JULGAMENTO POR AMOSTRAGEM DOS RECURSOS EXCEPCIONAIS

Por Catarina Santos Bogea | 13/06/2017 | Direito

ESTUDO DE CASO - JULGAMENTO POR AMOSTRAGEM DOS RECURSOS EXCEPCIONAIS¹

 

Catarina Santos Bogéa²

Christian Barros Pinto³

 

1 DESCRIÇÃO DO CASO

Finn e Princesa Jujuba ajuizaram ação contra Rei Gelado e Marceline, os primeiros requerem indenização em razão de danos causados em seu castelo, situado no Reino Doce. Conclusos os trâmites legais, foi proferida sentença de improcedência do pedido dos autores, o que motivou interposição de recurso, o qual foi provido por unanimidade no Tribunal de Justiça. Mediante os fatos, os réus, verificam omissão quanto a questões federais constitucionais e infraconstitucionais, se utilizando de recurso cabível, o qual foi rejeitado. Na sequência, foram interpostos recursos para o STJ e em seguida STF, com vistas à reforma do pronunciamento estadual. O presidente do tribunal de justiça constatou que vários recursos com idêntica controvérsia já haviam sido interpostos e que quatro deles foram admitidos e remetidos aos tribunais superiores. Todavia, os réus discordam que seja idêntica a questão de que trata o processo.

 

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

O direito a celeridade processual constitui também principio que deve ser resguardado em detrimento daquele que provoca o poder judiciário. Todavia, a desproporcionalidade entre demanda processual e processos julgados é destoante, e o abarrotamento nos tribunais resta consequência inevitável.

A Emenda Constitucional 45/2004 veio como medida de contenção ao acesso dos tribunais superiores, e determina, em curtos termos, que em âmbito de recursos extraordinários, a demonstração de repercussão geral das questões suscitadas é requisito de admissibilidade. Posto isso, os tribunais ainda cuidaram de remediar questão tenente a recursos repetitivos interpostos por diferentes autores, dessa forma, o artigo 543-C, acrescido ao CPC em 2008, veio como medida suplementar para conter a lotação processual que atrasa julgamentos nos tribunais, e dispôs acerca de alterações no procedimento de recursos extraordinários.

Conforme exposto, resumidamente, acima, atendido o requisito de admissibilidade quanto à repercussão geral dos recursos extraordinários repetitivos, o tribunal terá o arbítrio de escolha – dentre os recursos (repetitivos) interpostos – da peça que melhor representa as questões de controvérsia trazidas a juízo pelos mais diversos autores. É válida a ressalva de que os tribunais, no contexto de julgamento por amostragem, cuidam apenas dos recursos que versem sobre matéria de direito. Dito isto, os recursos escolhidos por afinidade, termo este utilizado por Didier e Cunha (2014), são julgados, devidamente, de acordo com os trâmites do devido processo legal. Noutro giro, os demais recursos interpostos (por autores diversos), mas que segundo entendimento dos tribunais versam acerca de mesma matéria, permanecem inertes ou, juridicamente sobrestados.

Por obvio, o julgamento por amostragem de recursos repetitivos detém o condão de desafogar os tribunais do excesso de demanda processual, sem, contudo, comprometer a segurança jurídica em detrimento da celeridade processual, uma vez que ambos os princípios são constitucionalmente previstos, e, portanto, devem ser cumpridos.

Adentrando o instituto do julgamento por amostragem, tema central deste caso, o tribunal a quo, mediante o artigo 543-C, §1º, CPC, deverá, quando admitido mais de um recurso que representa a mesma controvérsia, “suspender a tramitação dos demais por 180 dias” (DIDIER JR; CUNHA, 2014, p. 303), isto até que haja pronunciamento definitivo do tribunal superior.

Aqui, as partes não têm o direito de que o seu processo especificadamente, seja o escolhido como recurso-modelo na remessa para tribunal superior. “Inexiste direito da parte à escolha de seu recurso para remessa ao STF para aferição, a partir dele, da existência ou da inexistência de repercussão geral. O ato de seleção procedido pelo Tribunal de origem, por conseguinte, não desafia qualquer recurso.” (MARINONI; MITIDIERO, 2007, apud CONCEIÇÃO, 2010, p. 9).

Como em muitos casos concretos, em que os recursos suspensos poderão deter conteúdo destoante do recurso-modelo, o que ocorre é a frustração das partes que possuem processos vinculados à decisão que foi submetida ao julgamento por afinidade. Em análise ao caso posto, o que se verifica é que Rei Gelado e Marceline discordam acerca do seu sobrestamento, uma vez que não coaduanam com o entendimento de que a matéria de seu recurso é idêntica ao do recurso-modelo escolhido pelo tribunal. Se esta for a situação concreta, poderão os réus impugnar a decisão do sobrestamento, onde não cabe agravo ou reclamação constitucional, cabendo apenas o agravo interno ao tribunal de origem segundo Didier Jr. e Cunha (2014). Nos casos em que o tribunal a quo não selecionar o recurso de amostragem e o sobrestamento, o relator poderá determinar o último (TALAMINI, 2008).

 

2.1 Medidas de combate às decisões que afetam os demais recursos em julgamento por amostragem

Como se trata de um julgamento por amostragem, e a escolha, como elucidado anteriormente por Didier e Cunha (2014), se dá por ‘afinidade’, é possível que o tribunala quonão remeta a tribunal superior o recurso-modelo mais adequado, em outras palavras, é perfeitamente razoável que ocorra equivoco quanto a escolha do recurso-modelo. Assim, a parte que entender ter sido prejudicada, uma vez que o seu processo não versa acerca de matéria idêntica a do recurso-modelo, poderá se valer de meios de recorribilidade de tal decisão. Os meios de insurgência cabíveis que serão tratados a seguir derivam de analogias a casos concretos, assim como entendimento doutrinário, uma vez que ainda não há previsão legal de como proceder na tratativa de situações como a do referido caso.

Em primeiro lugar cabe tratar da interposição de Agravo nos moldes do artigo 544, CPC. Este legisla as situações em que o recurso extraordinário (ou especial) não for admitido. A partir da não admissibilidade, a petição do agravo será encaminhada ao presidente do tribunal de origem, e o agravado terá 10 dias para oferecer resposta. Na sequencia, os autos deverão de ser enviados ao tribunal superior. A partir daí o presidente do STJ ou STF enviará o processo ao relator que, por sua vez, julgará o agravo.

Noutro giro, o STF entende pelo não cabimento deste agravo para impugnar o recurso extraordinário sobrestado indevidamente. A Ministra Ellen Gracie demonstra este posicionamento: “não tendo juízo de admissibilidade, não é cabível a interposição de agravo de instrumento nos termos do art. 544 do Código de Processo Civil, motivo pelo qual não há que falar em afronta ao que dispõe a Súmula STF 727”. O entendimento do STF coaduna com o procedimento, uma vez que o pronunciamento que determina o sobrestamento é dado antes do juízo de admissibilidade, o que afasta o cabimento do agravo nos termos do art. 544 do CPC.

Outro meio de insurgência a ser analisado no contexto hora tratado é a Reclamação Constitucional. Esta, de competência do STF, é processo autônomo, e se faz utilizável quando da não observância do art. 544, §3º, CPC – que atribui ao tribunal a quo a responsabilidade de enviar os autos para a instância superior, já que esta é competente para analisar Agravo à luz do art. 544, CPC, se interposto contra sobrestamento de recurso extraordinário (ou especial). O STF, todavia, entende será cabível Reclamação Constitucional apenas nos casos previstos no art. 102, CR.

Previsto no art. 557, CPC, o Agravo Interno (ou regimental) considera hipótese de interposição contra decisão monocrática dos tribunais superiores que tenha julgado Agravo previsto no art. 544, CPC. A parte terá cinco dias para interpor o agravo interno, a partir da premissa de manifestação do principio da colegialidade, isto é, decisão proferida monocraticamente poderá sofrer o devido controle pelo colegiado competente (BUENO, 2011). O entendimento do STF acerca do Agravo Interno é a sua interposição no âmbito do tribunal a quo, uma vez que a atuação deste só se inicia depois do primeiro juízo de admissibilidade do recurso extraordinário. Como a decisão monocrática pode ser considerada antecipação de decisão do colegiado, então, com previsão legislativa ou não, caberá Agravo Interno contra qualquer decisão proferida monocraticamente nos tribunais (salvo exceções), inclusive no âmbito daquelas decididas por julgamento de amostragem.

No que concerne os Embargos de Declaração, estes se fazem cabíveis quando for constatada obscuridade, omissão ou contradição na decisão da sentença, em decisão interlocutória, ou decisão do relator ou acórdão. Em tese, caberia este tipo de insurgência no âmbito de sobrestamento indevido se para correção de erro material. Mas, por outro lado, como o pronunciamento que decorre o sobrestamento tem caráter de despacho, Embargos de Declaração seria recurso não cabível para interposição no contexto estudado (sobrestamento indevido). Ainda, de acordo com o principio da fungibilidade, Embargos de Declaração não cabem contra decisões do relator, e nestes termos, entende-se pela substituição ou transformação em Agravo Interno, ou Regimental.

Em se tratando de medida cautelar, se preenchidos os requisitos fumus boni juris e periculum in mora, poderá ser requerida medida cautelar com o objetivo de assegurar tutela que garanta efetividade na decisão do processo principal, isso porque, por obvio, a morosidade, ou demora resultaria em danos irreparáveis.

Como não há legislação acerca de remédio processual cabível em sobrestamento indevido, o Mandado de Segurança seria alternativa viável se impetrado em 120 dias. Resta necessário a comprovação que a decisão proferida nos tribunais superiores foi ilegal ou abusiva. Se impetrado Mandado de Segurança contra decisão judicial a autoridade coatora será a pessoa jurídica a qual o magistrado pertence, logo, o endereçamento, é claro, se dará aos Tribunais. (ISHII, 2012).

Por fim, ao despacho não cabe recurso, logo resta a possibilidade de se utilizar da simples petição para destrancar o recurso extraordinário que fora sobrestado indevidamente. “[...] a solução está em requerer-se, diretamente ao Tribunal de origem, demonstrando-se a diferença entre as controvérsias, via simples requerimento, a imediata realização do juízo de admissibilidade” (MARINONI; MITIDIERO, 2008, p. 63).

REFERÊNCIAS

BAPTISTA, Sônia Márcia Hase de Almeida.Dos Embargos de Declaração. São Paulo: RT, 1993.

BUENO, Cassio Scarpinella.Curso sistematizado de direito processual civil. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

DIDIER JR, Fredie. CUNHA, Leonardo José Carneiro. Curso de Direito Processual Civil – Meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. Salvador: JusPODIVM, vol. 3, 2014.

ISHII, Vivian Gomes. A problemática do instrumento processual cabível contra decisões que sobrestam recursos submetidos aos artigos 543-B e 543-C do Código de Processo Civil.Disponível em: http://www.repositorio.uniceub.br/bitstream/. Acesso em: Mar 2015.

MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel.Repercussão Geral no Recurso Extraordinário.2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

MOREIRA, José Carlos  Barbosa. Comentários ao Código de processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

WAMBIER, Luiz Rodrigues. ALMEIDA, Flávio Renato Correia de. TALAMINI. Curso avançado de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, vol. I, 2001, p. 701.