INCHAÇOS URBANOS
Por Cilas Emilio de Oliveira | 11/05/2014 | CrônicasINCHAÇOS URBANOS
Um bairros rural - em que habitávamos – era composto de uma população de no mínimo duas mil pessoas. Hoje, qual foi minha decepção ao retornar àquele local, observar que há somente cana e mais cana, com algumas casinhas caindo aos pedaços. Percorre-se o bairro todo e não encontra viva alma que possa relembrar a pujança de um passo não muito distante.Este é apenas um dos milhares de exemplos das situações criadas pelo verde da cana, que matou o verde cereal. Com isso o preço dos gêneros alimentícios, os hortifruti-granjeiros, principalmente o cereal, foram parar na lua. Somem-se a esse desalentador estado a criação de gado destinado à exportação. Florestas inteiras dizimadas para dar lugar ao capim. A solução encontrada pelos moradores foi inchar as cidades, tornando-as no caos em que se encontram. "Pra frente vão beber somente álcool", lamenta um dos antigos moradores. "Mesmo nós sendo produtores de carne pagamos um preço exorbitante pelo produto, para reservar os filés destinados à exportação", queixa-se outro. E assim o país, outrora dominado pelo homem do campo, aquele que respondia por grande parte do que era consumido nas cidades, vai se transformando em um mar de arbitrariedade.
Cidades inchadas, sem oferecerem locais de trabalho a uma população sem um mínimo de preparo para o setor técnico. Aludo ao exemplo de minha cidade, a qual "esticou" para todos os lados, formando dezenas de bairros novos, invadindo a zona rural, acabando com o restante que a cana havia deixado. Mais distante um pouco, ela tomou conta de tudo, formando verdes mares, responsável na maior parte pelo êxodo rural. Milhares recorreram à cidade que, sem condição de fornecer emprego à mão de obra desqualificada e ociosa, num futuro não muito distante poderá se transformar num centro de marginalidade. Assim, creio, se encontram centenas e centenas de bairros, em inúmeras cidades espalhadas por estes brasis.
Inchaços e mais inchaços confundidos com crescimento. Para contornar a situação caótica da falta de moradia para essa gente, os poderes públicos apelam para a construção de casas populares, com casinhas mais parecendo casas de pombos olhadas de longe. Verdadeiros “pombais” que se transformam em criadouros de gerações que não têm um mínimo de educação social. Os resultados já estão ai, com cadeias públicas e penitenciárias superlotadas. Não vamos dizer que este problema seja, ele só, a causa-mor da marginalidade. Porém, uma das facetas que envergonham o país como um todo. Qualquer indivíduo com um pouquinho de esclarecimento, pode perceber que o êxodo rural ajudou a criar o estado latente, onde os atos de marginais se descarregam na própria sociedade, formada - em parte - pelos retirantes, desalojados das terras ocupadas pelo verde da cana e da pastagem. Engrossando fileiras a esse estado, vêm os meios de comunicação que, diariamente, enchem a cabeça da população com notícias degradantes, quando a sociedade vai-se acostumando com o “é assim mesmo”, que “a vida é cheia de altos e baixos”, sem um horizonte a exaltar o lado das virtudes, estas banidas aos poucos no seio das gerações que se despontam. Por outro lado, as medidas paliativas do estado, muitas delas com fins eleitoreiros, marcham contra o sábio dizer: “Não dê o peixe ao homem, ensine-o a pescar”.
Outros fatores negativos vêm sendo somandos aos sintomas que o verde da cana fez acontecer, ao expulsar os produtores da pequena horta, da criação de animais de pequeno porte e da agricultura de subsistência. Hoje, os poucos que restam, não se sabem por comodismo ou por falta de estrutura, têm a petulância de virem às cidades buscar o que antes era produzido na zona rural. Ao lado desses, os que engordaram as cidades, por sua vez, não plantam um pé de nada em seus quintais, onde o mato tem sido o único dominador por excelência. Em suma, um quadro desalentador que, como um pintor, desenha para o futuro um enorme ponto de interrogação, cuja definição está além dos vislumbres de horizontes promissores.