Investigação criminal - Ministério Público e as Polícias (Felipe Genovez)

Por Felipe Genovez | 31/05/2011 | Direito



COMPETÊNCIA LEGAL PARA REALIZAR INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS


MINISTÉRIO PÚBLICO E A POLÍCIA CIVIL NAS INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS

GENOVEZ, Felipe MINISTÉRIO PÚBLICO E A POLÍCIA CIVIL NAS INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS / GENOVEZ, Felipe. ? Florianópolis [S.n.], 46 p. Trabalho de conclusão de Curso na WDireito. Curso de Especialização em Direito Penal e Processo Penal. 1. 2. 3. CDU ? XXX.XX - Florianópolis 2011 FELIPE GENOVEZ

Tese de conclusão final de curso apresentada à WDireito como condição necessária a conclusão do Curso de Especialização em Direito Penal e Processo Penal.

RESUMO MINISTÉRIO PÚBLICO E A POLÍCIA CIVIL NAS INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS A pesquisa que está sendo apresentada tem como firmamento estudos jurídicos a respeito das funções do Ministério Público e da Polícia Civil, especificamente, com relação à função de polícia judiciária voltada a perscrutação criminal na sua primeira fase. A partir deste trabalho pretende-se verificar a quem incumbe realmente a realização de investigações criminais e para esse fim foi utilizada a pesquisa bibliográfica.

Como inferência dos estudos pôde se verificar que os avanços ministeriais foram relevantes com a CF/88, entretanto, a função de investigar e acusar merecem ser repensada. Também, a função investigativa não pode se constituir monopólio de uma única instituição que exerce a função de polícia judiciária. O contexto jurídico penal exige bom senso e também humildade por parte dos operadores do Direito que atuam principalmente no Parquet como também das autoridades policiais. Palavras-chave: Ministério Público; Polícia Civil; Função de Polícia Judiciária; Autoridades Policiais; Investigações Criminais.

LISTA DE ABREVIATURAS/SIGLAS/SÍMBOLOS Art. ? Artigo Arts. ? Artigos Adin ? Ação Direta de Inconstitucionalidade CPP ? Código de Processo Penal IC ? Investigações Criminais MP ? Ministério Público PJ ? Polícia Judiciária STF ? Supremo Tribunal Federal § - Parágrafo

SUMÁRIO 1.
INTRODUÇÃO...........................................................................................p. 8 1.1
Dos Argumentos sobre o novo papel do MP......................................p. 9 1.2 O foco da ...........discussão ........................................................................p. 10 2.
DIREITO COMPARADO...........................................................................p. 12 2.1 Sistemas que Regem a Atuação do Ministério Público ..................p. 13 2.1.1 Histórico.....................................................................................................p. 13 2.1.1.1
O MP no Brasil..........................................................................................p. 14 2.1.1.2
O MP na França........................................................................................p. 15 2.1.1.3
O MP na Itália............................................................................................p. 16 2.1.1.4
O MP na Alemanha..................................................................................p. 17 2.1.1.5
O MP em Portugal....................................................................................p. 17 2.1.1.6
O MP na Espanha....................................................................................p. 18 2.1.1.7
O MP nos Estados Unidos.....................................................................p. 18 2.2
A Função de Polícia Judiciária...............................................................p. 18 2.2.1 A Evolução da Polícia Judiciária ...........................................................p. 20 2.2.2
Normas que tratam da função de PJ no Brasil..................................p. 23 3. INQUÉRITO ...POLICIAL...........................................................................p. 23 3.1 Origem.........................................................................................................p. 24 3.2
Do Conceito de Autoridade Policial.......................................................p. 31 4. LEGITIMIDADE DO MP PARA REALIZAR IC ........................................p. 35 4.1 Competência para realizar IC.................................................................p. 39 4.2 Entendimento do STF...............................................................................p. 39 4.3
Limites do MP para realizar IC. ..............................................................p. 40 4.4 O Poder de Investigação Criminal do MP.................................................p. 42 5. INTERPRETAÇÃO À LUZ DA CF/88........................................................p. 43 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................p. 45

CAPÍTULO 1 1.

INTRODUÇÃO

A criminalidade há muito tempo tem sido objeto de primazia na agenda dos governos, especialmente, considerando de um lado que o aparelho policial não consegue dar uma resposta efetiva à sociedade em termos de combater a impunidade e de outra parte em razão da necessidade de se investir em recursos humanos, ciência e estrutura na área policial. Também, os avanços do Ministério Público quanto ao nicho das investigações criminais tem ocupado os debates entre nossos juristas, autoridades e tribunais pátrios, na medida em que ganha relevo uma disputa institucional entre as polícias Federal/Estadual/Civil - que exercem função de polícia judiciária e investigações criminais - e o Ministério Público. Como é sabido o Parquet amplificou seu espectro de competências a partir da Constituição de 1988 de tal ordem que hoje não consegue cumprir com o seu papel, o que se explica e, sobremaneira, é cada vez mais cobrado pela sociedade em razão da demanda criminal que viceja em ordem geométrica, além das expectativas da sociedade com vistas à uma prestação jurisdicional mais célere e eficaz. Sobre os avanços ministeriais tem-se hodiernamente que o órgão está "Desvinculado do seu compromisso original com a defesa judicial do Erário e a defesa dos atos governamentais aos laços de confiança do Executivo, está agora cercado do contraforte de independência e autonomia que o credenciam ao efetivo desempenho de uma magistratura ativa de defesa impessoal da ordem jurídica democrática, dos direitos coletivos e dos direitos da cidadania" .

1.1 Dos Argumentos sobre o novo papel do MP

Os membros ministeriais argumentam que a partir do momento em que o legislador conferiu poderes legais para transigir como sujeito titular da ação penal pública, está apto a requisitar das autoridades policiais novas diligências, inclusive, podendo realizá-las caso entenda necessário. Nesse sentido, o argumento fértil é que o órgão não se constitui apenas parte no procedimento, muito pelo contrário, suas ações são necessárias à marcha procedimental e imprescindíveis ao combate da impunidade e controle da criminalidade. A pretensão ministerial tem ido de encontro ao que estabelece o art. 129, CF, (§§ VIII e IX) que dispõe como poder do Ministério Público exercer o controle externo da atividade policial, requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquéritos, bem como exercer outras funções, desde que compatíveis com a sua finalidade. Enquanto alguns ministros do STF se posicionam contra as investidas ministeriais (outros não, como no caso da Ação Direta de Inconstitucionalidade o Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado favoravelmente para que o MP possa exercer esse múnus público, ou seja, exerça as funções investigatórias. O Jurista Damásio E. de Jesus ensina que : (...) existem três correntes dominantes: a) O MP não pode realizar investigações na esfera criminal, por existir óbice constitucional; b) O MP não pode efetuar investigações criminais, por ausência de previsão legal; c) O MP pode realizar investigações criminais (Orientação dominante) . No exercício desse mister os promotores de justiça se defrontam com as limitações probatórias para ingresso da ação penal, cujas demandas acabam resultando em absolvição por insuficiência de provas (in dúbio pro reo). O festejado jurista Tourinho Filho ensina que o Ministério Público não pode ficar eqüidistante das partes. Em defesa do parquet, o autor ainda enfatiza que este não precisará do inquérito policial para oferecer a denúncia, desde que, é claro, possua todos os elementos para formar sua opnio delict: O inquérito policial é peça meramente informativa. Nele se apura a infração penal com todas as suas circunstâncias e a respectiva autoria. Tais informações têm por finalidade permitir que o titular da ação penal, seja o Ministério Público, seja o ofendido, possa exercer o jus perseguendi in judicio, isto é, possa iniciar a ação penal. Seja essa a finalidade do inquérito, desde que os titulares da ação penais (Ministério Público ou ofendido) tenham em mãos as informações necessárias, isto é, os elementos imprescindíveis ao oferecimento de denúncia ou queixa, é evidente que o inquérito será perfeitamente dispensável . Lênio Streck e Luciano Luiz Feldes, comentando os §§ VIII e IX do art. 129, CF/88, aduzem que esses dispositivos conferem ao MP plenos poderes para exercer o controle externo da atividade policial, requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquéritos, como exercer outras funções, desde que compatíveis com a sua finalidade .

1.2 O foco da discussão

Daí que surgem confrontos institucionais na medida em que essa função do ministerial, com a abrangência que lhe foi ofertada, concorre invariavelmente para a possibilidade de se incorrer em invasão de funções conferidas a outras instituições, como no caso dos órgãos encarregados da Segurança Pública, conforme estatui o artigo 144, §1º, IV e § 2º, que dispõe ser a Polícia Federal competente para "exercer com exclusividade as funções de Polícia Judiciária da União". Também, o parágrafo § 4º, referido mesmo preceptivo, cuja dicção estatui que as polícias civis, dirigidas pelos delegados de polícia de carreira, incumbem ressalvadas a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as Militares. O art. 4º, CPP, dispõe que: Art. 4º. A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida à mesma função. Além do que ficou estampado no parágrafo único do dispositivo sobredito, também, o art. 39, § 5º, CPP, dispõe que o Ministério Público poderá promover a ação penal independentemente da instauração de inquérito Policial, desde que existam elementos suficientes à propositura da ação. Vê-se que a partir dessas disposições é que teve origem a celeuma acerca da competência dos promotores de justiça poderem também realizar investigações criminais, em que pese que o legislador tenha conferido atribuição às autoridades policiais para realizar investigações, ou seja, ser atribuiu competência a autoridades administrativas, a fortiore, por quê então não poderiam membros do Ministério Público também realizarem investigações?. O foco da discussão está centrado na locução "investigação" que se constitui no conjunto de atividades e diligências adotadas com o objetivo de esclarecer fatos ou situações de direito. Diante desse conceito, pode-se afirmar que as diligências com a finalidade de esclarecer fatos podem ser obtidas por meio de provas amparadas em lei. No debate no STF discute-se, ainda, a constitucionalidade da Lei Complementar Federal 75/93, que permite aos membros do Ministério Público da União, nos procedimentos de sua competência, fazer inspeções e diligências investigatórias e requisitar o auxílio de força policial. Além disso, a lei permite a livre entrada de promotores e procuradores de Justiça nos estabelecimentos policiais e prisionais e o acesso a qualquer documento que trate da atribuição do controle externo da Polícia. A Ação Direta de Inconstitucionalidade a Lei Federal 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) também é objeto de contenda, especialmente porque determina a aplicação subsidiária da norma ao Ministério Público dos Estados e, ainda, a Resolução 20/2007, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) que disciplina o controle externo da atividade policial. Nesse sentido: A Advocacia-Geral da União, por meio do Parecer 102.446/2009, com 35 páginas, foi juntada a ADI 4.271, proposta pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil no STF, cujos argumentos estão direcionados aos poderes de investigação que seriam de atribuição exclusiva dos delegados de polícia . Diante dessa difícil controvérsia impõe-se uma análise a respeito da atividade de polícia judiciária, o inquérito policial, a fim de se poder aferir melhor o assunto e se contribuir para se por fim aos conflitos entre Ministério Público e as Polícias Federal/Estadual em se tratando de apuração das infrações penais e sua autoria, passando-se, preliminarmente, por uma abordagem sobre as duas instituições.

CAPÍTULO 2 2.

DIREITO COMPARADO

As vantagens que o direito comparado oferece podem, sucintamente, ser colocadas em três planos. O direito comparado é útil nas investigações históricas ou filosóficas referentes ao direito; é útil para conhecer melhor e aperfeiçoar o nosso direito nacional; é, finalmente, útil para compreender os povos estrangeiros e estabelecer um melhor regime para as relações da vida internacional (Apud Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, Professor Universitário em Brasília) . O direito comparado é prioritariamente tema de história, de filosofia e de teoria geral do direito. Do ponto de vista historiográfico, o direito comparado é componente discursivo da justificação dos modelos jurídicos. E porque a história é um guarda-roupa no qual cabem todas as fantasias, de tal modo que o presente olha para o passado e lá encontra a sua imagem, como quem se vê ao espelho, o direito comparado confunde-se com a narrativa histórica, e nesse sentido seu estudo exige cautelas (Apud Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, Professor Universitário em Brasília) .

2.1 SISTEMAS QUE REGEM A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O tema do qual tratamos é debatido mundialmente. Lopes Júnior ensina que no direito comparado existem dois sistemas principais: "(...) o primeiro é o inglês, no qual a polícia detém o poder de conduzir as investigações preliminares e o segundo é o continental, no qual o Ministério Público conduz a investigação criminal" . O sistema continental foi adotado por vários países, tais como: Itália, Alemanha, França e Portugal. A seguir, farei alguns comentários quanto às formas de Investigações Policiais em vários países do mundo.

2.1.1 Histórico

As origens do Ministério Público remontam à antiguidade, isso a cerca de quatro mil anos, no antigo Egito exercendo as funções de "Magiai" (citação) , com atribuições para castigar os rebeldes, reprimir violentos e proteger a sociedade. Conforme ensina Alexandre Pinto de Moraes, nos Éforos de Esparta, na Grécia, já havia resquícios daquilo que hoje conhecemos como "Parquet", cujo titular era investidos de funções jurisdicionais, mais que isso, podiam fazer o contraponto ao governo e ao senado, exercendo a acusação. Na Grécia também tínhamos o Thesmotites ou Themãtetas, que se constituía o acusador público . Alexandre de Moraes ensina que na Idade Média também o Ministério Público estava presente nos saions germânicos, nos bailios e senscais, cujo ofício era defender os senhores feudais perante o juízo. Também o autor anotou a presença dos ministeriáveis nos missi dominice ou gastaldi na Lombardia, como também no germener Anklager na Alemanha que exercia a acusação suplementando o particular. No direito ibérico lusitano o cargo de Procurador da Coroa surgiu no reinado de Afonso III, no ano de 1289, e na Espanha D. Juan I criou "El Ministério Fiscal, também já uma fase embrionário do Ministério Público como conhecemos. Na França o Ministério Público foi criado no ano de 1302, referindo-se aos procuradores do rei. No país franco surgiu com o "Ce Corps de Magistrals", sendo que antes, no século XIV havia os "procurateurs" ou "procureus du roi" que representavam os interesses reais.

2.1.1.1 O Ministério Público no Brasil

No Brasil o MP surgiu oficialmente em 1890 quando o Presidente Campos Salles promulgou o Decreto n. 848 de 11.10.1890, sendo que também naquele mesmo ano o órgão passou a condição de instituição e no ano seguinte com a entrada em vigor da Constituição Republicana surgiu a figura do Procurador-Geral da República (art. 58, par. 2º) . A Carta de 1934 tratou do órgão, dispondo sobre sua organização em todo o território nacional (União, territórios e Estados). Já a Carta de 1937 muito pouco tratou sobre o assunto, entretanto, a Constituição de 1946 criou um título especial (arts. 125 a 128), tratando-o como órgão independente dos poderes. Já a Carta de 1967 subordinou o órgão ao Poder Judiciário (arts. 137 a 139). A Emenda Constitucional n. 1 de 1969 recolocou o Ministério Público dentro do Poder Executivo, como órgão defensor da sociedade, assegurando sua autonomia, independência, além de ampliar suas funções (arts. 127 a 130). Na atualidade o MP possui independência institucional, não se vinculando a Poder algum dentro do Estado, exercendo um complexo de funções, inclusive, o controle de determinas áreas do Poder Executivo. Nesse sentido, o órgão atua em defesa dos direitos e garantias e prerrogativas da sociedade. O Ministério Público, segundo a Constituição de 1988, atua nos âmbitos Federal, do Trabalho, Militar, do Distrito Federal e Territórios, bem como nas unidades da federação. Ao analisar o período em que o Ministério Público estava vinculado ao Poder Executivo (art. 127, CF/88) o Ministro Celso de Mello já observava que os membros do órgão eram regidos por um regime jurídico-especial .

2.1.1.2 O Ministério Público na França

Na França, o Ministério Público é o titular da Ação Penal Pública, atuando como custus legis. Ocorre que seus membros não dispõem da estabilidade conferida aos Magistrados e são subordinados ao Ministro da Justiça. Quanto à Polícia Judiciária, esta é subordinada ao parquet, e este é o responsável pelo acompanhamento da investigação. Há duas modalidades de instrução preliminar: 1. "Enquête Préliminare": para os delitos de menor gravidade onde a investigação pode ser realizada pela polícia judiciária sob o comando do MP, admitindo o contraditório. 2. "Instruction Préparatoire": realizada por requisição do MP pelo juiz instrutor que poderá determinar que a polícia judiciária realize as diligências, sendo obrigatório nos crimes mais graves e facultativa nos rimes menos graves. Nesse procedimento, o acusado tem direito à assistência do advogado que tem amplo direito de consultar os autos e deve ser informado de qualquer ato que influencie na liberdade de seu cliente. Ambos os procedimentos são escritos e secretos e a violação do segredo importa em um delito.

2.1.1.3 O Ministério Público na Itália

Na Itália, o Código de Processo Penal entrou em vigor no ano de 1989 substituindo o Código de Rocco de 1930, estabelecendo em lugar da instrução judicial, a chamada "Idagini Preliminari" - instrução preliminar conduzida pelo Ministério Público, que tem à sua disposição a polícia judiciária. Nessa fase há o controle de um juiz específico. Tal investigação deve ser realizada também sobre as circunstâncias e fatos que possam favorecer a pessoa a ela submetida. Em até 48 horas, a Polícia Judiciária oferece a notitia criminis ao Parquet, após isso, toda investigação se canaliza através dele, o qual dispõe totalmente da polícia judiciária. Os atos praticados na fase da investigação preliminar não servem de prova ao processo e tal fase é facultativa, estando a cargo do Ministério Público a decisão quanto ao arquivamento, instauração ou oferecimento direto da ação penal.

2.1.1.4 O Ministério Público na Alemanha

Na Alemanha não existe a figura do Juiz Instrutor e a investigação preliminar está a cargo do Ministério Público, o qual está submetido ao princípio da legalidade e obrigado a investigar os fatos com total imparcialidade. O MP está obrigado a investigar não só os atos que possam incriminar como também deverá buscar provas que possam inocentar o suspeito (este é um dos grandes diferenciais, pois o órgão não só acusa como também inocenta). Nesse sistema, ele detém o monopólio da ação penal, inclusive na ação penal privada onde o ofendido poderá acusar, coadjuvando o MP. Na prática as investigações são realizadas pela polícia, a qual atua como órgão auxiliar sob a ordem, direção e vigilância jurídica do Parquet. A polícia judiciária age sob o controle do MP que está vinculado ao Poder Executivo, atuando, entretanto, possui independência quando à administração de justiça, asseguradas prerrogativas para o exercício das funções e garantias. O MP possui autonomia na administração da justiça criminal juntamente com o Poder Judiciário. Compete ao Ministério Público na área de persecução criminal a) dirigir, conduzir ou vigiar o procedimento de investigação; b) ordenar que se pratiquem as investigações e realizar, pessoalmente ou mediante outras autoridades públicas, os atos de investigação que considere necessários, e c) decidir sobre a ação penal pública e ordenar medidas coercitivas, ou seja, pode tomar declarações de testemunhas e peritos e também obrigá-los a comparecer e declarar, mas sem prestar juramento, interrogar o imputado, prisão provisória, seqüestros, embargos e requisições, estabelecer postos de controle, determinar identificações e realizar outras medidas de investigação.

2.1.1.5 O Ministério Público em Portugal

Em Portugal, a investigação preliminar denominada de "inquérito" e é presidida pelo Ministério Público, este auxiliado pela polícia judiciária que lhe compete todas as diligências por ele determinadas Existe também nesta fase a figura do juiz da garantia da instrução, assegunrando legalidade e atuando também na colheita de provas procedendo ao primeiro interrogatório e outros procedimentos, desde que sofra requisição do Ministério Público, da polícia, do assistente de acusação ou do sujeito passivo. Observe-se que este juiz não poderá atuar na fase processual e tem o poder de decisão quanto à pronúncia ou arquivamento. Nos casos de ação penal pública o Ministério Público poderá oferecer diretamente a ação penal, já que tem a sua titularidade, podendo o ofendido atuar como assistente. Nos crimes de ação penal privada a titularidade está a cargo do particular, cujo procedimento é escrito, secreto, não é contraditório (o defensor atua na fase do interrogatório).

2.1.1.6 O Ministério Público na Espanha

Na Espanha, onde existe uma tendência doutrinária favorável à investigação dirata por parte do Ministério Público este órgão é denominado "Ministério Fiscal", atuando na defesa da legalidade e tem como competência observar as garantias processuais do imputado e aa proteção dos direitos da vítima e dos prejudicados pelo delito. A Polícia é encarregada pela investigação criminal, e se constitui órgão auxiliar do MP e da Justiça.

2.1.1.7 O Ministério Público nos Estados Unidos

Nos Estados Unidos onde não se registra a existência do matistrado investigador ou de instrução a fase da investigação inicial é confiada aos agentes policiais e às agências federais de investigação, cujos trabalhos são direcionados ao Parquet que é o titular da ação penal e que eu verifica se há ou não elementos para apresentar a prova perante ao "grande juri", cujo órgão é tecnicamente parte do Departamento de Justiça e é utilizado também para investigar dados ou obter provas sobre uma atividade delitiva suspeita. Os promotores são conhecidos como Agentes Ministeriais ou "Criminal Prosecutor". Essas atribuições se associam, desde a origem, à necessidade de combater a alta criminalidade. Na esfera federal, a investigação é dirigida por agentes federais, sob a coordenação do Promotor ou um advogado do Departamento de Justiça. Durante a fase de investigação, há uma colaboração entre o Promotor e os agentes policiais o que acaba se protraindo para a fase acusatória judicial.

2.2. A FUNÇÃO DE POLÍCIA JUDICIÁRIA

Há que se registrar que a divisão das atividades policiais em Polícia Administrativa e Polícia Judiciária teve sua vertente no ano de 1794, na França, durante o período regido pelo "Diretório", com a ascensão de Napoleão Bonaparte. "O sistema policial brasileiro se filia diretamente à Revolução Francesa, adotando a divisão da polícia em administrativa e judiciária, de acordo com a distinção fixada nos arts. 19 e 20 da Lei francesa de 3 do Brumário, do ano IV, de 1894" (Luiz Carlos Rocha, in Organização Policial Brasileira, Saraiva, 1991, SP, p. 7). A primeira tem como objetivo manutenir a ordem pública e a segunda é responsável pelas investigações dos crimes e contravenções que a Polícia Administrativa não pode impedir que fossem cometidas, competindo-lhes, ainda, coligir as provas e entregar os infratores aos Tribunais incumbidos de puni-los. As atividades de polícia administrativa, no que diz respeito à competência da Polícia Civil, estão previstas na Constituição Estadual que atribuiu à corporação as funções de executar os serviços administrativos de trânsito; fiscalização dos serviços de jogos, diversões, armas, munições e segurança privada. Compete, via de regra, a Polícia Militar exercer também as funções de polícia administrativa. Contudo, isso não implica em exclusividade desses serviços, assim como não compete à Polícia Civil exercer com exclusividade as funções de polícia judiciária ou de polícia técnico-científica. A primeira legislação no território brasileiro a dicotomizar as funções de polícia em administrativa e judiciária foi o Regulamento n. 120, de 31 de janeiro de 1842 que logo em seu art. 1º., assim dispunha: "A polícia Administrativa e Judiciária é incumbida, na conformidade das Leis e Regulamentos: 1º. Ao Ministro e Secretario de Estado dos Negócios da Justiça no exercício da suprema inspecção, que lhe pertence como primeiro chefe e centro de toda a administração policial do Império. Par. 2º. Aos Presidentes das Provincias, no exercício da suprema inspecção, que nellas tem pela Lei do seu Regimento, como seus primeiros administradores e encarregados de manter a segurança e tranquilidade publica, e de fazer executar as leis. Par. 3º. Aos Chefes de Policia no municipio da Côrte e nas Provincias. Par. 4º. Aos Delegados de Policia e Subdelegados dos districtos de sua jurisdição. Par. 5º. Aos Juizes Municipaes dos Termos respectivos. Par. 6º. Aos Juizes de Paz nos seus districtos. Par. 7º. Aos Inspectores de Quarteirão nos seus quarteirões. Par. 8º. As Camaras Municipaes nos seus municipios e aos seus Fiacaes". O art. 2º., estabelecia quais eram a competência da Polícia Administrativa: "Par. 1º. As attribuições comprehendidas nos arts. 12, pars. 1º., 2º., e 3º., do Código do Processo" (tomar conhecimento das pessoas desconhecidas, suspeitas e conceder passaporte; assinar termo de bem viver aos vadios, mendigos, bêbados e etc.; obrigar a assinar termo de segurança aos legalmente suspeitos de crimes e aplicar penas de multas e de correção); "Par. 2º. A attribuição de julgar as contravenções ás posturas das camaras municipaes. (Código de Processo Criminal, art. 12, par. 7º.)" (julgar contravenções às Posturas das Câmaras Municipais e julgar determinados crimes); "Par. 4º. As attribuições mencionadas nos pars. 3º., 4º., 5º., 6º., 7º., e 9º., do art. 4º., da Lei de 3 de dezembro de 1841" (controlar as sociedades secretas e ajuntamentos ilícitos; vigiar com o intuito de prevenir delitos e manter a segurança e tranquilidade pública; exigir e fiscalizar das Câmaras Municipais os ?objetos de polícia? - recursos materiais e a normatização de condutas por meio de posturas; inspecionar teatros e espetáculos públicos; inspecionar prisões; e remeter, quando julgarem conveniente, todos os dados, provas e esclarecimentos que houverem obtido sobre um delicto, com o relatório final); "Par. 4º. As attribuições mencionadas no art. 7º., pars. 1º., 2º., 3º., e 4º., da mesma Lei" (organizar a estatística criminal na Província; fazer o levantamento da população local e informar; nomear e demitir carcereiros; "Par. 5º. As attribuições conteúdas nos pars. 4º., 5º., 6º e 14 do art. 5º., da Lei de 15 de outubro de 1827, e que a Lei de 3 de dezembro de 1831, art. 91 conserva aos Juizes de Paz" (conciliação entre as partes). O art. 3º., do Regulamento 120/1842, estabelecia a competência da polícia judiciária: "Art. 3º. São da competência da Polícia Judiciária: Par. 1º. A attribuição de proceder a corpo de delicto, comprehendida no par. 4º., do art. 12 do Codigo do Processo Criminal; Par. 2º. A de prender os culpdos, comprehendida no par. 5. Do mesmo artigo do dito Código; Par. 3º. A de conceder mandados de busca; Par. 4º. A de julgar os crimes, a que não esteja imposta pena maior que multa de 100$000, prisão, degredo, ou desterro até seis mezes com multa correspondente a metade do tempo, ou sem ella, a tres mezes de Casa de Correcção, ou officinas publicas, onde as houver. (Cod. Do Proc. Criminal art. 12, par. 7º.)".

2.2.1 A Evolução da Polícia Judiciária

O Estado Democrático de Direito, já excessivamente comentado, tem por premissa a garantia do bem comum. Contudo, para que o Estado possa prover os direitos individuais à sociedade, necessita ele do uso do poder de polícia, até mesmo a fim de manter a ordem. Assim, ele restringe os direitos individuais garantidos através do referido poder. Para Bismael B. Moraes, Delegado de Polícia do Estado de São Paulo e membro da Adepol do Brasil, o Estado democrático, garante os direitos individuais, porém, o usufruto desses direitos sem controle, pode ferir diretamente o interesse comum. Em outras palavras, liberdade sem controle, pode levar ao caos" . O poder de polícia, ora comentado, ter caráter meramente administrativo. Uma das maiores "pragas" da sociedade moderna é a criminalidade, a qual reitera-se, esta cada vez mais organizada. Diante de tal desequilibro social, na iminência de participar mais ativamente no combate a criminalidade, e que a Administração Pública se fez representar através da Polícia Judiciária, visando com isso, restabelecer o equilíbrio social, bem como, tornar seguro o convívio societário. Nesse sentido, Plácido e Silva conceitua a sua visão de Polícia Judiciária, a saber: Polícia Judiciária: denominação dada ao órgão policia, a qual se comte a missão de averiguar a respeito dos fatos delituosos ocorridos ou das contravenções verificadas, a fim de que sejam os respectivos delinqüentes ou contraventores punidos pela prática das Infrações cometidas. A polícia judiciária é repressiva, porque, não se tendo podido evitar o mal, por não ter sido previsto de modo efetivo, ou por qualquer outra circunstância, procura, pela investigação dos fatos, recolher as provas que os demonstram, descobrir os seus autores, entregando-os às autoridades judiciárias para que cumpram a lei . Quanto ao conceito de Polícia Civil ensina o autor: Polícia Civil: em oposição à polícia militar, é a designação que se dá ao conjunto de autoridades designadas pelo governo para que cumpram as prescrições estabelecidas para a manutenção da ordem pública. A Polícia Civil, em certos casos, é meramente administrativa, isto é, quando age preventivamente. Quando trata de reparar o mal, que não pôde ser evitado, procurando meio de trazer o criminoso ou infrator à sanção penal, é judicial ou Polícia Judiciária . Rodrigo Réginer Chemim Guimarães ensina que no Brasil a polícia judiciária é constituída pelas polícias civis dos Estados, bem como, pela polícia federal, e cujas delegações visam à apuração dos delitos conjuntamente com as suas autorias. O autor afirma que existem duas polícias: 1. Administrativa cuja atribuição é exercida pelas PMs e atuam para prevenir os delitos; e 2. a polícia judiciária que é repressiva, inicia as investigações a fim de reunir provas que atestem a autoria e materialidade delitiva. O jurista conclui afirmando que a Polícia Judiciária e Ministério Público devem atuar de maneira uníssona para que a justiça possa ser aplicada com precisão .

2.2.2 Das normas que tratam da função de polícia judiciária no Brasil

Nos termos do artigo 144, inc. IV da CF/88, a Polícia Civil tem competência para exercer a função de polícia judiciária e segundo dicção do § 4º, a instituição é presidida por Delegado de Polícia "de carreira" e terá a incumbência de apuração das infrações penais, ressalvados à competência da União, conforme segue: Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I ? polícia federal; II ? polícia rodoviária federal; III ? polícia ferroviária federal; IV ? polícias civis; V ? polícias militares e corpos de bombeiros militares; § 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, estruturado em carreira, destina-se a: I ? apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei; (...) IV ? exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União; (...) § 4º Ás polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração das Infrações penais, exceto as militares; (...) § 8º Os Municípios poderão constituir guardar municipais destinados à proteção de sues bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei (citação). As polícias federal e civil são consideradas polícias judiciárias (a primeira tem a exclusividade da função), incumbindo-lhes a apuração de infrações penais (ressalvadas a exceções contempladas na Carta Fundamental). As outras instituições policiais sobreditas possuem competência administrativa, isto é, não possuem atribuição para investigar ou apurar os delitos e seus praticantes realizam atividade de policiamento ostensivo/preventivo. A Polícia Judiciária tem atuação plena, após o cometimento do crime, ocasião em que se iniciarão os trabalhos investigativos, a fim de, apurar a autoria do delito, bem como, auxiliar o Ministério Público no oferecimento da denúncia, auxílio este que se dará com a conclusão do caderno Investigativo (inquérito policial), para que o sujeito ativo do delito não permaneça impune diante do crime. Tourinho Filho ensina que: A função precípua da Polícia Judiciária consiste em apurar as infrações penais e sua autoria. Sempre vigilante, ela indaga de todos os fatos suspeitos, recebe os avisos, as notícias, forma os corpos de delito para comprovar a existência dos atos criminosos, seqüestra os Instrumentos dos crimes, colige todos os indícios e provas que pode conseguir, rastreia os delinqüentes, captura-os nos termos da lei e entrega-os à Justiça Criminal, juntamente com a investigação feita, para que a Justiça examine e julgue maduramente .

CAPÍTULO 3 3.

INQUÉRITO POLICIAL

O Delegado de Polícia é a autoridade competente para a instauração e presidência do inquérito policial (embora por lei possa ser atribuída a outras, expressamente, essa função - art. 4º e seu parágrafo único, do CPP) e para a lavratura do auto de prisão em flagrante ( art. 304 do CPP).

3.1 ORIGEM

A gênese do Inquérito Policial remonta ao período do Império, segundo doutrina Felipe Genovez: (...) A grande reforma imperial que veio a ocorrer com edição da Lei n. 2.033/1871, regulamentada pelo Decreto n. 4.824/1871, trouxe importante inovação quanto aos trabalhos cartorários de natureza policial. O art. 81 desse Decreto Imperial, dispôs expressamente que ?Os Delegados de Polícia poderão ter Escrivães Especiais? (...) . Segundo Paulo Gusmão, tanto Egito quanto Atenas e Grécia, tiveram participação ímpar na implementação das primeiras leis, vez que, nessas épocas, predominavam os sacerdotes e reis, os quais acusavam e aplicavam as punições cabíveis de acordo com o ilícito cometido . Já na antiguidade surgiram as bases para idealizações do Estado Democrático de Direito, pois se deixava a individualização do ser para se chegar ao bem estar comum de todos. Entretanto o Estado ainda não possui as ferramentas jurídicas necessárias para punir o delinqüente considerando a visão racional de pena que temos hoje, sobretudo, sobre os tipos de penas a serem aplicadas e sua adequação ao delito cometido. Em razão disso é que surgiu o Direito Penal, tipificando condutas e por via de conseqüência a respectiva sanção, além da legislação adjetiva. Em boa parte do período do Império tiveram aplicação as legislações filipinas (Livro IV) das Ordenações do Reino, isso ante a falta de uma legislação moderna ? que se constituía uma legislação agressiva tendo com fundamento falsas idéias religiosas e políticas; O crime era confundido com o pecado e o procedimento utilizado eram as "devassas" e "querelas" que se constituíam o processo com o escopo de reunir provas necessárias à uma condenação que ficava ao alvedrio da autoridade policial ou do magistrado. Ismar Estulano Garcia ensina que "(...) as devassas e as querelas compunham um rol de procedimentos preliminares, cujo objetivo era reunir o máximo de provas possíveis, a fim de se fazer cumprir a lei" . Durante os séculos em que as Ordenações Filipinas tiveram vigência, o quadro social não necessitava de uma investigação minuciosa, visto que na época os crimes não apresentavam potencial expressivo. Contudo, se comparadas às exigências dos dias atuais, onde se verifica o cometimento de crimes com potencial absurdamente intelectivo ofensivo, torna-se inviável tal comparação. Exigem-se atualmente, além de uma legislação moderna, instrumentos sofisticados para que a criminalidade possa ser reprimida. "Ordenações do Reino, Filipinas", na parte cível, vigoraram basicamente no Brasil até a promulgação do Código Civil, que entrou em vigência em 01/03/1917 . O ano de 1832 vicejou na história criminal brasileira uma grande ruptura com o surgimento do nosso primeiro Código Criminal do Império (revogou expressamente as Ordenações do Reino ? Livro IV), ex vi do artigo 179 parágrafo 18 da Constituição do Império. Por meio da Lei de 29/11/1832 foi promulgado nosso primeiro Código de Processo Criminal de primeira instância com disposição provisória acerca da administração da Justiça Civil, quando foi criado o cargo de "Chefe da Polícia", inclusive nas unidades provinciais, substituindo o "Intendente Geral da Polícia". A competência antes atribuída aos Delegados de Polícia passou para os Juízes de Paz, figura criada nos arts. 162 e 163 da Constituição de 1824 (art. 12 e seus §§ e art.13), permanecendo os "Inspetores de Quarteirão" (arts. 16 até 19), e "Dos Juízes Municipais" (arts. 33 a 35, que, pelo § 3º do citado último artigo), podendo cumular funções de "Exercitar cumulativamente a jurisdição policial". Os Delegados de Polícia e Subdelegados retornaram ao cenário imperial logo em seguida, pela Lei nº 261, de 03/12/1841 que se constitui a reforma dos conservadores, impondo a reforma do Código de Processo Penal, com a competência de polícia preventiva (e/ou administrativa) e de investigação criminal (e/ou judiciária, e/ou repressiva), definidas como "autoridades policiais", em seus artigos 1º, § 9º do artigo 4º, em cujo artigo aparece a "competência dos Chefes de polícia e dos Delegados de Polícia", e ainda nos Artigos 5º, 6º e 11º. Essa Lei 261, de 03/12/1841, tem 124 artigos, e tem sua Regulamentação no Decreto nº 120, de 31/01/1842, que "Regula a execução da parte policial e criminal da lei nº 261 de 03/12/1841", onde estão definidos que "a Polícia administrativa e judiciária é incumbida, na conformidade das Leis e Regulamentos", do policiamento preventivo, de investigação criminal e/ou de polícia judiciária, com todo o "poder de policia" que lhe confere esse Decreto. Segue-se no Regulamento n.º 120 (31/01/1842), baixado de acordo com a competência oferecida pelo artigo 102 § 12º da constituição do Império, Sua Majestade, o Imperador, e seu Ministro e Secretário D? Estado da Justiça (Paulino José Soares de Souza), com 504 artigos, disciplinando o citado "poder de polícia". Inicialmente na parte "Da Polícia Administrativa" (art. 2º) e "da Polícia Judiciária" (art. 3º), com seus parágrafos, arrematado e complementado pelo Decreto n.º 1746, de 16/04/1856, que "Dá Regulamento para a Secretaria da Polícia da Corte". Verifica-se em toda essa legislação que a Polícia é civil, una, única, indivisível, podendo ter um ramo uniformizado naquilo que é polícia ostensiva do patrulhamento a pé, com uso de animais de montaria ou não e utilizando-se de outros meios. A Constituição de 24/02/1891, do Congresso Nacional Constituinte, em seu artigo 83, assinalou "Continuam em vigor, enquanto não revogadas, as leis do antigo regime, no que explícita ou implicitamente não for contrário ao sistema do governo firmado pela Constituição e os princípios nela consagrados". Manteve, pois, como autoridade policial, o Delegado de Polícia. E o policiamento civil, municipalizado às vezes, ainda que na forma de "Guarda Nacional", com o "coronel", chefe político, "autoridade máxima no município", agente de manutenção da ordem e força eleitoral, dá a definitiva expressão do fenômeno do coronelismo, fruto de uma sociedade rural, passando para agrário-mercantil e iniciando um processo de urbanização em vilas e cidades, ainda que de forma incipiente. Nos termos dos arts. 1º, 2º e 4º da Lei nº 261 (03/12/1841):estava previsto que: "Haverá no Município da Corte e em cada Província (hoje, Estado), um Chefe de Polícia, com os delegados e Subdelegados necessários, os quais, sob propostas, serão nomeados pelo Imperador ou pelos Presidentes de Província" (hoje, Estados). Também, no mesmo preceptivo, estava disposto que "Todas as Autoridades Policiais são subordinadas ao Chefe de Polícia. "Os Chefes de Polícia, são escolhidos dentre os Desembargadores e Juízes de Direito: os delegados e Subdelegados dentre quaisquer juízes e Cidadãos: serão todos amovíveis e obrigados a aceitar". "Aos Chefes de Polícia em toda a Província e na Corte, e aos seus Delegados nos respectivos Distritos, compete: ?seguindo-se-lhes a competência e no § 9º: remeter, quando julgarem conveniente, todos os dados, provas e esclarecimentos que houverem obtido sobre um delito, com uma exposição do caso e de suas circunstâncias, aos Juízes competentes, a fim de formarem a culpa. Se mais de uma Autoridade competente começar um Processo de formação de culpa, prosseguirá nele o Chefe de Polícia ou Delegado, salvo, porém, o caso da remessa de que se trata na primeira parte deste parágrafo". Com a criação do inquérito policial (Decreto nº 4824/1871) foi separada a função policial da Justiça, cuja legislação vigorou até o atual "Código de Processo Penal/CPP" (Decreto-lei nº 3689/1941), com sua Lei de introdução (Decreto-lei n.3931, de 11/02/1941), que aperfeiçoou a legislação anterior sobre a matéria. Já no período do Império os Delegados tinham que ser "Bacharéis Formados" (art. 26 do Regulamento nº 120, de 31/01/1842), bem assim como os Subdelegados que "serão propostos, ouvindo o Delegado dentre os Juízes de Paz dos respectivos Distritos; dentre os Bacharéis formados e outros quaisquer cidadãos, que neles residirem, e tiverem as qualidades requeridas no artigo antecedente". O Aviso nº 438 (29/10/1877) esclarece como proceder no caso de representação da autoridade policial ao Juiz da culpa, sobre a prisão preventiva. Essas normas permaneceram até o início deste século XX. Na Pós-república o Decreto nº 436 (31/05/1890) regulamentou a Competência dos Delegados de Polícia nas cidades onde houvesse mais de um. Na Constituição (24/02/1891), no art. 2º, em seu § 2º, estabelece que: "as sentenças e ordens da magistratura federal são executadas por oficiais do judiciário da União, aos quais a polícia local é obrigada a prestar auxílio, quando invocada por eles". O Código Penal (Decreto nº 847, de 11/10/1890), em seu art. 207, estabeleceu que: Cometerá crime de prevaricação o empregado público que, por afeição, ódio, contemplação ou para promover interesse pessoal seu: § 3º: deixar de prender e formar processo aos delinqüentes nos casos determinados em lei, e de dar-lhes nota constitucional de culpa no prazo de 24 horas. § 9º: ordenar a prisão de qualquer pessoa sem ter para isso causa ou competência legal, ou tendo-a, conservar alguém incomunicável por mais de 48 horas, ou retê-lo em cárcere privado ou em casa não destinada à prisão, etc. § 10º: fala da demora do processo de réu preso ou afiançado, além dos prazos legais. § 12º diz da remessa do preso a outra autoridade, ocultá-lo ou transferi-lo de prisão em que estiver. § 13º tornar a prender, pela mesma causa, o que tiver sido solto em provimento de habeas-corpus. § 14º executar a prisão de alguém sem ordem legal escrita de autoridade legítima ou receber, sem formalidade, algum preso, salvo o caso em flagrante delito ou de impossibilidade absoluta de apresentação da ordem. Na visão de Joel Bino de Oliveira; "o inquérito policial, provém, do latim quaerere, conjunto de atos e diligências, reduzidos a termo em processo, para sindicar e apurar determinado fato irregular ou ilegal" . Segundo o autor: "Quaeritare do latim, andar sempre em busca, ato ou efeito de inquirir, conjunto de atos e diligências com que se visa apurar alguma coisa" (ibidem, p. 27). Tourinho filho esposa o entendimento de que o inquérito policial é procedimento meramente Informativo: (...) se apura a infração penal como todas as suas circunstâncias e a respectiva autoria. Tais informações têm por finalidade permitir que o titular da ação penal, seja o Ministério Público, seja o ofendido, possa exercer o 'jus persequendi in judicio', isto é, possa iniciar a ação penal . O inquérito policial se constitui um procedimento por meio do qual a autoridade policial materializa as diligências que realizou na busca de provar a existência ou não do delito, além de obter provas quando a autoria e materialidade do fato delitivo. O jurista doutrina ainda que além dos inquéritos policiais, existem os chamados inquéritos extra-policiais que são aqueles cuja elaboração não se dá pela polícia judiciária, mas por outros agentes. São alguns exemplos de inquéritos extra-policiais: inquéritos militares (cujo fito é apurar tão somente crimes de âmbito militar); inquéritos judiciais (são presididos pelos juízes); as comissões parlamentares de inquérito (cuja finalidade é investigar crimes de repercussão de interesse nacional, tendo a sua presidência desenvolvida por membros do poder Legislativo); por fim, o inquérito civil, que visa apurar fatos que possibilitem o ingresso da ação civil pública. Esse último tem presidência do Ministério Público . Frederico Marques: "A Polícia Judiciária dirige e organiza a investigação para fornecer, (...), uma instrução provisória e informativa, sobre o fato delituoso e seu autor, que sirva de preparação à ação" . Tourinho Filho, em relação ao entendimento jurisprudencial, bem como doutrinário, manifesta assim a respeito de o inquérito não ser considerado documento imprescindível no oferecimento da denúncia: (...) desde que o titular da ação penal (ministério Público ou ofendido) tenha em mãos as informações necessárias, isto é, os elementos imprescindíveis ao oferecimento de denúncia ou queixa, é evidente que o inquérito será perfeitamente dispensável. É claro que se exige o inquérito para a propositura da ação, porque, grosso modo, é nele que o titular da ação penal encontra elementos que o habilitam a praticar o ato instaurador da instância penal, isto é, a oferecer enuncia ou queixa. Francisco Campos, citado por Joel Bino de Oliveira, quanto ao inquérito policial previsto no Código de Processo Penal faz o seguinte comentário: (....) é ele uma garantia contra apressados e errôneos juízos formados quando ainda persiste a trepidação moral causada pelo crime ou antes que seja possível uma exata visão de um de conjunto de fatos, nas suas circunstâncias objetivas e subjetivas. Por mais perspicaz e circunspecta, a autoridade que dirige a investigação inicial, quando ainda perdura o alarma provocado pelo crime, esta sujeita a equívocos ou falsos juízos a priori, ou a sugestões tendenciosas . Não raro, é preciso voltar atrás, refazer tudo, para que a investigação se oriente no rumo certo, até então desapercebido. Por que, então abolir-se o Inquérito preliminar ou instrução provisória, expondo-se a justiça criminal aos azares do detetivismo, às marchas e contramarchas de uma instrução imediata e única? Pode ser mais expedito o sistema tradicional, com o inquérito preparatório, assegura uma justiça menos aleatória, mais prudente e serena . Aury Lopes Jr. assim se reporta ao inquérito policial: (...) A atividade (policial persecutória) carece de mando de uma autoridade com potestade jurisdicional e por isso não pode ser considerada como atividade judicial e tampouco processual, até porque não possui a estrutura dialética do processo . A visão de que o inquérito policial se constitui uma peça informativa tem seu fundamento no art. 11, CPP: "os instrumentos do crime, bem como os objetos que interessam à prova, acompanharão os autos do inquérito". Sem embargo desse caráter informativo, o procedimento policial tem algumas singularidades: 1. Formalismo, pois suas peças dependem de redução a termo, devidamente assinadas por autoridade policial; 2. Ordem seqüencial considerando as variáveis espaço e tempo em que os atos são nele praticados/documentados; 3. É unidirecional ? a marcha procedimental objetiva apenas à apuração dos fatos; 4. Sigiloso - as diligências. Joel Bino de Oliveira faz os seguintes comentários a respeito da importância da atuação da autoridade policial na fase de inquérito policial: (...) não devemos ignorar seus acertos e pontos positivos. Atualmente à Polícia Judiciária cabe sua presidência, ou seja, à Autoridade Policial, que naturalmente atenderá às requisições do órgão do Judiciário e do representante do Ministério Público, e aqui um ponto de fundamental importância, sob pena de não sendo observado, pagar a própria comunidade: a afinação daquele poder com as duas instituições e vice-versa, a proximidade deve ser constante, e a integração e soma, são pontos preciosos contra uma criminalidade, cada vez mais organizada . Segundo Mirabete: Não é o inquérito ?o processo?, mas procedimento administrativo informativo, destinado a fornecer ao órgão da acusação o mínimo de elementos necessários à propositura da ação penal. A investigação procedida pela autoridade policial não se confunde com a instrução criminal, distinguindo o Código de Processo Penal o ?inquérito policial? (arts. 4º e 23) da ?instrução criminal?(arts. 394 a 405) .

3.2 Do conceito de autoridade policial

No Estado de Santa Catarina, o Provimento nº 04/98, da Corregedoria-Geral da Justiça , devidamente assinado pelo Desembargador Francisco José Rodrigues de Oliveira Filho (CGJ), objetivando esclarecer o art. 69, da Lei n. 9.099/95 (instituiu os termos circunstanciados), em seu art. 1º, dispôs que autoridade: "(...) é o agente do Poder Público com possibilidade de interferir na vida da pessoa natural, enquanto o qualificativo policial é utilizado para designar o servidor encarregado do policiamento preventivo ou repressivo". No art. 2º, do mesmo provimento, procurou resguardar os Delegados de Polícia, preconizando que: Ressalvando o parágrafo único do art. 4º do Código de Processo Penal, a atividade investigatória de outras autoridades administrativas, ex vi do art. 144, parágrafo 5º, da Constituição da República, nada obsta, sob o ângulo correcional, que os Exmos. Srs. Drs. Juízes de Direito ou Substitutos conheçam de ?termos circunstanciados? realizados, cujo trabalho tem também caráter preventivo, visando assegurar a ordem pública e impedir a prática de ilícitos penais. Em seus considerandos constam, ainda, do mesmo Provimento as seguintes especificações preliminares: (...) que a imprecisão acerca do conceito de autoridade policial pode prejudicar a investigação de um fato punível, embaraçando o funcionamento de parte da Justiça Criminal (CDOJESC, art. 383, IX)?; ?... que todo policial, inclusive de rua, é autoridade policial (2a Conclusão da Reunião de Presidentes de Tribunais de Justiça, Vitória/ES, 20/10.95); ?... que autoridade policial compreende todas as autoridades reconhecidas por lei (9a Conclusão da Comissão Nacional de Interpretação da Lei n. 9.099/95, da Escola Nacional da Magistratura, Brasília, 10/95); ?... que ?A expressão ?autoridade policial?, prevista no art. 69 da Lei n. 9.099/95 abrange qualquer autoridade pública que tome conhecimento da infração penal no exercício do poder de polícia? (1a Conclusão da Confederação Nacional do Ministério Público, Júlio Fabrini Mirabete, ?Juizados Especiais Criminais?, 2a ed., Ed. Saraiva, pág. 60); ?... que, embora peça híbrida entre o boletim de ocorrência e o relatório do Inquérito Policial (Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antonio Ribeiro Lopes, ?Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais?, ed. RT., 2a ed., pág. 472), nada impede que a autoridade policial responsável pela lavratura do termo circunstanciado ?seja militar? (...) (Damásio E. de Jesus, ?Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada?, 2a ed. Editora Saraiva, pág. 53)? (...). Sobre o assunto o Desembargador Francisco Oliveira Filho havia calcado esse seu Provimento invocando a lição do jurista Julio Fabbrini Mirabete, razão porque, tão-somente, para efeito de afastar qualquer dúvida sobre o seu entendimento, colhe-se de seus ensinamentos: "As autoridades policiais são as que exercem a polícia judiciária que tem o fim de apuração das infrações penais e da sua autoria (art. 4o do CPP)" . Paulo Lúcio Nogueira, tecendo comentários acerca do art. 69, da Lei n. 9.099/95, ensina que: "Autoridade policial referida na lei só pode ser o Delegado de Polícia..." . ?Autoridade? significa poder, comando, direito e jurisdição, sendo largamente aplicada na terminologia jurídica a expressão como o ?poder de comando de uma pessoa?, o ?poder de jurisdição?, ou ?o direito que se assegura a outrem para praticar determinados atos relativos a pessoas, coisas ou atos?. É o servidor que exerce em nome próprio o poder do Estado, tomando decisões, impondo regras, dando ordens, restringindo bens jurídicos e direitos individuais, tudo nos limites da lei. Não têm esse poder, portanto, os agentes públicos que são investigadores, escrivães, policiais militares, subordinados que são às autoridades respectivas. No sentido legal e constitucional, as polícias civis são dirigidas por ?delegados de polícia de carreira? (art. 144, §4º da CF). O Delegado de Polícia é a autoridade competente para a instauração e presidência do inquérito policial (embora por lei possa ser atribuída a outras, expressamente, essa função - art. 4º e seu parágrafo único, do CPP) e para a lavratura do auto de prisão em flagrante ( art. 304 do CPP). A expressão ?autoridade policial?, aliás, é citada em outros dispositivos da lei processual comum (arts. 5º, §§ 3º e 5º, 6º, 7º 9º,10, §§1º a 3º, 13 a 17, 20 e parágrafo único; 21, parágrafo único, 22 e 23, 39, §§ 1º, 3º e 4º, 46, 241, 301, 307, 308, 311, 325, 326, 332, etc), sempre com única referência ao delegado de polícia. A distinção da figura da autoridade policial e dos demais agentes policiais é registrada no Código de Processo Penal, que se refere ?às autoridades ou funcionários? (art. 47 do CPP), ou a autoridades e ?seus agentes? (art. 301). Na legislação processual comum, aliás, só são conhecidas duas espécies de "autoridades": a autoridade policial, que é o Delegado de Polícia, e a autoridade judiciária, que é o juiz de Direito. Somente o Delegado de Polícia e não qualquer agente público investido de função preventiva ou repressiva tem, em tese, formação técnica profissional para classificar infrações penais, condição indispensável para que seja o ilícito praticado incluído ou não como infração penal de menor potencial ofensivo. Somente o Delegado de Polícia pode dispensar a autuação em flagrante delito, nos casos em que se pode evitar tal providência, ou determinar a autuação quando o autor do fato não se comprometer ao comparecimento em Juízo, arbitrando fiança quando for o caso. Somente ele poderá determinar as diligências imprescindíveis à instauração da ação penal quando as provas da infração penal não foram colhidas por ocasião da prisão em flagrante delito. Assim, numa interpretação literal, lógica e mesmo legal, somente o delegado de polícia pode determinar a lavratura do termo circunstanciado a que se refere o art. 69... Em suma, a Lei que trata dos Juizados Especiais em nenhum de seus dispositivos, mesmo remotamente, se refere a outros agentes públicos que não a autoridade policial. Conclui-se, portanto, que, à luz da Constituição Federal e da sistemática jurídica brasileira, autoridade policial é apenas o delegado de polícia, e só ele pode elaborar o termo circunstanciado referido no art. 69. A OAB/SC, por meio de seu Presidente ? Jefferson Luiz Kravchychyn -, impetrou Mandado de Segurança em data de 21.05.99 contra o Desembargador Francisco José Rodrigues de Oliveira Filho ? Corregedor-Geral da Justiça/SC, aduzindo: "(...) 1.14 ? Outrossim, é de se destacar que inexiste lei que faculte o deslocamento de função policial judiciária civil para a polícia militar. Como também não há lei que autorize o ato atacado, de dilatar o conceito de ?autoridade policial? para abranger o policial militar de modo que esse venha a praticar atos de polícia judiciária civil na apuração de crimes comuns de menor potencial ofensivo, objeto do termo circunstanciado, previsto na Lei Federal n. 9.099/95 (...). 2.14. Assim, a Autoridade Policial, mencionada no Código de Processo Penal Brasileiro, ordenamento legal para instrução do Processo Penal, fase inquisitória e contraditória, de há muito, é o Delegado de Polícia".

CAPÍTULO 4 4.

LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA REALIZAR INVESTIGAÇÕES NO ÂMBITO CRIMINAL:

O Ministério Público constitui-se no órgão do Poder Público constitucionalmente responsável realizar a persecução penal e a defesa dos interesses individuais indisponíveis, difusos, coletivos e sociais (arts. 127 e 129, da Constituição Federal de 1.988). Nos últimos anos surgiram no Brasil normas processuais penais que infundem a outras entidades e servidores públicos legitimidade para atuar em área de atuação típica do Ministério Público, como no caso da autoridade judicial que passou moto própria a realizar investigações (art. 3o., da Lei 9.034, de 03.05.95). Nesse sentido tem se defendido a tese da legitimidade exclusiva ao Ministério Público para atos e ações ligados ao exercício da ação penal pública, conforme observa o Promotor de Justiça do Estado de São Paulo VALTER FOLETO SANTIN vista amplamente, "em face da concomitante incumbência de defesa dos interesses individuais indisponíveis, difusos, coletivos e socialmente relevantes, considerando a atuação na prevenção de crimes, fixação de política criminal e de segurança pública, de repressão e combate à criminalidade e de execução e cumprimento da pena, passando pela preservação dos direitos humanos" .

4.1 Competëncia para realizar investigações criminais:

Segundo Lênio Luiz Steck e Luciano Feldens: A explicitação acerca do sentido corrente (e razoável) da expressão investigar tem o condão de inserir o debate definitivamente no âmbito da linguagem (e, portanto, no linguistiturn ocorrido na filosofia no decorrer do século XX). Parece evidente que as palavras não carregam um sentido em si-mesmo. As palavras não refletem a essência das coisas . Quanto, ainda, ao inquérito policial: (...) é uma espécie do gênero investigação criminal, sendo apenas aquele procedimento de atribuição exclusiva da Polícia (Item II da Carta de Florianópolis, ratificada durante o 1º Congresso Sul Brasileiro do Ministério Público, que foi realizado na Capital catarinense, nos dias 19, 20 e 21 de agosto de 2004. Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, ET AL. Carta de Florianópolis. Florianópolis, ago. 2004 . Diligências investigatórias constituem-se gênero que abrandem ?qualquer conjunto de atos de natureza processual instrumentalizadores ou preparatórios de eventual futura ação penal? . O inquérito policial, sob presidência de um Delegado de Polícia, constitui-se um dos meios de coleta de provas utilizado pelo Parquet para exercer a persecução penal na sua segunda fase. Nesse sentido, o inquérito policial não é indispensável, porque o art. 27, CPP proporciona a qualquer pessoa o direito de reunir informações/provas a respeito de infrações criminais, para fins de provocar a ação ministerial . Dispõe o art. 47, CPP: Se o Ministério Público julgar necessários maiores esclarecimentos e documentos complementares ou novos elementos de convicção, deverá requisitá-los, diretamente a quaisquer autoridades ou funcionários que devam ou possam fornecê-los. A Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993 que regulamentou o art. 129, incisos VI VIII, CF/88 dispôs sobre o poder requisitório do Ministério Público que compreendem: 1. As diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (art. 7º, II); 2. A instauração de procedimentos administrativos (art. 7º, III). 3. A notificação de testemunhas e a sua condução coercitiva, no caso de ausência injustificada; 4. As informações, os exames, as perícias e os documentos de autoridades da Administração Pública direta ou indireta (art. 8º, II); 5. Os serviços temporários dos servidores da Administração Pública e os meios materiais para a realização de atividades específicas (art. 8º, III) 6. As informações os documentos de entidades privadas (art. 8º, IV); 7. A expedição de notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar (art. 8º, VII); 8. O auxílio de força policial (art. 8º, IX). Também, o art. 26, incisos I, "a"e "b", II e IV, da Lei 8.625/93. A requisição se traduz na solicitação, no caso, direcionada à autoridade policial, desprovida de caráter de imposição, já que esta é decorrente de decisões judiciais. Assim, no caso das investigações solicitadas pelo MP: (...) não poderia situar-se na esfera de maior ou menor inoponobilidade ? ou ?boa vontade? ? do destinatário da requisição, sob pena de ver-se frustrada a lógica e sistemática estrutura - repita-se, de densidade constitucional ? na qual foi recebido o poder requisitório . É evidente que nenhuma lei traz palavras ou disposições inúteis (é regra de hermenêutica), muito menos a Lei Maior" (MOREIRA, Rômulo de Andrade. A investigação criminal e o Ministério Público. Jus Navegandi, Teresina, a. 8, n. 277, 10 abril. 2004 . O art. 5º, da LC 75/93, em seu inciso VI, estabelece que o Ministério Público poderá exercer outras funções contempladas na CF/88 e na lei, sendo que no inciso XIV prevê, ainda, que poderá promover ?outras ações necessárias ao exercício de suas funções institucionais?. Além disso, também a alínea "c" do art. 26 da Lei n. 8.625/93 e o inciso V do art. 8º da LC 75/93, estabelecem que o Ministério Público poderá realizar inspeções e diligências investigatórias, sem qualquer restrição a determinado âmbito de atuação, o que importa inferir como: "(...) lógico, portanto, que abranja todas as áreas de atuação institucional, especialmente a área criminal, na qual é titular privativo da ação penal pública" . A Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) e a Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso) dispõem textualmente competir ao Ministério Público instaurar sindicâncias para apurar ilícitos penais (art. 201, VII, e art. 74, VI). Também, o art. 356, par. 2º, do Código Eleitoral e o art. 29 da Lei n. 7.492/86 (trata dos crimes contra o sistema financeiro nacional) especificam que o Ministério Público poderá exercer investigação criminal direta. O STF decidiu em votação unânime da sua 2ª Turma, realizada em 14.10.03 (HC n. 82.865), relator Min. Nelson Jobim, que o Ministério Público pode denunciar com base em sindicância própria, instaurada para apurar a existência de ilícito penal, com base no art. 201, VII, do Estatuto da Criança e do Adolescente (INFORMATIVO n. 325 do Supremo Tribunal Federal. Brasília, 13 a 17 de out. 2003" . Aliás, o Ministério Público, objetivando a propositura da ação penal, poderá até mesmo prescindir de qualquer procedimento administrativo instaurado ?bastando a notícia-crime ou peças de informação? (art. 39, par. 5º, do CPP). A Constituição Federal não infunde as polícias estaduais o monopólio da investigação criminal, isto é, o art. 144, par. 1º, inciso IV estabelece que a investigação dos crimes federais seja da alçada da Polícia Federal, cujo objetivo foi evitar conflitos de competências, isto é: "O art. 144 da Carta Magna estabelece tão somente a repartição de atribuições entre os diversos órgãos de polícia, incumbindo à Polícia Federal a apuração de crimes federais, com exclusão das polícias civis" . Para ilustrar, a Lei n. 9.099/95 que, em seu artigo 69, fez prescindir o inquérito policial para os crimes de menor potencial ofensivo, substituindo-o pelo Termo Circunstanciado, a ser lavrado pela autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência, a qual também pode ser entendida como a polícia administrativa. O que autoriza o Ministério Público a investigar não é a natureza do ato punitivo que pode resultar da investigação (sanção administrativa, cível ou penal), mas, sim, o fato a ser apurado, incidente sobre bens jurídicos cuja proteção a Constituição explicitamente confiou ao Parquet. A rigor, nesta como em diversas outras hipóteses, é quase impossível afirmar, a priori, se se trata de crime, de ilícito cível ou de mera infração administrativa. Não raro, a devida valoração do fato somente ocorrerá na sentença! Note-se que não existe uma diferença ontológica entre o ilícito administrativo, o civil e o penal. Essa diferença, quem o faz, é o legislador, ao atribuir diferentes sanções para cada ato jurídico, (sendo a penal, subsidiária e a mais gravosa). Assim, parece-me lícito afirmar que a investigação se legitima pelo fato investigado, e não pela ponderação subjetiva acerca de qual será a responsabilidade do agente e qual a natureza da ação a ser eventualmente proposta" (Julgamento do Inquérito 1968-2/DF, em 1.09.2004, Rel. Min. Joaquim Barbosa) .

4.2 Entendimento do Supremo Tribunal Federal

O STF não discrepa desse entendimento: a Segunda Turma do STF, em julgamento realizado no dia 10 de março de 2009, reconheceu por unanimidade que existe a previsão constitucional de que o Ministério Público tem poder investigatório. A Turma analisava o Habeas Corpus (HC) 91661 , referente a uma ação penal instaurada a pedido do MP, na qual os réus são policiais acusados de imputar a outra pessoa uma contravenção ou crime mesmo sabendo que a acusação era falsa. Segundo a relatora do HC, ministra Ellen Gracie, é perfeitamente possível que o órgão do MP promova a coleta de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e materialidade de determinado delito. "Essa conclusão não significa retirar da polícia judiciária as atribuições previstas constitucionalmente", ponderou Ellen Gracie. Ela destacou que a questão de fundo do HC dizia respeito à possibilidade de o MP promover procedimento administrativo de cunho investigatório e depois ser a parte que propõe a ação penal. ?Não há óbice a que o Ministério Público requisite esclarecimentos ou diligencie diretamente à obtenção da prova de modo a formar seu convencimento a respeito de determinado fato, aperfeiçoando a persecução penal?, explicou a Ministra .

4.3 - Limites do Ministério Público para realizar investigações criminais

O questionamento que se deve formular, considerando a tese de que o MP está apto a realizar moto própria investigações criminais, se isso interessa a sociedade da forma como está posto. Por meio da PEC 197/2003, intentada pelo PT, no mês de setembro de 2003, que pretendia alterar a redação do art. 129, inciso VIII, CF, que passaria a ter a seguinte redação: "promover investigações, requisitar diligências investigatórias e a instauração de Inquérito Policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais". A Organização das Nações Unidas (ONU) aponta o fortalecimento do Ministério Público como uma das soluções no combate ao crime organizado. A relatora especial da ONU para execuções sumárias, Asma Jahangir, no item 82 do relatório da visita que realizou ao Brasil no ano de 2004, fez constar que: As unidades do Ministério Público deveriam dispor de um grupo de investigadores e se encorajadas a realizar investigações independentes contra acusações de execuções sumárias. Obstáculos legais que impedem tais investigações independentes deveriam ser removidos em legislação futura . O Conselho Superior do Ministério Público Federal aprovou a Resolução nº 77/2004 que veio a regulamentar o artigo 8º da LC 75/93, disciplinando no âmbito do MPF a instauração e tramitação do Procedimento Investigatório Criminal. Críticas se insurgiram contra esse regulamento, inclusive, dentro do próprio MP, pois o conselho teria açambarcado competências do Poder Legislativo, sendo o referido ato normativo eivado de inconstitucionalidade, considerando que a matéria deveria ser objeto de lei (na aprovação da resolução houve o voto vencido da procuradora Delza Curvello). Da Carta de Florianópolis, consta o item IX que estabeleceu: É preciso, ao reverso de suprimir-lhe legitimação, que se confiram ao Ministério Público, estruturas e instrumentos investigatórios de real densidade, de modo a tornar expressa a possibilidade de promotores e procuradores desenvolverem, de forma regrada, investigações em todas as áreas, como único meio de enfrentamento efetivo das múltiplas delinqüências que mais solapam a nação ? a organizada e a incrustada em setores do próprio aparelho estatal . Esse ataque à ilegalidade ou à inconstitucionalidade tem no Habeas Corpus e no Mandado de Segurança os meios mais céleres e eficazes. São os remedium iuris mais adequados ao exercício desse controle e são aplicáveis sempre que alguém se sentir ameaçado ou lesado na sua liberdade. O membro do Ministério Público, caso venha a exceder-se no exercício de suas funções pode ser considerado autoridade coatora para fins de impetração de ambos os institutos. São eles os instrumentos aptos a moldar sua atuação. Autoridade é aquela por cuja ordem é praticado ato ou por cuja omissão não o é, e que poderá dar a contra ordem ao ato praticado ou a ordem ao ato omitido, e que pode ser a própria autoridade a praticar ou omitir. Ou ainda o autor da ameaça violadora de direito líquido e certo, ou que pode concretizar a ameaça . Segundo Luiz Roberto Barroso, citado por Clèmerson Merlin Clève: (...) as vicissitudes pelas quais passa a polícia devem ser tributadas menos às qualidades ostentadas pelos seus integrantes, e mais ao contexto no qual operam suas funções. Por isso, não é demais imaginar que, eventualmente, um Ministério Público transformado em polícia possa conduzir os seus membros a experimentarem semelhantes contingências e demonstrações de fragilidade moral. Não se fala, portando, da qualidade intrínseca das instituições em tela ou dos seus membros, e mais do lugar, mais seguro ou mais suscetível aos apelos da vantagem injustificável, no qual necessariamente transitam durante o desenrolar de suas atividades. Aqui, sim, a real compreensão do problema robustece, ao contrario de enfraquecer, a solução defendida neste texto. Se a sedução é real, e tão reais que as próprias forças armadas são reticentes quanto à utilização de seu corpo, no campo da segurança pública, em vista dos riscos que tal atividade oferece à integridade moral da tropa, melhor que as interferências recíprocas, ajustem as condutas dos agentes públicos e a atuação dos órgãos, tudo com o fito de melhor facilitar a vida em sociedade e a proteção dos valores constitucionalmente tutelados. Sem se transformar em polícia, portanto, porque não é disso que se trata, é justificável, à luz de argumentos racionais deduzidos do texto constitucional, a ação investigatória do Ministério Público, em particular nos casos especialíssimos e mesmo naqueles nos quais, diante do material probatório já colacionado, em face do encaminhamento por outros órgãos públicos ou de investigações de outra natureza que não criminal (v.g. improbidade administrativa ou matéria ambiental ou vinculada ao direito do consumidor ou da criança e adolescente ou do idoso, etc.) não se justifique a instauração de inquérito policial, eis que singela ou poucas, embora complexas, diligências complementares são suficientes para a formação da convicção e propósito da necessidade ou não da propositura da ação penal" (CLÈVE, Clèmerson Merlin. Investigação Criminal e Ministério Público. Revista Eletrônica de Direito do Estado. Número 1 ? janeiro/fevereiro/março de 2005 ? Bahia ? Brasil) .

4.4 - O Poder de Investigação do Ministério Público

O tema proposto pelo presente estudo atinge finalmente seu prisma principal, qual seja a legitimação do exercício por parte de membros do Ministério Público, nas atividades investigatórias, incumbidas inicialmente às Polícias Judiciárias. A discussão tem o seu marco inicial a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, e principalmente com a vigência da Lei Federal 8.625 de 12 de fevereiro de 1993 e da Lei Complementar nº 75 de 20 de maio de 1993, as quais conferem ao Ministério Público, plenos poderes para realizarem diligências de cunho investigatório, principalmente na esfera penal. A polêmica estabelecida, no entanto, estaria muito aquém das esferas político social, pois atinge com extrema intensidade a seara jurídica. Se as atenções se voltarem para o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, analisar-se-á que cada vez mais os entendimentos que se intensificam e renovam. Se de um lado é notório o entendimento de que o "Parquet" dispõe de competência legal para atuar diretamente nas investigações principalmente de cunho criminal, conforme já exposto pela legislação mostrada, de outra banda, têm-se os que entendem que a partir da promulgação da Carta Magna, o Ministério Público vem desenvolvendo investigações criminais desrespeitando flagrantemente a letra do texto constitucional, vez que este é expresso e taxativo quando menciona que as investigações devem ser "requisitadas" à autoridade policial a qual detém por força Constitucional, a incumbência de realizar investigações criminais, a fim de oferecer aos membros do Ministério Público toda segurança ao oferecimento da denúncia. Ainda nesse contexto, há quem entenda que para o MP se manifestar a respeito do seu convencimento, deve vivenciar os fatos, estudando-os em seu âmago, e não somente na condição de gabinete que na maioria, portanto, distante dos fatos. Juristas resistem ao caráter hegemônico do MP nas ações penais nas suas diversas fases, cujo entendimento foi invocado diz que o constituinte de 1988 preferiu, mesmo diante de opiniões divergentes, manterem o sistema penal vigente, qual seja, aquele que confere exclusividade as Polícias Judiciárias para investigarem crimes, por meio dos inquéritos policiais.

CAPÍTULO 5 5.

INTERPRETAÇÃO À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Conforme já se denotou anteriormente, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, através de seu artigo 127 que definiu o Ministério Público como instituição permanente e imprescindível à função jurisdicional do Estado, delegando-lhe a defesa do Estado Democrático de Direito e principalmente dos interesses sociais individuais e indisponíveis. A Constituição Federal depende indubitavelmente, das suas normas para desencadear, nos diferentes grupos sociais, a identidade que cada uma traz consigo e principalmente prover segurança na esperança depositada por aqueles. Não é demais recordar que o "Parquet" sofreu alterações consideráveis com o advento da Constituição Federal de 1988, vez que sob a égide do sistema anterior, este tinha sua vinculação atrelada ao Poder Executivo. Na verdade a instituição ministerial vem sofrendo alterações profundas no sítio penal atual, pois há a necessidade de acompanhar e principalmente frear o avanço das condutas criminosas, que cada vez mais apresentam modernas técnicas, requerendo aperfeiçoamento igualmente tecnológico, bem como ágil para sua repressão. No entender de Barbosa Moreira a respeito do pensamento obsoleto de alguns juristas têm-se: Põe-se ênfase nas semelhanças, corre-se o véu sobre as diferenças e conclui-se que, à luz daquelas, e a despeito destas, a disciplina da matéria, afinal de contas, mudou pouco, se é que na verdade mudou. É um tipo de interpretação em que o olhar do intérprete dirigiu-se antes ao passado que ao presente, e a imagem que ele capta é menos a representação da realidade que uma sombra fantasmagórica . O autor teve a intenção de destacar que não raras vezes, juristas preferem ao invés de acompanhar o desenvolvimento da matéria, buscar no passado, fundamentos que possam sustentar determinada disciplina. Entretanto, por vezes, a interpretação pretérita não acompanha o raciocínio atual. com isso, conclui o autor que várias matérias de âmbito constitucional estão obsoletas, a ponto de não cooperarem mais com a realidade que apresentam.

CAPÍTULO 6 6.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A corrente que sustenta a legitimação do Ministério Público para atuar na esfera investigatória, principalmente na vertente criminal, o faz com base nas Leis 8.625/1993 (Lei Orgânica do Ministério Público) e 75/1993 (art. 8º). O inciso VI, do art. 129 da Constituição Federal dispõe que o Ministério Público pode expedir notificações como o escopo de requisitar as informações do que necessitar para a melhor instrução de seus procedimentos administrativos, o que é o caso dos procedimentos administrativos investigatórios , o mesmo se aplicando as diligências investigatórias (art. 129, inciso VIII). Entretanto, o artigo 129 da Constituição Federal que dispõe a respeito do Ministério Público, enfatiza no inciso IX o seguinte: "exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas". Streck e Feldens, assim se reportam ao dispositivo suso mencionado: (...) Cabe-nos então ressaltar aquilo que se revela por demais relevante: ao contrário do que recorrentemente preconizado por setores da doutrina e da jurisprudência, as funções institucionais acometidas ao Ministério Público não se esgotam na literalidade mesma do art. 129 da Constituição. Atente-se, a tanto, que este mesmo dispositivo constitucional apresenta-se como uma cláusula de abertura ao desenvolvimento, pela instituição, de outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade (art. 129, IX, da CRFB) . Para aqueles que defendem a competência do Parquet na seara investigatória, este inciso exprime a intenção do constituinte em conceder o cunho investigatório ao referido órgão. Mesmo que subjetivamente, estaria dentro da letra constitucional, a legitimidade para investigar crimes, mesmo porque, como defensor da ordem jurídica e do Estado Democrático de Direito, seria inconcebível que o Promotor de Justiça ou até mesmo o Procurador Geral da República não pudessem praticar tais atos, visto que o núcleo das investigações é justamente formar a opinião e o convencimento e assim, poder embasar os preliminares do processo penal. Ademais, com o advento das leis supracitadas, estaria o Ministério Público munido de todas as ferramentas jurídicas necessárias para o desempenho da função da investigação criminal, sem ferir aos princípios previstos pelo Código de Processo Penal. Os defensores da investigação por parte do Parquet alegam que o artigo 144, § 1º, IV da Constituição Federal, está direcionado às questões atinentes a Segurança Pública, não caracteriza a exclusividade das Polícias Judiciárias em matéria de cunho investigatório, vez que o legislador constitucional, teve na verdade a intenção excluir da função mencionada os demais órgãos não trazidos pelo caput do referido artigo. Portanto, não há exclusividade das polícias. Nesse turno, enfatizam ainda o artigo 4º caput e § único do Código de Processo Penal atribui função investigatória ao órgão ministerial: Art. 4º. A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja [57] cometida da mesma função. Os mais atentos entendem que a letra contida no parágrafo único concede plenos poderes ao Ministério Público, vez que enfatiza objetivamente, que nenhuma autoridade administrativa será excluída desde que cometida à mesma função. Por conseguinte, sendo o Parquet ente administrativo dotado de poderes conferidos, segundo seus seguidores, pela Constituição Federal. Existem ainda, dois artigos do código de Processo Penal que corporificam a atuação Individual do Ministério Público. Quais sejam: Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a Iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção. Art. 39, § 5º: O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de 15 dias. Os dispositivos transcritos não deixam dúvidas que toda ação persecutória na esfera policial serão apreciados pelo Parquet que não está vinculado ao que inferir as autoridades policiais. Clèmerson Merlin Cléve, ao tratar do assunto com muita propriedade, assim se manifesta: Levando a cabo a interpretação do dispositivo em questão, resta assentado que à Polícia Federal é reservada, com exclusividade, a função de polícia judiciária da União, ou seja, não há exclusividade quanto à apuração de crimes e a exclusividade referida se opera em relação ao âmbito de atuação das funções de polícia judiciária ? federal ? em contrapartida ao das polícias civis. Assim, não há exclusividade constitucionalmente garantida aos órgãos que exercem função de polícia judiciária para a apuração de infrações criminais . Por fim, em prol do Ministério Público, à guisa de ilustração, trago alguns trechos do julgado do seguinte julgado: (...) 4. Diversamente do que se tem procurado sustentar, como resulta da Letra do seu artigo 144, a Constituição da República não fez da investigação uma função exclusiva da Polícia, restringindo-se, como se restringiu, tão somente a fazer exclusivo, sim, da Polícia Federal o exercício da função de polícia judiciária da União (parágrafo 1º, inciso IV). Essa função de polícia judiciária ? qual seja, a de auxiliar do Poder Judiciário -, não se identifica com a função com a função investigatória, isto é, a de apurar infrações penais, bem distinguidas no verbo constitucional, como ex-surge, entre outras disposições, do preceituado no parágrafo 4º do artigo 144 da Constituição Federal, verbis: ?§ 4º às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.? Tal norma constitucional, por fim, define, é certo, as funções das polícias civis, mas sem estabelecer qualquer cláusula de exclusividade. 5. O poder investigatório do Ministério Público é, à luz da disciplina constitucional, certamente, da espécie excepcional, fundada na exigência absoluta de demonstrado interesse público ou social. O exercício desse poder investigador do Ministério Público não é, por óbvio, estranho ao Direito, subordinando-se, a falta de norma legal particular, no que couber, analogicamente, ao Código de Processo Penal, sobretudo na perspectiva da proteção dos direitos fundamentais e da satisfação do interesse social, que, primeiro impede a reprodução simultânea de investigações, segundo, determina o ajuizamento tempestivo dos feitos inquisitoriais e, por último, faz obrigatória oitiva do indiciado autor do crime e a observância das Normas Legais relativas ao Impedimento, à suspeição, e à prova e sua produção. 6. De qualquer modo, não há confundir investigação criminal com os atos investigatórios ? inquisitoriais complementares de que trata o artigo 47 do Código de Processo Penal. 7. 'A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia . A Carta Constitucional de 1988 produziu uma repaginação do MP, elevando-o sob a ótica material, a condição de "Poder", sendo que além de titular da ação penal passou, também, a ser o guardião da ordem democrática e dos direitos fundamentais e sociais. A função do Ministério Público não é substituir a Polícia Judiciária e, tampouco, presidir inquéritos policiais, tão-só, ver legitimada sua competência para realização de investigações criminais. Além de órgão acusador o MP se constitui defensor da sociedade e sua função investigadora na área criminal possui embasamento na Carta Magna como na legislação infraconstitucional (art. 129, I e IX da CF/88 e arts. 8º, V da LC n. 75/93, 26, da Lei nº 8.625/93, e 4º, parágrafo único, do CPP). A produção de investigações tanto originárias como complementares, somada ao controle externo da atividade policial por parte do MP vem ao encontro de uma política essencial de combate a criminalidade em defesa da sociedade que exige sinergia entre esse órgão e as instituições policiais. Para alguns o controle externo da atividade policial, atribuído ao órgão ministerial, seria inviável sem a possibilidade de investigação criminal independente, donde se invoca a teoria dos poderes implícitos . A tendência internacional é infundir competência investigatória ao Ministério Público, como ocorre nos casos do Código de Processo Penal da Itália (1988), Alemanha, do Japão, da França, de Portugal, da Colômbia, da Venezuela, da Bolívia, do Equador, e do Chile, considerando principalmente que as infrações criminais passaram a ser protagonizadas por organizações criminais complexas e as pessoas que agem nessa senda são providas de grandes recursos.

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