Julgamento de Apelação Cível perante o Tribunal de Justiça

Por Lucas Brito Ferreira Sousa | 21/06/2018 | Direito

ARTIGO: Julgamento de Apelação Cível perante o Tribunal de Justiça

Lucas Ferreira Brito Sousa

1 DESCRIÇÃO DO CASO

Insatisfeito com o resultado, o candidato contratou advogado que propôs ação ordinária contra a Universidade Estadual do Maranhão, cuja causa de pedir se assentou em dois fatos:

a) a nota atribuída à prova de redação não pode ser mantida, haja vista que o examinador retirou pontos sem levar em consideração os argumentos alinhavados pelo candidato;

b) a regra editalícia prevendo reserva de vagas para as ações afirmativas padece de inconstitucionalidade em razão da violação aos arts. 1º, III, 3º, IV, 5º, caput, I e II, 37, caput, 205, 206, caput e I, 208, V da Constituição Federal.

Com base nesses argumentos, o candidato pediu a procedência da ação para que o Juízo lhe concedesse nota máxima na redação e anulasse a regra editalícia que tratava da política de cotas em virtude de sua inconstitucionalidade, determinando que a Universidade divulgasse novo resultado do vestibular e, de conseguinte, convocasse o candidato para a respectiva matrícula.

Após a apresentação de defesa e a realização da instrução processual, o Juízo da Vara da Fazenda Pública julgou improcedentes os pedidos. Após sua intimação, o advogado do candidato interpôs recurso de Apelação Cível, alegando que o magistrado não observou a prova dos autos e tampouco reconheceu a inconstitucionalidade da regra do Edital, devolvendo para o Tribunal a análise de todos os pedidos formulados na petição inicial. Após seu processamento em primeiro grau, o recurso foi remetido para o Tribunal de Justiça e incluído em pauta para julgamento por uma das Câmaras Cíveis.

ESPECIFICADADES DO CASE:

a) Os pedidos formulados na petição inicial são autônomos, pois acolhido qualquer deles o candidato passa a ter nota superior ao primeiro colocado das vagas destinadas às ações afirmativas;

b) iniciado o julgamento pela Câmara, 2 Desembargadores votaram pelo reconhecimento da inconstitucionalidade da regra editalícia que trata das ações afirmativas.

1) Questão Principal

Considerando os Direitos material e processual vigentes no país à época da intimação da sentença, assim como os modelos jurídicos doutrinários e jurisprudenciais sobre a matéria, a Apelação merece ser provida?

Não. Primeiramente, não houve respeito ao Princípio da Dialeticidade. De acordo com o art. 1010, inciso III do CPC, “a apelação, interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade”. (BRASIL, 2015). No caso em tela, o advogado interpôs apelação se utilizando das mesmas alegações da petição inicial em relação à inconstitucionalidade do edital.

Após o recebimento do recurso, este é distribuído e o relator deverá decidi-lo de forma monocrática se visualizar as hipóteses do art. 932, incisos III a V do CPC.

De acordo com o art. 932, inciso III, incumbe ao relator “não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida”. (BRASIL, 2015) (grifo nosso). Ora, o advogado não impugnou os fundamentos do reconhecimento da constitucionalidade do edital, ele utilizou as mesmas alegações da petição inicial.

E, segundo o inciso IV do mesmo artigo, incumbe também ao relator “negar provimento a recurso que for contrário a: b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos”. (BRASIL, 2015). Já existe acórdão em relação à constitucionalidade do edital e em relação à alteração de nota em concurso público.

“Atos que instituíram sistema de reserva de vagas com base em critério étnico-racial (cotas) no processo de seleção para ingresso em instituição pública de ensino superior. (...) Não contraria – ao contrário, prestigia – o princípio da igualdade material, previsto no caput do art. 5º da CR, a possibilidade de o Estado lançar mão seja de políticas de cunho universalista, que abrangem um número indeterminado de indivíduos, mediante ações de natureza estrutural, seja de ações afirmativas, que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estes certas vantagens, por um tempo limitado, de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas particulares. (...) Justiça social hoje, mais do que simplesmente retribuir riquezas criadas pelo esforço coletivo, significa distinguir, reconhecer e incorporar à sociedade mais ampla valores culturais diversificados, muitas vezes considerados inferiores àqueles reputados dominantes. No entanto, as políticas de ação afirmativa fundadas na discriminação reversa apenas são legítimas se a sua manutenção estiver condicionada à persistência, no tempo, do quadro de exclusão social que lhes deu origem. Caso contrário, tais políticas poderiam converter-se em benesses permanentes, instituídas em prol de determinado grupo social, mas em detrimento da coletividade como um todo, situação – é escusado dizer – incompatível com o espírito de qualquer Constituição que se pretenda democrática, devendo, outrossim, respeitar a proporcionalidade entre os meios empregados e os fins perseguidos”. (ADPF 186, rel. min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 26-4-2012, Plenário, DJE de 20-10-2014.). No mesmo sentido: RE 597.285, rel. min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 9-5-2012, Plenário, DJE de 18-3-2014, com repercussão geral. (STF, 2014).

 

“Segundo o entendimento consolidado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, bem como no do Supremo Tribunal Federal, é vedado ao Poder Judiciário o reexame dos critérios usados pela banca examinadora na elaboração, correção e atribuição de notas em provas de concursos públicos, devendo limitar-se ao exame da legalidade do procedimento administrativo e da observância das regras contidas no respectivo edital. Precedentes (...)”. (STJ, RMS 20984/RS, DJe 12/11/2009). (TJ-PR, 2011).

 

O exame das questões da prova, a pretexto de rever a sua adequação ao conteúdo programático, é vedado ao Poder Judiciário, pena de incursão no mérito administrativo, podendo, ainda, demandar dilação probatória, tendo em vista a especificidade técnica ou científica do conteúdo programático e da questão em discussão.

A regra é idêntica para os que se encontram na mesma situação. Não há quebra da paridade. Onde existe a mesma regra, existe idêntica razão. É o brocardo latino: “ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositivo”.

Não cabe ao Poder Judiciário, no controle jurisdicional da legalidade do concurso público, tomar o lugar da banca examinadora, nos critérios de correção de provas e de atribuição de notas a ela, quando tais critérios forem exigidos, imparcialmente, de todos os candidatos. Recurso ordinário improvido. (RMS 26.735/MG , Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 10/6/2008, DJe 19/6/2008). (STJ, 2010).

 

2) Questões Secundárias

 

a) Qual é o prazo para a interposição da Apelação Cível, considerando que a intimação da sentença ocorreu em 21/3/2016? Explique.

 

Em 21 de março de 2016 já estava em vigor o novo Código de Processo Civil. A Apelação deve ser interposta no prazo de 15 dias por meio de petição escrita, não se admitindo interposição oral. De acordo com o art. 219 do CPC “a contagem de prazo só se fará em dias úteis” (BRASIL, 2015). Portanto o prazo para interposição da Apelação Cível será até o dia 14/04/2016.

 

b) Pode a Câmara Cível reconhecer a inconstitucionalidade da regra do Edital e dar provimento à Apelação Cível? Explique.

 

Não. A Câmara só tem competência para reconhecer a constitucionalidade. Só quem pode reconhecer a inconstitucionalidade é o pleno. De acordo com o art. 97 da CF/88 (full bank): “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”. (BRASIL, 1988).

Existe, porém, uma situação em que a Câmara Cível pode reconhecer a inconstitucionalidade da norma impugnada. Isso ocorre quando o pleno ou o órgão especial já tenha analisado o caso e decidido sobre o incidente. Quando isso ocorre, não há mais a necessidade de a Câmara novamente submeter a questão para o pleno, ela já pode aplicar o entendimento que já foi firmado.

Bem, já existe entendimento firmado pela constitucionalidade do edital. Ademais, os 2 desembargadores que votaram pela inconstitucionalidade incorreram em erro de competência, pois apenas o pleno é competente para tanto.

 

c) Caso não seja possível, qual é o procedimento a ser adotado pelo órgão fracionário do Tribunal?

 

De acordo com Barroso (2012), havendo arguição de inconstitucionalidade e existindo prévia manifestação do plenário ou do órgão especial do próprio tribunal ou do Supremo Tribunal Federal acerca da questão incidental, o órgão fracionário, no caso em questão, a Câmara Cível, não submeterá ao plenário a arguição de inconstitucionalidade, podendo declará-la desde logo.

Não havendo esta possibilidade, o procedimento adotado pelo órgão fracionário do Tribunal, segundo o art. 949 do Código de Processo Civil, se a arguição for rejeitada, dar-se-á prosseguimento ao julgamento. Porém, sendo acolhida, “a questão será submetida ao plenário do tribunal ou ao seu órgão especial”. (BRASIL, 2015).

Verificado o acolhimento da arguição e o órgão fracionário submetendo a cópia do acórdão ao plenário, de acordo com Barroso (2012), o processo ficará suspenso na Câmara Cível aguardando a deliberação do pleno a respeito da questão constitucional.  Declarada ou não inconstitucionalidade, seguirá o julgamento do caso concreto no órgão fracionário, “tendo como premissa lógica, a decisão proferida pelo tribunal: se a norma tiver sido declarada inconstitucional, não será aplicada. Na hipótese contrária, incidirá regularmente sobre o caso concreto”. (BARROSO, 2012. p. 124).

 

d) Pode a Câmara Cível aumentar a nota do candidato na prova de redação? Explique.

 

Não. Já existe entendimento consolidado nos tribunais superiores negando essa competência.

“Segundo o entendimento consolidado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, bem como no do Supremo Tribunal Federal, é vedado ao Poder Judiciário o reexame dos critérios usados pela banca examinadora na elaboração, correção e atribuição de notas em provas de concursos públicos, devendo limitar-se ao exame da legalidade do procedimento administrativo e da observância das regras contidas no respectivo edital. Precedentes (...)”. (STJ, RMS 20984/RS, DJe 12/11/2009). (TJ-PR, 2011).

 

O exame das questões da prova, a pretexto de rever a sua adequação ao conteúdo programático, é vedado ao Poder Judiciário, pena de incursão no mérito administrativo, podendo, ainda, demandar dilação probatória, tendo em vista a especificidade técnica ou científica do conteúdo programático e da questão em discussão.

A regra é idêntica para os que se encontram na mesma situação. Não há quebra da paridade. Onde existe a mesma regra, existe idêntica razão. É o brocardo latino: “ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositivo”.

Não cabe ao Poder Judiciário, no controle jurisdicional da legalidade do concurso público, tomar o lugar da banca examinadora, nos critérios de correção de provas e de atribuição de notas a ela, quando tais critérios forem exigidos, imparcialmente, de todos os candidatos. Recurso ordinário improvido. (RMS 26.735/MG , Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 10/6/2008, DJe 19/6/2008). (STJ, 2010).

 

Este é o fundamento.

 

 

REFERÊNCIAS

 

BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: . Acesso em: 24 mar. 2016.

 

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: . Acesso em: 26 mar. 2016.

 

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso ordinário em mandado de segurança: RMS 20984 RS 2005/0192939-0, 2010. Disponível em: . Acesso em: 26 mar. 2016.

 

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. A Constituição e o Supremo: TÍTULO II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais. CAPÍTULO I - DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS, 2014. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/artigoBd.asp?item=31.>. Acesso em: 26 mar. 2016.

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ. Mandado de Segurança: MS 6732447 PR 0673244-7, 2011. Disponível em:

. Acesso em: 26 mar. 2016.

 

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