HISTÓRIA DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DE SANTA CATARINA: A PROPOSTA DE UNIFICAÇÃO DAS POLÍCIAS DO DEPUTADO HEITOR SCHÉ – 2002 (Felipe Genovez)
Por Felipe Genovez | 16/10/2017 | HistóriaDa nossa luta desde a década de oitenta em defesa de um projeto nacional de unificação dos comandos das polícias nas unidades federativas (reforma constitucional), também, resultado das propostas do Partido dos Trabalhadores prestes a assumir a Presidência da República (Presidente “Lula”), tivemos como resultante numa grande “sacada” política do Deputado Heitor Sché que deixou a impressão de ter incorporado essa ideia em termos de discurso para o novo milênio (muito embora sem falar em unificação dos comandos das Polícias Civil e Militar, tampouco, mencionou o fim do órgão político encarnado por meio da “Secretaria de Segurança Pública e, no seu lugar, a criação da Procuradoria-Geral de Polícia nos Estado e, também, o segundo grau nas carreiras de Delegado de Polícia e Oficiais da PM, conforme vínhamos professando há décadas):
I – Um encontro com o Comissário Samuel:
Dia 23.4.2002, por volta de vinte horas e trinta minutos, estava de saída da Delegacia-Geral da Polícia Civil (funcionava na Av. Osmar Cunha – Centro de Florianópolis, onde hoje está localizada a 1ª DP da Capital), em cuja ocasião encontrei o Comissário Samuel que estava no plantão e interrompeu minha saída. O assunto era o futuro da Federação Catarinense dos Policiais Civis – Fecapoc (atualmente denominada de “Assesp”), a fusão com o sindicato (Sinpol), o patrimônio do Clube dos Policiais Civis (com sede no Balneário do Campeche - Florianópolis). Dei minha opinião, deixei um “jornalzinho” antigo da Acapoc (Associação Catarinense dos Policiais Civis, depois Fecapoc). A conversa acabou se alongando e Samuel argumentou que no dia anterior teve um encontro com o Deputado Heitor Sché, tendo o parlamentar dito ao pessoal que defendia a integração das polícias Civil e Militar. No entanto, como agora a unificação era irreversível, Sché teria dito que passou a defender a unificação. Samuel falou do projeto da Deputada Federal (SP) Zulaê Cobra , que estava assistindo os debates na TV a Cabo e a segurança pública era assunto de quase todo dia. Externei minha opinião, o porquê de ser contra a unificação das duas polícias. Citei como exemplo um “tubarão e um peixinho”. Samuel argumentou que não seria mais assim, pois a Deputada Zulaê estava defendendo a Polícia Civil e que ninguém mais no país queria saber de militarismo, tendo a parlamentar deixado bastante claro seu posicionamento, que seria ruim para a PM o referido projeto de unificação... Novamente me mostrei cético, argumentando que era muito “blá blá blá”, tudo era só para iludir, enganar a população e os policiais... Depois disso, Samuel começou a demonstrar certa cautela, dando a impressão que se mostrava mais permeável aos meus argumentos. Citei o caso da Guarda Civil de São Paulo que no início da década de setenta foi absorvida pela Polícia Militar, e que depois os militares de carreira não deixaram nenhum oficial egresso da antiga corporação assumir postos de comando. Argumentei que poderia acontecer o mesmo com os policiais civis, já que os militares são em maior número e ninguém poderá apagar a doutrina hierárquica que receberam nas suas fileiras, não conseguiriam se libertar da lavragem cerebral, tudo levando a crer que muito provavelmente iriam sabotar os policiais civis, dentro de uma perspectiva que não dava para misturar água e o vinho. Samuel pareceu ficar sem argumentos e insistiu que num dos programas apresentados pela TV Câmara/Senado a Policia Catarinense, juntamente com a de Minas Gerais e Rio Grande do Sul eram as que estavam com maiores condições de iniciar imediatamente o processo de unificação, sem ter esperar os oito anos previsto na proposta. Argumentei que era natural naquele ano de eleições o Deputado Heitor Sché assumir novos discursos, levantar uma nova bandeira para se fazer presente na mídia, mostrar serviço, chegar aos policiais... Perguntei ainda para Samuel por que o Escrivão Nilton Sché havia deixado o gabinete do parlamentar (seu tio). A resposta que obtive foi que tudo indicava que foi por causa da “turca” que seria uma pessoa muito difícil. Samuel relatou que o Deputado Heitor Sché viajava pelo interior e levava consigo seu sobrinho Nilton Sché, e ela controlava o esposo o tempo todo, razão porque Heitor Sché desabafou que daquele jeito não dava mais, acabaram discutindo e Heitor mandou que Nilton então se apresentasse.
Dia 8.7.2002, por volta de dez horas e trinta minutos o Delegado Lauro Cesar Radke Braga chegou na “Assistência Jurídica” da Delegacia-Geral e me perguntou sobre as novidades. Então respondi: “Eu estava passando ontem de manhã, imagina um domingo, oito e trinta da manhã, chovendo e resolvi ir até o Makro (Supermercado varegista/Capoeiras). Aproveitei para dar uma passada em frente ao diretório do Heitor Sché lá em Capoeiras, rapaz, não é que estava aberto. Estava funcionando. Sabe quem é que estava lá? O Samuel. Vi o carro dele estacionado na frente do comitê”. Braga então faz algumas colocações: “O quê? Tu não conheces o Samuel? O Heitor teve uma sorte muito grande. Ele até pode não ser um bom policial. Os Delegados têm alguma resistência contra ele, mas polticamente é muito bom. Se marcar alguma coisa para ele resolver lá em Joaçaba de manhã ele pega o carro se manda e às nove horas da manhã ele já telefona dizendo que está tudo resolvido. O Heitor teve muito sorte de pegar ele o Valcir (Comissário Valcir Mangrich). Dizem que eles recebem alguma coisa lá do gabinete do Heitor. Parece que é um auxílio, prece que é auxílio a alimentação, não sei direito, acho que é vale-refeição, é isso. Eles recebem lá do gabinete do Heitor vale refeição, é por isso...”. Enquanto Braga fazia seu rerlato acabei lembrando do que Beto Helfenstein (servidor em licença médica da Assembléia Legislativa) havia me dito no dia anterior na sua residência: “Que os deputados na Assembléia Legislativa fazem trocas entre si, isto é, um deputado assume os fantasmas do gabinete do outro, só que esses servidores que recebem sem trabalhar acabam perdendo o 'vale refeição' que na Assembléia Legislativa é de quatrocentos e oitenta reais, cujo valor o Deputado dá para quem ele quiser". Enquanto Braga fazia o seu relato eu insistia em lembrar do conteúdo daquela conversa com Beto que dizia estar enojado e doente de tanta sujeira, a quem eu aconselhei a não ser mais fantasma, enquanto o Delegado Braga continua falando das qualidades do Comissário Samuel. De qualquer maneira Braga não deu muita certeza a respeito do que havia acabado de revelar e eu também não tinha certeza de que Samuel e Valcir estavam num esquema politiqueiro. Perguntei para Braga: “É difícil acerditar que o Samuel trabalhe para o Heitor Sché só por idealismo”. Braga argumentou: “O Samuel é pegador. Ele está afastado só para trabalhar para o Heitor”. Argumentei: “Falando nisso, Braga, o Maurício Eskudlark foi exonerado do cargo comissionado?” Braga respondeu: “Sim, o Paulo Koerich foi nomeado no lugar dele. Eu não entendo como é que esse pessoal se licenciou seis meses antes das eleições. Não é três meses antes? O Zachi (Delegado Nazareno Zachi, candidato a Deputado Federal) se licenciou agora. Por que esse pessoal se licenciou seis meses antes?” Fiquei também sem resposta e intrigado. Braga encerrou seu assunto com um lamento sobre as fotos integralistas que perdeu quando trabalhava no Dops: “Meu Deus, como eu me arrependo de não ter escondido aquelas fotos. Imagina, estava tudo lá jogado num canto. Eu peguei e separei um monte de fotos do período integralista e depois elas sumiram. Tem um cara aí que está escrevendo um livro sobre a Revolução de Trinta...”. Acabei encerrando o assunto, dizendo: “É, lamentavelmente somos uma polícia que não cuida da nosso história, assim que o pessoal trata os nossos documentos históricos. Ô Braga soubstes que saiu a Medida Provisória dos Procuradores? ” Braga ficou surpreso, pareceu que estava ali uma grande novidade, pois ela havia comentado que alguém tinha pedido vistas do projeto na Assembléia...
Dia 26.11.2002, por volta de dezenove horas estava saindo da Delegacia-Geral e encontrei o Comissário Samuel de plantão na portaria. Desde segunda-feira queria conversar com ele e saber das novidades, pois havia sido um fiel cabo eleitoral de Heitor Sché, tendo gozado férias antes das eleições só para trabalhar na sua campanha. Parei na portaria da Delegacia-Geral para uma conversa que acabou não sendo rápida como havia previsto. Samuel começou a falar tudo o que tinha direito e me surpreendeu com uma pérola: “Eu votei no Luiz Henrique. O nosso grupo se reuniu e perguntou para o Heitor se o Amin fosse eleito governador se ele seria Secretário da Segurança e ele respondeu lá no jantar no meu Cantinho (restaurante "Meu Cantinho" -Bairro Kobrasol - São José - SC): 'Olha pessoal vocês sabem que eu sou franco. Vocês são meus amigos, eu não vou ser Secretário da Segurança. Vocês não precisam votar no Amin no segundo turno'. O senhor pensa que o Heitor trabalhou para o Amin no segundo turno? Não trabalhou coisa nenhuma”. Fiquei curioso e perguntei: “Mas Samuel eu vi atrás da edícula do Heitor Sché (quando estive na residência do mesmo dias antes) a propaganda bem grande do Amin no segundo turno”. Samuel não soube responder e engoliu em seco, aproveitando para comentar que Heitor Sché estava com sessenta e nove anos e que pensava ainda em futuramente voltar a cena política e espera contar com o pessoal...
“Crise – Será hoje, às 13h30, no plenário da Assembleia, a audiência pública de líderes classistas e representantes das Polícias Militar e Civil, para tratar da crise salarial e do aumento da violência no Estado. O cenário de insatisfação é mais grave na Polícia Militar. O pedido da audiência foi feito pelo deputado Heitor Sché” (A Notícia, Moacir Pereira, 27.11.00). “(in)Segurança – O ex-secretário de Segurança Heitor Sché (PFL) arrolou ontem três causas de aumento da criminalidade em Santa Catarina: 1. Duplo comando na estrutura da segurança. A Polícia Civil é subordinada ao secretário de Segurança e a Polícia Militar, vinculada ao gabinete do governador; 2, Falta de uma política salarial; 3. Colocar mais quadros no policiamento ostensivo para aumentar a política de prevenção” (A Notícia, Moacir Pereira, 28.11.2000).
Heitor Sché – ao que tudo indica já desistiu de mais uma (pretendia ser candidato a Deputado Federal, preparando o discurso da "unificação" das polícias) – procurou estar em evidência (e conseguiu...), agora parte para outra tentativa voltada a sua reeleição para a Assembleia (e parece que volta as suas verdadeiras raízes). Dia 4.9.2001, por volta de quinze e trinta horas o Delegado Lauro Cesar Radke Braga chega na “Assistência Jurídica" da Delegacia-Geral da Polícia Civil e traz a última novidade que estava circulando: “Não sei se tu já estais sabendo, o Heitor não é mais candidato, já é oficial, o Mário (Delegado Mário Martins, Presidente da Adepol-SC) inclusive falou com ele, agora é oficial, ele desistiu, vai ficar como Deputado Estadual, acho que ele percebeu que não tem a menor condição, quem é que vai trabalhar para ele, o Valcir (Comissário Valcir Mangrich), eu duvido, da outra vez ele somou mais de seis mil votos aqui na grande Florianópolis, agora eu quero ver se ele faz mil e quinhentos votos. Eu tenho dito que acho que ele não sai mais candidato a nada, só quero ver como é que vai ficar a situação do Maurício (Delegado Maurício Eskudlark, atual Deputado Estadual), dizem que ele já brigou com o Heitor...” afirmou Braga.
Antes disso tudo, o discurso da "unificação" e o sonho de concorrer a Deputado Federal:
“O Chefe – O deputado Heitor Sché, que é governista, tem ido à tribuna da Assembleia Legislativa com tanto regularidade, normalmente só para criticar o atual comando da polícia estadual, que só falta dizer que com ele lá tudo vai se resolver como um passe de mágica. Exprime isso com uma invejável autoconfiança. Experiência não lhe falta. Além de delegado, já foi o maior manda-chuva na área da segurança pública do Estado” (A Notícia – Antonio Neves – Alça de Mira, 29.11.2000).
Unificação – O reinício dos trabalhos legislativos foi marcado por pronunciamento do deputado Heitor Sché (PFL), que questionou a legitimidade dos comandantes das Polícias Militares de se oporem à unificação com a Polícia Civil. Mostrou que um dos problemas da insegurança crescente no Estado decorre da redução dos efetivos policiais nos últimos 20 anos” (A Notícia, Moacir Pereira, 2.8.2001).
“Segurança – Enquanto o governo FHC lança um pacote visando a segurança nos estados o deputado Heitor Sché apresenta um relatório de realizações e propostas para o setor, considerado por ele, que ocupou a Secretaria de Segurança Pública, uma prestação de contas. Lembra que pouco vem sendo feito de alguns anos para cá, onde a população triplicou, e o atendimento se mantém estagnado. Em tempo: o governador, que defende a unificação das polícias assinou em Brasília um convênio de R$ 14,9 milhões para a segurança pública, enquanto que em Florianópolis PMs distribuíam panfletos com reivindicações” (DC, Paulo Alceu, 9.8.2001).
“Unificação - O deputado Heitor Sché (PFL) volta a insistir na tese que tem marcado sua atuação: a unificação das polícias Civil e Militar. A Assembleia está apelando ao senador Jorge Bornhausen para que apoie projeto nesse sentido em tramitação no Congresso. ‘Sem a unificação não se mudará a crise instalada na segurança pública do País e também de Santa Catarina’, diz Sché” (A Notícia, Moacir Pereira, 19.2.2002).
“Unificação 1 - A tese é antiga e está gestando nos escaninhos do Congresso, em Brasília. Unir as polícias Civil e Militar para combater a criminalidade no País é tema que há muito tempo é tido como solução para efetivo combate aos criminosos. Agora, o deputado Heitor Sché (PFL) acaba de apresentar requerimento solicitando o envio de mensagem ao senador Jorge Bornhausen (PFL/SC), pedindo que o mesmo apoie o projeto de lei que prevê a unificação das polícias Civil e Militar, que se encontra em tramitação no Congresso Nacional. Unificação 2 - Enfatizou o parlamentar, que é delegado de policia aposentado e já foi secretário de Segurança Pública do Estado e por isso sabe o que fala. É bom lembrar que a Polícia Militar resiste à fusão com a Civil em Santa Catarina, e não admite ser comandada pelo secretário da Segurança Pública, Antenor Chinato, e no organograma administrativo o comando da PM está diretamente subordinado ao governador do Estado, Esperidião Amin” (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 20.2.2002).