GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS E O CONSUMO SUSTENTÁVEL

Por Stephanie Correa Serejo Sousa | 26/03/2014 | Direito

Stephanie Correa Serejo Sousa[1]

RESUMO

Este trabalho traz como enfoque principal o debate sobre o direito à cidadania, melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, do regaste da consciência nas relações entre consumo e produção e da responsabilidade que deve ser atribuída a casa individuo, como ator social do processo de conservação ambiental e de bem-estar da humanidade. Analisa-se, então, a influência negativa de um consumo desenfreado na gestão de resíduos sólidos destacando o consumo sustentável como solução viável para tal problemática.

“... Se os resíduos são a memória material dos povos, que povo de triste memória nós seremos – memória vasta e longa, pesada herança de um estilo de vida de uso e abuso da Natureza. Se, como dizem os arqueólogos, os resíduos são um sinal do seu conteúdo social, que sociedade terá sido esta que, em vez de fazer lixo para viver, parecia viver para fazer lixo?” (ARAGÃO, 2006, p.73).

 

O aumento da população, coligado ao desenvolvimento de um modelo econômico que destacou pela produção em massa, pela veneração ao consumismo ilimitado, pelo individualismo exacerbado e pela associação da felicidade à aquisição de bens materiais, ignorando a limitação dos recursos ambientais que se encontram dispostos no Planeta, que levou à crise ambiental. A sociedade moderna partiu “os ciclos da natureza: por um lado, extraímos mais e mais matérias primas, por outro, fazemos crescer montanhas de lixo”. E como todo esse rejeito não retorna ao ciclo natural, transformando-se em novas matérias-primas, “pode tornar-se uma perigosa fonte de contaminação para o meio ambiente ou de doenças” (CONSUMO SUSTENTÁVEL, 2005, p.115).

A produção e o consumo, cada vez mais acelerados, é condição estrutural de reprodução social sob o capitalismo. Conseguintemente, também o é a produção acelerada de volumes cada vez maiores de dejetos da produção/consumo de mercadorias a que chamamos “lixo” (CARNEIRO, CORRÊA, 2008, p.136).

A partir do crescimento do movimento ambientalista, surgem novos argumentos contra os hábitos ostensivos, desperdiçador e consumistas, deixando evidente que o padrão de consumo das sociedades ocidentais modernas, além de ser socialmente injusto e moralmente indefensável, é ambientalmente insustentável. A crise ambiental mostrou que não é possível a incorporação de todos no universo de consumo em função da limitação dos recursos naturais. “O ambiente natural está sofrendo uma exploração excessiva que ameaça a estabilidade dos seus sistemas de sustentação” (exaustão de recursos naturais renováveis e não renováveis, desfiguração do solo, perda de florestas, poluição da água e do ar, perda de biodiversidade, mudanças climáticas etc.). Por outro lado, o resultado dessa exploração excessiva não é repartido eqüitativamente e apenas uma minoria da população planetária se beneficia desta riqueza (CONSUMO SUSTENTÁVEL, 2005, p.17).

A partir da percepção de que “os atuais padrões de consumo estão nas raízes da crise ambiental, a crítica ao consumismo” passou a ser vista como uma contribuição para a construção de uma sociedade mais sustentável. Mas como o consumo faz parte do relacionamento entre as pessoas e promove a sua integração nos grupos sociais, a mudança nos seus padrões torna-se muito difícil (CONSUMO SUSTENTÁVEL, 2005, p.18). Foi esta conclusão que Bauman (2005) retrata em ‘Vidas Desperdiçadas’ o problema do consumismo, chamando a sociedade de sociedade liquida. O mesmo autor analisa a influência traçada pelo consumismo através do grande volume de refugo humano que supera a capacidade gerencial além das mórbidas conseqüências do lixo industrial e doméstico para o equilíbrio ecológico e a capacidade de sustentação do planeta.

A modificação de padrões de consumo e o modo de utilização dos recursos naturais foi umas dos requisitos inadiáveis fixados pela Agenda 21 na ECO-92. Jacobi e Besen (2011, p.136) citam em sua obra dentre outros fatores a importância do consumo sustentável, eis que “é cada vez mais evidente que a adoção de padrões de produção e consumo sustentáveis e o gerenciamento adequado dos resíduos sólidos podem reduzir significativamente os impactos ao ambiente e à saúde”.

Mas a responsabilidade não cabe só ao consumidor, baseado no principio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, é preciso firmar acordos setoriais com diversas cadeias produtivas. Assim, os fabricantes, distribuidores, comerciantes e consumidores deverão compartilhar a responsabilidade pelos resíduos. Chama-se de um sistema de logística reversa com o objetivo de que os resíduos sólidos sejam reutilizados, reciclados ou recolhidos pela indústria responsável (JACOBI; BENSEN, 2011, p.139). Muitas vezes, governos e empresas buscam aliviar sua responsabilidade, transferindo-a para o consumidor, que passou a ser considerado o principal responsável pela busca de soluções. Mas os consumidores não podem assumir, sozinhos, toda a responsabilidade, ela deve ser compartilhada por todos, em cada esfera de ação.

Numa pesquisa realizada pela CP2 (2012, p.21), apoiado pela PNUMA, 66% dos entrevistados respondeu que não tem conhecimento sobre o que era consumo sustentável. O consumo sustentável traz além das inovações tecnológicas e das mudanças nas escolhas individuais de consumo, enfatiza ações coletivas e mudanças políticas, econômicas e institucionais para fazer com que os padrões e os níveis de consumo se tornem mais sustentáveis. “Mais do que uma estratégia de ação a ser implementada pelos consumidores, consumo sustentável é uma meta a ser atingida” (CONSUMO SUSTENTÁVEL, 2005, p.20).

A idéia de um consumo sustentável, portanto, “não se limita a mudanças comportamentais de consumidores individuais ou, ainda, a mudanças tecnológicas de produtos e serviços” para atender a este novo nicho de mercado. Apesar disso, não deixa de enfatizar o papel dos consumidores, porém priorizando suas ações, individuais ou coletivas, enquanto práticas políticas. Neste sentido, é necessário envolver o processo de formulação e implementação de políticas públicas e o fortalecimento dos movimentos sociais (CONSUMO SUSTENTÁVEL, 2005, p.21).

Ao contrário de transferir a responsabilidade exclusivamente para os consumidores individuais, ou se limitar a mudanças tecnológicas de produtos e serviços, “o debate sobre os padrões e níveis de consumo precisa ser ampliado para incluir o processo de formulação e implementação de políticas públicas”, criando um espaço de alianças entre diferentes setores da sociedade (CONSUMO SUSTENTÁVEL, 2005 p.21).

Um caminho para a solução dos problemas relacionados com o lixo é apontado pelo Princípio dos Três Erres (3R’s) – reduzir, reutilizar e reciclar. Fatores associados com estes princípios devem ser considerados, como o ideal de prevenção e não-geração de resíduos, somados à adoção de padrões de consumo sustentável, visando poupar os recursos naturais e conter o desperdício, já sabido que os resíduos não são um resultado principal, são antes subprodutos de quase todos os processos sociais de produção e de consumo (ARAGÃO, 2006, p.58).

Os resíduos podem surgir pelos consumidores, “quando não existam no mercado produtos alternativos ou quando existindo”, eles são excepcionalmente caros. Nesta ultima hipótese, o consumidor está impedido de exercer o seu direito de opção (ou voto verde), escolhendo um produto mais amigo do ambiente (ARAGÃO, 2006, p.89).

De fato, a existência de uma abundante produção de resíduos é uma prova de elevada ineficiência dos sistemas de produção e de consumos; e essa elevada ineficiência dos sistemas de produção e de consumo só existe devido às céleres falhas do mercado e à existência de bens ecológicos gratuitos. Porém, se a curto prazo podemos afirmar que os resíduos são inevitáveis, já a médio ou longo prazo, eles não são uma fatalidade incontornável (ARAGÃO, 2006, p.91).

A geração de lixo cresce no mesmo ritmo em que aumenta o consumo. Quanto mais mercadorias adquirimos, mais recursos naturais consumimos e mais lixo geramos.

Ademais, nota-se um expressivo crescimento da geração de resíduos acompanhado “de mudanças significativas em sua composição e características e o aumento de sua periculosidade”. Essas mudanças decorrem principalmente dos modelos de desenvolvimento pautados pela obsolescência dos produtos, “pela descartabilidade e pela mudança nos padrões de consumo baseados no consumo excessivo e supérfluo” (JACOBI; BENSEN, 2011, p.136).

O setor de embalagens também poderá contribuir de forma substancial para o consumo sustentável se encarar “o desafio de atender à demanda e ao mesmo tempo eliminar os resíduos pós consumo que comprometam o futuro”. Isso implica desenvolver tecnologias mais limpas e que privilegiem a redução da geração de resíduos, utilizar materiais menos agressivos ao meio ambiente, reduzir o uso de materiais desnecessários, promover a reutilização e a reciclagem (CONSUMO SUSTENTÁVEL, 2005, p.125).

Precisa-se reagir contra o consumismo desenfreado preconizado pelas mensagens publicitárias. Para isso, a princípio, é preciso desenvolver nossa capacidade crítica em relação à publicidade, para evitar a manipulação da nossa liberdade de escolha. É preciso também estar atento para os vários aspectos da elaboração do produto, antes, durante e depois da fabricação. Tem-se que adotar o hábito de avaliar etiquetas e embalagens, verificar a natureza do produto, sua qualidade, sua real utilidade, se o preço corresponde ou não à qualidade e qual pode ser seu impacto ambiental e social (CONSUMO SUSTENTÁVEL, 2005, p.141).

Enfim, ao consumir, é importante levar em consideração todos esses fatores, mas talvez o mais difícil, e o mais importante, seja não perder jamais de vista as reais necessidades, e evitar os exageros criados por uma cultura consumista. Assim, evita-se desperdícios e mais aglomerados de lixos.

REFERÊNCIAS

ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O Princípio do Nível Elevado de Protecção e a Renovação Ecológica do Direito do Ambiente e dos Resíduos. Coimbra: Almedina, 2006.

BAUMAN, Zygmunt. Vidas Desperdiçadas. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.

CARNEIRO, Eder Jurandir; CORRÊA, Petterson Ávila. A Produção Social da Catação de Lixo. Catadores na cena urbana: construção de políticas socioambientais. Belo Horizonte: Autentica Editora, 2008.

CONSUMO SUSTENTÁVEL: Manual de educação. Brasília: Consumers International/ MMA/ MEC/ IDEC, 2005.

JACOBI, Pedro Roberto; BENSEN, Gina Rizpah. Gestão de Resíduos Sólidos em São Paulo: desafios da sustentabilidade. Estudos Avançados v.25. n.71, 2011.

O que o Brasileiro Pensa do Meio Ambiente e do Consumo Sustentável. Edição 2012. CP2 pesquisa. Disponível em: http://www.mma.gov.br/images/noticias_arquivos /pdf/sumario%20executivo_pesquisabrasileiro_principais%20resultados_2012.pdf. Acesso em: 16 de jun/2012



[1] Graduanda do 6º período do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

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