JUIZ DAS GARANTIAS

Por NAILANE LACERDA OLIVEIRA DE MELO | 01/10/2016 | Direito

Autores:

Almir de Oliveira Santos

Elzely Amaral de Souza Rios

Gabriela Fernandes

Ivana Guimarães

Nailane Lacerda Oliveira de Melo

Taiana Levine Carneiro Cordeiro

 RESUMO 

O artigo tem por objetivo destacar o juiz das garantias no projeto de lei 156/2009 na visão de alguns axiomas da Teoria do Garantismo Penal desenvolvida por Luigi Ferrajoli. Teoria esta que tem como objetivo garantir o respeito a direitos e garantias do acusado, bem como reduzir ao mínimo necessário o desequilíbrio processual vigente. Necessário se fez apresentar, também, a forma como o ativismo excessivo do magistrado mitiga os princípios constitucionais no nosso sistema normativo, salientando aqui, o poder dos princípios como regras, e a sua predominância sobre a lei, tanto ao legislador, quando ao aplicador do Direito. Em especial o princípio da dignidade humana, que tem previsão na Constituição Federal, com status de cláusula pétrea, o que evidencia, por si só, a importância e aplicação básica dos princípios constitucionais que garanta a dignidade humana tanto do ofendido, quanto do acusado, de forma a garantir ao processo penal a imparcialidade do magistrado, bem como instituir ao juiz das garantias um meio para efetivar os princípios constitucionais.

  INTRODUÇÃO

 Ao iniciarmos o presente artigo científico, procuramos conceituar o significado de sistemas processuais penais, e, de que forma se dá a ingerência do sistema inquisitório no sistema acusatório que conseguintemente mitiga os princípios constitucionais, bem como resulta no ativismo excessivo dos magistrados na persecução penal.

Pode-se afirmar que, em análise ao projeto de lei 156/2009 à luz da teoria do garantismo penal verifica-se a incidência de alguns axiomas utilizados por Ferrajoli na teoria do garantismo, a saber: o axioma, nulla culpa sine iudicio ou principio da jurisdicioneidade em sentido lato e estrito, por esse principio ocorre a desconcentração da função judicial a órgãos distintos, ou seja, um órgão do estado promove a ação penal ou um particular move a ação penal, todavia tem que ter um juiz imparcial que garanta o contraditório e a ampla defesa para que possa se defender e provar que não há culpa; nullum iudicium sine acusatione, denota do principio acusatório ou da separação do juiz da persecução penal e acusação, visto que no código vigente o próprio juiz que atua na fase da persecução penal fica prevento para o processo penal conforme dispõe o art.75 do cpp, que remete ao sistema inquistório, no qual o órgão que acusava, julgava; nulla acusatio sine probatione, por este axioma, incumbe ao Ministério Público provar a autoria e materialidade, visto que se não há prova, deve prevalecer o indubio pro reo, tendo em vista a equidade das garantias probatórias para acusação e defesa.

Embora se verifique a incidência da teoria garantista, há resistência dogmática de alguns juristas quanto aos efeitos de prevalecer o direito individual do acusado, que segundo eles, acarretaria uma insegurança jurídica ainda maior. Contudo a competência do juiz das garantias finaliza quando proposta a ação penal, quando, então, passarão a ser decididas por juiz distinto daquele que presidiu a persecução, com a finalidade de garantir ao processo penal brasileiro as garantias fundamentais previstas na constituição federal e que será explanada no decorrer no trabalho.

 JUIZ DAS GARANTIAS

 Palavras chave: juiz das garantias, sistema acusatório, ativismo excessivo, principio da imparcialidade.

 SISTEMAS PROCESSUAIS PENAIS

Os sistemas processuais penais, em uma visão holística têm como finalidade organizar e titularizar os atos praticados em uma investigação criminal, bem como na sua instrução, de forma a atingir seus objetivos gerais com eficiência. Segundo Bobbio sistema “é um daqueles termos de muitos significados, que cada um usa conforme suas próprias conveniências”. Em termos gerais, a doutrina divide em três espécies: sistema inquisitivo, sistema acusatório e sistema misto, isso implica em dizer que os sistemas processuais penais estão formados por princípios, normas ou institutos jurídicos que podem estar presentes em vários ordenamentos ou somente em alguns.

  • SUBSISTEMAS
  • SISTEMA INQUISITÓRIO

 O sistema inquisitório tem fulcro nas manifestações históricas da idade média, adotado pela igreja católica como forma de repressão a heresia que, depois de aceito pelos monarcas da época, concentrou nas mãos do juiz a função de investigar, acusar e julgar, mediante provocação ou de oficio, atribuindo a confissão sob tortura, o titulo de “rainha das provas”, e, a atuação absoluta, do juiz, “senhor das provas”. Caracterizava-se assim, os elementos fixos do sistema inquisitivo que se estendeu pela idade moderna, cujo declínio iniciou-se com os ideais iluministas, perfazendo-se na revolução francesa.

Nota-se que nesse sistema, não existia o principio do contraditório e da ampla defesa, porque o direito canônico era regido pelo princípio inquisitivo, em que o valor da prova era tarifado de forma a instituir uma hierarquia entre elas. Além do mais, o processo era escrito, secreto, sigiloso e o acusado não gozava das garantias mínimas.

  • SISTEMA ACUSATÓRIO

O sistema acusatório teve inicio em Atenas, após o povo se rebelar com a forma de organização social e judicial que privilegiava a oligarquia e concentrava a função jurisdicional no conselho do areópago. Para por fim ao período de tensão social que se estendeu por longos períodos, a classe dominante e o povo elegeu Sólon, a quem foi eleito com a missão de fazer uma nova constituição para Atenas.

Com uma nova organização social estabelecida através da constituição elaborada por Sólon, iniciava-se um novo sistema penal, no qual dividia as funções, entre os arcontes que atuariam como magistrados; conselho do areópago, como responsáveis pelos castigos nos delinquentes, o efetivo respeito à constituição e como guardião das leis; e o tribunal popular que dava direito ao povo de apelar às decisões dos magistrados, bem como o livre acesso à justiça através da ação popular.  

Verifica-se que foi nessa conjuntura política que se deu a implantação da democracia em Atenas, momento em que, com o objetivo de desconcentrar do areópago a função jurisdicional, tal como limitar a arbitrariedade e poder voltados para privilegiar a oligarquia, nasce o sistema acusatório.

Embora não conste previsão expressa, o Brasil adotou o sistema acusatório na constituição de 1988 de forma implícita, porém, mediante a interpretação dos princípios constitucionais, a saber: contraditório e ampla defesa, previsto no art.5º, inciso LV da Constituição Federal que, incide na igualdade de direitos entre as partes do processo que sustentam posições divergentes; imparcialidade do juiz previsto como uma garantia constitucional, onde todo cidadão tem o direito de ser julgado por um juiz imparcial, o que significa que este deve ser justo, analisar o caso concreto sem estar contaminado com suas convicções ou qualquer animus tendencioso. Dentre outros, publicidade, oralidade, juiz natural, presunção de inocência, todos eles elencados como princípios constitucionais, com a finalidade de assegurar os direitos e garantias fundamentais ao acusado. Tal como, o elemento fixo do sistema, a desconcentração da função judicial a órgãos distintos, ficando a gestão da prova a cargo das partes; a função de acusar dado ao Ministério Público; e julgar ao judiciário.

  • SISTEMA MISTO

Os ideais iluministas e a revolução francesa contribuíram para o declínio do sistema inquisitivo, tendo em vista não poder concentrar nas mãos de um só juiz a função de investigar, acusar e julgar, então, o Estado resolveu dividir o sistema processual penal em duas fases, na qual atribui a função de julgar a órgão distinto de acusar, nascendo assim o Ministério Público. Desta forma, mostra-se necessário a exigência de duas partes que, por sua vez, compete ao Ministério público à função de acusar, em face daquele que sofre a acusação, configurando assim o sistema inquisitivo na fase pré-processual. 

Na segunda fase, a fase processual, demanda da aplicação do sistema acusatório, como forma de garantir a imparcialidade do juiz, assegurando ao querelado o contraditório, ampla defesa, publicidade, oralidade. Entretanto nem sempre se efetiva a garantia na separação das funções, visto que nesse sistema, por vezes, é devido ao magistrado intervir na produção da prova para somar-se à acusação como forma de garantir a veracidade da imputação, afetando diretamente a imparcialidade do juiz.

  1. INGERÊNCIA DO SISTEMA INQUISITÓRIO NO CPP

2.1 MITIGAÇÃO DOS PRINCIPIOS CONSTITUCIONAIS

Ao analisar os dispositivos infraconstitucionais acerca da problemática realidade jurídica do sistema acusatório no Brasil, verifica-se uma inércia legislativa, tal como uma dificuldade em conciliar o código de processo penal de 1941, com a democracia positivada da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que, consequentemente, incide na mitigação dos princípios constitucionais devido à ingerência do sistema inquisitório do código elaborado sobre o regime da ditadura militar. Contudo, apesar da constituição estar no topo da pirâmide normativa, tal como a imposição constitucional prevista no art. 5, incisos XXXV, LIII, LIV e LV, da CF de 88, alguns dispositivos do código de processo penal prevalece sobre a norma tida como a hierarquicamente superior.

Nesse compasso, percebe-se que embora seja defeso ao juiz ter conceitos prévios, realizar pré-julgamentos sobre provas no curso do inquérito policial em observância ao principio da imparcialidade do juiz, o código de processo penal no art. 5, inciso II, faculta ao magistrado requerer o inquérito policial. Além disso, o juiz que requerer ou que anteceder na prática de algum ato, verificar-se-á a competência por prevenção, conforme art.75, parágrafo único e art. 83 do CPP.

Ocorre, que dentre os atos praticados, está requisitar diligencias, expedir mandados de prisão, ou seja, pré-julgar pelos atos praticados antes e durante a instrução processual, relativizando também o principio do contraditório e ampla defesa; presunção de inocência; do devido processo legal e outros. Atingindo por via reflexa a supremacia dos direitos e garantias fundamentais do acusado. 

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