LETRAR E ALFABETIZAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL: É POSSÍVEL? É NECESSÁRIO?
Por Érica Patrícia dos Reis Oliveira | 30/10/2017 | Educação(*) Érica Oliveira, Kédma Macêdo e Sibele Rodrigues
Embora um tema ainda polêmico e causador de inúmeras dúvidas, letrar e alfabetizar ainda na educação infantil é possível, sim. No entanto, os modos em que esse processo ocorre podem e devem ser diferentes do ensino fundamental.
A criança pequena tem suas especificidades e, portanto, necessita de um trabalho pedagógico também específico para sua faixa etária. A imaginação, a curiosidade, a inquietação, a energia e o pouco tempo de concentração são características básicas dessas crianças. Assim, as atividades de alfabetização e o letramento devem ser pensados e propostos de modo que “desperte” nas crianças o desejo de aprender sobre a língua escrita.
Não defendo aqui que uma alfabetização deva ocorrer sistematicamente, mas é de suma importância o trabalho com práticas de oralidade e escrita já na educação infantil.
Letramento e alfabetização são processos distintos, porém complementares. O termo letramento não substituiu a palavra alfabetização, mas aparece associada a ela.
Podemos falar, ainda nos dias de hoje, de um alto índice de analfabetos, mas não de “iletrados”, pois sabemos que um sujeito que não domina a escrita alfabética - seja criança, seja adulto - envolve-se em práticas de leitura e escrita através da mediação de uma pessoa alfabetizada, e nessas práticas desenvolve uma série de conhecimentos sobre os gêneros que circulam na sociedade.
Assim, por exemplo, crianças pequenas que escutam frequentemente histórias lidas por adultos são capazes de pegar um livrinho e fingir que leem a história - usando, para isso, a linguagem característica desse gênero.
A criança chega à instituição de educação infantil repleta de conhecimentos e hipóteses sobre a língua escrita. O contato com diversos tipos de textos, música e arte é essencial, pois lhe oferecerá uma leitura de mundo diversificado e múltiplo ao qual está inserida.
O letramento nessa fase da infância é fundamental para que as crianças compreendam e aprendam para que e por que utilizar a língua escrita e falada. Segundo Delaine Cafieiro, “Depende do tipo de atividade que for proposta e de os exercícios de escrita estarem vinculados à situação de uso em que façam sentindo, isto é, tenham um para que e um por que escrever”. (CEALE_SEE_MG, 2004)
Cabe ao educador compreender que não basta apenas alfabetizar sem que a criança não saiba para que e o porquê precise saber ler e escrever. Sem que esta não saiba fazer o uso social da língua.
O letramento, ao contrário da alfabetização, não é finito, pois ocorre com o sujeito enquanto este for vivo e estiver em contato com a cultura, com a sociedade, com os iguais e com os diferentes. Assim podemos falar em letramentos, ou seja, diversos tipos de letramento que se iniciam ao nascimento.
Partindo do pressuposto que a criança constrói seu conhecimento mediado pelo educador e em interação com o mundo e os outros sujeitos, deve-se levar em consideração o desejo de aprender dos pequenos, pois a aprendizagem dever ser significativa e prazerosa.
É essencial levar em consideração, também, o modo como organizar as práticas pedagógicas no trabalho com as Práticas de Linguagem e Escrita. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 2010) apontam para a necessidade do trabalho pedagógico na Educação Infantil ter como eixos norteadores as interações entre as crianças e entre crianças e adultos, a brincadeira, como forma de conhecer o mundo, e participação em experiências fundamentais.
Desse modo, é necessária muita atenção quando o assunto é alfabetização na educação infantil, pois o que vemos em muitas instituições, principalmente no setor privado, são crianças muito pequenas sendo submetidas a exercícios de repetição e memorização em materiais como apostilas e livros didáticos que são fechados e possuem uma única resposta correta, onde as crianças são reduzidas a meras tarefeiras, aprisionando-as em mesas e cadeiras com intuito de chegarem ao resultado da alfabetização o quanto antes, e para isso deixam em segundo plano o essencial da infância: as interações e as brincadeiras.
Sabemos que crianças podem aprender brincando e que ao brincar têm a possibilidade de reconstruir elementos do mundo que as cercam e de atribuir-lhe novos significados, elaborar sentimentos e situações vividas, apropriar-se e produzir cultura.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil direcionam que garantir às crianças o direito à brincadeira é um dos objetivos da instituição da Educação Infantil. Portanto não se deve, de forma alguma, priorizar um trabalho de alfabetização e letramento das crianças em detrimento das brincadeiras, pois o ideal é que as duas práticas caminhem juntas.
A alfabetização e o letramento são processos graduais e podem, sim, estar presentes na Educação Infantil desde que em momentos lúdicos, prazerosos e contagiantes.
(*)Érica Patrícia dos Reis Oliveira, Kédma Macêdo Mendonça e Sibele Silva Leal Rodrigues, pedagogas, são professoras da rede municipal em Rondonópolis (MT).