HISTÓRIA DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE SANTA CATARINA: ORIGENS HISTÓRICAS E OS NOTÁVEIS ESCRIVÃES DE POLÍCIA (Felipe Genovez)
Por Felipe Genovez | 13/09/2017 | HistóriaI - Escrivães de Paz e Escrivães Especiais como auxiliares dos Delegados de Polícia:
Há que se fazer uma historicização a respeito do cargo de Escrivão de Paz e sua importância tanto em níveis federal e estadual:
a) O cargo de Escrivão de Paz foi instituído a partir do nosso Código de Processo Criminal de Primeira Instância do Império, datado de 1832;
b) Eram auxiliares da autoridade policial. Nesse sentido, dispunha o art. 12, par. 3°., do referido CPP/Império que competia aos Juizes de Paz "obrigar a assinar termo de segurança aos legalmente suspeitos de pretensão de cometer algum crime, podendo cominar nesse caso, assim como aos compreendidos no parágrafo antecedente, multa de (...)".
II - Nos termos do Codex Criminalis o par. 4°., também, do mesmo art. 12 dispunha que competia ao Juiz de Paz (fazia às vezes de autoridade policial até a vigência da Lei 261 , de 3 de dezembro de 1841, que restaurou os cargos de Delegados de Polícia) "proceder a auto de corpo de delito, e formar a culpa aos delinqüentes". Por fim, o par. 5°., estabelecia, ainda, que lhe competia "prender os culpados, ou seja no seu, ou em qualquer outro juízo". Também, lhe competia conceder fiança e julgar contravenções às posturas das Câmaras Municipais e etc.; evidentemente que para poder exercer esse complexo de responsabilidades foi que o legislador daquele ordenamento jurídico passado instituiu o cargo de Escrivão de Paz, cujos titulares eram nomeados pelas respectivas Câmaras Municipais, sob proposta dos Juízes de Paz, dentre as pessoas que, além de bons costumes e maiores de vinte um anos, tivessem prática em processos ou aptidão para adquiri-la facilmente (art. 14). No art. 15, par. 4°., havia disposição expressa de que aos Escrivães de Paz competia "acompanhar os Juízes de Paz nas diligências de seus ofícios"; o referido sistema perdurou até a edição da citada Lei n. 261/ 1841; surge a necessidade de antecipação da maioridade de D. Pedro II, a partir da ascensão dos conservadores ao poder; retoma-se a centralização do poder e, em razão disso, também surge o Regulamento 120, de 31 de janeiro de 1842, que em seu art. 18, dispunha que "cada subdelegado terá um Escrivão (a cujo cargo estará todo o seu expediente), e o número de Inspetores de Quarteirão que admitir o distrito"; segundo dicção do art. 19, "tanto os Escrivães, como os Inspetores de Quarteirão servirão perante os Juízes de Paz, os quais com autorização do Juiz de Direito, poderão ter Escrivães separados, quando os julgarem conveniente, e hajam pessoas que queiram servir esse cargo separadamente"; em termos de nosso Estado as determinações contidas no Código de Processo Criminal do Império foram acatadas em diversas legislações; a grande reforma imperial que veio a ocorrer com a edição da Lei n. 2.033/1871, regulamentada pelo Decreto n. 4.824/1871, trouxe importante inovação quanto aos trabalhos cartorários de natureza policial: o art. 81, desse Decreto Imperial, dispôs expressamente que “os Delegados de Polícia poderão ter Escrivães Especiaes”. Não obstante essa inovação e que pretendia minimizar os serviços prestados pelos Escrivães de Paz, a verdade é que a Lei n. 105, de 19 de agosto de 1891 (primeira legislação que tratava sobre a organização policial no Estado), deixou de contemplar qualquer disposição acerca da criação desses cargos de Escrivães Especiaes.
III - Nesse mesmo sentido, a Lei n. 856, de 19 de outubro de 1910 - e que pode-se dizer constituiu a segunda legislação que prescreveu disposições relativas à organização e estruturação da Polícia Civil no Estado de Santa Catarina -, em seu art. 7°., dispôs que as autoridades policiais tinham como seus auxiliares os escrivães dos juízes de paz. O art. 13, dispôs também que "os escrivães dos juízes de paz servirão perante as autoridades policiais; e nos districtos, em que não houver escrivão de paz, os subdelegados nomearão os seus escrivães". Ainda, no art. 25, foram definidas pela primeira vez em legislação estadual as atribuições desses profissionais. Já o capítulo VI, tratou com exclusividade das atribuições dos ocupantes do referido cargo, denominando-se: "Dos Escrivães da Polícia" e não "Escrivães de Polícia" para caracterizar o cargo, bem como estabeleceu as suas atribuições.
IV - A Lei n. 1.174, de 3 de outubro de 1917 foi a primeira legislação estadual a tratar dos Escrivães de Polícia Especiais. Nos termos do seu art. 6°, dispunha que "a recusa dos escrivães de paz dos districtos das sedes da comarcas, como substitutos dos escrivães do crime, quando estes forem legalmente impedidos, e dos escrivães dos demais districtos de servirem com as autoridades policiais nos autos de corpo de delito e demais actos de competência destas, que não seja fundada em causa legal, suspeição ou incompatibilidade alleada e jurada será punida com multa de cinqüenta mil réis e o dobro na reincidência". O artigo 8°., da supramencionada Lei, estabeleceu que "os escrivães de paz, quando servirem sem interrupção, como escrivães do crime nas delegacias e sub-delegacias policiais receberão mensalmente e mediante attestado da respectiva autoridade policial, a título de verba para expediente: nos districtos sedes de comarca 10$000. Nos demais districtos 6$000. Parágrafo único. Nas comarcas em que houver escrivão privativo do crime, excepto na da Capital, caberá a este a verba assim estipulada".
V - A Lei n. 1.297, de 16 de setembro de 1919, em seu artigo 1°., inciso VII, determinou que “junto a cada uma das Delegacias Auxiliar (nossa atual Delegacia-Geral) e da 1a Região, funcionaria um Escrivão (surge então os primeiros cargos de Escrivães Especiais), remunerados pelos cofres do Estado, de acordo com o que for fixado pela lei orçamentária”. O inciso VIII, do mesmo artigo, seguindo ainda a herança do Brasil colônia (época da vigência das Ordenações do Reino) dispôs que "o cargo de escrivão da polícia, nas sedes das comarcas passará a ser exercido pelo respectivo escrivão de paz".
"Escrivães/PC-II": Werner Pabst
Escrivães/PC: A Origem - II
I - Para se compreender o assunto, ilustrar a primeira parte do nosso artigo e melhor se entender a História da carreira de Escrivães de Polícia, apresento algumas informações sobre a trajetória profissional do policial civil aposentado Werner Pabst:
a) Na Década de Quarenta, em nossa unidade federativa, especialmente no interior do Estado, os Escrivães eram nomeados, de acordo com o art. 169, do Decreto-Lei n. 431, de 19 de março de 1940, para exercer vitaliciamente o cargo de Escrivão de Paz do distrito sede, no município e comarca de Indaial. Como já mencionado anteriormente, desde a época do Brasil Colônia (período de vigência das Ordenações Filipinas) e no período do Brasil Império que os Escrivães das Câmaras e mais tarde Escrivães de Paz (Código de Processo Criminal/1832), participavam ativamente dos serviços policiais.
b) No Estado de Santa Catarina, já no início do Século XX, esses Escrivães de Paz tinham como principal atribuição, quando devidamente designados pela autoridade competente, exercer encargos da respectiva escrivania junto à repartição policial existente, haja vista a inexistência de titular para exercer essa função (não havia interesse de se nomear Escrivães Especiais para atuar nas Delegacias de Polícia, isso apesar da vigência - no âmbito Federal, da Lei n. 2.033/1871, regulamentada pelo Decreto n. 4.824/1871 e, no nosso Estado, das Leis ns. 1.174, de 3 de outubro de 1917 e 1.297, de 16 de setembro de 1919) e, segundo, porque assim era a determinação contida na legislação vigente à época. Nesse caso, não tinham direito a vencimentos pagos pelos cofres públicos, contando, apenas, com o direito à percepção de custas cobradas das partes.
c) Com a reestruturação da Secretaria de Segurança Pública (década de sessenta por meio da Lei n. 3.427, de 9 de maio de 1964) e a conseqüente desanexação das escrivanias de paz (para as quais esses serventuários eram nomeados originariamente, pois, poderiam ser afastados em vista do direito de opção que lhes era facultado exercer, muitos desses profissionais acabaram por ser confirmados nas funções policiais civis, passando a ser providos nos cargos de Escrivão de Polícia. A partir dessa medida, tiveram editados novos atos de nomeação - de acordo com o art. 13, II, da Lei n. 198, de 18 de dezembro de 1954 (antigo Estatuto dos Funcionários Públicos do Estado). Essa medida teve amparo nos parágrafos 1° e 2°, do artigo 56, da Lei n. 3.427/64 que dispôs que em caso de opção, passariam a exercer as funções exclusivas de Escrivão de Polícia, padrão I-23, do Quadro Geral do Poder Executivo.
d) Esses novos servidores (ex-Escrivães de Paz) permaneceram no exercício de suas funções, geralmente, na mesma Delegacia de Polícia a que já estavam vinculados anteriormente. Para se entender melhor as transformações por que passou a carreira de Escrivão de Polícia, aproveito para fazer um breve relato a respeito do caso concreto envolvendo Werner Pabst, com quem tive o privilégio de realizar entrevista no ano de 1996 em sua residência na cidade de Indaial (apesar de sua idade avançada). Segundo o entrevistado e como consequência do cotejamento dos documentos que me apresentou, em 29 de dezembro de 1976, por Ato n. 3.621, de acordo com o artigo 14, da Lei n. 5.267, de 21 de outubro de 1976 (primeiro Estatuto da Polícia Civil), Werner Pabst foi enquadrado, por transposição, com fundamento no art. 8°., da Lei n. 5.266, de 21 de outubro de 1976, do cargo de Escrivão de Polícia de 1a. Classe, padrão PF-17, do Quadro Geral do Poder Executivo, código PC-ANM-9D, do Subgrupo: Atividades de Nível Médio, do Grupo: Polícia Civil, criado pelo art. 7°., anexo II, da referida Lei. Finalmente, em 1º de março de 1977, foi aposentado de acordo com a Portaria n. 0154/77/SEA, com proventos da Lei. Durante todo o período em que exerceu suas funções junto à escrivania, a partir de sua investidura originária ocorrida no início da década de quarenta (Escrivão de Paz), já havia sido designado também para prestar serviços no cartório da Delegacia de Polícia de Indaial, sob pena de sofrer sanções disciplinares.
II - A carreira de Escrivão de Polícia ainda sofreu alterações por meio das Leis ns. 4.265/69 (instituiu classes/padrões) e 5.266/76. Também, foi reclassificada por meio das LCs 55/92 (passou a exigir nível superior para ingresso) e 453/2009.
III - Dentre os Escrivães que mais se destacaram na carreira ou na vida pública podemos citar:
a) Luiz Henrique da Silveira (Escrivão de Polícia das Delegacias de Segurança Pessoal, Furtos e Roubos e Dops - político influente do Partido do PMDB; exerceu vários mandados em níveis municipal, estadual e federal, além disso foi Ministro de Estado);
b) Jair Silveira (Escrivão de Polícia na região de Xanxerê do Partido do PP - foi deputado estadual duas legislaturas e teve papel importante na aprovação de emendas às LCs 55/92 e 93/98);
c) Livadário da Nóbrega (Escrivão de Polícia em Joinville - militante da Ação Integralista Brasileira - AIB, chegou a ser preso na Década de Trinta e foi deputado estadual pelo PRP nas décadas de cinquenta/sessenta).