Igreja vs. Religião

Por José Peres Júnior | 07/12/2010 | Religião

A palavra IGREJA deriva do termo grego εκκλησία [ekklesia], em latim ecclesia. A palavra grega ekklesia é composta de dois radicais gregos: ek que significa para fora e klesia que significa chamados.
No contexto do Novo Testamento, IGREJA está muito associada à idéia de reunião de pessoas, sem vínculos a uma edificação ou a uma doutrina religiosa. Quando Jesus disse que edificaria a sua Igreja, certamente Ele fazia referência a uma reunião de homens e mulheres unidos por um mesmo espírito.
Mas qual é o espírito da Igreja?
Se fizermos uma leitura atenta do Novo Testamento e apreciarmos todos os ensinos do Senhor Jesus Cristo, percebemos diversos termos e expressões que remetem à idéia de família. Por diversas vezes, Ele disse que os seus discípulos deveriam considerar uns aos outros como irmãos. Ele nos ensina a orar, não mais ao Senhor dos Exércitos, mas ao Pai. E as recomendações para o cultivo de um amor fraterno estão expressas em toda a doutrina do Novo Testamento.
Isto nos leva a admitir, sem sombra de dúvidas, que o espírito da Igreja é família. E a expressão "levar as cargas uns dos outros" traduz significativamente o objetivo maior dessa família.

A palavra Religião vem do latim "religio" que significa "prestar culto a uma divindade", termo que, por sua vez, originou-se da composição "re+ligare" que significa "ligar novamente", ou simplesmente "religar". O termo, pois, nos remete à idéia de busca incessante de um reencontro, de uma religação. Ou seja, reaproximação do homem a Deus.
Desde que o homem desobedeceu a Deus, ainda no Jardim do Éden, esse homem procura reatar as suas relações espirituais com o Criador. A partir da desobediência, desenvolveu-se no espírito da criatura o sentimento de vazio, de culpa, de saudade, de perda e de condenação. Daí que, por todos os meios, o homem procura se reaproximar do Deus Criador para resgatar aquela comunhão perdida.
É importante notar que desde o mais primitivo dos seres humanos até os mais civilizados, todos possuem esse sentimento de necessidade de reaproximação do divino, do belo, da perfeição, do sagrado, de Deus.
Em todos os tempos, em todos os lugares, os homens têm procurado se reaproximar de Deus. Nessa busca incessante, eles desenvolveram diversos tipos de cultos e de métodos religiosos tentando se reaproximarem da divindade. Evidentemente, tateando aqui e ali na escuridão espiritual, há, desde de cultos de adoração a animais, a cultos de adoração aos espíritos malignos.
Esse esforço humano para se reencontrar, se reaproximar, se religar a Deus é o que eu qualifico de espírito religioso. Esse espírito se revela pela ansiedade da criatura desobediente de querer "agradar" a Deus e tentar alcançar as benesses espirituais pelo esforço próprio, pelos próprios méritos. E, assim, edificam um ser maior que cada indivíduo, que submete e que controla todos os indivíduos. Um ser gigante a quem todos os fiéis devem obediência. É a religião. Uma Torre de Babel.

Embora cada religião apresente elementos próprios, é também possível estabelecer uma série de elementos comuns entre elas.
1º - Lugares e Objetos Sagrados - As religiões tendem igualmente a sacralizar determinados locais, roupas, objetos, relíquias. Todas as religiões do mundo, de uma forma ou de outra, possuem templos, lugares sagrados como altares, montes, campos santos, estátuas, imagens e objetos consagrados ao serviço das divindades. Esses locais e objetos são reverenciados porque são tidos pelos religiosos como sagrados.
Em religiões mais antigas, os templos não eram locais para a prática religiosa, mas sim locais onde se acreditava que habitava a divindade, sendo por isso sagrados.
As organizações religiosas também se consideram sagradas. E é muito comum seus adeptos dizerem que elas foram "criadas" pela própria divindade (obra de Deus).
2º - Sacerdotes (intermediários entre a divindade e o indivíduo) - do latim Sacerdos + otis é um ministro religioso, habilitado pela organização para dirigir ou participar das cerimônias de culto, sendo compreendido e tido pelos fiéis como um indivíduo que faz a ligação entre a divindade e os homens. Os sacerdotes são uma espécie de mediadores e interlocutores entre a divindade e o ser humano. Em todas as religiões, há sempre a figura desses indivíduos "mais elevados", que se acredita, podem mediar, intermediar, ou facilitar o encontro entre o fiel e Deus.
3º - Dogmas (Leis Religiosas) - Todas as religiões possuem dogmas, leis e tradições que devem ser observadas e confessadas pelos fiéis. Dogma é uma crença estabelecida, uma doutrina, considerada como ponto fundamental e indiscutível dentro da religião. Essas regras de fé, impostas a todos os que vão se aderir ao culto, são encontradas em todas as religiões e devem ser respeitadas por todos os fiéis. Contestar um dogma dentro da religião é motivo para represálias, expulsão, ou excomunhão.
4º - Títulos Religiosos - Nas religiões, os fiéis são escalonados em níveis e em degraus hierárquicos que distinguem as categorias do ofício religioso. Alguns recebem títulos, patentes especiais, credenciais religiosas, porque se acredita que são os escolhidos dos deuses e são mais especiais (ungidos) para a divindade. São as ordenações, separações, ou consagrações, em que os indivíduos mais graduados "elevam" de categorias uns e outros, para exercer serviços mais especiais dentro da religião. A cada degrau que sobe, o indivíduo recebe títulos religiosos que indicam a sua patente dentro da organização.
5º - Serviços do Altar - Nas religiões, há sempre um serviço que deve ser prestado nos templos, denominado serviço do altar, ou serviço do templo. Consiste em organizar as celebrações. Limpar, enfeitar e ornamentar o templo. Fazer as oferendas. Dar ofertas (dízimos) para custear as despesas da religião e pagar os serviços dos sacerdotes. Celebrar os rituais e cerimônias. Cânticos. Rezas. Tudo isto é considerado pelos fiéis com um serviço aos deuses. Serviço para "agradar" a divindade.

Porém, analisando o espírito da Igreja do Senhor Jesus, constatamos que esses elementos não fazem parte dela.
1º - Na Igreja, não existe lugares e objetos sagrados. Na verdade, na doutrina de Cristo, o homem, o ser humano, o indivíduo, gente é que é consagrada e que se transforma em templo de Deus. Mc.15.38, At. 7.47-49, At.17.24-25, I Cor. 06.16-19, II Cor. 06.16. Se há alguma coisa sagrada entre os cristãos, não é a instituição religiosa e nem tampouco objetos corruptíveis, mas é o ser humano. A alma dos homens é que é o grande alvo do Senhor Jesus.
2º - Na doutrina Cristã, o homem não precisa de intermediários, sacerdotes e de mediadores para interceder por ele junto a Deus. Cada indivíduo tem acesso direto a Deus, sem intermediários. I Tm.02.05. Quando o véu do templo se rasgou, inaugurou-se uma nova era, em que cada pessoa pode clamar a Deus, no nome de Jesus, sem necessidade de sacerdotes humanos. Cristo é o único sacerdote dos cristãos. E Ele não instituiu nenhum chefe humano sobre os seus, ou sumo sacerdote sobre os sacerdotes. À Igreja, Ele dá líderes. Liderança é horizontal, chefia é vertical. Líder tem autoridade "entre", e não autoridade "sobre". Basta verificar Mt.20.25-28.
3º - É importante notarmos que, para Cristo, só existe uma Lei, a Lei do Amor fraternal. Entre os cristãos, é somente esta lei que deve prevalecer. Rom. 13.8-10, Gal. 05.14. Qualquer rudimento, regra ou doutrina que passar disto, é artimanha manipuladora para colocar os crentes sob o jugo de organizações religiosas dominadas por homens de torpe ganância.
Por outro lado, não é a obediência ao rudimentos, às regras e às leis de uma instituição religiosa que salva o homem. A salvação não depende de leis, como no Judaísmo. O apóstolo Paulo deixou isto bem claro na Carta aos Gálatas. A Lei mata...
4º - Na Igreja do Senhor Jesus não há distinções de homens maiores, melhores, mais especiais, ou mais elevados. Nela, todos os cristãos são apenas "irmãos". Mt.23.08-10. Títulos honoríficos é outra artimanha religiosa para instigar a obediência e a submissão de espíritos cobiçosos que sempre almejam estar no lugar daqueles que ocupam lugares de destaque na organização.
Indiretamente, o espírito religioso aniquila a profecia, porque, ao oferecer títulos aos fiéis, ele está dizendo: "Se vocês obedecerem todas as minhas ordens, vocês poderão chegar lá em cima." "Vocês poderão ter sucesso, basta se submeterem às minhas ordens e eu elevo vocês." "E todos verão que vocês são homens de Deus". Assim, esses títulos funcionam como moeda de troca pela submissão e obediência dos fiéis. A profecia, no entanto, é avessa à submissão, porque ela jamais pode se submeter à vontade dos homens. E sem profecia, a igreja navega em um mar de mentiras.
5º - Na Igreja, os únicos serviços são "levar as cargas uns dos outros" e pregar o Evangelho que liberta o homem do egoísmo, do engano e do espírito religioso. Porém, esse serviço não é serviço a Deus, mas é expressão de amor ao próximo. Gal. 06.02, Lc. 10.30-37. Jesus não quer que trabalhemos para Ele, não. Ele quer que trabalhemos pelos nossos irmãos. Os dons, os talentos e os ministérios são para uso em favor do nosso próximo. Nenhum cristão será abençoado por prestar serviços religiosos em templos e em altares. Todos os dons e todos os talentos com que o Espírito Santo capacita o cristão, nada têm a ver com serviço de altar, mas é dom para o serviço de ajuda. Isto é que edifica o edifício espiritual chamado de IGREJA.
Esta, nada tem de religião, nada tem de organização humana, nada tem de instituição. Ela é espiritual e se manifesta totalmente no espírito. E quem a governa é o próprio Senhor Jesus Cristo, que é o seu Cabeça. Ele é que cuida da fé, da esperança, do caráter e da conduta de cada um dos seus. Ensinando, no espírito de cada cristão, a viver na Sua Doutrina e na Sua Lei.
Por fim, é tempo de denunciarmos o espírito religioso que tenta se passar por Igreja. É tempo de denunciarmos a contaminação da Igreja pelo espírito religioso. Religião é apenas esforço desesperado do homem para se salvar, mas, salvação é impossível aos homens. Somente o que Deus preparou, por si mesmo, é que pode nos salvar: Jesus Cristo. E este nos chama a sair dos barcos religiosos e a andar sobre as águas, ao Seu encontro. E aos religiosos do seu tempo, e de hoje, Ele diz: "importa- vos, nascer de novo."


José Peres Júnior
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