LOCAÇÃO DE IMÓVEIS - GARANTIAS CONTRATUAIS E A “NOVA” FIANÇA...

Por Antonio Costa de Souza Neto | 15/05/2017 | Direito

LOCAÇÃO DE IMÓVEIS - GARANTIAS CONTRATUAIS E A “NOVA” FIANÇA: Fiança enquanto garantia e sua segurança jurídica ao credor

RESUMO

O contrato que será abordado no presente trabalho será o de locação, conjuntamente com a fiança, na qual é contrato acessório daquela. Há ainda de ser abordadas as características destes contratos e ainda um ponto ao qual terá um enfoco especial: a garantia que a fiança exerce perante o contrato de locação, uma vez que serve como segurança jurídica ao credor por dar ao mesmo a certeza do recebimento do valor acertado no contrato de locação.

Palavras-chaves: Contratos; Locação; Fiança; Segurança jurídica. 

INTRODUÇÃO 

O trabalho basear-se-á nos estudos referentes ao contrato de fiança enquanto garantia e segurança jurídica ao credor (locador). Será identificado nos capítulos que seguirão à pesquisa os sujeitos dos respectivos contratos, bem como será abordado quanto à questão das obrigações, do credor e devedor (do locador e locatário), não esquecendo ainda das obrigações do fiador.

A pesquisa inicia-se tendo como primeiro capítulo o estudo geral do contrato de locação, explicitando seu conceito e abordando a lei do inquilinato, obrigações dos sujeitos e os desdobramentos ao longo do contrato.

Após o adentrar do estudo da locação, falar-se-á do seu contrato acessório: a fiança. Dessa forma, tratar-se-á as suas noções gerais, suas obrigações, o fato de haver ou se tornar o fiador insolvente, além da possibilidade de haver co-fiadores. Além disso, ao falar de fiador e da ação judicial como cobrança do credor ao devedor, nada mais justo que tratar o estudo do benefício de ordem.

Por fim, haverá maior aprofundamento do tema, vendo a fiança como garantia, uma vez que esta é a segurança que o credor receberá o valor acertado, independentemente de qualquer situação, como inclusive o fato do fiador ter como único bem um apartamento onde mora sua família. Nesse contexto, será abordada a discussão do conflito existente entre direito fundamental à moradia e direito do credor receber sua quantia, além de explicitado jurisprudências que tratam desse tema.

Tendo as noções gerais dos contratos a serem trabalhados, será explicitado como o credor tem sua garantia e como o locador garante que a obrigação do locatário seja plenamente cumprida, garantindo assim, que não haja prejuízo a nenhuma das partes – a não ser a diminuição do patrimônio do fiador, cofiador ou do devedor principal.

 

  1.  DO CONTRATO DE LOCAÇÃO 

1.1. Conceito 

Este contrato é conhecido por conceder a posse à determinada pessoa por tempo determinado. É deste modo que Carlos Roberto Gonçalves (2004, p. 283) utiliza a palavra locação “para designar unicamente o contrato que se destina a proporcionar a alguém o uso e gozo temporários de uma coisa infungível, mediante contraprestação pecuniária”.

Tendo em vista então o presente conceito, pode-se trazer ainda a explicação que Maria Helena Diniz (2007, p. 254) aponta em sua obra, vendo contrato de locação como:

(...) o contrato pelo qual uma das partes, mediante remuneração paga pela outra, se compromete a fornecer-lhe durante certo lapso de tempo, o uso e gozo de uma coisa infungível, a prestação de um serviço apreciável economicamente ou a execução de alguma obra determinada.

A partir deste pensamento, analisa-se que os conceitos se assemelham, mas é importante ressaltar que Diniz trata a prestação do contrato como sendo apreciável economicamente ou a execução de alguma obra determinada. A apreciação econômica do contrato como contraprestação já está claro, como sendo a prestação pecuniária. No tocante a prestação pela execução de alguma obra determinada trata-se do contrato cuja sua espécie é a locação de obra, ou seja, empreitada.

Há três espécies de contrato de locação conceituado por diversos doutrinadores. Há a locação de coisa (art. 565-578, CC) como utilizado comumente, que é a locação de bens infungíveis, cujo objetivo atém-se ao uso temporário da coisa, tendo a contraprestação pecuniária. Há ainda a locação de serviço, ou, mais rotineiramente, chamado de prestação de serviços (art. 593-609, CC), o qual o sujeito vai à busca de um serviço. Já a locação de obra ou empreitada (art. 610-626, CC), é quando o objetivo do contrato é executar uma obra prevendo determinado resultado.

1.2. Lei do Inquilinato 

A lei do inquilinato de 1991, lei nº 8.245, sofreu modificações na atual de 2009, nº 12.112. Houve diversas mudanças na passagem de uma lei por outra, afinal, se passaram 18 anos. Neste lapso temporal, diversas foram as mutações interpretativas acerca do Direito Civil (LOMEU, 2010, p. 10), nas quais trouxeram diretamente efeitos ao contrato de locação que consequentemente atingiu-se a lei do inquilinato.

Com isso, a atual lei do inquilinato trouxe mudanças no tocante à alteração no que tange a devolução do imóvel, não mais sendo necessária a existência da dissolução da sociedade concubinária presente no art. 12 da Lei de 1991, mas a união estável; e outra mudança trata da possibilidade do locador exigir novo fiador ou substituição da modalidade de garantia no caso de ausência, interdição, falência ou insolvência do fiador, declaradas judicialmente.

A alteração contida no artigo 12 da lei do inquilinato inclui abordagem a cerca do fiador no contrato de locação. A alteração que este artigo sofreu refere-se à exclusão do parágrafo único, ou melhor, a substituição deste para que fossem acrescentados dois parágrafos. A antiga lei do inquilinato, a de 1991, assim dispunha em seu artigo 12:

Art. 12. Em casos de separação de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução da sociedade concubinária, a locação prosseguirá automaticamente com o cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel.

Parágrafo único. Nas hipóteses previstas neste artigo, a sub - rogação será comunicada por escrito ao locador, o qual terá o direito de exigir, no prazo de trinta dias, a substituição do fiador ou o oferecimento de qualquer das garantias previstas nesta lei. (Lei 8.245/91)

A lei do inquilinato de 2009, diferente, assim dispõe em seu artigo 12:

Art. 12. Em casos de separação de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução da união estável, a locação residencial prosseguirá automaticamente com o cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel.

  • 1º. Nas hipóteses previstas neste artigo e no art. 11, a sub-rogação será comunicada por escrito ao locador e ao fiador, se esta for a modalidade de garantia locatícia.
  • 2º. O fiador poderá exonerar-se das suas responsabilidades no prazo de 30 (trinta) dias contado do recebimento da comunicação oferecida pelo sub-rogado, ficando responsável pelos efeitos da fiança durante 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador. (Lei 12.112/09)

Na alteração do artigo 12 em seu caput, a substituição ocorreu apenas quanto à sociedade concubinária, que se alterou para união estável, obedecendo, deste modo, a mutação constitucional do artigo 226, §3º, da Constituição Federal, assim como acrescentou termo que limita a locação referida a ser apenas residencial. Seguindo ainda aos parágrafos acrescidos, no primeiro acrescenta possibilidade da exceção caber ainda ao artigo 11, e que além do locador a sub-rogação deve ser comunicada também ao fiador. O segundo parágrafo dá direitos ao fiador, na medida em que possibilita exoneração de suas responsabilidades após os prazos respectivos que este parágrafo estabelece.

1.3. Obrigações das partes 

Para que se possa tratar das obrigações de cada uma das partes no contrato de locação é necessário que seja apresentado primeiro os sujeitos que o envolvem, na medida em que haverá ainda intervenção de terceiros, mas que só será analisado no próximo capítulo.

Os sujeitos do contrato de locação como assim explicita o código civil nos artigos 566 e 569, é o locador e o locatário, respectivamente. O locador é aquele a que pertence a coisa que será alugada. É o locador que estará transferindo a posse temporária de determinada coisa à outra parte. Do outro lado relação, tem-se o locatário, que é aquele a que requer a locação da coisa.

Conhecidos os sujeitos do contrato, segue-se então para a abordagem quanto as suas devidas obrigações, afinal, sendo um contrato bilateral como será visto mais a frente, ambas as partes possuem obrigações.

As obrigações do locador estão arroladas no artigo 566 do código civil, o qual se divide em dois incisos como se infere a seguir:

Art. 566. O locador é obrigado:

I - a entregar ao locatário a coisa alugada, com suas pertenças, em estado de servir ao uso a que se destina, e a mantê-la nesse estado, pelo tempo do contrato, salvo cláusula expressa em contrário;

II - a garantir-lhe, durante o tempo do contrato, o uso pacífico da coisa.

O primeiro inciso deste artigo trata quanto à obrigação fundamental do locador de entregar a coisa em condições possíveis para que o locatário possa usufruir o bem (da coisa alugada). Haverá ainda de cumprir com a obrigação de manter a coisa nesse estado, ou seja, trata das benfeitorias necessárias (aquelas com a finalidade de conservação do imóvel ou para evitar sua deterioração), enquanto durar o contrato. O segundo inciso vem tratar do uso pacífico da coisa enquanto houver contrato, devendo o locador garantir que o locatário possa ter o uso e gozo da coisa.

É válido ressaltar aqui ainda a importância que o artigo 568 tem, pois, como assim é disposto no referido código, Roberto Gonçalves traz em sua obra a seguinte explanação sobre o assunto:

Responde, ainda, o locador pelos vícios e defeitos ocultos da coisa locada, anteriores à locação (CC, art. 568). Aplica-se à hipótese, portanto, a teoria dos vícios redibitórios. Se o locador conhecia os vícios ou defeitos, restituirá o valor da locação mais perdas e danos. Se não os conhecia, somente, restituirá o valor recebido, mais as despesas do contrato (CC, art. 443). (GONÇALVES, 2004, p. 292)

Seguindo então, quanto às obrigações do locatário que consta no artigo 569 da mesma lei, assim é disposto:

Art. 569. O locatário é obrigado:

I - a servir-se da coisa alugada para os usos convencionados ou presumidos, conforme a natureza dela e as circunstâncias, bem como tratá-la com o mesmo cuidado como se sua fosse;

II - a pagar pontualmente o aluguel nos prazos ajustados, e, em falta de ajuste, segundo o costume do lugar;

III - a levar ao conhecimento do locador as turbações de terceiros, que se pretendam fundadas em direito;

IV - a restituir a coisa, finda a locação, no estado em que a recebeu, salvas as deteriorações naturais ao uso regular.

O inciso I, assim como o inciso IV trata acerca do cuidado e zelo ao qual o locatário deverá ter com a coisa alugada, assim como utilizar a coisa para o fim ao qual foi contratado, ou melhor, convencionado, bem como o locatário deverá preservar a coisa até que haja devolução do mesmo, devendo esta coisa ser devolvida da mesma forma ao qual o sujeito a recebeu, salvo, claro, as deteriorações naturais ao uso regular como expõe o artigo. O inciso II aborda a questão da prestação do locatário ao locador, isto é, o pagamento pontual dos alugueis. Seguindo ao inciso III infere-se deste que é necessário a comunicação ao locador em casos que terceiros venham a perturbar questões de direito, o qual será direito do locador a defesa deste, por isso a necessidade de comunicação.

1.4. Características da locação 

O contrato de locação possui algumas características que será feita aqui apenas uma breve análise – uma vez que não é o foco principal do presente trabalho. A esta natureza contratual Maria Helena Diniz classifica o contrato de locação como sendo bilateral, já supracitado, que é quando ambos os sujeitos do contrato possuem obrigações para si, sejam estes o locador e o locatário; é ainda oneroso, pois cada um dos sujeitos contraentes buscam para si vantagens, uma vez que o locador quer a prestação pecuniária e o locatário quer a coisa a sua disposição; outra classificação é o contrato como comutativo, tendo em vista que todo o contrato é, desde o início, elaborado com suas vantagens e obrigações para as partes, sendo ainda conhecidas por elas; consensual, já que sua formação não requer forma especial; por fim, de execução continuada, ou seja, o contrato cessa com o decurso de determinado prazo.

  1.  DA FIANÇA 

2.1. Noções gerais 

Para que se entenda a fiança é necessário saber sobre sua natureza jurídica, na qual é considerada, de forma pacífica na doutrina, como um contrato acessório, unilateral, solene e gratuito.

O contrato de fiança é uma espécie do gênero garantia (RODRIGUES, 2006, p. 357), ou seja, ocorre quando um terceiro intervém no negócio como garantidor do pagamento da dívida ao credor, caso o devedor principal não o pague. É assim que o código civil conceitua este contrato, no artigo 818 que explicita que “pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra”. Portanto, é deste modo que há de se falar em contrato acessório, pois “não se concebe sua existência sem um contrato principal, cujo cumprimento a fiança visa assegurar” (RODRIGUES, 2006, p. 358).

Sobre a natureza jurídica de o contrato ser unilateral, entende-se que gera obrigações unicamente a uma das partes, ou seja, apenas ao fiador. A outra característica do contrato de fiança é sua solenidade e formalidade, uma vez que o contrato deverá ocorrer de forma escrita (VENOSA, 2013, p. 467); além disso, como explicita o artigo 819 do Código Civil, a fiança “não admite interpretação extensiva”.

Como afirma Venosa (2013, p. 465), a gratuidade é característica essencial da fiança, pois o fiador está a ajudar o afiançado, garantindo ao credor que a dívida deste seja paga, não recebendo nada em troca. É ainda a fiança, subsidiária, uma vez que o fiador só se obrigará caso o afiançado não honre com sua dívida (DINIZ, 2007, p. 577). É importante salientar ainda que este contrato poderá ser oneroso (VENOSA, 2013, p. 466), mas apenas como uma exceção, nos casos de fianças bancárias, o que não é assunto a ser tratado no trabalho que discorre.

2.2. Obrigações do fiador e do devedor principal 

Como já tratado antes, o contrato de fiança sendo unilateral implica dizer que há obrigação a apenas uma das partes, seja esta o fiador, que é o de arcar com a dívida caso o afiançado não o faça.

Segundo o artigo 824 do código civil ao qual “as obrigações nulas não são suscetíveis de fiança, exceto se a nulidade resultar apenas da incapacidade pessoal do devedor”, ou seja, a fiança como sendo acessório seguirá o principal, se se anular o contrato principal, a fiança automaticamente é nula.

O devedor principal, após o fiador haver arcado com a dívida pelo motivo daquele não a ter cumprido, terá dívida com o fiador, fala-se então do direito de regresso. Dessa forma, “compelido a pagar a dívida, fica o fiador com ação regressiva contra o afiançado, para dele reclamar não apenas a importância que desembolsou, como também todas as perdas e danos que houver pago e ainda os prejuízos que sofrer em razão da garantia prestada” (RODRIGUES, 2006, p. 362). É, portanto, deste modo que o Código Civil garante este direito, através do artigo 832 que assim deixa expresso: “O devedor responde também perante o fiador por todas as perdas e danos que este pagar, e pelos que sofrer em razão da fiança”.

Caso venha a ocorrer de o devedor não pagar o credor, então o fiador será obrigado a assim o fazer, respeitando a característica, já explicada, de subsidiariedade, garantindo assim ao credor que a dívida seja devidamente paga, podendo o fiador receber do devedor o que pagou, como assim será analisado no tópico referente a litisconsórcio.

2.2.1. Fiador insolvente

A lei deixa expresso no artigo 826 do código civil quanto ao fiador insolvente quando afirma que “se o fiador se tornar insolvente ou incapaz, poderá o credor exigir que seja substituído”. A substituição em questão, seja quanto ao fiador insolvente, será então direito do credor, pois é este quem vai dizer se aceita ou não determinado fiador, embasando-se quanto à idoneidade deste, isto está garantido no artigo 825 do código civil: “Quando alguém houver de oferecer fiador, o credor não pode ser obrigado a aceitá-lo se não for pessoa idônea, domiciliada no município onde tenha de prestar a fiança, e não possua bens suficientes para cumprir a obrigação”. No entanto, não pode o credor “abusivamente, recusar qualquer pessoa indicada pelo devedor, sob o pretexto de não ser moral ou financeiramente idônea” (ROGRIGUES, 2006, p. 360).

2.2.2. Fiança e litisconsórcio

O litisconsórcio, como bem conceitua Fredie Didier Jr. (2014, p. 345) é “a reunião de pessoas assumindo, simultaneamente, a posição de autor ou de réu”. O litisconsórcio que aqui tratado vem ocorrer quando o credor (locador) já entrou com uma demanda judicial em face do devedor (locatário). Nesse caso, uma vez que pode o autor por o fiador na posição de réu da ação, cria-se o litisconsórcio passivo.

Diante disso, há uma segurança jurídica tanto para o fiador como para o credor. A segurança ao credor é que uma vez que não pagando o devedor ao credor, o fiador (que também é réu) arca com a dívida. E, a segurança ao fiador é que este poderá invocar o benefício de ordem.

2.3. Benefício de ordem 

O benefício de ordem consiste em um dos efeitos da fiança, como assim há também a de solidariedade do(s) cofiadore(s). Para o tema em questão será tratado apenas o benefício de ordem como sendo necessário. Este vem expressamente garantido no artigo 827 do código civil, sendo assim exposto:

Art. 827. O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor.

Parágrafo único. O fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito.

Fica claro que o benefício de ordem deve ser exigido pelo fiador para que, quando for cobrada a dívida a ele, possa exigir que antes seja cobrado ao devedor principal, sendo ainda possível que execute os bens do devedor principal, para que, caso não seja o suficiente, responda então o fiador por esta dívida.

É importante ressaltar que o parágrafo único deste artigo traz os pressupostos para que o fiador tenha direito ao benefício de ordem. Possível todas estes pressupostos, e sendo então suficiente que o devedor principal arque com a dívida podemos explicitar o que a doutrina afirma quanto a isto, que “acolhida a exceção representada pelo benefício de ordem, o juiz suspenderá a execução contra o fiador, ordenando que se penhorem e executem os bens do devedor principal” (RODRIGUES, 2006, p. 361).

  1.  FIANÇA COMO GARANTIA 

Como já destacado no início do capítulo anterior, a fiança é uma garantia ao credor, pois é o fiador que arcará com a dívida caso o devedor não a cumpra, estando, então, ali o fiador apenas como garantia.

É relevante que se destaque ainda que o fiador, como sendo obrigatório, não poderá haver extinção de sua obrigação antes que cumprida esta. O que ainda é possível de se alterar é a substituição do fiador, que como já citado, quando este se tornar insolvente ou incapaz, nos preceitos do artigo 826 do código civil que já fora aqui exposto.

3.1. Constituição Federal e Direito Civil 

É sabido que o fiador responde por uma importante obrigação do devedor quando este não cumprir com sua obrigação. O artigo 836 do código civil consiste na duração da obrigação do fiador. Infere-se deste dispositivo que “a obrigação do fiador passa aos herdeiros; mas a responsabilidade da fiança se limita ao tempo decorrido até a morte do fiador, e não pode ultrapassar as forças da herança”. Em outros termos, o que se afirma é que o fiador responderá por sua obrigação enquanto estiver vivo, e depois de sua morte até as forças de sua herança, como bem preceitua o Código.

É ainda importante ressaltar que o fiador responde pela dívida inclusive com o bem de família, caso não tenha recursos suficientes para o cumprimento de sua obrigação. A constituição Federal garante em seu artigo 6º o direito à moradia, havendo, portanto, certa contradição quanto à fiança locatícia a qual está sendo tratada.

A impenhorabilidade do bem de família vem tratada na lei 8.009/90, a qual estabelece em seu artigo 3º, inciso VII, quanto à exceção para esta impenhorabilidade: “A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”. O fato é que ainda está em contradição, já que esta lei é ordinária e o direito a moradia é direito constitucional.

Supondo que o fiador, para cumprir com sua obrigação, seja obrigado a entregar seu bem de família, este que é sua casa, não tendo, portanto, lugar à moradia a partir de então. Desta forma o que prevalecerá, lei ordinária ou a constituição federal no tocante aos direitos fundamentais? Como resposta, longas foram as discussões sobre este assunto. Os tribunais estabelecem que o preceito fundamental do artigo 6º não revoga a lei 8.009/90, assim como será demonstrado no tópico à frente referente às jurisprudências, que considera-se tal preceito como sendo de eficácia limitada, ou seja, são as normas na qual terão eficácia a partir de normas infraconstitucionais. Deste modo, é plenamente possível que o fiador entregue seu bem de família para cumprimento de sua obrigação, tendo, deste modo, a fiança como uma garantia de fato ao credor.

3.2. Dispositivos Normativos 

Diante do que aqui já foi exposto, encontra-se a fiança engajada em diversos dispositivos normativos, e que muitas vezes encontrarão divergências como o explicitado em tópico anterior. Há a lei do inquilinato, nº 12.112 de 2009, assim como a lei que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, nº 8.009 de 1990, bem como a lei 10.406 de 2002 (Código Civil), na qual dispõe mais especificamente sobre a fiança em seus artigos 818 ao 839.

3.3. Jurisprudências 

É possível fazer uma análise quanto a algumas jurisprudências pelas quais serão aplicadas na prática o que aqui foi exposto em teoria. Deste modo, tem-se uma jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (AC 300599) que afirma que é admissível a penhora de bens de família dos fiadores uma vez que o Superior Tribunal Federal entendeu que o artigo 3º, VII, da Lei 8.009/90 não afronta o artigo 6º da Constituição Federal.

Da mesma forma ocorreu no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, o qual ratifica o que aqui fora falado sobre a garantia que o fiador exerce mesmo se tratando de bem de família. Assim expõe:

APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE LOCAÇÃO. PENHORA DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLICAÇÃO DO ARTIGO 3º, INCISO VII, DA LEI Nº 8.009 /90. MATÉRIA SUBMETIDA AO REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL. RE 612360. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 1. Na dívida derivada de contrato de locação, a penhora do imóvel que serve de moradia à família está autorizada pelo inciso IV do art. 3º da Lei nº 8.009 /90. [...]

É perceptível, portanto, através das jurisprudências aqui destacadas, adequar a teoria que foi apresentada nos casos concretos, ou mesmo nos casos especiais como é este da penhorabilidade dos bens de família. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Diante do exposto é derradeiro concluir que a fiança, como bem já foi relatada durante o trabalho, é uma garantia. Não obstante o fato de ser um contrato ao qual o fiador é o que garante a dívida, mas importa que este tenha ainda o direito ao regresso.

Foi visto que locação é um ato firmado entre locador e locatário que firmam contrato no qual diz que o locador concede a coisa (moradia) por tempo determinado para o locatário, havendo assim um contrato bilateral, comutativo, oneroso e consensual.

É ainda cabível citar quanto ao benefício de ordem que fora abordado em tópico exclusivo, tratando sobre o direito do fiador de exigir sobre o cumprimento da obrigação do devedor principal antes do seu. Importante foi trabalhar com o conceito de litisconsórcio, o qual abordou o direito de regresso do fiador, ao qual é muito utilizado na prática jurídica.

Tendo todas estas abordagens através dos estudos feitos para a realização deste trabalho, ficou claro que a apresentação foi suficiente para tratar sobre o tema proposto, apresentando a fiança como garantia. 

REFERÊNCIAS 

DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. V. 1. 16. ed. Bahia: JusPodivm, 2014.

DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Curso de Direito Civil. V. 3. São Paulo: Saraiva, 2004.

LOMEU, Gustavo Soares. Lei do Inquilinato Atualizada: reflexos da lei 12.112/09.  Governador Valadares: UVRD, 2010.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. V. 3. São Paulo: Saraiva, 2006.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: contratos em espécie / Sílvio de Salvo Venosa. – 13. Ed.- São Paulo: Atlas, 2013.

VADE MECUM. 15 em 1 Universitário/ Editora Jurídica da Editora Manole. – 5. Ed. – Barueri, SP: Manole, 2013

Lei 8.009. Dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família. Disponível no site: . Acessado em 30 de abril de 2014.

Lei 8.245/91. Lei do Inquilinato. Disponível no site: . Acessado em 30 de abril de 2014.

Lei 12.112/09. Lei do Inquilinato. Disponível no site: . Acessado em 30 de abril de 2014.