INVOCAÇÃO DO PLANO INDISPENSÁVEL
Por Paulo de Aragão Lins | 16/05/2009 | PoesiasINVOCAÇÃO DO PLANO INDISPENSÁVEL
Amada...
És mais que tu mesma
Ultrapassaste a ambição,
O sonho
A utopia
Que tiveste em teu travesseiro
De menina-moça
De menina triste muitas vezes.
Criaste sozinha
O além de ti
A ternura que muitas
Mecanicamente buscam
E precocemente perdem.
E por seres assim,
Quase simbólica,
Abandonei-me ao teu amor
E ao teu carinho,
Porque preciso de luz
Para a viagem.
Por teres alçado um grande vôo
Além do que pensavas,
Deixei também de ser concreto,
Palpável,
Transitório...
E alcancei os símbolos
Falei a linguagem das alturas
Descerrei horizontes incompletos
E colhi muitas flores no caminho.
Fui irreal também
Só por momentos
Que é perigoso
Pairar além de alguns segundos
E deixar que o mundo passe
Seus pecados
Seus gritos
Seus mistérios
E nos deixe muito puros
Muito santos
Insensíveis
À ansiedade e à dor
Dos irmãos que ficaram.
Presente, complementas
Ausente, entristeço tanto
A quase alma
Que nada resta de amor ou alegria.
Anjo que és,
Não entendes o bem
Não entendes o mal
Por isto usas dialeticamente
Seus poderes
Construindo o “perfectum”
Que é nosso
Porque somos imperfeitos
Para o compreendermos.
Nas alturas senis de onde viemos
Deixamos o desnecessário
Para vivermos no pó
Compartilharmos
Com todos os mendigos
A existência
E os outros
Por sujos que se façam
São nossos
Pertencem-nos
E nós a eles pertencemos
Somos juntos
Seres uniformes
Univivos
Unifeitos
Vindos do não sabemos
Vivendo no não queremos
E indo para o não vemos.
Depois de tudo o que fizermos
Seremos espalhados pelo mundo
Correremos multípedes
Viveremos multiformes
Nos outros que criarmos
Nos males que formarmos
Nos bens que dispersarmos.
Vejo-te assim, amada
Pluridimensionalmente
Maior do que és
Maior do que pensares
Criei-te assim
Construi-te assim
És minha obra de lúcida imaginação.
Se um dia quiseres ser mais uma apenas,
Desce do pedestal
E serás apenas estátua nua
Projeção do que és.
Porque os outros odeiam o mármore
São vândalos perdidos
Que buscam só a carne
E não desejam empunhar
O sagrado de um cinzel.
Se me deixares, mudarei de arte
Esculpirei nas telas
O multicor do abstrato
Esterilizações
Corporificações
E nunca mais criarei
Estas imagens que me elevam.
Serei apenas eu
Um eu incomensurável
Segregado de mim mesmo
Em cauterizações absolutas.
Agora é tudo gelo e nebulosa
E a sublimidade consiste
Em não sabermos quem seremos.