Função das Línguas Moçambicanas no 1º Ciclo do Ensino Básico
Por João Samuel | 30/01/2013 | ArteFunção das Línguas Moçambicanas no 1º Ciclo do Ensino Básico
Em torno do tema acima exposto, levantou-se o seguinte problema: Será que a Função das Línguas Moçambicanas no 1º Ciclo do Ensino Básico é valorizar o património cultural e linguístico?
O objectivo é mostrar que as Línguas Moçambicanas são instrumentos e veículos de transmissão de aspectos culturais e determinam a identidade do aluno do 1º Ciclo do Ensino Básico, assim como da Comunidade Linguística a que pertence.
Contudo, exige-se ao professor do 1º ciclo do Ensino Básico que conheça a situação linguística de cada aluno no concernente ao uso da língua moçambicana, visto que quando se opta por uma língua em detrimento de tantas outras, estar-se-á a excluir os alunos falantes daquelas outras línguas. Portanto, de uma maneira geral, a abordagem sobre a Função das Línguas Moçambicanas no 1º Ciclo do Ensino Básico situa-se essencialmente na área de análise da valorização do património cultural e linguístico.
Hipoteticamente, supõe-se que a valorização do património cultural e linguístico depende da manutenção das Línguas Moçambicanas no 1º Ciclo do Ensino Básico. Numa Breve resenha sobre o Plano Curricular do Ensino Básico (PCEB), sustenta-se que o mesmo constitui o pilar do currículo em Moçambique, apresentando as linhas gerais que sustentam o novo currículo, assim como as perspectivas do Ensino Básico no país (PCEB, 2003). Sendo assim, o principal desafio, que se coloca ao presente currículo, é tornar o ensino mais relevante, no sentido de formar cidadãos capazes de contribuir para a melhoria da sua vida, da vida da sua família, da sua comunidade e do país, dentro do espírito da preservação da unidade nacional, manutenção da paz e estabilidade nacional, aprofundamento da democracia e respeito pelos direitos humanos, bem como da valorização da cultura e da língua moçambicanas.
A visão da relevância do currículo fundamenta-se na percepção de que a educação tem de ter em conta a diversidade dos indivíduos e dos grupos sociais, para que se torne num factor, por excelência, de coesão social e não de exclusão.
Para tornar factível a perspectiva curricular, foram tomadas em consideração as reflexões de diferentes estudos feitos por instituições do Ministério da Educação, em particular, do Instituto Nacional do Desenvolvimento da Educação – INDE, bem como de outras entidades colectivas e individuais. Foram também tomadas em conta as reflexões e recomendações dos professores, dos supervisores e dos inspectores educacionais, dos pais e dos encarregados de educação, em geral, das diferentes sensibilidades da sociedade moçambicana: governantes, políticos, religiosos, empresários, sindicalistas, autoridades e líderes locais, Organizações Não-Governamentais, de entre outras.
O principal desafio deste currículo é tornar o ensino mais relevante, contudo pretende-se que, ao concluir o ensino básico, o graduado tenha adquirido conhecimentos, habilidades e valores que lhe permitam uma inserção efectiva na sua comunidade e na sociedade em geral.
O currículo do Ensino Básico tem 7 classes organizadas em 2 graus. O 1º grau, está dividido em 2 ciclos, sendo o 1º correspondente à 1ª e 2ª classes e o 2º, a 3ª, 4ª e 5ª classes. O 2º grau compreende a 6ª e 7ª classes correspondentes ao 3º ciclo. O ingresso para o Ensino Básico é feito aos 6 anos de idade, devendo o aluno concluí-lo, em princípio, aos 12 anos e, os ciclos são unidades de aprendizagem com o objectivo de desenvolver habilidades e competências específicas. A análise deste trabalho assenta-se no 1º ciclo, correspondente à 1ª e 2ª classes.
As línguas moçambicanas são todas de origem bantu, com excepção do português, que é a língua oficial e de ensino, desde que o país se tornou independente, em 25 de Junho de 1975 (LOPES et al, 2002).
Portanto, em 1988 e 1998, o então Núcleo de Estudos de Línguas Moçambicanas (NELIMO) convocou seminários de padronização das línguas moçambicanas em termos de ortografia, divisão de palavras e representação de tonalidade. O terceiro seminário organizado pelo agora Centro de Estudos de Línguas Moçambicanas, teve lugar em 2008. Salienta-se que no tempo colonial, as línguas moçambicanas foram relegadas para o segundo plano e encaradas de uma forma desprivilegiante. Eram denominadas, pejorativamente, “dialectos” ou landins (na zona sul), por oposição à Língua Portuguesa.
MENDES (2000:31) quando fala da função das línguas moçambicanas acautela que “preferimos empregar a designação línguas moçambicanas por nos parecer a forma mais neutra e por não concordarmos com a designação línguas nacionais, muitas vezes, empregue por alguns falantes. Interpretamos que para uma língua ter estatuto de língua nacional deve ser empregue, pelo menos, por metade da população de um país, o que não é o caso de Moçambique”.
Concordando com o autor acima citado, significa que as línguas moçambicanas, como línguas maternas da maioria da população, são aquelas que oferecem melhores condições de comunicação aos falantes. Para além das funções emotiva e veicular, as línguas moçambicanas estabelecem, também, a relação de identidade entre o falante, a tradição e a cultura.
O principal desafio, que se coloca às línguas moçambicanas, é tornar o 1º Ciclo do Ensino Básico, mais relevante, no sentido de formar cidadãos capazes de contribuir para a melhoria da sua vida, da vida da sua família, da sua comunidade e do país, dentro do espírito da preservação da unidade nacional, manutenção da paz e estabilidade nacional, aprofundamento da democracia e respeito pelos direitos humanos, bem como da valorização do património cultural e linguístico.
A valorização das línguas moçambicanas é também sublinhada no artigo 9 da constituição da Republica (2004) na medida em que esta diz que “O Estado valoriza as línguas nacionais como património cultural e educacional e promove o seu desenvolvimento e utilização crescente como línguas veiculares”.
Actualmente, as línguas moçambicanas são consideradas “línguas” como qualquer outra língua natural e o termo “dialecto”, designação que lhes era atribuída com sentido pejorativo, deixou de ser empregue como tal, pelo menos no meio académico e passou a ser definido como termo científico, como variante dessas línguas.
As línguas moçambicanas, tal como o Português, desempenham actualmente a função veicular: é frequente estabelecer-se uma conversa, dar uma explicação ou um esclarecimento na língua local, mesmo nas zonas urbanas. Por esta e outras razões arroladas, as línguas moçambicanas devem se manter no 1º ciclo do ensino básico, pois a sua marginalização contribui para o fracasso do rendimento escolar e afecta a preservação de valores culturais e linguísticos da sociedade, uma vez que o respeito e a promoção destas línguas constituem poderosos meios de democratização (LOPES, 2001).
Outrossim, a não atribuição duma função social específica das línguas moçambicanas reduz as oportunidades educacionais de construção da cidadania para a maioria das crianças moçambicanas, pelo que a manutenção das línguas moçambicanas no 1º ciclo do Ensino Básico se afigura importante para o processo de inclusão e redução de desperdício escolar e para a valorização do património cultural e linguístico.
Portanto, a maior parte dos alunos do 1º ciclo do Ensino Básico, quando ingressa na escola, já tem desenvolvida a competência comunicativa básica nas suas línguas maternas/locais. Assim, a utilização das línguas moçambicanas na escola tem, por objectivo, desenvolver as competências que os alunos já possuem para a iniciação à leitura e escrita, desenvolver outras habilidades e assegurar a valorização dos conhecimentos e, do património cultural e linguístico que estas mesmas línguas veiculam.
Bibliografia
1. INDE/MINED, Plano Curricular do Ensino Básico, Maputo, 2003.
2. LOPES, A. J. et al, Moçambicanismos: Para um léxico de usos do Português
Moçambicano, Livraria Universitária, Universidade Eduardo Mondlane, Maputo, 2002.
3. MENDES, Irene, Léxico no Português de Moçambique, Promédia Editora, S/ed., Maputo,
2001.
4. MULÉMBWÈ, Eduardo Joaquim-O Presidente da Assembleia da República,
Constituição da República, Moçambique, 2004.
5. PEBIMO, Ensino Bilingue: Uma Alternativa para a Escolarização Inicial (EP1) nas Zonas
Rurais, INDE, Maputo. (1996).
Por: João Samuel