Maioridade Penal
Por Bruno Oliveira | 23/04/2010 | DireitoMAIORIDADE PENAL
Bruno Costa Rosa de Oliveira
Graduado em História, acadêmico de Direito, funcionário publico.
Sumário: 1. Introdução; 2. Redução da Maioridade Penal; 3. Considerações Finais; 4. Bibliografia.
Palavras-chave: Maioridade penal; Adolescente; Política.
1 - Introdução
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), criada com a aprovação da lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990. Decorridos quase 20 anos da aprovação desta, que tem por objetivo dispor sobre a proteção integral à criança e ao adolescente, é necessário fazermos uma análise acerca da efetividade dessa lei. No seio de nossa sociedade diversos setores sociais acreditam que a perpetuação da violência urbana está ligada a uma impunidade juvenil. A partir disso, fazemos uma análise sobre a criação de diversas emendas constitucionais que possuem o intuito de modificar o art. 228 da Constituição Federal e reduzir a maioridade penal.
Quando o tema é violência e criminalidade, especialmente envolvendo jovens, mitos e distorções tomam conta do debate público. A redução da maioridade penal causa polêmica dentro do mundo jurídico penal. Temos por um lado à questão inerente à reforma do Código penal pátrio e do outro a aplicação severa e minuciosa do Estatuto da Criança e do Adolescente.
2 - Redução Da Maioridade Penal.
Para uma melhor fundamentação sobre a criação de leis no sistema legislativo atual, busca-se a teoria tridimensional de Miguel Reale. Essa teoria baseia-se na ontognoseologia jurídica e justifica porque as leis possuem uma razão para serem criadas e permanecerem vigendo. A ontognoseologia se apresenta como a estrutura tridimensional da realidade jurídica, baseando a criação de leis em: fato, valor e norma.
Reale afirma em sua obra:
"O Direito é uma realidade, digamos assim, trivalente ou, por outras palavras, tridimensional. Ele tem três sabores que não podem ser separados um dos outros." (Reale p. 121)
Sendo assim, a Teoria Tridimensional explica que os fatos geram juízos de valor que demandam normas para regulamentá-los. Para seu criador, o eminente jurista Miguel Reale, o Direito não é abstrato, porque também está imerso na vida humana, que é um complexo de sentimentos e estimativas.
É neste contexto que se insere a importância do tema, os quais, mediante ênfase em determinados fatos sociais, permitem uma valoração social carregada de emotividade, proporcionando uma análise menos racional em relação às leis que estão sendo criadas. Nenhuma norma existe sem que se perceba sua necessidade social, pois é ela quem regula o convívio entre os indivíduos na sociedade.
Pode parecer redundante falar sobre violência e crime cometidos por menores de 18 anos, ou com a participação destes, tem-se ensejado a criação de um projeto polêmico, é o que visa reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos. Para tanto, é fundamental que haja uma execução efetiva das penas, cumprindo-se com competência e sapiência as disposições penais.
Na legislação brasileira as leis que regulamentam a imputabilidade penal constam da Constituição Federal art. 228, do Código Penal, art. 27 e do Estatuto da Criança e do Adolescente art. 104. No Brasil, bem como na maioria dos países, o limite para a imputabilidade penal é de 18 anos
Varias opiniões se divergem sobre o assunto, o então presidente nacional da OAB, Cezar Britto, afirmou que a redução da maioridade penal não significa que o crime diminuirá. Para Britto:
"Reduzir a idade penal é fugir do problema social da violência e da desorganização do Estado. Esse triste episódio nos mostrou o despreparo do Estado com relação à questão da segurança pública. O momento não é de acomodação, mas de ação." (entrevista concedida a Folha Online, 12/02/2007).
Em contra partida, em pesquisa realizada pelo Data Senado, 2009, chega a 87% o percentual de brasileiros que defendem a redução da maioridade penal, segundo pesquisa realizada em todo o país. Se houvesse uma consulta a respeito do tema 9% votariam contra a medida. Mostram-se indiferentes à questão 1% dos entrevistados e 3% não souberam responder.
Atualmente, o acesso à informação é quase compulsivo. Novas tecnologias fazem parte do dia-a-dia das pessoas, inclusive dos jovens (telefone celular, internet, correio eletrônico, rádio, TV aberta e fechada, etc). São tantos os canais de comunicação, que se torna impossível manter-se ilhado, alheio aos acontecimentos. Não há espaço para a ingenuidade, e com maior razão no que concerne aos adolescentes. Aliás, estes estão mais afetos a essas inovações. Em algumas situações, há inversão da ordem natural. É comum, por exemplo, filhos orientarem os pais sobre informática.
Segundo Renata Macedo, a PEC 171/1993 utiliza a seguinte justificativa para redução da maioridade:
"Atualmente os jovens possuem maior capacidade de informação que no passado, e via de conseqüência, a idade cronológica não corresponde à idade mental. Tais motivos fazem com que os jovens do século XXI não possam ser comparados com os jovens de cinqüenta anos atrás." (MACEDO, 2008. p. 191-192)
A principal justificativa para a redução do limite cronológico da imputabilidade penal de 18 anos, no entanto é a capacidade de discernimento do adolescente, demonstrada pela possibilidade destes jovens, já partir dos 16 anos, poderem exercer alguns atos da vida civil, como o voto e a permissão para dirigir veículos. Esta constatação, contudo, mostra-se como uma meia verdade, visto que, apesar de poder votar, os adolescentes não podem concorrer a cargos eletivos, e mesmos os que já possuem a capacidade civil plena (maiores de 18 anos), são proibidos de concorrerem a determinados cargos públicos segundo um piso etário mínimo.
Além disto, o que justifica esta inimputabilidade aos menores de 18 anos não é a capacidade de discernir entre o certo e o errado, que já está presente no ser humano saudável muito antes desta idade, e sim a imaturidade do jovem para compreender os limites da reprovação do seu ato.
Neste sentido Renata Macedo pondera:
"[...] não se discute que o jovem nesta faixa etária possui o discernimento necessário de entender e de querer, mas não se pode desprezar aquele elemento relevante da imputabilidade que é a vontade capaz. É necessário que o adolescente além de reconhecer o bem e o mal de suas ações, compreenda os limites da reprovação social que pesa sobre seu ato..." (MARCEDO 2008, p.198)
O pensamento imediatista de que a redução da maioridade reduzirá a criminalidade não se sustenta. Algumas pesquisas apontam que a participação dos menores infratores nos crimes globais é menor do que se propaga, conforme atesta Alyrio Cavalleri:
"A delinqüência dos menores ainda está em níveis suportáveis: o número de processos de adolescentes representa cerca de 10% do total registrados nas varas criminais do Rio de Janeiro. O percentual é o mesmo nas grandes cidades do país" (Cavalleri 2003. p.9)
Talvez o argumento que mais sensibiliza a opinião pública seja o de que os infratores juvenis, principalmente aqueles que cometem crimes graves, não são punidos ou responsabilizados pelos seus atos. No entanto, imputabilidade não significa impunidade, mas apenas a constatação de que determinados pessoas devem receber tratamento adequado às suas necessidades especiais, afastado-as do sistema penalista.
O menor infrator, na condição de adolescente, vivencia mudanças biológicas próprias da puberdade e conflitos que o torna vulnerável do ponto de vista psicológico: formação da identidade do ego, egocentrismo de pensamento, exacerbação do complexo de Édipo, reverência do desamparo infantil, tensão intensa no aparelho psíquico em decorrência de pulsões que não consegue dominar, dentre outras vivências subjetivas. Esta transição para a vida adulta, para ser suave e sadia, exige ações sócio-educativas especificas, mais condizentes com o modelo atual de inimputabilidade penal.
Desta forma, como bem explica Renata Macedo, o objetivo de a responsabilidade penal iniciar-se aos dezoito anos é impedir que estes adolescentes infratores venham a cumprir pena em estabelecimentos prejudiciais a sua formação e ao desenvolvimento de sua personalidade.
A colocação destes jovens em prisões comuns, somente contribuiria para prepará-los para o crime organizado, vez que as prisões brasileiras são verdadeiras escolas do crime. A cadeia além de ser cara e ineficaz, separa famílias, aniquila a auto-estima do indivíduo e não inibe a criminalidade. (Macedo 2008. p. 198.)
Acima de tudo, não pode ser desconsiderado que a causa para que o jovem cometa ato infracional deriva, em grande medida, da degradação familiar, da baixa escolaridade e da miséria social. O Estado e a sociedade devem, portanto, tomar medidas, mesmo a médio e longo prazo, para promover uma justa distribuição de renda, prover serviços públicos universais e de qualidade, fixar as famílias no campo e gerar empregos, evitando, com isto, o recrudescimento da violência. Para tanto, terá que buscar um modelo de desenvolvimento econômico e social que permita uma sociedade mais justa e mais racional.
3 - Considerações Finais
Independente das divergências, uma única coisa, talvez, aceita por todos, é que não podemos assistir de braços cruzados a escalada de violência, onde menores de 18 anos praticam os mais hediondos crimes e já integram organizações delituosas, sendo inteiramente capazes de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. O Estatuto da Criança e do Adolescente, por benevolente que é, não tem intimidado os menores. Como forma de ajustamento à realidade social e de criar meios para enfrentar a criminalidade com eficácia, impõe-se seja considerado imputável qualquer homem ou mulher a partir dos dezesseis anos de idade.
4 - Bibliografia
1.CAVALLERI, Alyrio. Responsabilidade Penal. Revista Jurídica Consulex, ano VII, n.166, p.16-17. 2003.
2.MACEDO. Renata Cheschin Melfi de. Adolescente Infrator e a Imputabilidade Penal. 1. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
3.REALE, Miguel. Teoria tridimensional do direito. 5ª ed. rev. e aum. São Paulo: Saraiva 1994.
4.VADE MECUM. 9ª Ed. Saraiva 2010.