Lide temerária e crimes praticados no exercício da advocacia

Por Paulo Rangel de Carvalho Junior | 19/07/2009 | Direito

Lide Temerária e Crimes

Configura lide temerária o ato do advogado que, conhecendo a real verdade dos fatos, a distorce deliberadamente, de modo que o mesmo ou seu cliente sejam beneficiados. Acontece no caso do advogado que, mesmo tendo conhecimento que seu cliente recebeu todas as verbas resilitórias, ajuíza reclamação trabalhista cobrando esses valores.

O capítulo III do Código Penal trata dos crimes contra a administração da justiça. O advogado pode ser processado criiminalmente se incorrer em Fraude Processual, artigo 347, se "inovar artificiosamente, na pendência de processo civil ou administrativo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito", apenado com detenção de 03 meses a 02 anos, aplicando-se em dobro as penas se a inovação se destina a produzir efeito em processo criminal, ainda que não iniciado.

O Código Penal tipifica em seu artigo 355 a conduta denominada Patrocínio Infiel, que consiste em "trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo o patrocínio, em juízo, lhe é confiado", sendo apenado com detenção de 06 meses a 03 anos, sendo a ação penal pública incondicionada.

Tanto o advogado como o estagiário podem ser sujeitos ativos desta modalidade de crime. O crime de patrocínio infiel se consuma com o efetivo prejuízo oriundo da traição. A tentativa é admissível na forma comissiva. A atuação extrajudicial não basta para a configuração do delito. O abandono, pelo advogado, de processo criminal não caracteriza o crime do artigo 355 do CP, incorrendo na multa prevista no artigo 265 do CPP e na infração disciplinar do artigo 34, inc XI do Estatuto da OAB, passível de censura.

O artigo 355, parágrafo único do Código Penal trata do Patrocínio Simultâneo e do Patrocínio Sucessivo (Tergiversação), apenando estas condutas delituosas com as mesmas penas do caput, ou seja, detenção de 06 meses a 03 anos.

O patrocínio simultâneo acontece quando o advogado ou procurador judicial defende na mesma causa, simultaneamente, partes antagônicas. Aqui, o agente toma para si a defesa, ao mesmo tempo, interesses de partes contrárias, consumando o delito com a realização de ato processual destinado a beneficiar a parte contrária. A ação penal é pública incondicionada, cabendo a tentativa na modalidade comissiva.

Por outro lado, o patrocínio sucessivo ou tergiversação acontece quando o procurador judicial representa na mesmo processo, sucessivamente, partes adversas. No caso em tela, o advogado, após ter abandonado ou ter sido dispensado por uma das partes, assume o patrocínio da parte contrária. Impossível a tentativa neste crime.

O Tribunal de Ética e Disciplina da OAB já decidiu que o advogado com relação de emprego ou contratual com pessoa jurídica ou física, para prestação de serviços de assessoria jurídica, administrativa ou ética, deve manter o interregno de 02 anos sem patrocinar causas contra qualquer deles (OAB, Tribunal de Ética, P.E-857, rel. Dr. Elias Farah. BolAASP 1763/6).

Temos no artigo 356 do código repressivo pátrio o crime de Sonegação de papel ou objeto de valor probatório, tipificando a conduta de "inutilizar, total ou parcialmente, ou deixar de restituir autos, documento ou objeto de valor probatório, que recebeu na qualidade de advogado ou procurador", sujeitando-se a pena de detenção de 06 meses a 03 anos, e multa. Cabe a suspensão condicional do processo a luz do artigo 89 da lei nº 9.099/95. Para a caracterização do delito é necessária a prévia intimação do advogado para devolução em cartório.

Trata-se de crime próprio, pois somente o advogado ou estagiário podem ser sujeitos ativos desta modalidade criminosa. Entende-se por autos o conjunto de peça que integram o processo, como petições, instrumentos de mandato, termos, arrazoados, sentenças etc. Documento é todo papel escrito destinado à prova de fato juridicamente relevante. Por seu turno, objeto de valor probatório é todo aquele que serve ou servirá como elemento de convicção acerca dos fatos em que qualquer das partes baseia sua pretensão.

Há uma relação muita estreita entre o artigo 356 e 305 do CP. Todavia, pelo princípio da especialidade, quando a supressão ou destruição é realizada por advogado, incidirá o artigo 356 em detrimento do artigo 305.