INTOLERÂNCIA À LACTOSE
Por Analu de Freitas Barros | 19/11/2014 | SaúdeIntolerância à lactose
Lactose intolerance
Intolerância à lactose
Analu de Freitas Barros¹, Xisto Sena Passos², Cláudia Cantelli Daud Bordin³
1Aluna do curso de Graduação em Nutrição da Universidade Paulista – UNIP
²Doutor em Medicina Tropical pela Universidade Federal de Goiás. Professor Titular do Curso de Nutrição da Universidade Paulista – UNIP
³Mestre em Nutrição e Saúde pela Universidade Federal de Goiás. Coordenadora do Curso de Nutrição da Universidade Paulista - UNIP
Área Temática: Nutrição Clínica
Declaração de conflito de interesse: Declaramos que não existe conflitos de interesse entre alunos, quanto à publicação.
Resumo
As intolerâncias alimentares estão sendo cada vez mais discutidas no mundo atual. A principal delas é a Intolerância à Lactose que está presente no mundo todo e principalmente em crianças e está relacionada à má digestão da lactose, carboidrato presente nos laticínios. A preocupação maior no assunto é em relação aos riscos nutricionais que o indivíduo corre, pois os tratamentos estão relacionados com a exclusão ou restrição destes alimentos na dieta, portanto a possível carência nutricional em relação à proteína e cálcio é preocupante. A necessidade de realizar o diagnóstico precoce é fundamental para a saúde do indivíduo podendo evitar perdas nutricionais, portanto a busca sobre informações e estudos relacionados a este assunto podem facilitar a compreensão do tema e então o diagnóstico fidedigno.
Descritores: Intolerância à lactose, deficiência de lactase, ausência de lactase, lactose, má absorção de lactose, intolerância alimentar.
Abstract
Food intolerances are increasingly being discussed in the current world. The main one is that Lactose intolerance is present worldwide and mainly in children and is related to lactose maldigestion, carbohydrate present in dairy products. The biggest concern on the subject is in relation to nutritional risks that the individual runs, because the treatments are related to the exclusion or restriction of these foods in the diet, so the possible nutritional deficiency in relation to protein and calcium is worrying. The need for early diagnosis is critical to the health of the individual can avoid nutrient losses, so the search for information and studies related to this topic can facilitate the understanding of the topic and then a reliable diagnosis.
Descriptors: Lactose intolerance, lactase deficiency, absence of lactase, lactose, lactose malabsorption, food intolerance.
Introdução
Para se ter um crescimento e desenvolvimento ideal deve-se atentar a alimentação adequada, principalmente em relação a alimentação infantil, e nesta fase um dos alimentos mais consumidos é o leite, portanto sua restrição deve ser cautelosa já que pode influenciar os níveis nutricionais1. Com 75% da população mundial, a Intolerância à Lactose (IL) é a mais comum entre as demais intolerâncias alimentares2, que são reações adversas a um determinado alimento por deficiência enzimática ou redução metabólica3. Esta prevalência está associada ao aumento do consumo de laticínios na dieta devido as condições suscetíveis à pecuária existentes na região, adquirindo maiores condições de digestão da lactose, ou seja o “açúcar” do leite4. O principal fator da IL é a ausência ou deficiência da enzima lactase, responsável pela hidrólise da lactose para ser absorvida pelo organismo5.
A deficiência da enzima lactase pode estar relacionada tanto por origem fisiológica, por decorrência de alguma patologia intestinal, ou de origem congênita e são determinantes para o diagnóstico e grau da IL6. Os sintomas relatados oriundos deste tipo de intolerância são de origem gastrointestinal (dores abdominais, náuseas, diarreia, flatulências), causados pela lactose mal digerida que é direcionada ao cólon e fermentada pelas bactérias do local7. Por se tratar de uma doença transitória e dose dependente, o diagnóstico precoce é o ideal podendo ser realizado de forma clínica ou através de exames laboratoriais. O tratamento deverá ser iniciado de imediato e depende do diagnóstico de acordo com o fator desencadeante da intolerância6.
A faixa etária mais atingida por esse tipo de patologia é de 0 a 10 anos de idade devido ao grande consumo de lácteos, porém a partir dos 30 anos também possuem números crescentes de casos, e muitos destes há evolução do tratamento apenas pela adaptação da mucosa intestinal pelas agressões8. Devido ao crescimento do interesse e preocupação da população pelo assunto, pode se questionar sobre o aumento de incidências de casos da IL, o diagnóstico fidedigno e precoce pelos profissionais responsáveis e pela existência de carências nutricionais referente a restrição desses alimentos da dieta.
Este trabalho teve como objetivo identificar os relatos da literatura científica na importância da informação sobre a intolerância à lactose, desde o diagnóstico de acordo com os sintomas do paciente, como os diversos tipos de tratamentos e a relação entre eles.
Revisão da Literatura
Trata-se de uma pesquisa de revisão narrativa bibliográfica, de aspecto qualitativo. A busca de dados foi realizada no Scientific Eletronic Library (SCIELO), Biblioteca Virtual da Saúde (BSV-BIREME), Periódicos CAPES e PubMed, como critério de inclusão foram selecionados artigos em português publicados no período de 2004 a 2014 da área da saúde. A análise foi desenvolvida em etapas sendo: leitura prévia do conteúdo, estudo do material e interpretação dos resultados.
Importância dos Lácteos na dieta
A nutrição tem papel fundamental para o desenvolvimento ideal do indivíduo desde os primeiros anos de vida, sendo assim suas necessidades de macro e de micronutrientes devem ser atendidas. Um dos alimentos mais consumidos nessa faixa etária e que mais se completa nessas necessidades é o leite e seus derivados, portanto a importância deste na dieta deve ser preservada e toda indicação clínica de restrições ou suspensões deve ser analisada cuidadosamente1, pois além de ser fonte de proteínas é também a principal fonte de cálcio, já que possui melhor biodisponibilidade em relação a outros alimentos9 e a sua diminuição na dieta pode acarretar riscos nutricionais.
Intolerâncias alimentares
As Intolerâncias Alimentares estão diretamente relacionadas com a restrição ou exclusão de determinado alimento na dieta, já que são reações adversas a um determinado alimento de origem não imunológica ou psicológica e que estão relacionadas de acordo com a forma que o organismo processa este alimento4.
A Intolerância à Lactose é a principal intolerância alimentar atualmente, já que há uma crescente prevalência dos casos em diversas faixas etárias, e é caracterizada pela má absorção da lactose proveniente de uma deficiência enzimática da lactase, esta que é responsável pela hidrólise da lactose em galactose e glicose (monossacarídeos) para ser absorvida pelo organismo7.
Prevalência de Intolerância à Lactose
A prevalência mundial em relação a Intolerância à Lactose está relacionada à dependência da pecuária em sua região, portanto os países que praticavam esse tipo de atividade possuem menor prevalência de IL, já que consumiam em sua dieta leite e derivados com mais frequência e então acabaram adquirindo melhores condições de digestão da lactose do que aqueles países que dependiam da agricultura por exemplo4.
Aproximadamente 75% da população mundial sofre da IL, sendo que de acordo com as conclusões de Wortmann et al. 2013, as maiores taxas de prevalência estão em países do continente africano, Ásia e Oriente Médio podendo chegar em até 100%. Também está relacionado à prevalência de casos de IL o fator idade, sendo que a faixa etária com maior incidência é de 0 a 10 anos de idade, porém se expandindo até os 40 anos, a partir desta idade o organismo passa por uma fase adaptativa das mucosas intestinais pelas frequentes agressões e acabam tolerando melhor8.
Classificação e Sintomas
A Intolerância à Lactose, ou seja, má absorção da lactose pelo organismo, pode ser classificada de acordo com a origem da deficiência da enzima lactase, esta que se localiza nas células da borda em escova da mucosa intestinal10. A deficiência enzimática de origem primária é a mais frequente dos casos, é de origem fisiológica, ou seja o indivíduo apresenta este tipo de deficiência desde a infância e a ação enzimática é reduzida.
A redução enzimática de origem secundária se dá proveniente a patologias intestinais que acabam lesionando a mucosa intestinal como por exemplo: doença celíaca, doença de Crohn, desnutrição enérgico-proteica entre outras. Pode ser proveniente também da redução da atividade lactásica de origem congênita, esta é caracterizada por ser de origem genética, extremamente rara porém irreversível caso não seja diagnosticada precocemente1.
Com a ausência, ou redução da atividade da enzima lactase, a lactose ingerida não será hidrolisada e então se acumulará no cólon do intestino onde será fermentada pela flora bacteriana intestinal11. Isso ocorrerá um acúmulo de gases proporcionando ao indivíduo diversos sintomas desagradáveis como flatulências, dores e desconfortos e distensão abdominais, além de náuseas e diarreia7.
Diagnóstico
Para a avaliação clínica no caso de IL é utilizado alguns testes de tolerância, como por exemplo a curva glicêmica a qual é realizado dosagem da glicemia do indivíduo em jejum e posteriormente a ingestão de uma quantidade de lactose, sendo repetida a cada 15 min em um intervalo de uma hora, posteriormente o diagnóstico afirmativo deverá ser de acordo com elevação menor que 20mg/dL na glicose sanguínea1. Outro teste para diagnóstico da IL bastante utilizado é o teste de hidrogênio expirado, considerado padrão-ouro, devendo seguir dieta, anteriormente ao exame, restrita para alimentos lácteos e/ou fermentativos, não fumar e não praticar exercícios físicos, também devendo comparecer em jejum de até 12h.
O exame se resume em captar a produção de hidrogênio proveniente da fermentação da lactose não absorvida. Ocorre pela expiração do paciente em cromatógrafo gasoso (aparelho específico para captação do hidrogênio) anterior e posteriormente a ingestão de lactose, sendo repetido a ação em 60, 90, 120, 150 e 180 min. O exame é considerado positivo para os casos de aumento de hidrogênio expirado de até 20ppm em relação ao valor de início4.
Terapia Nutricional
É importante salientar que a IL se trata de uma patologia dose dependente, ou seja, os sintomas estão diretamente associados com a quantidade de lactose ingerida e consequentemente não absorvida, portanto pode ser variável de acordo com o grau de intolerância de cada paciente (12). Com relação a isso, a indústria alimentícia tem desenvolvido diversas alternativas para os pacientes com IL, como por exemplo os leites com lactose hidrolisada em até 80%, alimentos lácteos fermentados como iogurtes, pães feitos com soro do leite, estes alimentos podem ser tolerados já que o teor de lactose não hidrolisada está reduzida, ou também alimentos à base de proteína de soja13.
Outras opções existentes são a suplementação da enzima lactase por cápsulas ou em forma líquidas que são ingeridas posteriormente ao alimento lácteo, minimizando os efeitos causados pela ausência da enzima. Como também o uso de alimentos prebióticos e probióticos, estes que contribuem respectivamente em ocasionar o estímulo da proliferação bacteriana desejável no cólon do intestino e ao aumento da ação enzimática14.
Ingestão de Cálcio
Além das alterações na dieta dos intolerantes à lactose em relação ao consumo de lácteos, outro fator preocupante é a ingestão insuficiente de cálcio, já que a sua absorção nestes alimentos está diretamente relacionada à presença da lactose. Nestes casos a ingestão deste mineral deverá vir de outras fontes alimentares, ou até mesmo de forma suplementada15, já que de acordo com o Guia alimentar da população brasileira, é recomendado três porções de leite e derivados por dia para se atingir as recomendações de cálcio16.
Algumas opções de alimentos fontes de cálcio são interessantes para substituir ou complementar a dieta como leite de cabra ou ovelhas, queijos preparados a partir destes leites, feijão branco, brócolis, couve e peixes pequenos e inteiros como sardinha e salmão, porém devem ser sempre analisados em relação à real absorção do mineral, evitando assim um aumento do cálcio urinário e/ou de reabsorção óssea levando a um risco aumentado de osteoporose por exemplo17.
Discussão
Barbosa e Andreazzi15 demonstraram através de estudos que considerando a importância do cálcio no organismo e as possíveis complicações a partir de sua carência, a intolerância à lactose pode levar à uma considerável redução na absorção deste mineral.
Almeida et al.9 conclui que a população brasileira não possui grandes hábitos de consumir vegetais e folhagens, e que o leite de soja não agrada muito o paladar brasileiro, portando considera que os indivíduos que não ingerem o leite de vaca e seus derivados devem ter uma atenção especial e acompanhamento nutricional para a ingestão diária principalmente de cálcio.
Conclusão
A intolerância à lactose é uma patologia presente em grande parte da população mundial, sendo que cada vez mais frequente ocorre a procura da população por informações, tratamentos e opções na dieta. Sabe-se que esta intolerância pode atingir tanto as crianças quanto os adultos, e alterando a qualidade de vida de ambos, deixando claro a necessidade de realizar o diagnóstico precoce, acompanhamento e tratamento para que não tenham complicações nutricionais.
Dentre as diferenças com relação à origem da intolerância, o tratamento realizado é em geral relacionado com a ingestão de lácteos, devendo ser excluídos ou apenas reduzidos na dieta, porém em todos os casos deve-se atentar aos níveis de cálcio e proteína, estes que são os nutrientes mais prejudicados na retirada da dieta.
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