GÊNEROS E SEXUALIDADES DISSONANTES DE LEI MARIA DA PENHA: Aplicação da lei 11.340/2006 em casos envolvendo transexuais

Por Elioenai Araújo Mendonça | 29/08/2017 | Direito

Elioenai Araújo Mendonça

RESUMO

O presente trabalho examina a lei 11.340/2006, a fim de explicitar a possibilidade de sua aplicação em casos envolvendo transexuais. Esse tema foi escolhido, porque esse grupo de pessoas está sujeito às mesmas violências sofridas por aquelas que nasceram com a genitália feminina e, portanto, são igualmente merecedoras de proteção quando o assunto é relação de gênero. Utilizou-se o auxílio científico encontrado em livros e artigos relevantes para o tema e analisaram-se seus desdobramentos, a fim de conseguir dados suficientes para a elaboração deste artigo científico. Nota-se que, uma vez que a lei surgiu com o nítido objetivo de coibir a violência de gênero, é pertinente que sua aplicação seja debatida de acordo com uma interpretação mais ampla, de modo que o maior número possível de vítimas em potencial fique resguardada.

Palavras-chave: Lei 11.340/2006; violência; relação de gênero; transexuais.

1 INTRODUÇÃO

A possibilidade jurídica da garantia legal aos transexuais serem reconhecidos civilmente, é uma grande conquistas para o direito constitucional no viés da igualdade e dignidade da pessoa humana. Neste mesmo enfoque é importante ressaltar no que se trata de conquistas sociais e jurídicas, a lei 11.340/2006 trouxe grande amparo jurídico e maior segurança social para as mulheres, em uma sociedade onde anteriormente os abusos contra as mulheres envolvendo violência em seus tipos eram constantes. Trazendo para a atual perspectiva social e o anseio pela constante efetivação das premissas constitucionais, em especifico a igualdade e dignidade da pessoa humana. A partir do momento que o seio legal reconhece civilmente o transexual, este tem o direito de ser reconhecido pelo sexo feminino. Devido a isto, abarcar os transexuais tornaria eficaz o direito dos(as) mesmas(os) e efetivaria plenamente o direito fundamental a igualdade e dignidade da pessoa humana, uma vez que tal direito é concedido a mulheres e da mesma forma os transexuais devem ser reconhecido como tais, caso o sexo de sua identificação interior seja o feminino.

2. A LEI 11.340/2006

Primeiramente, é de fácil percepção ao investigar a evolução social, as modificações que os direitos das mulheres sofreram ao longo do tempo. Partindo da grande base social machista arrizada na sociedade brasileira, a mulher sempre foi considerada minoritária em relação a seus plenos direitos em ralação ao homem. Diante disto, através das grandes lutas, fatores históricos e convecção constitucional pela igualdade entre os seres humanos, as mulheres começaram a ganhar seus status mais equilibrados na sociedade como lhe eram de direito. (COSTA; PORTO. 2010) Neste milênio, as conquistas pelas mulheres foram de grande impacto socialmente, uma vez que mesmo com uma nova ótica sobre os direitos femininos, a sociedade ainda descriminaliza questões do gênero feminino, tratando com menor valoração. Outro ponto de crucial valor é a constante prática de violência contra a mulher, em todas as vertentes, tanto moral, quanto física, patrimonial, sexual e psicológica, uma vez que grande parte da sociedade interioriza o machismo. Por tal fato, a lei 11.340/2006 veio como forma de proteger a uma classe vitimizada por questões sociais e culturais, contra abusos de indivíduos que desrespeitam a questão de igualdade imposta pela constituição. Devido a isto as mulheres têm como forma de proteção contra as inúmeras formas das violências contra elas. (COSTA; PORTO. 2010)

Antes de analisarmos friamente a lei 11.340/2006 através dos olhos do legislador, é fundamental entender seu contexto histórico. Essa lei ficou nacionalmente conhecida como “Lei Maria da Penha”, devido à luta de uma mulher chamada Maria da Penha Maia Fernandes, vítima de cruéis episódios de violência doméstica. Ocorre que tal situação, infelizmente, se tornou corriqueira no Brasil e os casos não recebiam os cuidados necessários do Estado. Como consequência, o país recebeu recomendações internacionais que apontavam a necessidade de mudança no ordenamento jurídico, o que ensejou a edição da lei agora em estudo. (HUDLER; TANNURI, 2015).

Analisando a questão já do ponto de vista do Direito, nota-se que a Constituição Federal, no seu artigo 226, §8º já dispunha, de modo genérico, sobre o tema da violência no âmbito familiar. (BRASIL, 1988). Esse dispositivo fala da criação de mecanismos, isto é, não tem eficácia plena por si só. Sendo assim, pode-se dizer que a lei veio para “suprir a lacuna infraconstitucional, sintetizando no campo legislativo e normativo as formas como se espera seja a violência doméstica e familiar contra a mulher combatida”. (LOURENÇO, 2015, p.11).

 

A lei trouxe consigo, sem dúvidas, inovações. A primeira pode ser vista já no artigo 1º, com a expressão “mulheres em situação de violência”, porque a nomenclatura “vítima” contribuía para etiquetar sempre um caráter de submissão à mulher, ao passo que a nova expressão enfatiza que a situação pela qual a mulher está passando é passageira. Outra questão que merece destaque é o que foi elencado no artigo 2º, visto que, visando atender aos princípios da igualdade e dignidade da pessoa humana, o legislador englobou “todas as mulheres”, o que já enseja a interpretação que inclua os transexuais. (LOURENÇO, 2015).

3 A SITUAÇÃO DOS TRANSEXUAIS SEGUNDO A ORDEM JURÍDICA DO BRASIL

Primeiramente é importante adentrar na questão constitucional da dignidade da pessoa humana, onde se garantirá a pessoa um respeito a sua condição em quanto ser humano em questão de tratamento moral e social. (BRASIL, 2000; NOVAES, 2004) Diante disto, é a abarcado pela dignidade da pessoa humano a premissa de igualdade perante as demais pessoas, através disto o transexual é um ser humano dotado de mesmas condições genéticas como outro, onde a condição para ser considerado humano é sua condição genética e não sua opção sexual, religiosa ou outras vertentes ideológicas. (PERES, 2001) Diante destas vertentes, é importante ressaltar que os transexuais devem ter os mesmo direito assegurados que pessoas heterossexuais, tomando como base a o texto solene constitucional, o qual rege todo ordenamento jurídico. (KLABIN, 1995, PERES, 2001) Através das diversas discursões jurídicas a respeito deste assunto, jurisprudências tornam positivo o viés de garantias de direito aos transexuais. É importante destacar que não possui matéria legislativa especifica para os transexuais, porém é de suma importância enxergar as mesmas como outro gênero, colocando de forma igual ao sexo que decidiram seguir, e não como uma classe ou gênero segregado e diferente. (KLABIN, 1995) Através disto já é possível o registro civil para os mesmos dentro outras conquistas para as transexuais, que será abordado de forma mais embasada nesta pesquisa.

Primeiramente é importante adentrar na questão constitucional da dignidade da pessoa humana onde se garantirá a pessoa um respeito a sua condição enquanto ser humano, em questão de tratamento moral e social. (BRASIL, 2000; NOVAES, 2004) Diante disto, é abarcado pela dignidade da pessoa humana a premissa de igualdade perante as demais pessoas, através disto o(a) transexual é um ser humano dotada(o) de mesmas condições genéticas como outro, onde a condição para ser considerado humano é sua condição genética e não sua opção sexual, de gênero, religiosa ou outras vertentes sociais e ideológicas. (PERES, 2001) Através das diversas discursões jurídicas a respeito desse assunto, jurisprudências tornam positivo o viés de garantias de direito as(aos) transexuais. É importante destacar que não possui matéria legislativa especifica para os(as) transexuais, porém é de suma importância enxergar os(as) mesmos(as) como outro gênero, colocando de forma igual ao sexo que decidiram seguir, e não como uma classe ou gênero segregado e diferente. (KABLIN, 1995) Em segunda abordagem, a identificação pessoal de cada individuo dar-se-a pelo seu nome e através disto a pessoa é reconhecida no seio social e familiar. Tal direito é publico subjetivo, sendo subsistente para evitar a ingerência por parte do Estado aos direitos de personalidade. Neste fato, o que é amparado essencialmente não é o nome, mas sim a pessoa e sua dignidade, que seriam atingidas através do primeiro. Considera-se o nome como uma apresentação de direito absoluto, uma vez que este é impenhorável, imprescritível, indisponível, personalíssimo, público, refletindo a qualidade de ser pessoa. (HOGEMANN, 2014)

No que se refere a identificação pessoal com o gênero diferente ao que lhe é de nascimento, a transexualidade apresenta duas abordagens. A primeira através da medicina e a segunda em esfera social. Quanto ao fator médico, é considerado como um distúrbio de identidade, causando no indivíduo depressão e o sofrimento continuo, pelo fato do descontentamento do seu sexo biológico, e discriminação social através do fato. A segunda vertente, a social, funda-se nos direitos fundamentais que o individuo tem. Sendo assim tem a livre iniciativa de se auto afirmar. É importante frisar que transexual não é o mesmo que homossexual, uma vez que este último possui uma aceitação do seu sexo biológico, porém tem atração sexual pelo mesmo sexo. Já os casos dos(as) transexuais, não ocorre uma aceitação interna cm o sexo biológico. No direito brasileiro é possível a visualização de alguns casos da admissão do nome social aos transexuais.

O Decreto nº 55.58/2010 autoriza o tratamento pelo nome social nos órgãos públicos [...] O servidor deve cumprir decreto, sob pena de ser processado [...] há o Decreto n 51.180/2010, que permite o uso do nome social em formulários, prontuários médicos e fichas de cadastro, entre outros requerimentos da administração pública. O nome social aparece antes do nome civil e entre parênteses nos registros municipais. (HOGEMANN, 2014. p. 225)

Tais aspectos revelam a questão da oponibilidade deste direito a terceiros. Diante disto, o reconhecimento da mudança do gênero deve ser aceita perante a sociedade, e caso não seja aceita cabe a sua oponibilidade pela(o) detentor(a) deste direito por via judicial, através de indenização.

Apresentado tais relevâncias sobre a matéria da mudança de reconhecimento de identidade de gênero em relação ao nome civil no registro, é imprescindível a citação de constantes interpretações sobre o tema, pela ótica do STJ:

[...] ministra Nancy Andrighi, afirmou que a observação sobre alteração na certidão significaria a continuidade da exposição da pessoa a situações constrangedoras e discriminatórias[...]A ministra destacou que, atualmente, a ciência não considera apenas o fato biológico como determinante do sexo. Existem outros elementos identificadores do sexo, como fatores psicológicos, culturais e familiares. Por isso, a definição do gênero não pode ser limitada ao sexo aparente, ponderou. Conforme a relatora, a tendência mundial é adequar juridicamente a realidade dessas pessoas. Não é raro encontrar outras decisões iguais, posteriores a do STJ, na justiça paulista, por exemplo. Em maio de 2010, a 2ª Vara da Comarca de Dracena (SP) também foi favorável à alteração de nome e gênero em registro para transexuais. Para o juiz do caso, estava inserido no conceito de personalidade o status sexual do indivíduo, que não se resume a suas características biológicas, mas também a desejos, vontades e representações psíquicas. Ele também determinou que a alteração não constasse no registro. (STJ, 2013. p [?])

É importante desenvolver que a questão de gêneros é uma construção social, que foi pregada e interiorizada ao longo da história social. Anteriormente com a falta de análise mais fundamentada e estudos sobre o fato da não identificação com o sexo biológico, já existiam inúmeros casos sobre esse respeito. Porém, pela grande repressão social e condenatória, escondia-se ou até negava-se a existência de variações desses gêneros. (BENTO, 2006. LOURO, 2004) Diante disto, elencando como premissas nietzschianas, a valoração moral que nós cerca e determina como valor inflexível o produto não do próprio ser em si, mas de constantes vivências e determinações sociais em busca da aceitação. Entretanto, as bases ideológicas pregadas e transpassadas até a presente geração, por serem duradouras, não significa que são perfeitas ou absolutamente corretas. (NIETZSCHE, 1998) Trazendo isto ao caso dos gêneros, a determinação de gênero, assim como os demais fatores da vida em sociedade, não deve ser taxada por uma condição externa fixa, mas sim de uma série de vivências e aceitações internas do ser. Esclarece tais colocações em tal exposição:

Não existe nada no fato de ser “mulher” que naturalmente una as mulheres. Não existe nem mesmo uma tal situação – “ser” mulher. Trata-se, ela própria, de uma categoria altamente complexa, construída por meio de discursos científicos sexuais e de outras práticas sociais questionáveis. A consciência de classe, de raça ou de gênero é uma conquista que nos foi imposta pela terrível experiência histórica das realidades sociais contraditórias do capitalismo, do colonialismo e do patriarcado. (HARAWAY, 2000. p. 47)

A partir disto, ter-se-á uma construção mais sólida do ser enquanto gênero sexual, mas não uma condição absoluta e biológica determinável, e sim uma construção interior ao psíquico e social. Em uma abordagem sobre o as premissas sociais e como elas nos são impostas, Heidegger preceitua:

O fato da circunvisão cotidiana se equivocar devido a abertura primordial da disposição e estar amplamente sujeito à ilusão é um[...], segundo a ideia de um conhecimento absoluto de “mundo”. Em razão dessas avaliações ontologicamente inadequadas, desconsidera-se inteiramente a positividade existencial da possibilidade de ilusão. É justamente na visão instável e de humor variável do “mundo” que o manual se mostra em sua mundanidade específica, a qual nunca é a mesma. A observação teórica sempre reduziu o mundo à uniformidade do que simplesmente é dado; dentro dessa uniformidade, sem dúvida subsiste encoberta a nova riqueza de determinações, passiveis de descoberta. (HEIDEGGER, 2005. p. 192)

 

Estes desenvolvimentos filosóficos buscam esclarecer as questões sociais em suas valorações e como são impostas de forma acabada para cada individuo. Diante destas abordagens, percebe-se que através do questionamento sobre a identidade só ser, as valorações não devem ser pré-constituídas ou acabadas, mais sim construídas e moduláveis. Sendo isto uma premissa para reafirmação que a questão de gênero sexual não deve ter uma determinação findada pela questão biológica natural, como veio ocorrendo ao longo dos tempos, mas sim por uma questão de vivências sociais, como já afirmado anteriormente.

Entretanto, é importante ressaltar os limites relativos este direito, assim como todos os direitos. O registro do nome civil, só seria possível após cirurgia de mudança de sexo. Diante deste fato encontra-se limite para afirmação do gênero que a pessoa interiormente se identifica.  (ALMEIDA; DENCZUK, 2014)

Contudo tal limitação não deve sobrepor a todos os efeitos sociais e interiores ao individuo, que sua afeição íntima com determinado gênero venha a ocorrer. Isto é reafirmado pela condição da dignidade da pessoal humana, preceito fundamental e constitucional, que rege toda a sociedade. Tal preceito engloba uma vivência através de sua aceitação própria e bem-estar consigo mesmo em reflexo com a sociedade

 

 

4 A LEI 11.340/2006, E A SUA EFETIVAÇÃO NA GARANTIA DOS DIREITOS DOS(AS) TRANSEXUAIS

 

A interligação que a transexualidade pode sofrer com o amparo legal através da Lei Maria da Penha, uma vez que esta tem como principal destinação as mulheres, deverá levar em consideração que após a transexualidade o individuo deveria ser considerado socialmente e através dos linhames legais, uma mulher, caso seja essa a sexualidade que se identificou através de uma longa vivência e identificação interna com tal sexo. Diante disto, o(a) transexual seria tratada(o) como uma mulher como outra cujo sexo veio desde o nascimento, sendo desta forma possibilitando seu amparo pela Lei Maria da Penha. (CEARÁ, 2012) Ademais, é importante o questionamento, o que é necessário para que uma pessoa que não nasceu mulher - do ponto de vista biológico - mas que assim se considera, seja protegida pela lei 11.340/2006? É necessário haver um reconhecimento judicial a respeito da mudança de gênero anterior ao episódio de violência? Ou tal reconhecimento é irrelevante? Para o Poder Judiciário, a cirurgia de redesignação sexual influencia na decisão de alguma forma? Essas são questões que permeiam o debate acerca da efetivação dos direitos dos transexuais, o que faz com que mereçam ser discutidas neste tópico.

Em relação ao procedimento cirúrgico, é pertinente relembrar que ele não é aquilo que torna a transexual uma mulher e, portanto, não é razoável que o Judiciário se atenha ao aspecto físico. (HUDLER; TANNURI, 2015) Além disso, não seria plausível associar a aplicação da lei 11.340/2006 com a realização da cirurgia, pois dessa forma uma parcela das pessoas seria excluída, atitude que iria de encontro ao real objetivo da lei (proteção de uma camada social vulnerável), assim como seria uma afronta ao princípio da equidade, ao privilegiar quem tem condições de fazer uma cirurgia em face de quem não tem.

Um caso emblemático, que corrobora o que foi dito no parágrafo anterior, aconteceu no Mato Grosso. Em 2015, uma pessoa que ainda não havia feito a cirurgia- pois o Sistema Único de Saúde – SUS desse ente federativo não oferece esse tipo de procedimento, assim como o fato de ser portadora de HIV tornaria a cirurgia arriscada- conseguiu, graças a uma decisão do tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJ-MT), que o seu companheiro se mantenha sempre a uma distância de mil metros. (SOUZA, 2015)

Evocam também a existência de decisão judicial, anterior ao caso de violência, que reconheça a mudança de gênero, ou seja, a preocupação com o nome e o registro. Ocorre que esse questionamento não é digno de aprovação, uma vez que a demora em tais processos podem macular o intuito do legislador, de modo que seria uma afronta à dignidade condicionar a aplicação da lei à mudança no registro, por exemplo.

Sobre o assunto tratado no parágrafo acima, há precedentes judiciais que fomentam bastante esperança quanto à efetivação dos direitos das transexuais ao nome, o que, por óbvio, interfere no assunto que é tema deste trabalho. Interfere, porque, se ocorre a mudança de nome sem a cirurgia de redesignação sexual, implica dizer que o operador do direito começa a consolidar a ideia de que a questão do gênero não se resume ao sexo biológico, o que aumenta a margem para a proteção das pessoas que sentem pertencentes ao sexo oposto. Como exemplo, uma decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) que determinou retificação do registro civil mesmo com a ausência de cirurgia, sendo possível ler na ementa, inclusive, que “o gênero prepondera sobre o sexo”. (BRASIL, 2015)

 

5 METODOLOGIA

A metodologia utilizada neste trabalho é dedutiva, a qual parte do objetivo geral que busca a analise da nulidade absoluta na investigação criminal no contexto civil e jurídico brasileiro. Posteriormente ocorre a ramificação do artigo em objetivos específicos que abordam posição da doutrina e ordenamento jurídico sobre a égide da lei 11.340/2006, tendo posteriormente uma construção estrutural da pesquisa apresentando a situação das transexuais segundo a ordem jurídica do Brasil, e por fim como a da lei 11.340/2006 pode ser efetivada na garantia dos direitos das transexuais.

Este artigo será elaborado, com relação aos seus objetivos, através de pesquisas exploratórias. Visou-se criar maior familiaridade com o tema, pretendendo esclarecê-lo, ou explicita-lo da melhor forma possível, gerando um aprimoramento de ideias. Considerou-se os mais variados aspectos relativos a função social da posse, valendo-se, em geral, de levantamentos bibliográficos para isso. Do ponto de vista procedimental o trabalho deu-se por pesquisa bibliográfica. O Paper será produzido com base em material já elaborado, esta pesquisa se constituiu principalmente a partir de livros, que constituem as fontes bibliográficas por excelência, e de artigos científicos (GIL, 2002)

 

6 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A lei 11.340/2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, é considerada uma grande referência no combate à violência de gênero. Esse julgamento é compreensível, haja vista que, no contexto histórico que antecedeu à lei, o Estado não tratava o assunto com a atenção devida, de modo que o Brasil chegou a receber recomendações internacionais sobre o tema. (HUDLER; TANNURI, 2015).

O artigo 2º da referida lei, demonstrando sua tentativa de coibir a violência de gênero, utiliza a expressão “toda mulher” (BRASIL, 2006). Mas o que é ser mulher? Segundo Bento (2006, p.13), “A norma de gênero repete que somos o que nossas genitálias informam [...] Mas os deslocamentos existem. Apresentam-se”. A questão é pertinente, porque é sabido que transexuais também são vítimas da violência doméstica e familiar e, nesse caso, não podem deixar de receber o amparo do ordenamento jurídico.

Nesse caso, surge o seguinte questionamento: “É possível que a lei 11.340/2006 seja aplicada para transexuais?”.

Diante disto, nas relações de gênero, as mulheres são submetidas ao poder e à violência simbólica, além da violência física propriamente dita, o que denuncia a forma como costumeiramente são tratadas: como se ocupassem posição inferior aos homens na sociedade. (MACHADO, 2010). Nesse cenário, é importante analisar a situação do(a) transexual, de modo que esta(e) se sinta integrante de um gênero diferente da sua genitália e, caso seja essa sua escolha interna. Por conseguinte, a(o) mesmo(a) está sujeito(a) às mesmas violências as quais as mulheres que tiveram seu sexo determinado pelo nascimento sofrem, e caso a transexual tenha sua identidade ao sexo feminino, terá as mesmas vitimizações, e até piores devido a discriminação por sua escolha de gênero diferente. Com isto a transexual que escolhe o sexo feminino como o seu, sofreria uma dupla segregação, uma advinda da sociedade machista, em relação a ser mulher e outra discriminação por ser transexual, sendo visto como diferente por uma sociedade arraigada nos preconceitos sociais estipulados pelo paternalismo de separação de gêneros.  (BENTO, 2006)

Além disso, deve ser observado o fato de que, se a lei surgiu como forma de combater a violência de gênero, sua aplicação de maneira mais ampla possível deve ser discutida (HUDLER; TANNURI, 2015), sob pena de uma parcela das vítimas dos crimes não serem protegidas, o que poderia representar um fracasso da medida.

Devido a isto, abarcar os(as) transexuais tornaria eficaz o direito dos(as) mesmo e efetivar plenamente o direito fundamenta a igualdade e dignidade da pessoa humana, uma vez que tal direito é concedido a mulheres e da mesma forma as(os) transexuais que se identificam como do sexo feminino, devem ser reconhecido como tais.

7 CONCLUSÃO

Uma vez que os números comprovam a violência de gênero sofrida pelas mulheres brasileiras, todas as maneiras possíveis de combate e proteção devem ser bem recebidas. Tendo em vista que existe um grupo de pessoas que ocupa o papel social de mulher – apesar de não serem biologicamente assim - este se torna merecedor das mesmas garantias que as mulheres, pois é alvo das mesmas intimidações, vítima das mesmas agressões e sujeito às mesmas injustiças. Nesse sentido, é louvável a atitude do legislador, que no artigo 2º da lei 11.340/2006 se a refere a “toda mulher” como objetivo do amparo legal.

Transexuais formam um segmento social que- à revelia de princípios norteadores do nosso ordenamento jurídico, como a dignidade da pessoa humana- é vítima de muita discriminação. Além da violência doméstica, a qual todas as mulheres estão sujeitas, transexuais enfrentam outros dilemas passíveis de censura por grande parte da sociedade, tais como a mudança do nome no registro civil e a cirurgia de redesignação sexual. Estas situações conflituosas são, por vezes, erroneamente usadas como forma de avaliar se alguém é mulher, o que é absurdo, pois além de ignorar direitos e garantias fundamentais dos transexuais, também ignora o fato de que a identidade de gênero se sobrepõe ao sexo.

A lei conhecida popularmente como “Lei Maria da Penha” representa, sem dúvidas, uma garantia para que transexuais possam viver sem violência. No campo prático, os precedentes judiciais apontam nesse mesmo sentido. Tais entendimentos, por fim, devem priorizar sempre a pessoa da transexual, respeitando suas liberdades e protegendo sua dignidade.

REFERÊNCIAS

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