Hipostasia do simulacro, verossimilhança e estética da fragmentação no noticiário
Por FELLIPE KNOPP | 27/05/2010 | SociedadePrefácio
Uma das propostas fundamentais de nosso trabalho teórico em cuja forma e modo próprio de discussão se apresenta como um ensaio filosófico é sinalizar determinadas direções de desdobramento de um tema recorrentemente aludido por diversas literaturas qual conjuntáramos sob a insígnia do "discurso sobre a representação". Representação como forma culminante de produção social de trabalho morto, representação em sua forma mais proeminente que transborda as arestas do campo artístico em sua techné e se propaga por diversos segmentos da vida contemporânea. Walter Benjamin e seus colegas da Escola de Frankfurt, como Adorno e Horkheimer, começam o trabalho de realizar um inventário crítico da cultura industrial do ocidente da primeira metade do Século XX.
A forma mais otimizada da reprodução técnica ainda estaria por vir na segunda metade do século: a duplicação de idênticos numa logística capciosa se irradia para a esfera da vida comum, lado a lado se apresentam representação e realidade de modo indistinguível no nível da forma e do conteúdo, mas sobremaneira do modo - um espetáculo da aparência para qual a apropriação real da vida se mostra fadada a uma repulsa generalizada mediante os apelos hipnóticos do reino global da falsificação sem limites - esse é o status do ethos denunciado por Guy Debord de A sociedade do espetáculo. Em conformidade com a "escolha já feita na [origem da] produção" (DEBORD: op.cit.). Era o preâmbulo de uma mudança qualitativa da ordem social que se mostraria ainda mais ob-nublar.
Uma vez que a produção e decorrentemente o modus vivendi contemporâneo se sustentam sobre a "incessante renovação tecnológica" (ibid.), o aperfeiçoamento das técnicas da reprodução atingem seu ponto fundamental como também o cerne da vida social: chegamos à era da eminência do código, ao que atesta Jean Baudrillard em toda sua vasta literatura sobre a construção e dominância dos simulacros até seu atual estágio, desde A troca simbólica e a morte até ao celebrado Simulacros e simulação, em que o autor retoma mais detidamente as discussões iniciadas naquele trabalho, mas prenunciadas já em O sistema dos objetos, em seu capítulo denominado "modelos e séries".
Simulação e hiperrealidade, operação realizada pela codificação de cada fator, manipulação interna da lei composicional de uma dada relação, função combinatória dos elementos fundamentais da vida, genoma, seja ele animal, robótico, imagético ou social. Esse é o fundamento, a estrutura nuclear de produção das coisas na atualidade cuja reversão opera também sobre a linguagem a cuja lógica se iguala: identidades plenas, singularidades anuladas pela indiferença elementar, elisão do referente real, manipulação simbólica na "magia do código" (id.).
No trabalho que se verá adiante encontra-se a síntese seleta dos elementos teóricos designados acima, alguns modos particulares em que comparecem e operam na construção do discurso midiático cuja ideologia é sustentada pela função da mensagem jornalística, a perfeita identificação imaginária da sociedade dita ”pós-ideológica”, pós-moderna ou performática - no sentido mais estrito que esse(s) termo(s) possa(m) designar.