG, Rui.  Fenomenologia e Educação. In: Lauand, Jean (org.) Estudos em antropologia, religião e educação: São Paulo: Factash Editora, 2015. Disponível em: <http://www2.fe.usp.br/~cemoroc/EstudosIJeanRui2015.pdf> Acesso em 22 de jun de 2016.

MARTINS, Joel. Um enfoque fenomenológico do currículo: educação como Poiésis. São Paulo: Cortez, 1992.

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MARX, Karl. Contribuição para a crítica da economia política. 3. ed. Lisboa: Estampa, 1973.

RUCKSTADTER, Vanessa Campos Mariano. Positivismo e educação: Alguns Apontamentos. 2º Seminário Nacional Estado e Políticas Sociais no Brasil. Unioeste- campus de Cascavel. Anais. Disponível em <http://cac-php.unioeste.br/projetos/gpps/midia/seminario2/trabalhos/educacao/medu32.pdf> Acesso em 16 de jul 2016.

SUPERTI, Eliane. O Positivismo de Augusto Comte e seu Projeto Político. 1998. Disponível em: <http://portal.estacio.br/media/3708663/eliane-superti.pdf> Acesso: 16 jul de 2016.

TRIVIÑOS, Augusto N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.

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