Lei 11.340/2006 - Principais alterações processuais e jurisprudenciais nos dez anos de sua vigência
Por Lyvia Jacomeli | 07/12/2016 | DireitoRESUMO
O presente trabalho de conclusão de curso tem como tema, “Lei 11.340/2006 – Principais alterações nos dez anos de sua vigência”. O presente trabalho, demonstra como desde os primórdios as mulheres são colocadas em situações de risco no âmbito familiar. Aborda sobre ação pública condicionada e incondicionada, a ADIN 4424/12, que sanou a divergência sobre o tipo de ação pública utilizada para referida lei. Discorre sobre o procedimento, competência, e aplicabilidade de uma lei de proteção específica a mulher em relação à violência doméstica contra homens.
INTRODUÇÃO
A violência contra mulher é um fato constante em nossa sociedade, uma vez que desde os primórdios a mulher sempre foi considerada submissa em relação aos homens. Podemos dizer que, desde os tempos bíblicos, as mulheres são violentadas, colocadas em situações de riscos, tendo seus direitos elementares violados, passando por situações vexatórias, discriminatórias e de submissão aos homens. Embora não se possam culpar somente os ensinamentos religiosos pela disseminação dessas ocorrências, não podemos deixar de relacionar que a educação religiosa também influenciou, para que houvesse as diferenças entre homens e mulheres, tendo em vista que desde o começo da história da criação do mundo as mulheres são colocadas como inferiores, pois sua criação adveio do homem. No entanto, apesar de ser um episódio ainda existente de submissão, que se repete com o passar dos anos em todas as sociedades, e mesmo existindo uma vontade mundial, no sentido de erradicar essa questão, encontra-se ainda com muita dificuldade.
Um caso de violência contra à mulher, que por sua vez denominou a Lei 11.340/06, é o caso da cearense, Maria da Penha Maia Fernandes, que foi agredida pelo seu esposo durante seis anos, tendo esse último atentado contra sua vida duas vezes. Longos dezenove anos, esta mulher lutou por seus direitos, de forma que o fato após grande repercussão tomasse uma posição e assim fosse criado um meio de erradicação a violência contra a mulher.
Apesar das divergências advindas com a criação da referida lei, deve-se observar as mudanças que esta trouxe no que se trata da competência da propositura da ação penal, se deveria ser condicionada ou incondicionada e quais as modificações ocorridas neste período de vigência.
O tema proposto se justifica na busca de demonstrar como a Lei 11.340/2006 é aplicada, se desenvolve deixando claro como é o procedimento e as inovações reconhecidas pelo Judiciário nestes dez anos de sua vigência, sua aplicabilidade quando se trata de violência doméstica contra homens e os sujeitos existentes na relação.
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ASPECTOS PROCESSUAIS E PROCEDIMENTAIS
Em princípio, os processos envolvendo a violência doméstica contra a mulher eram de competência dos Juizados Especiais, sendo tratadas e aplicadas nos termos da Lei 9.099/95[1], como simples crime, sendo considerado de menor potencial ofensivo, onde se permitia a aplicação de penas pecuniárias e multas. Penas que chegavam até no máximo dois anos, sendo ofertada ao agressor a possibilidade de transação penal.
A vítima não tinha nenhuma solução para erradicar as agressões sofridas no âmbito familiar, já que se considerava crime de menor potencial ofensivo. Para que fosse tomada alguma providencia, essas mulheres tinham que procurar um defensor, para que fosse proposta uma separação de corpos, com pedidos de liminar, que seria ajuizada na Vara de Família onde os juízes poderiam indeferi-las, uma vez que o simples Boletim de Ocorrência juntado a petição inicial, configurava prova unilateral, devendo então ser indeferido o pedido, até que em audiência, pudesse o agressor apresentar defesa, e posteriormente ser deferido o pedido da inicial, com base no que era apresentado. Mas, até que essa audiência fosse realizada, a vitima tinha que conviver com seu agressor.
Com a promulgação da Lei 11.340/96, o procedimento para tomada de medidas de proteção foram modificadas. A mulher, vítima, deverá procurar a delegacia, onde será lavrado um Boletim de Ocorrência, e com este último já está assegurada de imediato, proteção policial e à familiar possibilidade de imediato acolhimento, como de seus dependentes, se necessário.[2]
Contudo, um ponto obscuro deixado pelo legislador foi o que permitiu discussão em relação quanto à natureza da ação penal aplicável nos casos da Lei Maria da Penha, onde no seu artigo 41[3], deixou expresso que não se aplicaria a Lei dos Juizados Especiais, pois cria nesse exato ponto um questionamento de qual ação pública seria cabível, quando se tratar de lesão corporal de natureza leve. Essa obscuridade foi sanada com o advento da ADI 4424/12, que retirou da competência dos Juizados Especiais Criminais à apreciação dessas situações e procedimentos. Foram criados os Juizados de violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, a fim de se ter um atendimento especial para essas causas de violência doméstica.[3], deixou expresso que não se aplicaria a Lei dos Juizados Especiais, pois cria nesse exato ponto um questionamento de qual ação pública seria cabível, quando se tratar de lesão corporal de natureza leve. Essa obscuridade foi sanada com o advento da ADI 4424/12, que retirou da competência dos Juizados Especiais Criminais à apreciação dessas situações e procedimentos. Foram criados os Juizados de violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, a fim de se ter um atendimento especial para essas causas de violência doméstica.[4]
Esses Juizados receberão o pedido inicial da ofendida, e no prazo de 48 (quarenta e oito) horas dera o juiz despachar sobre medidas protetivas de urgência. Posteriormente, deverá comunicar o Ministério Público para a este tome as medidas necessárias. Nas comarcas onde ainda não foram criadas os Juizados de Violência Doméstica e Familiar conta a Mulher, o pedido de medidas protetivas será encaminhado para a Vara Criminal.
2. DA COMPETÊNCIA
Com o fim da competência do Juizado Especial, para apreciar os casos de violência contra a mulher, ficou visível que o legislador retirou o caráter de considerar a violência contra a mulher, como um crime de pequeno potencia ofensivo.
Uma vez que retirada a competência dos Juizados Especiais Criminais, e quando não estruturados os Juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher, os pedidos de medidas protetivas e instauração de procedimento será pelas Varas Criminais, ou Justiça Comum em caso de comarcas de Vara única.
Mostra-se necessário a criação dos Juizados Especiais (JVDFM), uma vez que existe divergência e discussões sobre a competência de apreciação das medidas e procedimentos envolvendo violência doméstica, pois somente procedimentos advindos das delegacias poderão ser distribuídos às Varas Criminais. Outros pedidos como alimentos, serão processados pelas Varas de Família, quando existentes, causando divergência em relação ao procedimento e aonde se instaurar. Quando não existente o juizado especial especifico para a tramitação da ação, foi delegado as Varas Criminais, receber, julgar, processar e executar as sentenças condenatórias.
No que se trata de recurso, não se tratando das medidas protetivas, que essas serão de alçada da Vara Criminal, mas quando versar sobre algum conteúdo cível, deverá o recurso ser encaminhado a Vara de Família, o que gera tamanho transtorno, uma vez com o Juizado Especial (JVDFM), esse seria responsável por todo o conteúdo, pois teria competência mista, atendendo quanto o procedimento cível, quanto criminal.
Agora, quando se falar de competência territorial, deve-se observar que essa é relativa, uma vez que a vítima pode escolher propor ação no seu domicílio, no local onde ocorreram os fatos e até mesmo do domicílio do agressor,de forma que o legislador deixou a cargo da ofendida o privilégio para definir o local da tramitação. Uma forma flexibilizada, devido ao estado que a vítima se encontra e se demonstra uma forma de facilitar a recuperação e estabilidade da vítima, após a agressão.
3. DA AÇÃO PÚBLICA
3.1. Incondicionada à representação
Tratando-se da ação pública incondicionada, que é aquela que independe da vontade da vítima, o Estado, observando o fato toma para si a responsabilidade de garantia do direito, cumprindo-se o fundamento do artigo 5º, XXXV da Constituição Federal que dispõe:
Art.5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros residente no Pais a inviolabilidade do direito a vida, à liberdade à igualdade, à segurança e à propriedade.(...)
XXXV- a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
(Brasil. 1988 – Constituição Federal)
Cabe ao Ministério Público a propositura da ação penal, independentemente da vontade da vítima, ficando autorizado a intentá-la sem qualquer provocação, por apenas indícios de materialidade de autoria. Essa constitui regra no nosso ordenamento jurídico, somente não executada quando a lei penal expressamente estabelecer outra forma de representação.
O Ministério Público é também responsável pelas ações públicas condicionadas à representação, sempre que a vítima, ou seu representante legal autorizar que essa seja proposta. Para que se evitem a ofensa à vitima em sua intimidade, optou o legislador por condicioná-la a representação do ofendido, para que possa então o Ministério Público implantar ação em juízo.
No artigo 41 da Lei 11.340/2006, o legislador deixou um ponto obscuro quando se fala nesse assunto, de ser uma ação pública condicionada ou não a representação. A divergência tanto doutrinária como jurisprudencial em relação ao tipo de ação pública para o procedimento da Lei 11.340/06, foi resolvida com a ADI 4424/12, que questionava a constitucionalidade dos artigos 12, inciso I; 16; e 41 da Lei Maria Penha. Essa ação foi proposta pelo Procurador Geral da República, Roberto Gurgel Santos, que defendia qualquer ato de violência contra a mulher não deveria ser aplicado a Lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95), que nos crimes de lesão corporal praticados no âmbito familiar contra a mulher, mesmo de caráter leve, atua-se mediante ação penal pública incondicionada.
Com a expressa menção à inaplicabilidade da Lei nº 9.099/1995 há um retrocesso da norma penal, no que tange ao crime de lesões corporais leves ou culposa contra mulheres vítimas de violência doméstica. Contudo, no âmbito de abrangência da Lei nº 11.340/2006, outros delitos continuam dependendo de representação, tais como a ameaça, os crimes contra a honra, na hipótese do artigo 145, parágrafo único, do Código Penal, e os crimes contra os costumes, quando aplicável o artigo 225, § 2, do mesmo diploma legal.
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