Governo Eletrônico: Realidade Ou Promessa?
Por Leonardo José Andriolo | 26/10/2008 | PolíticaA utilização da Internet e de outros instrumentos da Tecnologia de Informação mudou a forma como as empresas são gerenciadas e como os negócios são realizados. Ao permitir a comunicação instantânea entre quaisquer pontos do planeta, sem limites de distância ou de fronteiras, a Internet faz com que o mundo seja visto como uma aldeia global.
Nesse amplo processo de mudanças, também foram criadas novas condições de relacionamento entre o cidadão e o Estado. A esse tipo de transações se deu o nome de e-government, governo eletrônico, que significa a utilização da Internet para permitir o acesso a informações e serviços oferecidos pelos governos. O seu processo básico consiste na informatização das atividades internas e na comunicação com o público externo através de portais governamentais na Internet.
A dimensão mais imediata e visível da informatização do serviço público é o acesso a informações, como legislação, dados estatísticos, decisões administrativas e judiciais. Já se tornou prática comum a solicitação de serviços através dos portais, o que evita que o interessado tenha que se deslocar até as repartições para obter um documento, uma segunda via, ou uma permissão. Essa dimensão do governo eletrônico pode ser definida como uma modalidade em que o órgão governamental disponibiliza o serviço ou produto, e o cidadão tem a possibilidade de adquirir ou utilizar esse produto ou serviço.
Os sistemas de compras dos governos também estão se reformulando nesse novo cenário, com a utilização cada vez maior da modalidade de licitação por pregão eletrônico, ampliando a competitividade e a transparência do processo.
Para Pinho, Iglesias e Souza(1), o avanço da tecnologia também aumenta a gama de possibilidades de interação e participação entre governo e sociedade e permite aumentar a transparência dos atos dos governos. Eles observam, contudo, que não basta a tecnologia oferecer esses recursos, se não houver disposição política para implantar os canais de participação popular e transparência.
Esses autores analisaram 09 portais de governos estaduais e mais o do Distrito Federal, observando que, de uma forma geral, os recursos tecnológicos utilizados são adequados e a navegação e o acesso às informações ocorre em boas condições. A partir dessa análise, concluem que a tecnologia disponível não parece representar uma dificuldade. No entanto, a principal conclusão da pesquisa foi a falta de interatividade, visto que o governo assume o papel de emissor e a sociedade limita-se a ser um receptor passivo. Ainda conforme o estudo, não foi verificada "transparência e diálogo aberto com o público", o que significa que o governo eletrônico não está contribuindo para ampliar o provimento democrático de informações. O problema não está na tecnologia, mas sim na cultura política, pois os recursos tecnológicos que poderiam ser usados para o aperfeiçoamento democrático não são mobilizados nesse sentido. Em outras palavras, a tecnologia não faz milagres, ela apenas vai reproduzir os processos, as práticas e os objetivos reais de cada organização.
Outro desafio para que o governo eletrônico se torne efetivo é a chamada inclusão digital, ou seja, a universalização do acesso à Internet. Ampliar o número de pessoas que utilizem a Internet é uma necessidade para permitir que mais cidadãos possam obter o benefício do acesso fácil, rápido e confortável a serviços e informações governamentais. De acordo com pesquisa do Ibope/NetRatings, no primeiro trimestre de 2008, o número de pessoas com acesso à Internet no Brasil chegou a 41,5 milhões. Esse dado inclui o uso da Internet em locais como residência, trabalho, escola, cybercafé, bibliotecas e telecentros, e abrange usuários com mais de 15 anos de idade. Apesar de expressivo, e em rápido crescimento, o número de internautas no Brasil representa cerca de 22% da população total. Ou seja, quase 80% da população ainda não conta com os benefícios da comunicação pela rede mundial de computadores. Essa parcela "sem-Internet", que naturalmente já é menos favorecida econômica e culturalmente, acaba também não tendo acesso às facilidades do governo eletrônico.
Bem, mas retomando a questão posta no título deste artigo: o e-governo ainda é uma promessa ou já é realidade? Sem desmerecer os avanços já alcançados e sem esquecer algumas experiências inovadoras, como a declaração de Imposto de Renda pela Internet e o uso de urnas eletrônicas nas eleições, acredito que o governo eletrônico permanece como uma promessa. Para se tornar realidade, é preciso avançar em quatro aspectos:
- melhoria da funcionalidade dos portais governamentais, que nem sempre oferecem acesso simplificado às informações e às aplicações. Há necessidade de tornar a navegação mais amigável, apresentando as informações de forma simples, compreensível e precisa;
- aumentar a interatividade com o cidadão, para que a Internet não seja utilizada apenas como um mural de avisos eletrônicos para divulgar as informações de interesse do governo;
- reestruturar os processos internos de trabalho, visando otimizar os resultados da informatização. Pouco ajuda informatizar um processo, se antes ele não for redesenhado para eliminar as deficiências; e
- promover a inclusão digital, para permitir que a maioria da população tenha acesso aos serviços virtuais.
Com exceção do último aspecto, que tende a se resolver naturalmente pelo simples crescimento vegetativo do número de pessoas que têm acesso à Internet, os outros três fatores dependem de decisões administrativas ou de vontade política. Há, contudo, boas razões para sermos otimistas e acreditarmos que o governo eletrônico em breve deixará de ser promessa para se tornar um fato.
(1) PINHO, José Antonio Gomes de; IGLESIAS, Diego Moura e SOUZA, Ana Carolina Pereira de. Portais de Governo Eletrônico de Estados no Brasil: muita tecnologia e pouca democracia. Anais do EnANPAD. Salvador, 2006.