Filosofia Jurídica - Concepções de Estado

Por Claultyon Andrey Farias | 10/09/2010 | Filosofia

GRÉCIA ANTIGA
Dois grandes períodos:
1. Antes de Sócrates > período pré-socrático
2. Depois de Sócrates > período pós-socrático (469-399 a.C.)

Na transição entre esses dois períodos, há uma mudança no pensamento filosófico grego:

A Filosofia passa da condição teológica-mítica, ou seja, a compreensão da existência humana centrada nos Deuses e mitos e, por isso, TEOCÊNTRICA, para a condição ANTROPOCÊNTRICA, centrada no homem e no mundo.
Os Deuses deixam de ser a centralidade e o poder na compreensão da existência humana.
A centralidade do pensamento filosófico grego passa a ser o próprio homem > a solução dos problemas deve vir dos homens e não dos Deuses do Olimpo.
Nesse sentido, ganha importância a discussão sobre as concepções de Estado, este entendido como a maior organização social da humanidade.

CONCEPÇÃO DE ESTADO EM MAQUIAVEL

Nicolau Maquiavel (1469-1527), segundo Gruppi, ao pensar a realidade de sua época, não elaborou uma teoria do Estado moderno, mas uma teoria de como se formam os Estados, como se constitui o Estado moderno, quais as formas de sustentação do poder centralizado. É o primeiro pensador a refletir sobre o Estado.

O meio justificando o fim: Faça, pois, um Príncipe por vencer e conservar o Estado, que os meios serão sempre tidos como honrosos e dignos de louvor, porque o vulgo é sempre atraído pelas aparências e pelo fato consumado. (In O Príncipe. São Paulo: Ed. Parma, p. 23)

Para Maquiavel, o Estado não tem mais a função de assegurar a felicidade e a virtude, como afirmava Aristóteles; também não era mais a preparação para o Reino de Deus, como imaginavam os pensadores da Idade Média.

O Estado tem suas próprias características, faz política e segue suas próprias leis. Maquiavel defendia um Estado unitário, um Estado absoluto fundado no poder centralizado e no terror, pois "Os homens têm menos escrúpulo de ofender que se faz amar do que quem se faz temer".

Maquiavel levava em consideração a natureza humana e a realidade efetiva, dizendo que devemos estudar as coisas como elas são e devemos observar o que se pode e é necessário fazer, não aquilo que seria certo fazer, pois quem quiser ser bom entre os maus, fica arruinado. (Relação entre política e moral).

CONCEPÇÃO DE ESTADO EM THOMAS HOBBES (1588-1679)

Filósofo inglês
A teoria de Estado e Hobbes: - quando os homens vivem em estado natural, como animais, eles se jogam uns contra os outros pelo desejo de poder, de riquezas e de propriedades.

É o impulso à propriedade privada burguesa que se desenvolve na Inglaterra, onde surge a concepção de que o homem é o lobo do próprio homem (homo homini lupus).

Por isso, segundo Hobbes, é necessário um CONTRATO para constituir o Estado que impeça o desencadear dos egoísmos e a destruição mútua.

O "contrato" preconizado por Hobbes cria um Estado absoluto, de natureza mercantil, destinado a assegurar as relações sociais burguesas e uma vida mais confortável.

Hobbes defendia um "pacto social" para permitir a vida em sociedade, como forma de superar o egoísmo humano; este, o pacto, devia se impor pela força, por um Estado absoluto que concentrasse todo o poder. As relações entre as pessoas são relações mercantis e se dão através de contratos de compra e venda, de transferência de propriedades, etc.

Dessa forma, lança as bases da teoria moderna do estado, descrevendo o surgimento do Estado liberal, a formação do mercado e as desigualdades que produz (a competição e a concorrência são fatores de concentração de riqueza e de exclusão social).

A CONCEPÇÃO DE ESTADO EM JOHON LOCKE (1632-1704)

Locke é tido como o teórico da segunda Revolução liberal inglesa que encerrou em 1689, com um acordo entre a monarquia e a aristocracia, de um lado, e a burguesia de outro, dando origem ao surgimento do Estado fundado nos direitos do parlamento.

Entendia que o homem em estado natural é plenamente livre, mas sente a necessidade de colocar limites à sua própria liberdade.

- Qual a finalidade de restringir a liberdade?
- para garantir a sua propriedade

Para J. Locke, o estado natural (ausência de um Estado) não garante a propriedade; logo, é preciso criar um Estado que assegure as relações mercantis e o cumprimento dos contratos.

Locke estabelece uma estreita relação entre "propriedade" e "liberdade", que devem ser garantidas pelo Estado, principalmente a liberdade de iniciativa econômica. Essa é uma concepção tipicamente individualista, no sentido de que o indivíduo preexistiria ao Estado, que as pessoas partiriam de uma condição natural como indivíduos soltos.

Marx se contrapõe a essa concepção, entendendo, ao contrário, que o homem é um ser social e só torna-se homem na medida em que vive e trabalha em sociedade; o homem no estado natural seria uma animal, um ser posicionado numa visão individualista, própria da concepção burguesa.

HOBES E LOCKE > o indivíduo existiu antes da sociedade humana e esta nasceria pelo "contrato" entre indivíduos preexistentes; esta concepção revela que cada pessoa é um indivíduo isolado em relação aos outros, sem consciência do caráter social das relações políticas e econômicas.

LOCKE > o Estado é soberano, mas sua soberania tem origem no contrato que o faz nascer; não recebe soberania de nenhuma outra fonte, muito menos do poder divino, como entendiam os filósofos pré-socráticos.

Estabelece a distinção entre sociedade política (o Estado) e a sociedade civil, ou seja, entre o público e o privado. Para Locke a propriedade é objeto da herança (o Pai transmite a propriedade aos filhos); já o poder político não se transmite pela herança, pois deve ter uma origem democrática, pela via parlamentar.

"Na Idade Média, a sociedade e o Estado (poder político) são inseparáveis, estão entrelaçados, são transmitidos juntos; na sociedade burguesa moderna esses dois aspectos estão separados, pois na sociedade civil existe transmissão da propriedade, mas não há transmissão do poder político". (Gruppi, Luciano. Tudo começou com Maquiavel. Porto Alegre: L&PM Editores Ltda, p. 16).

A CONCEPÇÃO DE EMMANUEL KANT (1724-1804)

Em Kant fica nítida a idéia da formação do Estado Liberal (Liberalismo econômico).

Afirma que a soberania pertence ao povo, o que revela um ideal democrático (o que não se encontra em Locke, pois, para este, a sociedade nasce de um contrato e a soberania do povo não existe).

Kant, após afirmar que a soberania pertence ao povo, classifica as pessoas em cidadãos independentes e cidadãos não-independentes: - independentes, "(...) são os que podem exprimir uma opinião política, que podem decidir a política do Estado ? são os cidadãos que não dependem de outros, isto é, os proprietários (grifei)". (Gruppi, op. cit. p. 16). Os demais, os que não são proprietários, não são independentes e não podem expressar opinião política. Os direitos políticos ativos cabem somente aos proprietários. Kant diz que a soberania pertence ao povo, mas a restringe apenas a um grupo, negando os direitos políticos aos não-proprietários.

Essência do Liberalismo: a relação indissociável entre propriedade e liberdade.

"Essa distinção entre proprietários e não-proprietários é o alicerce do liberalismo e é expressa com extrema lucidez por Kant". (op.cit. p. 17)

Kant atribui um sentido superior à lei: é tão sagrada, tão inviolável, que é crime até mesmo colocá-la em discussão. É o instrumento regulador entre propriedade e liberdade, representando a soberania do povo, mas está acima dessa soberania. É a visão liberal típica do Estado de Direito. "A soberania do povo deve ser delimitada por algumas leis que estão acima dela e são inviolávis, indiscutíveis: o direito de propriedade, a liberdade de palavra, de expressão, de reunião, de associação. Liberdade que, na prática, são usufruídas apenas por quem tiver recursos suficientes para desfrutar delas". (ibidem).

A CONCEPÇÃO DE KARL HEIRINCH MARX - (1818-1883)

Marx, ao contrário do pensamento liberal, estabelece a conexão entre a sociedade civil (conjunto das relações econômicas) e a sociedade política (o Estado), que se apresentam entrelaçadas, sendo uma expressão da outra. "A sociedade política, o Estado, é expressão da sociedade civil, isto é, das relações de produção que nela se instalaram". (ibidem, p. 26).

Na obra A Ideologia Alemã, Marx sintetiza a essência de sua concepção entre o desenvolvimento econômico, o Estado e as ideologias. "(...) não é o Estado que funda a sociedade civil, que absorve em si a sociedade civil, como afirmava Hegel; pelo contrário, é a sociedade civil, entendida como o conjunto das relações econômicas, que explica o surgimento do Estado, seu caráter, suas leis, e assim por diante". (Ibidem, p. 27).

Ao discutir a concepção marxista, Gruppi faz uma abordagem precisa e eloqüente: "O Estado escravista garante a dominação sobre os escravos, o Estado feudal garante as corporações, e o Estado capitalista garante o predomínio das relações de produção capitalistas, protege-as, (...) garante a reprodução ampliada do capital, a acumulação capitalista (...)" (p.28).

Marx não produz uma elaboração orgânica da teoria do Estado, mas forneceu o elemento para a teoria fundamental a partir da qual pode-se construir uma teoria do Estado: a estrutura econômica está na base do próprio Estado. Este é o fundamento para a compreensão do Estado.

Para finalizar estas abordagens sobre concepções de Estado, a lição de Norberto Bobbio (In Entre Duas Repúblicas: às origens da democracia italiana. São Paulo: Editora UnB, 2001):
"Há ainda quem diga que a política é questão de homens. Tais pessoas formavam durante o fascismo o alinhamento dos desiludidos, porque admitiam que tudo teria dado certo se, no lugar daqueles homens, corruptos e prepotentes, houvesse outros homens, honestos, íntegros. (...)

Esse conceito, melhor dizendo, esse preconceito, baseia-se na divisão abstrata e moralista dos homens, de todos os homens, em bons e maus, e na falsa e ingênua opinião de que a política seja a simples arte de colocar os bons no lugar dos maus". (op. cit. p. 31)

O autor salienta que não se trata de questão dos homens, mas questão de instituições. "Os homens, na sua maioria, são aquilo que são; as boas instituições revelam as qualidades positivas, as más instituições, as negativas. Uma instituição onde os homens se corrompem e antepõem o próprio interesse ao interesse público, não resta dúvida, é uma má instituição". (ibidem, p. 32).

Bobbio, ao mesmo tempo, questiona e responde: qual a solução, de onde virá a resposta?
"Respondemos com duas palavras: instituições democráticas. São aquelas instituições que chamam o maior número possível de cidadãos à responsabilidade do poder sem amarrá-los; que, ampliando o sufrágio, a participação, o controle, impedem alguns poucos de transformar o Estado em uma fortaleza de privilégios e de tirar do poder todas as vantagens, descartando todas as responsabilidades. (...) É preciso substituir de uma vez por todas o poder dos homens pelo governo das instituições democráticas" (pp. 33-34)

REFERENCIA BIBLIOGRAFICA
Fonte principal de consulta para elaboração deste material:
GRUPPI, Luciano. Tudo começou com Maquiavel. Porto Alegre: L&PM Editores Ltda.

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UNIVESC - CURSO DE DIREITO
Trabalho de Filosofia Juridica

Acadêmicos:
Claultyon Andrey Farias
Fabiana Simiano
Eloisa de Oliveira Furtado