HISTÓRIA DO PROJETO DE LEI ORGÂNICA DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE SANTA CATARINA: "ENTRE ANJOS E DEMÔNIOS?" -  PARTE XXVII (Felipe Genovez)

Por Felipe Genovez | 14/02/2018 | História

Data: 30.08.2016, horário: treze horas, o Delegado Godoi que começou a trabalhar na Corregedoria (a convite da Delegada Sandra Mara) veio até minha sala e me convidou para tomar um café. No curso da conversa pedi seu apoio à causa da lei orgânica e mencionei a necessidade de unirmos forças, especialmente, a partir da sinergia: Adepol, DGPC e Sinpol. Godoi concordou, entretanto, demonstrou ceticismo com relação à Adepol e alguns Delegados que mencionei que havia convidado para participarem na revisão do anteprojeto  e  exposição de motivos. Godoi argumentou que alguns deles estariam mais preocupados (e espertos) para seus interesses pessoais, seus egos, vaidades, cargos comissionados, inclusive citando Delegados do sul do Estado...  Intuitivamente, cheguei a citar os casos dos Delegados Bermudez, Casarolli... Godoi apenas disse: "Tirasse esses nomes da minha boca...". No retorno, Godoi pediu que eu imprimisse o projeto de lei orgânica porque gostava de papel e queria ler com toda a atenção para fazer suas anotações (de imediato gostei da  sua convicção  materializada nas palavras, diferente de outros que uma vez testados sequer deram um retorno).

Por volta das quinze horas e quarenta minutos, juntamente com os Delegados Carlos Francisco dos Passos (Carlão) e Ester Fernanda, cheguei na DRP/Balneário Camboriú. Ester estava de férias e havia retornado de viagem do Miami/EUA no dia 25.08.2016. Logo que aportamos no nosso destino fui direto para o gabinete da Delegada Regional Magali que já me monitorava pelas imagens no seu circuito interno de TV instalado bem a sua frente. Porém,  resolvi esperar alguns instantes sentado na recepção, enquanto Magali encerrava um atendimento. Logo que entrei no gabinete da DRP Magali foi avisando que minha testemunha (seu desafeto Delegado Márcio Luiz Colatto) havia me esperado e como houve atrasos retornou para a Delegacia de Comarca  (apesar de ter sido cientificado dos imprevistos na BR 101 e que os membros da comissão se atrasariam um pouco). O início da sua ouvida estava marcado para quinze horas. Da minha parte estava tudo bem, só faltava ouvir Colatto no Processo Disciplinar do Delegado Vilson Carvalho (já aposentado e conhecido como "Mancha", em razão das suas marcas no rosto). Enquanto conversávamos Magali confidenciou alguns fatos, especialmente, que depois que havia conversado comigo sobre o fato dos conselheiros da Adepol não precisarem estar presentes nas reuniões da diretoria ela teria deixado também de ir, inclusive, citando o exemplo do Delegado Dirceu Silveira (membro do Conselho de Ética que também não foi visto mais nas reuniões). Concordei com os argumentos de Magali, todavia afirmei que no seu caso apenas deveria se reunir mensalmente com os membros do Conselho Fiscal para aprovar as contas da Adepol. Magali imediatamente rebateu dizendo que durante todo esse tempo em momento algum foi chamada para aprovar conta alguma da Adepol e que essa seria mais uma das razões para não ir mais as reuniões da diretoria. Fiquei surpreso com aquela declaração e aproveitei para esclarecer que não era bem assim, pois então para que serviria o Conselho Fiscal? Magali não quis aprofundar a questão, apenas torceu o nariz e se fixou na sua mesa vaticinando: "Eu não vou mais doutor, não vou mais as reuniões". Interrompi para argumentar: "Mas se houver alguma convocação a gente vai, mas se for reunião de diretoria é reunião de diretoria".  Diante desse fato, aproveitei para lembrar que na época que presidi a "Federação Cat./PCs" mensalmente convocava reunião do Conselho Fiscal para aprovar minhas contas e que isso era uma praxe, porque do contrário não existiria necessidade de conselheiros. Mais, ainda, o fato do Conselho Fiscal participar ativamente da fiscalização das contas proporcionaria segurança, credibilidade para a presidência da nossa entidade, cujo dirigente deveria ser o maior guardião desses princípios (transparência - probidade). Magali reiterou, afirmando com seu toque emocional: "...Doutor, eu nem estou participando mais das reuniões da Adepol. Depois que o senhor disse que os conselheiros não precisam participar das reuniões eu resolvi não ir mais... Eu já decidi, o doutor Felipe falou que não precisa ir então eu não vou mais...". Depois disso, confidenciei para Magali que resolvi pedir minha aposentadoria porque fiquei chateado com a Direção da Polícia Civil, especialmente, com o Delegado-Geral (Nitz) que acatou uma manifestação do Secretário Grubba que havia mandado me sindicar, cumprindo parecer jurídico do seu “Conjur” e do assistente jurídico - DGPC. Magali ficou surpresa com minha informação e já aproveitou para emendar afirmando que: "O doutor Nitz me chamou a atenção porque eu andava escrevendo muito no grupo 'whats'ap' (Ética na Polícia Civil). Ele disse que alguém do grupo andou informando que eu fiz críticas ao governo. O senhor precisava ver o que eu ouvi dele que é meu amigo. Ele me chamou a atenção, mandando baixar a bola e quis saber ainda quem era o informante dentro do nosso grupo, mas ele sabia e não quis me dizer, desconversou...". Argumentei: "Bom, tu estais num cargo comissionado, não é? Então tens que dançar conforme a música. Mas essa do Nitz te chamar a atenção desse jeito é que me causa surpresa" (lembrei dos comentários do Delegado Toninho a respeito de Nitz...). Magali continuou: "Ah, doutor, precisava ver o que ele me disse, então eu não quero mais participar de nada. Por mim eu pediria minha aposentadoria...". Interrompi: "É, mas se tu fizeres isso vais perder muito dinheiro, não é? Começa com a 'Jari' (noutra ocasião Magali disse que recebia nove mil reais na condição de membro da Jari), depois tem o cargo comissionado, mais o abono permanência...". Magali concordou com meu raciocínio e disse que iria permanecer trabalhando, mas sem se expor. Pedi seu apoio à causa da lei orgânica da Polícia Civil e ela concordou comigo, lembrando que não poderíamos mais perder tempo, como ocorreu na época do Governador Pavan, dos Delegados Maurício, Ademir Serafim e André Mendes da Silveira. Aproveitei para expor sobre a necessidade de criarmos uma sinergia envolvendo Delegacia-Geral, Adepol e Sinpol na luta pela lei orgânica e que a estratégia seria a exposição de motivos vir a ser assinada por vários Delegados (cujo documento final seria entregue para Nitz, Ulisses e Anderson), pois do contrário se correria o risco de morrermos na praia. Magali se colocou à disposição, afirmando que assinaria tranquilamente a exposição de motivos.

Em seguida falamos sobre o Delegado Ademir Serafim e fiz um relato sobre os motivos porque não presidi seu processo disciplinar (e do Delegado Beber). Relatei que foi graças a ela que me avisou que quando Ademir Serafim era Delegado-Geral da Polícia Civil, depois de ser cobrado (em razão das minhas investidas) disse para a mesma não dar bola para os meus projetos, pois era tudo "balela", que era para me deixar falando sozinho que depois eu fosse  embora do seu gabinete...". Magali alfinetou lembrando das minhas palavras na época: "Doutor, assim, nós perdemos um momento precioso durante o governo Pavan (com André Mendes, Maurício, Ademir..., todos amigos do governador e não se aprovou nada). Na época entreguei para Maurício Eskudlark e Ademir Serafim um anteprojeto de "emenda constitucional estadual" criando a "Procuradoria-Geral de Polícia" (segundo Magali, o Delegado Ademir Serafim quando foi cobrado sobre o assunto argumentou que "esse era mais um projeto balela do Felipe”).  Retomei ao caso do Delegado "Ademir Serafim" e lembrei que na época resisti à determinação dos Delegados Aldo e Nilton Andrade de presidir o seu processo disciplinar, chegando a ter que advertir que se insistissem entraria recorreria ao Secretário de Segurança e, em última instância, impetraria um mandado de segurança e iria à imprensa para denunciar as pressões internas... Magali pareceu surpresa com minha revelação, pois desconhecia esses fatos, chegando a dizer: "Meu Deus, vai sobrar mais uma para mim". Na sequência, perguntei para Magali onde andava o Delegado Gilberto Cervi e Silva e ela respondeu que o mesmo conseguiu uma proeza: ser demitido em três processos disciplinares, mas que conseguiu uma liminar na Justiça (a exemplo do Delegado Ademir Serafim), garantindo sua aposentadoria, sendo que naquele momento poderia ser visto trabalhando no Restaurante Farol, em Balneário Camboriú, como uma espécie de relações públicas (usou a expressão "RP"). Na sequência, Magali, devido ao adiantado da hora, passou a tentar localizar o Delegado Colatto que não aparecia (passavam das dezesseis e trinta horas). Magali aproveitou, ainda, para dizer que o Delegado Colatto passava longe do seu gabinete e nunca vinha até sua presença, que ambos nutriam um sentimento mútuo de ódio. Achei aquilo pesado demais e recomendei que para aprovarmos nossa lei orgânica era imprescindível a união de todos, esquecendo quaisquer ressentimentos profissionais ou pessoais. Magali novamente torceu o nariz, deixou soltar uma espécie de grunhido ("Rhummm"). Passados mais uns instantes, finalmente apareceu o Colatto circulando pelo interior da DRP (tomei conhecimento pelas imagens, sob os olhos atentos da Delegada Regional Magali que monitorava todos os seus passos e ao mesmo tempo comentava cada ambiente em que o mesmo adentrava, até chegar no seu destino final (a sala de audiências nos fundos da DRP).

Por volta das dezessete horas e trinta minutos, após encerrar a audiência de ouvida, o Delegado Colatto me indagou querendo saber minha opinião sobre o atual quadro da Polícia Civil e se existiria um futuro para nós diante de tantas adversidades, inclusive, fazendo questão de registrar que tem lido meus artigos na "rede" (PC/Delegados/Lista de Discussão). Resumi tudo, dizendo que a solução talvez fosse uma lei orgânica, mas que para isso precisávamos de muito união de todos, a começar pelos nossos representantes: a cúpula da Polícia Civil, Adepol e Sinpol. Colatto apenas ouviu meus argumentos e me questionou: "Para quando isso, doutor? Desse jeito nós não vamos resistir, prá quando isso?" Respondi que estávamos trabalhando no projeto (olhei para "Carlão" e "Ester" do meu lado e tratei incluí-los na conversa, até porque ambos já tinham se comprometido de estudar e assinar a exposição de motivos). Depois que externei essas informações Colatto deixou aquela impressão com um misto de esperança, mas que "acreditava e desacreditava" em mais essa "novidade". Procurei carrear minhas informações com convicção e o peso da minha história. Argumentei que durante todos esses anos apenas numa única oportunidade os policiais apoiaram a luta dos Delegados, e isso ocorreu quando conquistamos a isonomia salarial com o Ministério Público no ano de 1989. Mencionei que estaria chegando a hora e nós termos um novo momento de união que ocorreria com a cristalização da aspiração histórica com o anteprojeto de lei orgânica, especialmente porque se proporia a contemplar o interesse de todos na Polícia Civil. Aproveitei para concitar Colatto para que participasse desse processo já que tem um irmão que é Deputado Federal pelo PMDB e peça fundamental nesse processo.  Colatto imediatamente se colocou a disposição para o que fosse necessário nessa nossa empreitada. Disse ainda que seria preciso que cada um de nós esquecesse as picuinhas, ódios, raivas, diferenças profissionais e pessoais com os colegas, para que pudéssemos partir juntos para essa luta tão significativa no plano institucional. Colatto, mais uma vez não disse nem que sim e nem que não, apenas ouviu meu relato ao lado dos Delegados "Carlão" e Ester. Deu para perceber que a relação com a Delegada Magali é quase que insustentável, não tem remédio, beirava o impossível qualquer perdão. Já na saída da DRP, ao nos despedirmos, Colatto registrou também suas pérolas: "Não, não, eu passo longe dessa mulher, vocês vão lá falar com ela? Ela é uma f., f., eu estou com dois processos criminais contra ela. Não, eu e ela, nós...não, não tem jeito". Interrompi para dizer: "Meu amigo, se nós não esquecermos essas nossas diferenças pessoais nós nunca vamos chegar a uma união para lutarmos juntos por uma lei orgânica. Sinceramente, desse jeito vamos morrer na praia. Olha, eu tenho diferenças com alguns colegas, mas por exemplo, se eu tivesse que dar um abraço no... para estarmos juntos nessa empreitada, sinceramente, eu passaria uma borracha em tudo porque acima de tudo está nossos interesses institucionais". Antes que eu terminasse a frase "Carlão", na presença de Ester, completou com seus gestos energizados e vibrando a palma da mão direita para o alto: "...Em primeiro lugar a 'instituição', claro, claro!"

Durante a viagem de retorno para Capital, o Delegado "Carlão" continuou  na direção da viatura descaracterizada (Logan/Renault), já que não tínhamos motorista, fato recorrente na Corregedoria e aproveitamos para relembrar um pouco de tudo que vimos e ouvimos no que dizia respeito aos Delegados Magali e Colatto, uma relação que mais parecia entre "Anjos e Demônios" (acabamos dando umas boas risadas, apesar da seriedade dos fatos e suas consequências, especialmente, no que dizia respeito a união de todos para a luta por uma lei orgânica). Lembrei também o artigo que havia publicado sobre a "Acadepol e o representante da OAB nos concursos". "Carlão" avisou que não leu, mas pediu para que eu sustasse minha aposentadoria e aguardasse os ventos das mudanças.  Lembrei que durante a viagem de ida para Balneário Camboriú o Delegado "Carlão" havia mencionado que no dia anterior teve que se segurar para não publicar uma nota na rede quase que chamando o Delegado Fragelli (DRP/Itajaí) de "b.", por ter publicado uma nota sobre "desobediência" na "lista de discussão/Adepol". Fiquei pensando, justamente esse Delegado, cujo nome tinha uma empatia, se bem que quando estava em São João Batista, mas agora que é Delegado Regional de Itajaí ficou a impressão que alguma coisa mudou nele... e não pude deixar de lembrar do que Godoi havia me dito no início daquela tarde no nosso café a respeito do efeito "mosca azul" e pensei: "Será?"

Horário: dezenove horas e trinta e seis minutos, já estava na Corregedoria da Polícia Civil e quando estava fechando minha sala para ir embora a Delegada-Corregedora Sandra Mara também fechou a sua porta e veio ao meu encontro perguntando: "Doutor Felipe, como é que esta a sua aposentadoria, o senhor está acompanhando?" Logo de imediato imaginei que ela deveria ter lido meus dois últimos artigos publicados na data de hoje ou que teria recebido mais um telefonema do Delegado-Geral Nitz "surtando" ou... Respondi (lembrando da minha conversa com a DRP Magali), já no elevador que não estava acompanhando nada e que queria ser "surpreendido". Sandra Mara deixou escapar um sorriso quase que num misto de angelical e sutil que poderia ser...?  Logo pensei: "Realmente querem que eu vá embora? Imagina se eu tivesse dito que havia sustado minha aposentadoria, como recomendou algumas vezes o Delegado "Carlão", sob o pretexto que o comando da SSP e DGPC vão mudar" (?!?).

 Depois disso, voltei meus pensamentos para a conversa que tive com Magali e a chamada de atenção que recebeu o Delegado-Geral por se manifestar em redes sociais, o que reforçou a ideia de me calarem ao formularem "convite", cujo mote seria trabalhar na Delegacia-Geral no anteprojeto de lei orgânica, cujo preço seria o meu silêncio. Valeria a pena?  Sim, dava para entender a saia justa da Corregdora Sandra Mara traduzida em questionamentos, atitudes, censuras, considerações... tudo de forma velada e quase invisível. Lembrei que o Delegado Jeferson que antecedeu Sandra Mara várias vezes foi enérgico comigo quase me proibindo de escrever artigos na rede. Nunca desisti (o Delegado Nilton Andrade quando respondeu pela Corregedoria foi grandioso quanto a isso, pois jamais me fez qualquer questionamento.