Inferno particular

Por Beatrice Cavalcante | 13/08/2019 | Contos

Era como se eu tivesse voltado para o ensino médio, aquela sensação de não se enquadrar naquele lugar, as pessoas me olhando de canto de olho. Estava vivendo tudo aquilo de novo. Me sentei no lugar mais escondido que consegui, na minha frente tinha uma parede, atrás de mim as pessoas, ótimo, assim eu não conseguiria ver elas falando mal de mim pelas costas. 

Se aquela sala tivesse cheiro de giz, seria a reconstrução perfeita da minha adolescência, solidão, desespero e aquele aperto no peito que dava falta de ar. Já que era a reconstrução do meu inferno particular, vou resolver da única forma que eu sabia, colocando os fones e tentando calar meus pensamentos suicidas, não sei quanto tempo mais irei aguentar isso, depois do ensino médio, pensei que jamais passaria por isso novamente.

A falta de ar me impedia de falar com as pessoas, como me foi orientado tanta vezes, os fones me impediam de tentar ouvir o que elas tinham para dizer. 

Todas as noites eu tinha crise de pânico de lembrar da sensação de entrar em um lugar onde todos me odiavam, ou onde eu odiava a todos, nunca soube exatamente quem odiava a quem naquele lugar. 

Enrolada nas cobertas as lágrimas escorrem por mais que eu tentasse controla-las, elas simplesmente escorrem pelo meu rosto e param no travesseiro. Minhas noites eram resumidas a crises de choro, ansiedade, falta de ar, e a mistura de álcool com remédios para dormir. Não conseguia acreditar que estava vivendo aquela sensação da adolescência de novo. 

Quando alguém me fala que a época do ensino médio foi a melhor época de sua vida, só consigo me lembrar do meu primeiro dia de aula, eu entrando na sala, escolhendo o lugar mais escondido, de preferência perto da parede, colocando os fones e repetindo esse ritual por um longo tempo, mas sempre tinha aquele momento em que eu fazia "amigos"  e acreditava que teria uma adolescência normal, mas óbvio que não, depois de um tempo, eles iam se afastando, me evitando até chegar ao ponto onde eu me sentava e todos pulavam uma cadeira para não ficarem perto de mim, essa foi a pior sensação da minha vida e de verdade, achei que isso nunca mais aconteceria, a gente acha que adolescentes são cruéis e que adultos são no mínimo bons atores. Erro meu, adultos são tão cruéis quanto os adolescentes, talvez até mais, afinal a escola tem data para acabar, agora a vida. 

As noites em claro se tornaram cada vez mais frequente, a quantidade de lágrimas, álcool e remédios foram aumentando, eu era uma bomba relógio a ponto de explodir.