História Eletrizante
Por Henrique Araújo | 21/06/2009 | LiteraturaHISTÓRIA ELETRIZANTE
- Atenção, muita atenção! Senhores e senhoras! Hoje, somente hoje nesta praça, a banha do peixe elétrico. Um complexo poderoso para doenças. Um composto que acaba com tudo: sarna,sarampo, coceira, erisipela,furúnculos,reumatismo, ferida, tontura, dor de
cabeça, fraqueza, dor na bexiga, nos rins, no útero, na próstata etc, etc.
O homem da cobra acabara de chegar. A gurizada toda animada, começou a chegar perto. Eu, como era guri, tinha já marcado o meu lugar de curioso. Guri é assim mesmo, não compra nada, mas é o primeiro a chegar, marcar o lugar e ficar enchendo o saco.
- É isso aí mesmo, pessoal- gritava o homem da cobra - vamos se achegando e marcando o seu lugarzinho. Você vai ver coisas fantásticas, coisas de outro mundo. Coisas de que você jamais viu e vai ver. Um peixe diferente... - Epa! Não é mais cobra? - Pensei eu. Já virou peixe. E ele continuava: - um peixe diferente dos outros. Um peixe milagroso.
Eu nunca tinha visto falar em peixe elétrico. Era a primeira vez que ouvia aquilo e ele continuava:
- Basta a senhora passar um pouquinho de banha do peixe elétrico que sua doença será imediatamente curada.
Conversa fiada - pensava eu. Há doenças que os médicos passam anos e não conseguem curar, imaginem se curar com uma banha de peixe.
Procurei muito ver o dito peixe. Estava escondido numa caixa. eu só conseguia ver frascos de remédios, ou supostos remédios.
O homem falava, falava, falava, mas não estava conseguindo vender nada.
- Um custa 3 e dois custam apenas 5 reais -dizia o homem. Comprando
Só então ele abriu a tampa da caixa de ferro. Era uma caixa cheia de água. Cheguei mais perto e vi um peixinho pequeno como se fosse uma cobra, nadando na água.
Mentira desgraçada - pensei - um peixinho deste tamanho vai dar choque
- Olha aí, meus senhores, vamos comprar o remédio milagroso. Tão milagroso como o peixe elétrico. Está barato, muito barato. Quem comprar 2 tem o direito de levar um choquinho, comprando 3 leva dois choquinhos.
Daí a pouco ele começou a vender os produtos, mas as pessoas meio ressabiadas compravam somente um. Ou com medo de não curar nada, ou com medo de gastar o dinheiro à toa.
Eu, doido pra ver alguém levar um choquinho daquele peixinho pra ver se era mesmo de verdade.
Mais tarde um sujeitão comprou três frasquinhos e fazia questão de levar os dois choquinhos.
Fiquei todo curioso, até que enfim eu ia ver o peixinho elétrico de mentira funcionar.
O homem da cobra ajeitou o senhor bem no centro da roda, perto da caixa do peixe, pegou os dois plugues, colocou-os entre os dois braços do sujeito e pediu que ele fechas
se os braços.
Eu não perdia um detalhe do evento, agora eu ia desmascarar aquele safado do homem da cobra. Peixe elétrico...
O homem ficou com os dois braços fechados e com os fios entre eles. As outras pontas do fio estavam no chão, enquanto o homem fazia sua propaganda.
- Agora, meus senhores e senhoras, vou demonstrar a validade do banha do peixe elétrico. Este senhor comprou três frascos do remédio e merece levar os dois choques. Observem bem, senhores e senhoras, a força deste peixinho.
Pegou os fios, olhou bem para o homem,olhou para o peixe.
O comprador olhava o peixe e parecia ter lá suas dúvidas. Estava calmo e parado, esperando o momento de receber o choquinho.
De repente o homem da cobra ligou os dois fios no peixe.
Truumm...O homem deu um solavanco, um pulo enorme, esbugalhou os olhos, soltou os fios, correu a uns dois metros do peixe, bufava e berrava:
- Caramba! Isto lá é um choquinho? Isto é uma usina elétrica.
O homem da cobra não se deu por achado e continuou:
- A banha do peixe elétrico cura sarna,sarampo, mau olhado etc. Quem comprar três frasquinhos tem direito a levar dois choquinhos do peixe. Aquele senhor ali comprou 3, já levou um choquinho, tem direito a levar outro de graça. É um brinde da casa.
- Por favor, senhor, pode se achegar aqui de novo.
- Se achegar aí?...Lá vou eu levar mais um choque desta bomba atômica nada.
- O senhor tem o direito de levar outro choquinho de l50 volts, por favor, moço, venha tomá-lo de graça.
- Quem vai tomar é a mãe, eu não.
Saiu dali pisando duro e se mandou.
Eu fiquei lá mais um pouco vendo se mais alguém iria se danar ali, mas não apareceu mais ninguém disposto.
E eu, que pegava meia dúzia em cada mão, fui saindo de fininho, sem nem triscar em um peixinho, quanto mais pegar seis.
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