Lembranças inesquecíveis de Engenheiro Goulart

Por Nelson Barboza Leite | 26/01/2016 | Contos

 Lembranças inesquecíveis de Engenheiro Goulart!

 São recortes da lembrança  para compartilhar com os amigos, com os quais convivemos, num bairro simples e rico de  inesquecíveis  histórias.  São janelas de boas recordações: momentos e pessoas especiais, verdadeiras “figurinhas” que, com certeza, nunca sairão do imaginário, de quem  conheceu.  Trazem a sensação gostosa da  volta no tempo, do aperto no coração.... da saudade alegre e maravilhosa! Espero compartilhar com os inesquecíveis amigos, daquele aconchegante bairro, esses pingos de memória. Lá, construímos laços de verdadeira amizade. Fui jogando as recordações sem me preocupar com ordem ou importância. Lembranças são sempre boas e não há necessidade de seleção! São acompanhadas de pequenos detalhes, o suficiente para abrir  as janelas  da nossa imaginação.  Do coração, nem se fala! A listagem não esgota as histórias e lembranças. Só aguça, mais e mais.... Com certeza, muitas outras brotarão e merecerão registros!  Enfim....bons tempos de muita alegria e de ingênuas malandragens. Só quem viveu, sabe a dimensão de tanta felicidade.....

1-João Português  - corintiano roxo, jogador de truco, de dama e de dominó, assíduo e bravo. O famoso e único fazedor de poço do bairro, amigo de todo mundo e de pouca prosa. Não me lembro dele,  sem seu barulhento tamanco, com aquele chapéu  surrado, redondo e  com sua companheira  inseparável – Dona Maria Barrocal;

2-João-da-pão – e sua companheira Dona Alice e seu bando de cachorros.  Vinham todo dia de mais de 5 km  a pé, pegavam o ônibus e iam à cidade pedir esmolas. Voltavam à noite sempre bêbados e brigando  com palavrões de toda a natureza. A molecada ficava assistindo e dando risada. Ela toda torta com mais de 50 anos e ele todo deformado e meio paralisado.  Arrastavam-se. De repente, tiveram uma filhinha linda que foi entregue a algum parente;

3-Zé Barbudo – eletricista faz tudo, treinador e técnico do Vila Silvia, um amigão  de plantão, mentiroso engraçado e valente, gozador de primeira linha, foi fundador de um time de futebol de mulheres,  participativo e otimista, sempre à disposição  de todos e para tudo.  Sabia de  tudo que acontecia e com  uma riqueza invejável de detalhes.  Conhecia e vivia bem com qualquer pessoa.  Pregava umas mentiras barbudas. Uma das figuras especiais do bairro;

4-Genésio – um bêbado de todos os dias. Uma pessoa bondosa, mas nunca esteve sóbrio. Sumia de vez em quando. Aparecia bem vestido, cumprimentava todo mundo e meia hora depois estava bêbado. Dormia em algum canto e pinga para dentro. Sempre acompanhado de alguns cachorros famintos. De repente sumiu.. e nunca mais apareceu.

5- João Tatá – retardadinho, que corria feito louco atrás da bola, quando brincávamos de bobinho numa distância de mais de 50 metros. E ele correndo... Um dia desmaiou e ficamos  perdidos, sem saber o que fazer! Ficamos de longe e desesperados assistindo o Tatá se batendo.  Quando voltou estava todo sujo, arranhado e chorando... Quase choramos juntos. Nunca mais brincamos e passamos a protegê-lo. O arrependimento   bateu em todos. Um grupo de mais  de moleques, do chifre furado, chocados.....

6- Ovídio –um  moço todo engravatado e de palavras bem colocadas e pausadas. Terno alinhado, fazia bem a figura do elegante. De repente, uma pinguinha, outra pinguinha e em poucos meses estava destroçado. Sem casa, sem roupa, sem amigos, só! Sujo, mal cheiroso... sumiu!

7-Aimoré – uma pessoa maravilhosa, inteligente, educada e cheio de histórias. Uma pena..  tinha suas estações de bebedeira e eram meses. Ficava a zero. Um dia parou de beber para sempre... Virou uma pessoa  queridíssima no bairro. Com seu carrinho de pipoca e outras guloseimas era figura presente no portão de saída do grupo escolar.

8- Tio Ditinho, o Geléia – o tiozão de todas as  paradas. Brincalhão,sempre sorrindo. Exímio truqueiro.  Tio, meio paizão,conselheiro,amigão. Presente em todos os momentos  bons e ruins. Um coração de gigante. Viveu 200 anos, sempre à disposição, com certeza,  ocupa um pedacinho do coração de muita gente;

9-Mané Galinha – uma figura estranhíssima, valente, briguento. Parecia mais fama, reforçada pela  sua aparência bruta. Irmãos e família maravilhosa.  Respeitado por todos. Tinha fama de acabar com festas e de bater em polícia. Desconfio que era só fama!

10-Caetano – figura soturna, sempre com o mesmo terno e gravata por anos. Falava pouco e sem ninguém entender  nada. Resmungava. Todo dia, o almoço e o jantar era  uma xícara de café com leite e um pãozinho. Com chuva ou sol sempre de guarda-chuva.  Tinha o jeito típico de assustar criança;

11-Porfírio –bigodudo, pequeno, atarracado, mais cheio de valentia, pouca prosa, destoava dos turcos. Era genro do seu Amadeu. Também, só tinha fama de dar tiro! quem se aproximava percebia a pessoa amiga que era. Com certeza, o bigode é que fazia o tipo assustador;

12-Nelson Mineiro-  um craque de bola e o mais briguento do bairro, um amigão do peito. Gostava de futebol, de tomar conta do time, fazia de tudo. Até brigava e acabava com a festa. Nunca vi apanhar e vi se meter em centenas de brigas com razão e sem razão.

13- Geraldão – o briguento e respeitador. Todos tinham medo dele. De vez em quando, se metia em boas encrencas e batia. Foi um tiozão para muitos. De uma docilidade e gentileza de se admirar. Uma pessoa enorme, mas de um coração de gigante. Um companheiraço,  comia com apetite de leão.Comedor de manteiga.

14-Cabralzão-o nosso juiz de futebol. Repeitado, mas  só apitava jogos difíceis. Virou presidente do time e amigo de todo mundo para todos os momentos. Mais culto, melhor preparado era a voz mais ouvida. Foi algumas vezes, me pegar na saída da escola para que eu pudesse  chegar a tempo para jogar. Esses detalhes  nem o tempo apaga.

15-Neguinho – com seus irmãos Nato, Tite e Didice levavam as  marmitas até a Cisper para o almoço do pessoal da Vila que trabalhava lá.  Muitas vezes, um bando de moleques acompanhavam os quatro irmãos. Era uma festa. Sempre sobrava uma cocada para ser repartida. Esse neguinho era um craque de bola. Mais tarde enveredou pelo caminha da bebida...

16-Devanil – o homem dos apelidos. Jogava muito bem  e quando ficava de fora batizava todos com apelidos que sempre pegavam. Um dia minha mãe me fez um grande calção. Apareci no campo e fui batizado com o nome de “cuecão”. Esse apelido grudou, enquanto joguei futebol..  Tinha um apelido  fotográfico e inesquecível - Jacaré  

17-Odair Capeta – um dos melhores jogadores que vi jogar. Brincava descalço com a molecada e brigava. E já era jogador profissional. A molecada ficava parada olhando ele brincar com a bola. Foi nosso companheiro de time muitos anos. Adivinhava tudo dentro do campo. Passarinheiro inveterado, sempre com uma gaiola na mão. Nas brincadeiras de rua era malvado e brigão. O apelido  retratava seu comportamento.

18-Fogueirinha – um crioulinho  cheio de graça. Cantor de samba e metido  a passista. Apitava jogos muito bem. Neguinho alinhado e bem empregado. Terninho, gravata e cheio de  galanteios. Foi sumindo, consumido pela pinga. Passou a dormir num cômodo abandonado no Zeca Arruda e um dia não acordou mais.

19- Honor Bonato –uma figura. Fazia o papel do intelectual e do rico. Isolado e cheio de sabedoria. Era  de dificil conversa, mas era ótima pessoa. Nosso vizinho e sempre atento a qualquer necessidade.  Cheio de segredos políticos. Metido a poderoso.

20-Leopoldo – meu querido pai, meu amigo, meu herói. Criativo, briguento, contador de história e muito trabalhador. Juntava amigos com facilidade e parecia liderar as conversas e iniciativas. Um batalhador incansável. Um aninador e incentivador. Merece muitas páginas por tudo que aprendi com ele.  Não tem um pedaço, tem o meu coração todo.

21- Seu Amadeu – o turco de uma perna só. Família enorme, com muita filhas,filho,genros,netos,uma turma enorme. Sempre muita conversa. Tudo cheio de drama. Gente divertida e festeira. Toda rodinha e conversa ou confusão tinha alguém do Seu Amadeu metido. O velho era teimoso, de uma sobrancelha parecendo taturana e  uma  cabeleira branca, que  nascia em cima do nariz. Com uma perna só era ágil e barulhento. A muleta era sua arma forte.

22- Ida - a moça mais bonita do bairro.  Sem nenhuma comparação. Juntava tudo. Elegante, alegre, era a beleza em pessoa, amiga de todos, participava de tudo. O Denarte  seu irmão mais novo e  o Bebé seu irmão mais velho eram, antes de qualquer coisa, o “cunhado  que todos queriam ter”.  DE uma família espetacular, gente  maravilhosa. Seu Abel um anjo de pessoa! Dona Elga, uma bondade, com aquele vozeirão nas rezas caseiras e  seus deliciosos bolinhos  de fubá das festas  juninas;

23- Neguita - outra moça bonita, bem morena. Merece lembrança pela competição  de beleza  com a Ida. Perdia  de longe, mas competia. A molecada era toda da Ida. A Neguita era mais extravagante  e mais carrancuda. Simpatia é tudo. Uma tinha de sobra a outra não tinha, logo  perdia de goleada.  O irmão da Neguita, o Santo era uma pessoa espetacular;

24- Aidê –  filha do seu Marcolino, pai do Mario e do Nei, donos do Corintinha. Era uma disputa ferrenha – Vila Silvi a do Mingão e o Corintinha do Marcolino. No fim, os filhos se casaram- Aidê ( filha do Marcolino) com o Mirtola ( filho do Mingão). Tiveram filhos maravilhosos, mas depois se  separaram.

25- A família dos turcos- a turma todo do Seu Amadeu e Dona Sofia – filhas, netas, netos, uma turma, quase um exército. Em tudo, em festas, em jogo, em pescaria, sempre tinha alguém da família. Turma unida, adoravam uma confusão, uma conversa em voz alta. No fim virava festa, mas a dramatização ia da compra do pãozinho amanhecido, às encrencas da molecada na rua ou pelo troco errado recebido no bar ou na venda. Tinha uma turma de netos e bisnetos que deram continuidade à agitação da família : Amadeuzinho, Tuca,Valtinho,Tripa, Claudio Macaco, além das moças. Pessoal maravilhoso;

26- Zezinho – um baianinho criado com  a gente em casa. Nosso companheiro no bar,nos jogos nas  brincadeiras ou qualquer confusão. Pessoa de nossa total confiança e lealdade. Sabia e conhecia todos os costumes da  nossa casa e das pessoas que frequentavam nosso bar. Um quase irmão. O “perigoso “, gozador silencioso. Pronto para qualquer parada;

27- As primas-Lena e Roseli –  na casa delas, juntavam-se as meninas do bairro. Bailinhos, namorinhos, nasciam e morriam por ali. Um ambiente cheio de amizade e curiosidade de toda natureza. A baianinha que chegou e que todos paqueravam , aquela moça bonita parente do amigo e assim a casa estava sempre cheia de moças bonitas e  os gaviões rondando. Uma casa receptiva, sem maldade, só carinho e amizade;

28-As festas juninas – os eventos anuais esperados. Santo Antônio na Dona Elga e os bolinhos de fubá. São Pedro, no Pedrinho e a turcaiada toda. Comida à vontade. São João na Dona Nega e os grandes balões. Foram muitos anos e cada vez as festas eram melhores e mais animadas. Uma moçada!

29- Pessoal do  bairro dos bancários – um  bairro bem próximo da Vila Silvia. Gente considerada “mais rica”. Formavam um grupinho diferente- Pirilo,Robertinho,Miltinho,Teobaldo, Giba,Noquinha, Orlando,Espanhol, a turma do Cabral, Dico e outros. O tempo foi encurtando as distâncias e formaram um mesmo grupo.  O Dico era a figura de destaque. Ótimo jogador de futebol e cheio de malandragem e conversa fiada. Sempre presente em todas as brincadeiras edebom humor. Uma figuraça e amigo de todos;

30- Pessoal do Jardim Janiópolis – um bairro das proximidades.  Outro time de futebol com gente boa: Cabrinha,Cabrão, Bila que faleceu precocemente, Alvoneti,Landinho e outros. Esse bairro logo se juntou aos demais e as pessoas formaram um mesmo grupo. Turma bacana e todos bons de bola;

31- A mineirada da Dona Judith –  uma familia  grande, todos morando perto, tios, sobrinhos, primos ,a família inteira. Torcedores do São Paulo e  morando bem na frente do campo do Vila Silvia, eram os torcedores mais fanáticos do time. E  muitos jogadores do time – Nelson Mineiro e Alemão eram excelentes,  os demais bem regulares, mas pontuais Zezé, Durão, Mario e outros. Muita festa e muita comida e as portas abertas a quem chegasse. E  um punhado de histórias.....

32- O Seu Fernando e os portugueses da batata – a família que iniciou vendendo carvão, se transformou em batateiros de feira. O velho, de vez em quando, tomava cada porre de estremecer! Queria brigar com todo mundo. Com jeitinho, a gente conseguia levá-lo  para casa. Prometeu que iria à minha formatura em Piracicaba. Foi com toda a  família. Seus filhos eram bem entrosados com a turma. 

33-Seu Borboleta – não era uma figura muito popular. Nunca desconfiei do que vivia. Vez ou outra, em épocas de eleição, aparecia o “baixinho” com sua gravatinha borboleta. Cheio de sabedoria  e  de mistérios. Vivendo no bar, a gente tinha mais oportunidade de conhecer essas figuras marcantes, mas esporádicas;

34- Mauro mudinho –  filho do Seu Nicolau da venda, lá dos bancários. Bom de bola e encrenqueiro. Ninguém entendia nada de suas expressões e ele achava que todos eram loucos e burros.

35-Bar do Nicolau  - uma venda misturada com bar, sorveteria e que ficava  na parte do bancários. Era mais uma referência geográfica do que qualquer outra coisa

36-Odaque – o soldado rabugento, de uma perna só, aposentado e de pouquíssimos amigos. De  conversa zero. Tinha a mania de empinar pipa toda tarde. Era a atração dos que não jogavam futebol.  Seu filho mais novo , “o cuco” ficou com o apelido pelo balançar da cabeça quando andava.

37-Otávio mineiro – pai do Nelson Mineiro, Arlindo , Durão, Mario, Ceci e Vilma. Seu Otavio foi loteador da Vila Cisper. Contador de histórias de valentia, ar de gente brava, sempre falando alto e dando a impressão de que estava brigando.  Era mais um instrumento de imposição de um grande vendedor. Era um mentiroso imbatível;

38-Zé Caroço – o sobrinho do Seu Pedrinho. Um magricela, chorão e briguento. Quando ficava nervoso o caroço do pescoço ficava enorme, daí o apelido. Um grande arrumador de encrenca para  os parentes. Era só estar na rua e virava foco de gozações e em seguida pedrada, paulada, estava arrumada a confusão. A mãe dele corria para socorrer, nunca  chegava a tempo, mas iniciava um riquíssimo xingatório. Só que nunca descobria quem estava brigando;

39-Merinho – casou com a Ceci, filha do Seu Otavio. Virou cunhado d e toda mineirada brava. Um tremendo boa vida. Especialista em contabilidade e arrecadação da mensalidade dos clientes. Corajoso, depois de alguns anos separou-se e não apanhou dos mineiros. Continuou amigo da turma e sem falhar na arrecadação mensal dos  clientes. Para alguns era o Dr. Homero e para muitos era o irmão de uma morena lindíssima que morava na Vila Nova;

40-Durão – um dos filhos do Seu Otávio. O apelido foi dado pela habilidade futebolística. O azar dele foi ter os irmãos  mais velhos- Nelson e Arlindo- considerados craques do times. Assim mesmo, com jeitinho e mais conversador acompanhava o time. Um mineiro da paz e sempre conciliador. Quando bebia um pouco gostava de cantar –  e como cantor era também, muito parecido ao jogador de futebol;

41- Mirtola – um craque de bola. Cheio de manha. Esteve em alguns clubes profissionais, mas não perdia a índole de jogar quando queria.  Mas quando queria era espetacular. Quase um irmão pela convivência familiar de nossos pais, nossas queridas e amicíssimas mães. As sua irmãs Elza, Linda e Ana eram maravilhosas, bondosas e sempre alegres;

42-João Minhoca – irmão do Mirtola e filho mais velho do Mingão e Dona Nega. Foi o melhor jogador de futebol que conheci em Goulart. Uma pessoa espetacular. Também jogava quando queria. Dançarino e de uma educação admirável. Era o namorador  que sempre estava com alguma moça de deixar a molecada de boca aberta. Formou  família com uma companheira de baile – a Japoneza;

43-Luiz Manquinho – o tapeceiro que virou goleiro do Vila Silvia por muitos anos. Ele tinha um pequeno defeito físico no pé, mas o time sempre marcava mais gols do que tomava. Presente em tudo e sempre colaborador;

44- a turminha da igreja – era a turma das festas, das procissões, das quermesses, etc.- com isso formou-se  um grupinho de gente independente que  iniciaram os primeiros movimentos para organização de uma representação comunitárias. Não tinham a simpatia de muita gente,mas as festas saiam e todos gostavam. Fizeram uma quadra, que virou um acontecimento no bairro,  fundaram uma associação de bairro e mais outras iniciativas. Faltava mais  informação e aproximação da grande turma , que os sentiam como “gente metida”.  Ficava  sempre faltando uma melhor explicação melhor em tudo que faziam. Faltava conversa com a turma que punha fogo em tudo - para o bem ou para o mal. Com certeza, essa turma da igreja,  teve muito a ver  com o processo de formação comunitária do bairro;

45- Marinho Bicheiro – exímio jogador de bilhar, virou bicheiro. Irmão do Gervásio e do Mané, casado com a irmã do Dico. Pessoal bacana, mas nunca se aproximavam muito do bochicho;

46- cinema do Medeiros – esse dá um livro. Sessão aos sábados a noite e aos domingos à tarde. Uma festa esperada por todos. A grande atração do bairro. O Seu Medeiros, um homenzarrão, era uma figura enigmática. Pouquíssima prosa para evitar entradas francas. Uma catraca ajustadíssima e um farolete surpreendente eram as marcas do cinema. No domingo, aquela farra e de repente acendiam-se as luzes e alguém era retirado da sala. Foram anos, só com essa grande e inesquecível atração no bairro;

47- a turma da Vila Nova – uma vila pouco afastada com pessoas bem unidas : Galó, Lucas, Seu Benjamim Pintor, a turma do Fogueirinha, do Zé André, Delegado, Valter Capão, Douglas, o Português Leiteiro, a turma do Cacolé, e outros. Tinham um time de futebol  que era a paixão do Galó e do Vartonga – filho do Seu Amadeu. Jogar Vila Silvia e Vila Nova nem pensar....

48-Mingão – o dono do Vila Silvia. Ficava com as camisas, apito, bola, escalava o time e era dono da camisa 9. Jogo de domingo à tarde e sempre seguido de briga. Pescador de todos os dias. Bom de prosa e de arrumar confusão. Esposo da Dona Nega, mãe do João Minhoca,Mirtola,Linda,Elza,Ana  e de muita gente. Eu tenho um pedacinho do coração para essa mãe. Casa grande e sempre de portas abertas. Mesa com lugares para quem chegasse. Tudo simples... um  paraíso, além da cordialidade de toda a família;

49-Zé do açougue – um rapaz que chegou e logo enturmou. Goleiro  e participativo de todas as iniciativas do time. Da turminha era um dos únicos que pegava no batente para valer. Direto no açougue;

50- os tintureiros – uma família de japoneses – Takachi,Kengi e mais duas irmãs que ficavam  andando para todo canto, levando as roupas  lavadas. Não me lembro de fazerem tintura de roupa, mas ficaram com o nome. Todo mundo tinha como referência..... lá perto “da casa dos tintureiros”;

51-Sapo –  O Sidnei era um moço muito quieto, meio gordinho e molenga, daí o apelido.  Filho do Seu Siqueira e Dona Antonieta. Era muito conhecido também pelas irmãs bonitas que tinha – Dalva e Hilda. Grande colaborador do time de futebol. Não me lembro de nenhuma encrenca em que o Sapo estivesse metido. Gostava de jogar dominó e baralho;

52-os goleiros do Vila – isso é registro importante. O Vila Silvia sempre teve um timaço – com certeza, nos dias de hoje, muitos jogadores seriam craques profissionais. Mas nunca teve um goleiro brilhante- boas pessoas, amigas, pontuais, mas como goleiros não passavam de regulares: Maurão, Luiz, Hildo, Zé do Açougue, e outros. Pessoas maravilhosas, que todos queriam como participantes do time. Lá na frente, a turma resolvia;

53-a bala do Baltazar – talvez poucos se lembrem dessa pessoa. Lembro-me  pela sua infalível presença no bar do meu pai aos domingos à tarde para vender balas  brancas de coco. Todo arrumadinho com sua sacola de bala. Voz tranquila e calma. Sempre dando para alguém a receita das balas deliciosas. Era o “homem das balas”;

54- a rivalidade dos times – Vila Silvia- do Mingão, no início, depois do Zé Barbudo, do Nelson Mineiro,do Sergio, do bar do seu Leopoldo; Vila Nova – do Lucas e do Galó; Corintinha – do Seu Marcolino ; o Janiópolis- do Bila e do Cabrinha. Disputa entre eles nem pensar! Briga  certa e feia!  Rivalidades a parte, formavam  grupos de grandes amigos, que foram se juntando com o tempo e deixaram para trás todas as rivalidades;

55- Prado Linguiceiro – uma figura meio misteriosa,meio metida a valente e  musculoso exibido, e que  se achava “o forte”. Todo robusto, era metido a entender de dores musculares. Sabia fazer linguiça e com certeza foi o precursor da fabricação de linguiça no bairro. No começo, no Bar do Seu Leopoldo. Depois no Nardo, que se transformou na Linguiçaria de Eng. Goulart, que existe até hoje e muito bem sucedida;

56- bailinho do corintinha – aos domingos à tarde. Sucedeu o Cinema do seu Medeiros. Das  17,00 às 22,00 horas. Era a hora da paquera! Muita gente e um punhado de meninada bonita do bairro e das redondezas. Sempre apareciam algumas “piratas”, que eram disputadíssimas!

57- Bar do Jaci – um amigão da família e um grande companheiro dos momentos difíceis. O Jaci tinha um táxi, que nunca se atrasava nos momentos de socorrer alguém.  Deu continuidade ao Bar do Seu Leopoldo. Fez uma padaria e foi incansável  tocador do boteco por muitos anos. Um lutador e que prestou socorro para muita gente;

58- Zeca Arruda – na nosso tempo era o “dono de tudo”. Do depósito de  materiais, de terrenos, do caminhão que  fazia alguma mudança, de casas e torcedor do Corintinha.  Metia-se em políticas e criava tremenda rivalidade com Seu Leopoldo, Seu Honor, Seu Medeiros. Sabia ser do contra. Meio só. Não dava a menor importância para fazer amizades.  Por muitos anos, jantou no bar do Seu Leopoldo – lá na cozinha da família.  De vez em quando, tínhamos até cerveja no jantar;

59- o pombal do seu Artur- Pai do Odair Capeta e do Aimoré, o Se Artur, de um braço só, tinha um pombal com milhares de pombos. Era uma diversão ir ver a Dona Zilá tratar dos famintos pombos, que de vez em quando, migravam para o pombal do Seu Amadeu e vice-versa e armava-se tremenda discussão. A grande sacada da molecada era quando, sigilosamente, montava- se um atalho, e a migração parava embaixo de alguma peneira.  Aí, era panela!

60- Luiza Louca -  a mulher que bebia e  que aparecia nos bares. Uma coitada, sem família e que nunca se soube a origem. O dia todo aos gritos desesperados na frente de algum boteco sorteado, que logo fechava as portas. Alguma mãe mais prevenida dizia que ela pegava criança. Mas não adiantava nada. A molecada ficava de longe na espreita vendo o  triste espetáculo e sem entender nada;

61- Fagundes – um crioulo bonzinho e educado sempre à disposição de alguém. Não fazia nada direito e nem até o final.  Qualquer serviço mal feito ou inacabado era obra do Fagundes. Um dia numa briga de pessoas embriagadas tomou uma facada do Paraíba. Todos ficaram assustados  com a inesperada brutalidade do nordestino quieto e franzino;

62-  O português leiteiro – famoso pela filhas bonitas que tinha e pelo que falava e que ninguém entendia. Tinha meia dúzia de vacas e atendia o bairro inteiro  com uma carrocinha. Meu pai, o Seu Leopoldo, pouco venenoso, dizia que as vacas eram boas, mas ótimo mesmo, era o poço  de água!

63- Seu Joaquim Bento – uma  pessoa diferente, sem muitas amizades e de pouca conversa. Pai do Jaci, tocador de cavaquinho e do Valdir, o Gordo, um craque  na defesa e exímio jogador de bilhar. Um amigão no campo de bola, especialmente para dar aquela trombada  no jogador de destaque do time adversário;

64- o campo do Vila Silvia –  bem no centro do bairro se transformava no palco de todas as atenções no domingo. Um campo com uma trilha de bicicleta e de carroça  cortando ao meio. Sempre cheio de buracos e pedaços de grama alta. Nunca conseguiram passar uma máquina ou colocar um caminhão de terra para melhorar o piso.  Os jogadores se trocavam em suas casas e iam para o campo. O adversário, num matinho ao lado.  O campo não tinha nenhuma sinalização. Tudo ficava a critério do juiz e do resultado do jogo. E quantas encrencas! E o campo lotava! Quando fizeram a primeira casa dentro do campo e sacramentou-se o loteamento, ficou para todos  a sensação de que terminava ali uma rica história do bairro;

65-o trem da central – a famosa Central do Brasil. Ligando o Brás à Calmon Viana – cerca de 60 minutos passando por dezenas de estações.  De hora em hora, desde 4,00 horas da manhã o trem andava sempre cheio. Bem cedo e à tarde era uma luta para se entrar e sair. Nas determinadas horas, os passageiros de sempre e foram anos, como a única opção para se deslocar para o centro da cidade;

66- o ônibus para a Penha – o amarelinho  ia até a Penha. Também de hora em hora. Em dias de chuva  o tempo duplicava, quando não parava de circular. Todo mundo conhecia os motoristas e desciam ou subiam onde queriam. Nada de ponto definido, principalmente para os mais conhecidos. O ponto inicial era no Bar do Seu Leopoldo e os motoristas e cobradores tinham direito ao café e algum salgadinho o dia todo. Foi uma festa quando o percurso foi estendido até o Largo da Concórdia;

67- o corre-corre dos balões – festas juninas  era época da turma dos balões. Quem pegava mais, o mais distante, o maior. E aquele monte de conversa em cada  balão, o grande troféu.  E os espaços territoriais eram divididos. Atravessar ou invadir o espaço era encrenca na certa. Mas essa era a grande conquista. A turma da vila, do bancário, da vila nova. Soltar enormes balões era evento para toda a vila. O Mirtola e o seu irmão João Minhoca eram os comandantes da festa. E faziam aquela festa quando alguém se metia a soltar balão  e não conseguia – ou queimava ou não subia. Na Vila dos Bancários, o Neno, outro baloneiro cheio de conversa,vez ou outra, aparecia para ajudar ou para atrapalhar. Uma molecadinha já acompanhava: Marcos( filho do Geraldão), Ricardo, Eduardo ( filhos do Mirtola), Silvio ( filho do João Minhoca ), Zé Caroço e muitos outros;  

68-o pastel e o sorvete – O Bar do Seu Leopoldo foi o ponto de encontro e referência do bairro por muitos anos. Ponto do ônibus, sede do Vila Silvia, jogo de truco, televisão para assistir futebol, etc. Mas nada batia o famoso pastel e o sorvete de abacaxi de massa e sem leite. De sábado e domingo o movimento era  intenso. Futebol, truco, e muito bate- boca eram os ingredientes de toda semana. Um ambiente de alegria e gozações intermináveis;

69- as brigas do futebol – o time do  Vila Silvia era  excelente.  Sempre a mesma turma e as posições eram disputadas. Jogos para fora com muita torcida acompanhando com caminhões lotados de torcedores. O campo no fundo do  bar do Seu Leopoldo foi palco de um punhado de brigas. Era só jogar com times do Cangaiba e era briga certa. Quase sempre com polícia depois dos jogos. Nada de tiros ou facas. Só tapas e no máximo algumas pauladas. Quando a policia chegava não encontrava ninguém; 

70- o tiroteio – Num domingo chuvoso, o time de veteranos que jogava no campo do  Vila Silvia enfrentou um time do Brás. Houve muita pancadaria e o Nelson Mineiro,  deu uns tapas em alguns adversários. Separaram e o jogo  parou. O pessoal saiu dizendo que voltariam para pegar o Nelson. No fim da noite ,por volta de 21,00 horas, quando o seu Leopoldo estava fechando o bar, surgiu um grupo de rapazes armados procurando pelo Nelson – não imaginavam que o filho do Seu Leopoldo também se chamava Nelson – algumas conversas e um gigantesco tiroteio. O Seu Leopoldo tomou 3 tiros e segundo sua versão baleou uns 5  ou 6 ! Ferimentos superados e história para muito tempo....

71- o time da Cisper – era uma grande indústria de vidro onde muitos do bairro se empregavam. Havia um campo de futebol muito bem cuidado e o time de futebol disputava o concorrido  torneio de futebol das indústrias ( LECI – Liga Esportiva do Comércio  e da Indústria). O papa tudo do torneio  era o Nitro Química de São Miguel Paulista bancado pela Votorantin. Os jogos aos domingos à tarde  representavam o acontecimento semanal. A pé ou de bicicleta a turma se deslocava para lá. Eu acompanhava meu tio Ditinho e com menos de 15 anos comecei a jogar no time. Foi pouco tempo, em seguida, o outro tio Antenor, levou-me para jogar no juvenil da Nitro Química. Foi um período de muitas lembranças e devo muito ao meu tio Antenor, um misto de tio e de pai, e ao Mario, o Tal, seu filho, que sempre esteve presente, ao lado do meu pai e querida mãe – Seu Leopoldo e Dona Tita;

72- as brigas no bar – de quando em quando no Bar do Seu Leopoldo  havia um corre-corre e alguns tapas. Nessas confusões, aprendi uma lição de vida – na hora da briga, os da casa tem sempre razão! Separar segurando os outros! Pulava-se o balcão com muita facilidade e aumentava-se o time da casa;

73- Dona Nega e suas gentilezas – era a esposa do Mingão, dono do time do Vila Silvia. Família grande com filhos, filhas e sempre alguns agregados.  Fui tratado sempre como filho da casa. Na verdade, éramos todos uma grande família – Dona Nega,Mingão,Linda,Elza,Ana, João Minhoca, Mirtola. Juntaram-se os genros Leo e Geraldão e depois a nora Aidê. Sentia-me um filho da casa e era tratado como tal. Muitas gerações curtiram esse ambiente maravilhoso e aconchegante. Netos e bisnetos estão dando continuidade a essa ligação familiar;

74-a venda do Seu Massao – um japonês calado com 6 filhos. Ao lado do bar do Seu Dema era o lugar do tem tudo. Bom negociante, sempre cordial. Os filhos cresceram e se tornaram parte da turma do bairro

75-o bar do Seu Dema – sempre cheio de novidades. Era o bar do jogo de bilhar . Morava em frente, do outro lado da rua. Dona Encarnação sua esposa estava sempre presente ao lado da grande sorveteria da Kibon – uma novidade, na época. Seu grande ajudante era o Maninho, pai do Pororó, moleque cheio de malandragem, que logo se descolou da turma;

76- Seu Claudionor Presidente – uma figuraça, pai do Clovis e do Canudo. Sentia-se todo orgulhoso com o garboso título de presidente do Vila Silvia, mas o Canudo tinha que jogar na ponta direita. Era arrojado e sempre surpreendia com jogos de camisa ou uma bola nova;

77- Sergio - o irmão para tudo – foi irmão, foi amigo, foi pai, conselheiro. Nunca tivemos uma desavença! Sempre disposto e otimista. Lidava com tudo e bem! Segurou todas as responsabilidades da casa nas minhas frequentes ausências. Ficou mais tempo no bairro, tomou conta do bar e ajudou muito o time do Vila Silvia. Um amigão de todos do bairro;

78- a surra de pau – uma turminha muito unida – João Baiano, Didi, Nato, Zé Pobre, Ivo, Claudio e outros – sempre procurando o que fazer. Um dia resolvemos derrubar uma caixa de abelha em minha casa e que ficava  perto do gaiola do papagaio. Em pouco tempo o  verdinho estava voando e  eu tomei uma surra de pau do Seu Leopoldo. O pau quebrou na primeira paulada e  eu nunca mais esqueci da brincadeira;

79- o natal e as fantasias do S. Paulo – o presente de Natal para grande parte da molecada era bola, chuteira e uniforme de algum clube. O quarteto de são-paulinos : Nelson, Mirtola, Lucio e Gijo ( este meu  primo nunca  jogou bola na vida). Era uma festa. Fomos crescendo e virou gozação. Nunca mais ganhamos nada;

80- os jogos na rua – nos finais de tarde era infalível : os tijolos marcando  as traves (!) e bola  no chão. Nunca menos de 15 a  20 moleques e alguns marmanjos, de fora, pondo fogo. Quando a plaina  limpeza as ruas de terra, aumentava o espaço e deixava o campinho “um brinco”. Era comum algumas trombadas e troca de tapas.  Uma diversão que durou anos;

81- o Cruzeirinho – uma pequena construção, simbolizando um Cruzeiro para orações. Seu Leopoldo, antes de ter o famoso bar, foi quem contruiu. Era uma referência geográfica do Bairro. Foi lá nas bandas do Cruzeirinho que o Zé Barbudo foi morar e fundou um time de futebol de mulheres.

82- Josué – um grande amigo. Morava na Penha e vinha todo final de semana ver o Vila Silvia jogar. Foi presidente e fanático torcedor do time. Uma gentileza a toda prova. Grande jogador de dominó;

83- a  Dona Comadre, a lavadeira – mãe da Dona Nega. É a pessoa mais velha que me  lembro do bairro. Bem menino, a velhona sempre alegre já beirava seus 80 anos. O dia todo lavando roupa e muita prosa...

84- os craques de bola – essa relação é enorme: João Minhoca, Mirtola, Mario ( Tal), Nelson Mineiro, Odair Capeta, Cabrinha, Arlindo, Artuzinho, Valdir Gordo, João Baiano,Dico,Amadeuzinho,Vicão ( jogou no Corinthians). Os meus amigos me incluem nessa lista também. Era um timaço de bola e de amigos;

85-a televisão no bar – O Seu Leopoldo comprou uma televisão e colocou no bar. Um sucesso! De domingo pagava-se um guaraná e tinha direito a acesso ao salão da televisão. Lotava! Nos dias da semana a lotação também era completa. Algumas discussões para escolha da programação, mas tudo terminava em festa...

86-os jogos e os caminhões -  o time do Vila Silvia quando ia jogar fora era acompanhado de muita torcida. O caminhão do Quirino  estava sempre à disposição, mas o Quirino tinha que jogar no segundão. E a dificuldade para se colocar o Seu João Barrocal! Seu Amadeu! Alguns carros, raríssimos  no bairro naquela época, iam buscar alguns jogadores em suas casas. O Seu Cabral era o maior catador de jogador. Farra na ida e na volta farra dobrada;

87-os técnicos do vila –  o técnico tinha algumas vantagens:  tinha que se preocupar com toda a roupa; a bola; juiz; se precisasse de caminhão era com ele também. Entrava no vestiário e o time já estava pronto. Dava uns berros  durante o jogo, e ostentava garbosamente o título de técnico. Foram carregadores do time : Zé Barbudo, figura folclórica e sempre de plantão , Giba, Nelson Mineiro, o meu irmão Sergio, Artuzinho, Durão, Sidnei e outros. O único que mandava e brigava mesmo era o Zé Barbudo.

88- o time  e as diversidades – o Vila Silvia tinha jogadores de todo tipo. E as coisas não se misturavam. Havia de Doutores à malandros de verdade. A amizade e o respeito andam  ao lado. O Denarte, um bom jogador, mas um médico excelente! Até hoje assisti a inúmeros colegas do time. Os malandros, não havia como evitar, e eram craques quando queriam jogar. Era uma grande família;

89- as pescarias – O Seu Leopoldo vez ou outra arrumava uma pescaria no Baiano ou no João Kun  - hoje Parque Ecológico . Fazia uma fila de acompanhantes,  pois ia ter feijoada na beira da lagoa!  Tudo improvisado, todos comiam e todos gostavam;

90- Português carvoeiro – formava uma família cheia de curiosidades. O velho quando pegava um porre ninguém aguentava.  Quando chegava no bar do Seu Leopoldo,  uma de suas paradas, eu ou o Sergio  levávamos o Seu Fernando embora. A família ficava toda agradecida. Ele prometeu que iria à minha formatura em Piracicaba. E lá esteve. Fiquei muito  satisfeito ;

91- Miguel Louco – era uma pessoa agradável que,  de tempos em tempos, amarrava um porre  de semana inteira. Perdia todo o controle e ficava perambulando pela Vila a semana toda. Não reconhecia ninguém e assustava as crianças pequenas. Uma tristeza para seus familiares. Mesmo assim, era respeitado por todos. De repente, sumiu....

92- Galó da Vila Nova – o corinthiano  que virou santista.  Era o procurador, o técnico e o Presidente do Vila Nova. Era gago e passava no bar todo dia  para falar de futebol ,e sem ninguém notar paquerava  a Inês, a moça, que trabalhava com minha mãe – a Dona Tita. E o Galó casou-se com a Inês;

93- Seu João da Mata – senhor sóbrio de pouca conversa. Voz baixa e sempre muito bem arrumado. Morava para o lado da Dona Ida – avó do Denarte – Era irmão da Dona Nega. Gostava de ler e sempre aparecia com uma pastinha que nunca se soube o que tinha dentro.  Sentava no bar, bebia um guaraná e ia  embora. De chapéu e óculos redondinhos era a figura do intelectual;

94- a laranja da Dona Ida – avós do Denarte e da Ida, a mãe da Dona Helga. Imigrantes que todos achavam que eram russos. Tinham uma chácara mutio bem cuidado com muitas frutas e um carro muito antigo guardado na garagem. Comprar laranja na Dona Ida era uma distração da Dona Tita,Dona Nega e Dona Zefa  e a molecada toda acompanhando para chupar algumas frutas  e ver o carro do Seu Nicolau;

95- a briga do Gaúcho – o Gaúcho apareceu no bairro e tinha uma fama de matador. Um bigodão, um vozerão e um chapéu enorme completavam a figura. Vivia de rolo. Um dia se meteu numa briga com meu tio Antenor. A briga começou de manhã no campo de futebol e foi ter continuidade à  tarde no bar do Seu Leopoldo.  O Gaúcho quase foi morto. Foi levado para o hospital no caminhão do Machado – pai do Zé Luiz. Sumiu e nunca mais apareceu no bairro;

96- as quermesses – as festas da Igreja.  A atração do bairro quando eram organizadas pela Igreja e  sua turminha. Encontro para paquera e conversas de toda ordem.  Foram crescendo a cada realização e foi também responsável pela criação da Associação que se criou depois. Muitos casamentos do bairro começaram nessas quermesses;

97- as procissões – essa era uma iniciativa da turma da Igrejinha, que ficava perto do campo. Aqui, o comando era da Dona Helga e do pessoal da Dona Judith, a matriarca dos mineiros. Aos sábados de Aleluia passava pelas ruas do bairro e findava na Igrejinha com uma prolongada reza;

98- o ônibus para escola – o ônibus das 12,00 horas levava a turma que estudava à tarde no Estadual. Éramos mais 10. Voltávamos no ônibus das 18,00 horas. Em dias de chuva. Só de trem. Era comum o motorista parar num ponto e esperar um pouco por alguém atrasado. Alguns berravam,  mas chegava o atrasado e vaia nele...

99- roubo de pedra com o caminhão do  Quirino – um dia vindo do sítio, recém adquirido na época, e em companhia do tio Ditinho, Geraldão e o Zezinho  encontramos um monte de paralelepípedo num canto da estrada de Santa Izabel. Programamos para voltarmos à noite com o caminhão do Quirino e fazermos um “carregamento ao sítio”.  Voltamos e afinamos. Bateu a vergonha em todos nós! Paramos e descarregamos o que estava na carroceria. Na volta em Arujá, comemos um punhado de pizzas. E demos muita risada, pois o arrependimento tinha partido do Mirtola, um especialista nessas traquinagens;

100- ADÃO –  um menininho que apareceu pedindo para um e para outro, com uma perna atrofiada e andando todo torto. Ficou amigo de todos e ninguém deixava de ajudar com alguma coisa. No meio de tanta gente ficou espertíssimo. Logo estava fumando, bebendo escondido e continuou vivendo de ajuda. Cresceu e ficou mais deformado. Foi ficando malandro, bravo e valente. Foi se distanciando e sumiu....

101- QUERO-QUERO – um menino todo educadinho, de voz baixa e feições de índio  e sempre querendo alguma coisa. Sempre “quero” e ficou batizado. De repente, já estava jogava futebol e bem! A convivência com a turma do bairro fez bem para o menino com cara de índio. Cresceu e se virou com trabalhos variados. Sempre brincando e respondendo ao apelido;

102- Delegado – um crioulinho cheio de estilo. Cabelinho esticado, terninho variado e jinga de malandro. Virou em bêbado e encrenqueiro. Um coitado que brigava e só apanhava. Seu irmão, o Valdir,  ficava furioso, mas não tinha o que fazer. Uma pessoa santa quando não bebia;

103-sala de jogo de baralho – quando o Seu Leopoldo mudou o bar, deixou uma sala à disposição do truco e dos carteiros de plantão. Foram anos e  a mesma rotina. Abre-se a porta, junta-se o grupo ,joga-se e abaixa a porta. Uma varrida no ambiente  ou um baralho novo eram acontecimentos festivos. Aquela sala era ,na verdade, um saco de risada e diversão;

104- Tiãozinho -  pessoa bem discreta e muito educada.  E seu irmão, Bauer, muito extrovertido e são-paulino roxo. O Tiãozinho era respeitado e ouvido e bom jogador de bola e sempre era o capitão do time. Esse moço foi o meu grande incentivador para jogar futebol! Sempre aos sábados, antes de se formarem os times de futebol do bairro,havia uma brincadeira de futebol no campo do corintinha. Formavam-se três, quatro times e bola em jogo. A escolha dos times ficava por conta dos mais respeitados. Eram  os donos dos times. Naquele bolo de mais 40 escolhiam-se os times e a molecada menor era repartida entre os times. Aí, a surpresa! Numa escolha para formação dos times, o Tiãozinho  escolheu o menino, que  ele chamava de “ esquerdinha” como o primeiro do seu time. Eu, da turminha para ser repartida, fui o primeiro a ser escolhido!  Esse destaque  valeu-me  a motivação e gosto pelo futebol e uma lição de vida: sempre faço questão de destacar e reconhecer o mérito  das pessoas!

105-Edmundo fotógrafo – o homem da fotografia estava presente em todas as festas com muita conversa e sempre alegre. Trazia novidades e não tinha preguiça para viajar a trabalho.  Logo foi trabalhar na Cisper, por conta de fotografar e fazer propaganda. Entusiamado por futebol, logo virou Presidente do Vila Silvia. Ajudou e se dedicou muito. Amigo e querido por todos;

106- Dico - era a figura de destaque  em todo lugar que estivesse. Contando piada e sempre alegre. Ótimo jogador de futebol e cheio de malandragem e conversa fiada. Era o “Maradona” do time. Sempre presente em todas as brincadeiras e de bom humor. Um companheirão para tudo;

 107-como descobri a agronomia – uns dias antes do Natal de1965, num sábado à tarde, o caminhão do Quirino encostou no bar  chegando de uma viagem. Todo desajeitado disse que tinha vindo do João Kun, onde tinha visto uma  criação de porcos bem organizada. Voltei com ele para conhecer e  tive oportunidade de encontrar o responsável  no local.  Fiquei encantado com a quantidade de informações e o embasamento técnico do trabalho. Descobri ali, o primeiro sinal, do trabalho do engenheiro agrônomo!