HISTÓRIA DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE SANTA CATARINA: “O Duelo entre dos Delegados” - Republicanos (Hercílio Luz) e Federalistas (Elesbão Pinto da Luz) (Felipe Genovez)

Por Felipe Genovez | 04/09/2017 | História

HISTÓRIA DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE SANTA CATARINA: “O Duelo entre dos Delegados”

A Capital do Estado de Santa Catarina  (Florianópolis) tem se constituído um dos destinos naturais de pessoas que buscam um lugar melhor para viver, trabalhar ou se divertir.  Dentro dessa perspectiva, julgamos importante que conheçam um pouco da nossa gente, a começar por algumas considerações históricas para que possam conhecer e refletir melhor sobre um assunto tão relevante e recorrente nos nossos meios sociais e políticos, cuja gênese principal  teve a cidade de Blumenau como cenário de disputas nos campos político e policial no adiantado da segunda metade do século XIX, em razão de  “duelos entre dois Delegados” (Hercílio Luz e Elesbão Pinto da Luz) que se rivalizavam numa relação de amor e ódio, julgada ao longo dos tempos pelos olhares dos “vencedores” republicanos (nunca dos vencidos).

Primeiramente, para se entender um pouco as nossas origens, tudo começa com o   navegador veneziano (a serviço da Espanha) Sebastião Caboto, que esteve por aqui  por volta de  25 de novembro 1526, data em que foi martirizada  "Catarina de Alexandria" (e também porque seu cônjuge se chamava "Catarina Medrano"),  razão porque resolveu dar o nome do lugar como "Ilha de Santa Catarina”.

Depois disso, surgiu o nome "Nossa Senhora do Desterro" que nos foi trazido pelo bandeirante Francisco Dias Velho (1622-1687) que fixou residência com sua família (e escravos), e acabou vitimado por piratas.

No Império a Capital mudou de nome e passou a se chamar apenas "Desterro", o que lhe valeu muitas críticas não só pela referência a um lugar de "abandono", mas também pelo aspecto negativo que a parte insular oferecia aos navegadores em razão da vista do "cemitério" que praticamente beijava as águas que divisava o "Y-Jurerê Mirim" (local onde está situada a "ponte velha" e nome utilizado pelos autóctones). O nome "Desterro" era objeto de críticas e havia um movimento quase que insipiente para alterar esse nome. Intelectuais "barrigas-verdes" do final do Século XIX iniciaram um movimento para mudar esse nome, de sorte que surgiram propostas, tais como: "Ondina, Ilhópolis, dentre outros".

 A “Revolução Federalista” (1893/1894) que desaguou nas terras catarinenses e gaúchas, teve como causa maior outro duelo de proporções bem mais complexas pelo poder nacional pós “monarquia”: Exército x Marinha. O epicentro desses acontecimentos foi o Rio Grande do Sul (sob a direção de Júlio de Castilhos, que se notabilizou implacável no combate aos federalistas, ao contrário de  Santa Catarina, cujas lideranças políticas locais aderiram ao novo governo fugido do Rio de Janeiro (Capital da República), instalando na nossa “Desterro” a sede provisória do governo revolucionário, formando uma “aliança” de conveniências, rendição velada ou sedução ideológica.

Acredito piamente que o Marechal Floriano, chamado pelos simpatizantes de “Marechal de Ferro” e “Consolidador da República” (em decorrência do “Encilhamento” e da “Revolta da Armada”) soube muito bem aplicar  "Maquiavel" ao mandar um "sanguinário" com as "qualidades" do Coronel Moreira Cesar para as terras que bem antes os índios “Carijós” denominavam carinhosamente de "Meiembipe". Isso trouxe invariavelmente consequências sem precedentes para nossa gente/história.

Os historiadores, em especial, “Hercilistas” de carteirinhas ou condescendentes com os “métodos republicanos”, apropriaram-se rapidamente do discurso da caserna, de maneira a assegurar ao “mecenato” que representavam   um “passaport”  para que  se mantivessem   no poder político e econômico como legítimos representantes da “Velha República” (leia-se: dos interesses dos Estados de São Paulo e Minas Gerais). Dessa  maneira  procuraram de diversas formas relativizar os acontecimentos, contextualizar a época, reduzir as conseqüências terríveis das práticas (delações, devassas, calúnias, infâmias...), considerando que “os fins  justificavam os meios ”, a ponto de se comparar que  Hercílio Luz teria sido o Júlio de Castilhos de Santa Catarina, caso o seu Governo de Julho de 1893 tivesse sido mantido.

Aproveitando o momento, a Lei 111/1894 (período pós- Cel. Moreira Cesar, morto na Guerra de Canudos), sancionada pelo Governador Hercílio Luz (fervoroso republicano e "florianista"), a exemplo de Gustavo Richard (Presidente do Partido Republicano, duas vezes governador) e Elizeu Guilherme da Silva (parlamentar "republicanista" e Presidente da Assembleia Legislativa Catarinense) se constituiu a expressão máxima de devoção ao governo militar republicano quando mudou o nome de “Desterro” para “Florianópolis” (aprovada por unanimidade pelos parlamentares na nossa Assembleia Legislativa).

Quanto à "lista negra" entregue ao Coronel Moreira Cesar (não conhecia quase nada da terra e seus habitantes, exceto pelos relatos de alguns políticos mais próximos como Elizeu Guilherme  e teve que beber nas fontes locais) contendo os 185 nomes dos simpatizantes do "Federalismo" (que defendiam o fortalecimento dos Estados, alguns ligados à monarquia, como nosso "Barão do Batovi") e se antagonizavam aos "Republicanos" (defendiam a centralização do poder, daí o surgimento da política dos governadores inaugurada por Campos Salles) e da República  do “Café com Leite" (legado republicano defendido aqui no Estado, em especial, por figuras como Lauro Muller, Hercílio Luz, Gustavo Richard, Vidal Ramos, Felipe Schmidt e Adolpho Konder).

Os embates entre dois concunhados, primos irmãos e "Delegados": Hercílio Luz (Delegados de Terras, representando o governo Federal - republicano) e Elesbão Pinto da Luz (Delegado de Polícia - eleito Deputado Estadual - "federalista), ambos residindo na cidade de Blumenau, cujas desavenças poderiam ser traduzidas  como épicas  para a época , chegando a agressões físicas, morais e prisão.

Fácil se intuir, a exemplo do Barão do Batovi ("herói" da Guerra do Paraguai) e outras personalidades ilustres de nossa Capital, quem entregou o nome de Elesbão e de tantos outros para que o Coronel Moreira Cesar mandasse fuzilá-lo em Anhatomirim (abril/1894)?

O certo que de "ideologia" pouco relevância permeou os acontecimentos, e  o que mais talvez tenha vicejado  foram os “egos” de dois parentes próximos que estiveram nos seus casamentos e se deram presentes reciprocamente, os "ódios" urdidos entre ambos, tendo como justificativas a aderência a doutrinas políticas importadas e de interesses escusos quer por parte dos "republicanos" quer por parte dos  “federalistas” (e monarquistas), sob vários pretextos, sem se desconsiderar os ventos das mudanças e as novas oportunidades de se ascender ao poder (aplicando-se o método fiorentino ensinado aos "Médici").

A imprensa na época era limitada e controlada e soube muito bem servir ao poder. Não tomou partido de nada, não se posicionou e, tampouco, divulgou lista alguma sobre os preso. Não se escreveu uma linha  sobre o fato do  Marechal Floriano Peixoto (nascido no Estado de Alagoas), ter jamais pisou nestas terras que lhe concedeu tamanha homenagem, bem diferente do tratamento dispensado por “Castilhistas” (“Pica-Paus”) no Rio Grande do Sul que foram também implacáveis contra os “Maragatos” (liderados por Gumercindo Saraiva).

Perguntas que não querem calar: "Por que 'manezinhos' provincianos de um Estado inexpressivo e distante quiseram homenagear um Presidente que se impôs no poder desafiando a própria Constituição/1891 (deveria ter convocado eleições frente a prematura renúncia de Deodoro) aplicando o que ficou  conhecido como "República das Espadas" (1889-1894), em cuja época mandou apagar à bala pessoas da sociedade catarinense em nome de um governo militar ditatorial e truculento (Floriano não conseguiu eleger seu sucessor, tendo que “engolir” “Prudente de Moraes”?" Mais, ainda, o que o Estado ganhou com isso (diferente dos nossos vizinhos que segundo consta não fizeram homenagem alguma ao “Marechal de Ferro”? Seriam eles os senhores da Velha República no nosso Estado, cujo projeto era exclusivamente pessoal e de busca pelo poder a qualquer preço e custo?

Desse breve histórico, acredito que após uma ampla discussão com a sociedade, um plebiscito estadual deva ser realizado, primeiramente para confirmação ou não da sede da Capital onde está situada e, também, para votação/escolha dos seguintes nomes (dentre outros que surgirem): "Meiempibe" (homenagem aos Carijós), "Ilha de Santa Catarina" (homenagem à fantástica Santa  Catarina de Alexandria), "Batovi" (homenagem aos mortos em Anhatomirim e que amavam esta terra e ao próprio Marechal Manoel de Almeida Lobo Gama D'Eça e seu filho Alfredo, ambos fuzilados no mesmo ato) e, também,  "Floripês" (homenagem às flores e à natureza).

Por derradeiro, penso  que nossos Delegados (e todos os policiais civis) poderiam se engajar nessa missão e contribuírem para  essa proposta  tão relevante  e de interesse  da nossa sociedade, a começar porque  também somos partes ativas do processo histórico.