ARTIGO: Honorários Advocatícios na Classificação dos Créditos da Falência

Por Lucas Brito Ferreira Sousa | 21/06/2018 | Direito

ARTIGO: Honorários Advocatícios na Classificação dos Créditos da Falência.

 

Lucas Brito Ferreira Sousa

 

1 DESCRIÇÃO DO CASO

 

O case versa sobre a classificação de créditos no quadro geral dos credores, especificadamente os créditos derivados da Zifi Mizifii Advogados Associados, que foi contratado para prestar serviços de consultoria jurídica em 02/01/2015 para Lullysaldanha Empreendimentos Ltda, que teve sua falência decretada em 02/01/2016. Por ocasião da classificação dos créditos, o escritório figurou no quadro geral de credores como crédito com privilégio geral em razão de valores decorrentes da falta de pagamento da remuneração devida pelos serviços prestados desde julho/15. Em sede de impugnação do Ggc, Zifi Mizifii advogados associados buscou o recurso junto à 666ª vara de falências para reconsideração da sua preferência creditícia.

Diante do exposto, Supondo que você fosse o juiz do caso, você decidiria como procedente a impugnação do Quadro Geral de Credores e sua imediata retificação para alteração da ordem de preferência do crédito referente aos honorários advocatícios?

 

2 ARGUMENTOS CAPAZES DE FUNDAMENTAR CADA DECISÃO

2.1 Procedente a impugnação do Quadro Geral de Credores.

Os honorários advocatícios não podem configurar na classificação de créditos com privilégio geral, pois estes são aqueles bens que não são sujeitos a direito real e nem possuem privilégio especial, além dos mesmos estarem dispostos no artigo 965 do Código Civil de acordo com a Lei N° 11.101/2005.

Art. 965. Goza de privilégio geral, na ordem seguinte, sobre os bens do devedor:

I - o crédito por despesa de seu funeral, feito segundo a condição do morto e o costume do lugar; II - o crédito por custas judiciais, ou por despesas com a arrecadação e liquidação da massa; III - o crédito por despesas com o luto do cônjuge sobrevivo e dos filhos do devedor falecido, se foram moderadas; IV - o crédito por despesas com a doença de que faleceu o devedor, no semestre anterior à sua morte; V - o crédito pelos gastos necessários à mantença do devedor falecido e sua família, no trimestre anterior ao falecimento; VI - o crédito pelos impostos devidos à Fazenda Pública, no ano corrente e no anterior; VII - o crédito pelos salários dos empregados do serviço doméstico do devedor, nos seus derradeiros seis meses de vida; VIII - os demais créditos de privilégio geral.

Diante da análise do texto da lei, não há porque se classificar honorários advocatícios como credito de privilegio geral, tendo em vista que o mesmo tem natureza alimentar. O julgamento da REsp 1.152.218 perante o Superior Tribunal da Justiça, o ministro Luís Felipe Salmoão (2009) durante seu voto proferiu o entendimento de que os honorários são a remuneração do advogado, logo sua fonte de alimentos. Não podendo negar-se a essa realidade. Por isso os honorários advocatícios têm natureza alimentar e merecem privilégio similar aos créditos trabalhistas. De fato, assim como o salário está para o empregado e os vencimentos para servidores públicos, os honorários são a fonte alimentar dos causídicos. Tratá-los diferentemente é agredir o cânone constitucional da igualdade.

Há ainda doutrinadores e juristas que tendem a negar a natureza alimentar dos honorários advocatícios enquadrando-lhes em créditos de privilégios utilizando-se do artigo 24 da Lei 8.906/1994 “Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil” ao citar: “A decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na falência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial.” (BRASIL, 1994).

Com uma breve leitura de fato há como cair no erro do entendimento de que o próprio Estatuto da OAB confere poder de credito privilegiado aos honorários advocatícios, sendo esse erro constante em decisões de primeiro e segundo grau. Porém, ainda durante o voto do ministro do STJ perante o julgamento da REsp 1.152.218, Luís Felipe Salomão afirmou: “A posição defendida pela OAB é a de que o "crédito privilegiado" a que se refere o mencionado dispositivo legal deve ser entendido como equivalente aos trabalhistas” (BRASIL, 2009).

Logo, mediante o exposto não há como negar a natureza alimentar dos honorários, tendo em vista a atualização de credito como fonte de seu alimento, equiparando-se perfeitamente como um mero trabalhador daquela empresa. Julgo procedente a impugnação ao quadro geral de credores e retifico a alteração para a ordem de credito trabalhista.

2.2 Improcedente a impugnação do Quadro Geral de Credores.

Ademais, referente a outros entendimentos, os advogados trabalham para outros clientes, logo não há porque se equiparar como um trabalhador daquela empresa falida. Para Kelen Campos Benito, créditos de privilegio geral são aqueles que:

Encontram-se no artigo 83 da lei de falências, inciso V, que diz: “(a) os previstos no art. 965 da lei nº 10406, de 10 de janeiro de 2002; b) os previstos no parágrafo único do art. 67 desta lei; c) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária da lei”; Por sua vez, é exemplo de crédito com privilégio geral, além dos mencionados no art. 965 do CC, o decorrente de debêntures com garantia flutuante, nos termos do art. 58, parágrafo 1º, da LSA, e os honorários de advogado, na falência do seu devedor (EOAB, art.24). (CAMPOS, 2010)

 

Logo, honorários advocatícios são créditos de privilégio geral. Assim, julgo improcedente a impugnação ao quadro geral de credores.

 

3 QUESTÕES PARA OBSERVAÇÕES GERAIS.

3.1. Apontar as condições gerais da decretação da falência e seus efeitos;

3.1.1 Condições Gerais

De acordo com Ecio Perin Junior (2011) a falência é um estado de direito que se aperfeiçoa após a sentença de decretação de falência, para aqueles empresários cuja tenham empresas em condições de insolvências, seja ativa (quando o ativo é menor que o passivo) ou aparente (mesmo sendo o ativo maior, o empresário não dispõe do mesmo para cumprir suas obrigações). Basta que caracterize a insolvência em relação o não cumprimento de suas obrigações para que seja decretada a falência.  Sendo um instituto com intuito de proteger os credores, tendo em vista que todo o procedimento da falência visa à quitação de seus créditos, assim como punir aquele que age de má-fé ou até mesmo, aquele que não age de má-fé que porem não é capaz de administrar uma empresa.

Por fim, analisadas as condições de pessoa que exerce atividade empresaria, assim com o estado de inocência, para caracterizá-lo como falido é necessária uma sentença. “A sentença declaratória da falência deverá atender a requisitos de duas ordens: genéricos e específicos. Os requisitos genéricos são aqueles que dizem respeito a toda e qualquer sentença judicial, previstos no art 458 do CPC”(PERIN, 2011)

Enquanto os requisitos específicos são: a) o relatório; b) os fundamentos da decisão; c) a conclusão.

“No relatório o juiz deve mencionar os nomes das partes, formulando síntese do pedido e da defesa. No fundamento, juiz coloca em relevo os elementos que firmaram sua convicção. E finalmente, a conclusão, dispositivo da sentença em que o juiz julga procedente ou improcedente a ação.” (ALMEIDA, 2013).

 

3.1.2 Efeitos da Decretação da Falência.

a) Quanto à Pessoa do Falido:  Perante a lei n° 11.101/2005

Inabilitação empresarial, “art. 102. O falido fica inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência e até a sentença que extingue suas obrigações” (BRASIL, 2005).

Impossibilidade de dispor seus bens, “Art. 103. Desde a decretação da falência ou do seqüestro, o devedor perde o direito de administrar os seus bens ou deles dispor.” (BRASIL, 2005).

Restrições à capacidade processual do falido. “Com efeito, em regra, o falido não atuará como autor ou réu dos processos relacionados aos bens, interesses e negócios envolvidos no processo de falência.” (TOMAZETTE, 2011).

Sigilo de correspondência. “Na administração da massa falida, cabe ao administrador à abertura das correspondências dirigidas ao devedor, entregando a ele o que não for assunto de interesse da massa. Não podendo se cogitar violação de correspondência, pois há autorização legal expressa para a abertura” (TOMAZETTE, 2011).

 

b) Quanto ás Obrigações do Falido:

Vencimento antecipado. “A falência é uma execução coletiva, na medida em que visa o pagamento de todos os credores do devedor falido. É essencial que todos os créditos sejam exigíveis, isto é, estejam vencidos. Assim sendo, a falência impõe o vencimento das obrigações” (TOMAZETTE, 2011).  E a suspensão da prescrição, assim como a suspensão do direito de retenção, “Art. 116. A decretação da falência suspende: I – o exercício do direito de retenção sobre os bens sujeitos à arrecadação, os quais deverão ser entregues ao administrador judicial” (BRASIL, 2005).

 

c) Quanto aos Contratos do Falido:

“Uma das opções que se colocam ao administrador judicial em relação aos referidos contratos bilaterais é a decisão de resolução dos contratos. Tal decisão cabe exclusivamente ao administrador judicial, não havendo necessidade de autorização judicial. [...] Além da resolução, o administrador judicial pode decidir pela continuação do contrato, mas tem que motivá-la dentro das próprias justificativas admitidas pela legislação, a redução do passivo, o impedimento do aumento do passivo e a manutenção e preservação dos ativos” (TOMAZETTE, 2011).

 

3.2. Os critérios de prioridade na classificação dos créditos;

 

 

Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:

 I – os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho;

II - créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;

III – créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias;

IV – créditos com privilégio especial, a saber: a) os previstos no art. 964 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002; b) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei; c) aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia; d) aqueles em favor dos microempreendedores individuais e das microempresas e empresas de pequeno porte de que trata a Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006

  V – créditos com privilégio geral, a saber:

a) os previstos no art. 965 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002; b) os previstos no parágrafo único do art. 67 desta Lei; c) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;

 VI – créditos quirografários, a saber:

a) aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo;  b) os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento; c) os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso I do caput deste artigo; (BRASIL, 2005)

 

3.3 Exceções creditícias;

Afirma Amador Paes de Almeida (2013) após a decretação de falência surgem inúmeros atos e operações que podem gerar despesas, sendo estes não sujeitos à habilitação e devem ser pagos preferencialmente a todos os credores.

Art. 84. Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, os relativos a:

I – remunerações devidas ao administrador judicial e seus auxiliares, e créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho relativos a serviços prestados após a decretação da falência;

II – quantias fornecidas à massa pelos credores;

III – despesas com arrecadação, administração, realização do ativo e distribuição do seu produto, bem como custas do processo de falência;

IV – custas judiciais relativas às ações e execuções em que a massa falida tenha sido vencida;

V – obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 desta Lei, ou após a decretação da falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a ordem estabelecida no art. 83 desta Lei. (BRASIL, 2005)

 

Logo, mediante exposição da Lei, esses são os casos de exceção a classificação dos créditos. Dessa forma deverão ter preferência e serem pagos com precedência.

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e recuperação de empresas. - 27. ed. rev. ampl. - São Paulo: Saraiva, 2013.

 

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 "Código Civil". Publicada no Diário Oficial da União em 11 de janeiro de 2002.

 

BRASIL. Lei n° 8.906, de 4 de julho de 1994 "Estatuto da Advocacia e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)". Publicada no Diário Oficial da União em 05 de julho de 1994.

 

BRASIL. RECURSO ESPECIAL Nº 1.152.218 - RS (2009/0156374-4). Disponível em: < http://www.idtl.com.br/noticia.cfm?ID=13408>. Acesso em: abr. 2016.

 

BRASIL.  Lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005. Publicada no Diário Oficial da União em 09 de fevereiro de 2005.

 

PERIN, Ecio Junior. Curso de direito falimentar e recuperação de empresas. - 4 ed. - São Paulo: Saraiva, 2011.

 

TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial, volume 3: Falência e recuperação de empresas. - São Paulo: Atlas, 2011.

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