FATORES CLIMÁTICOS IMPRESCINDÍVEIS À GERMINAÇÃO DE SEMENTES DE ESPÉCIES FLORESTAIS TROPICAIS

Por Tarcísio Viana de Lima | 30/12/2021 | Ecologia

FATORES CLIMÁTICOS IMPRESCINDÍVEIS À GERMINAÇÃO DE SEMENTES DE ESPÉCIES FLORESTAIS TROPICAIS

Tarcísio Viana de Lima[1]

RESUMO

Indispensáveis para a renovação e manutenção da vida nos diversos ecossistemas, os fatores mesológicos climáticos são segmentos de estudos que permitem compreender, de forma gradativa, a profunda e necessária influência que esses componentes exercem sobre a etologia no âmbito das interações, distribuição geográfica e abundância dos seres vivos na biosfera; mas, principalmente, na dinâmica dos processos indutores da germinação das sementes e emergência das plântulas. Portanto, o presente manuscrito teve por objetivo reunir de forma condensada informações e conceitos básicos extraídos de fontes bibliográficas que tratam especificamente dos aspectos relacionados a germinabilidade das unidades reprodutivas das espécies vegetais a partir das participações efetivas dos fatores climáticos representados pela água, luz e temperatura, imprescindíveis para as atividades metabólicas que regem a dinâmica reprodutiva dos taxa em geral.

Palavras-chave: Unidades reprodutivas; Água; Luz; Temperatura.

 

  1. INTRODUÇÃO

Neste trabalho de revisão são sistematizados alguns embasamentos teóricos relacionados aos fatores ambientais reconhecidamente importantes por serem imprescindíveis na dinâmica germinativa das unidades reprodutivas das plantas dos mais diversificados ecossistemas florestais, sobretudo as que contemplam as grandes coberturas vegetacionais nas regiões intertropicais.

Embora os fatores ambientais tenham sido amplamente analisados e discutidos no contexto ecológico, bem como apresentados em inúmeras referências bibliográficas especializadas, nem sempre é possível encontrar de forma concisa as diversas proposições difundidas sobre os processos que desencadeiam a germinação de unidades reprodutivas de espécies vegetais a partir da interferência direta desses fatores mesológicos, particularmente os de origem climática.

Portanto, com o objetivo de reunir algumas das principais afirmações teóricas de pesquisadores e autores de trabalhos que, ao longo do tempo, vêm realizando estudos sistemáticos que tratam das implicações resultantes da ação dos fatores ambientais sobre o comportamento germinativo de sementes, a presente e concisa revisão bibliográfica procura sistematizar essas linhas de pensamentos teóricos visando ampliar a compreensão de como esses fatores ambientais interferem no poder germinativo das sementes e, por consequência, na dinâmica populacional e comunitária dos ecossistemas florestais em geral.

2. DESENVOLVIMENTO

A importância dos principais fatores climáticos na evolução germinativa das sementes de espécies florestais

  1. Água

Indispensável para as bioformas encontradas na biosfera terrestre, a água exerce papel preponderante no processo de desenvolvimento na medida em que a semente altera seu estado metabolicamente ativo para o inativo, devido ao efeito da dessecação, após alcançar a maturidade; regressando ao estágio metabólico pleno durante a germinação (FERREIRA E BORGHETTI, 2004).

A ocorrência da germinação de sementes, que está na dependência direta da sua retomada metabólica, pode favorecer, ou não, o estabelecimento da futura planta no ambiente. Essa reativação das atividades metabólicas inicia-se com a disponibilidade de água no solo e a efetiva embebição por parte das sementes. Entretanto, essa absorção hídrica, responsável pela reidratação e respiração dos tecidos embrionários impelindo-os a germinação, só é possível se a permeabilidade do tegumento e as propriedades coloidais das sementes permitirem essa reidratação (CARVALHO e NAKAGAWA, 2000; NASSIF et al., 1998).

Considerando-se a disponibilidade hídrica dos solos, em especial a das regiões tropicais, constata-se que a água subterrânea é a principal fonte de suprimento para a hidratação das espécies florestais (BRAGA et al., 2008).

Embora seja a água subterrânea a principal fonte hídrica, a velocidade de absorção é fator preponderante e varia de espécie para espécie, sendo condicionada pela disponibilidade desse recurso, que pode oscilar desde a saturação até próximo de zero; e pela pressão hidrostática. Essa oferta de água e sua velocidade de fluxo para a semente são determinadas pela diferença de potencial hídrico entre a unidade reprodutiva e o meio (BITTENCOURT, 2002).

Segundo Carvalho e Nakagawa (2000), a absorção hídrica pelos diferentes tecidos da semente ocorre de forma distinta. Nesse contexto, observa-se que o tegumento, em decorrência da sua maior consistência, absorve baixa quantidade de água em relação ao tecido de reserva, cuja capacidade de absorção é maior a tal ponto de funcionar como um reservatório a partir do instante que cessa a captação. Todavia, é o tecido meristemático, por ser responsável pelo crescimento, o que absorve as maiores quantidades de água.

Apesar do tegumento restringir ou absorver menor quantidade de água, na realidade ele exerce papel regulador de entrada dessa substância na semente. Portanto, atua como uma barreira mecânica à difusão acentuada, executando funções vitais para o bom desenvolvimento, manutenção, viabilidade e perpetuação da espécie no ambiente (LOPES et al., 2006).

Ecofisiologicamente, constata-se que a sensibilidade hídrica é inversamente relacionada ao tamanho das sementes, uma vez que a maior eficiência no processo de absorção verifica-se naquelas unidades menores, devido ao menor contato de sua superfície com o substrato (CARVALHO e NAKAGAWA, 2000).

No caso específico das florestas tropicais, as sementes geralmente localizam-se na superfície do solo. Essa disposição espacial estabelece o balanço entre o ganho de umidade do solo e a perda por transpiração, determinando, assim, o instante em que a semente adquire umidade suficiente para iniciar a germinação. Esse contexto ecofisiológico pode determinar, inclusive, a extensão alcançada pela germinação, sobretudo de uma coorte de sementes instalada num sítio durante um período. Como a dinâmica de distribuição espacial de sementes nas florestas tropicais também permite que tais unidades possam ser cobertas pela serrapilheira ou parcialmente enterradas, verifica-se, nessas condições, uma possível melhoria no balanço hídrico entre o substrato e a semente, permitindo eventualmente total embebição do embrião (BASKIN e BASKIN, 1998).

Baskin e Baskin (1998), porém, advertem que as sementes recalcitrantes, aquelas com alto teor de umidade (30 a 70%) durante a fase de maturação; apresentam metabolismo contínuo e são passíveis de perderem a viabilidade antes de efetivar sua germinação quando em sítios onde se verificam redução de umidade abaixo de um determinado valor crítico ou quando submetidas à elevada insolação direta em áreas abertas (clareiras).

Contrariamente as recalcitrantes, as sementes ortodoxas, por possuírem um baixo teor de umidade (15 – 20%), conseguem suportar gradientes de escassez hídrica quando submetidas diretamente sobre solo desnudo, tolerando inclusive desidratação inferior a 5%, sem sofrer danos na sua viabilidade (BASKIN e BASKIN, 1998). Segundo esses autores, é trivial se perceber germinação demorada nesse grupo de sementes enquanto não ocorrer aumento na umidade do solo.

Independentemente do teor de umidade intrínseco em que se enquadrem as sementes silvestres, condicionando-as a ter maior ou menor habilidade no processo de ativação de suas funções metabólicas, são as imposições ambientais, sobretudo as tensivas, que determinarão a sua capacidade de efetivar a germinação. Capacidade essa conhecida por plasticidade fenotípica (NOVOPLANSKY, 2002).

  1.  Luz

Considerada parte visível da radiação solar, a luz é um dos principais fatores ambientais por exercer importância substancial no controle da germinação (LIMA et al., 2007).

Segundo Nassif et al. (1998), no que diz respeito à sensibilidade luminosa, há uma ampla variação às respostas germinativas. Dessa forma, detectam-se na natureza sementes que só germinam quando submetidas à extensa exposição à luz, já outras a uma breve exposição. Além dessas, encontram-se ainda àquelas indiferentes à luminosidade, as que germinam no escuro e as que requerem um longo ou curto fotoperíodo diário.

Dentro desse contexto, observa-se que a luminosidade, apesar de sua importância no evento germinativo, nem sempre é fator indispensável e limitante nesse processo, pois há espécies produtoras de sementes cuja germinação é efetivada na presença da luz branca, portanto classificadas como fotoblásticas positivas; outras produzem unidades reprodutivas que germinam na ausência de luz branca, sendo enquadradas como fotoblásticas negativas; e as geradoras de sementes que se comportam indiferentemente à presença ou ausência da luminosidade, logo incluídas como fotoblásticas neutras ou afotoblásticas (MARCOS FILHO, 2005; FERREIRA e BORGHETTI, 2004; RIZZINI, 1997; POPINIGIS e SANTOS, 1990).

Para Piña Rodrigues (1990), espécies florestais pioneiras e secundárias iniciais são fotoblásticas e, portanto, para germinar requerem um equilíbrio entre a intensidade de luz vermelha e vermelho longo; enquanto secundárias tardias e climácicas, por pertencerem aos estádios mais avançados da sucessão ecológica, podem germinar, ou não, na presença da radiação direta. Essa assertiva se assemelha com a posição de Ferreira e Borghetti (2004), pois asseveram que sementes de espécies cujo desenvolvimento ocorre sob dossel ou cobertura vegetal densa geralmente germinam com baixíssima intensidade luminosa, enquanto sementes de espécies típicas de ambientes abertos (grandes clareiras ou áreas sem vegetação) exigem quantidade relativamente expressivas de luz para emergirem.

Essa forma de se agrupar sementes considerando sua capacidade germinativa em função da ocorrência ou não da luminosidade vem gerando contradições, ao longo do tempo, pois estudos têm comprovado que várias espécies heliófilas germinam também no escuro. Baseado nessas constatações, Klein e Felippe (1991) separaram as espécies fotoblásticas positivas em preferenciais, quando há alguma evidência de germinação no escuro; e absolutas, quando inexiste germinação na ausência da luz.

A sensibilidade das sementes detectarem alterações na luminosidade ambiental está diretamente relacionada à presença de pigmentos fotorreceptores denominados de fitocromos.

O fitocromo se expressa sob duas formas: fitocromo vermelho (Fv) e o vermelho extremo (Fve). Enquanto este é fisiologicamente ativo, aquele é inativo e produzido no escuro. A partir do instante em que o fitocromo vermelho é exposto a radiações na faixa de 660 nm, mais precisamente sob comprimento de onda vermelho, verifica-se a sua conversão em fitocromo vermelho extremo. Fisiologicamente, o processo de fotoconversão é reversivo e apresenta comportamento cinético bidirecional. A condição ativa do fitocromo possibilita a síntese e concentração suficiente do hormônio giberelina, responsável pela ocorrência da germinação. Contrariamente, o fitocromo inativo sintetiza o ácido abscísico, o qual inibe o processo germinativo das sementes (MARCOS FILHO, 2005; VAZ et al., 2008; FLOSS, 2004).

Esse processo fisiológico dinâmico desenvolvido pelos pigmentos fotorreceptores induziu a Takaki (2001) a propor a substituição do conceito do fotoblastismo pelas formas controladoras da germinação por meio do fitocromo, pois todas as sementes possuem esse pigmento.

A luz, entretanto, não só influencia as sementes e/ou outras estruturas do vegetal, é capaz também de modificar o comportamento de outros fatores ambientais, entre esses a temperatura, intensificando, ou não, seus efeitos (POPINIGIS e SANTOS, 1990).

  1. Temperatura

Para vários autores, a temperatura é considerada um fator de extrema importância nos processos ecofisiológicos dos vegetais, independentemente de apresentarem hábitos ecológicos herbáceo, arbustivo ou arbóreo. Entre esses autores, Rizzini (1997) é categórico em afirmar que as condições térmicas ambientais são básicas na dinâmica de distribuição das floras, além de interferirem no aspecto organizacional do corpo vegetal. Entretanto, é fundamental a percepção de que a temperatura não só atua na conjuntura comunitária ou macroecossistemática, mas principalmente no que diz respeito a indução germinativa de sementes das espécies vegetais, em particular as encontradas nos complexos ecossistemas tropicais da biosfera.

Nesse contexto, Ferraz-Grande e Takaki (2001) salientam que há espécies cujas sementes são insensíveis à incidência de radiação, porém germinam sob temperaturas relativamente altas, favorecendo a sua ocorrência tanto em ambientes de clareiras quanto sombreados pela vegetação.

Para Barbosa et al. (1990), o fator temperatura é crucial para a germinação e está, estreitamente, vinculado às características ecológicas da espécie vegetal. Já Carvalho e Nakagawa (2000) consideram que, além de agir na velocidade de absorção hídrica por parte da planta, a temperatura influi no total, na velocidade e na uniformidade de germinação.

Segundo Deen et al. (1998), a temperatura deve ser considerada o fator ambiental mais importante em meios úmidos, devido a sua capacidade de controlar a germinação de sementes de várias espécies típicas de solos com essas características.

Independente do grau de importância assumido pela temperatura, Carvalho e Nakagawa (2000) alertam que a germinação só se processa dentro de limites térmicos nos quais sobressai a temperatura adequada onde se verifica a maior eficiência de emergência de plântulas.

Floss (2004) denomina esses limites térmicos específicos de pontos cardeais e os identifica por meio da temperatura mínima, quando abaixo da qual, os processos metabólicos e fisiológicos são paralisados devido à inibição enzimática; da temperatura máxima, aquela em que, uma vez superada, as atividades metabólicas e fisiológicas cessam devido à desnaturação enzimática; e pela temperatura ótima, considerada ideal para o metabolismo e a fisiologia da estrutura orgânica.

Além de corroborar com as opiniões de Carvalho e Nakagawa (2000) e Floss (2004); Marcos Filho (2005) acrescenta que a velocidade, a porcentagem e a uniformidade da germinação são influenciadas pelas oscilações da temperatura. Nessas variações térmicas, entretanto, há uma faixa ideal ou ótima, na qual a germinação da semente se expressará com o máximo potencial num menor espaço de tempo, devido à combinação eficiente entre a velocidade e porcentagem de emergência.

Segundo Felippe e Silva (1984), os mais significativos percentuais de germinação para a maioria das espécies vegetais concentram-se entre 20 e 30ºC. Entretanto, só as espécies com ampla distribuição geográfica- euritópicas -, ou que são adaptadas às grandes oscilações de temperatura no seu ambiente, produzem sementes com capacidade para iniciar sua germinação numa faixa extensa de temperatura (LARCHER, 2000).

Marcos Filho (1986) e Popinigis (1985), entretanto, argumentam que temperaturas elevadas são drásticas para a germinação de sementes de inúmeras espécies porque elas podem desestabilizar enzimas, causar modificações fisiológicas nas sementes, ou tornar o oxigênio insolúvel, aumentando sua exigência e acelerando a velocidade respiratória dessas unidades reprodutivas.

Já a redução térmica, de acordo com Marcos Filho (2005), ocasiona modificações na dinâmica da velocidade de embebição e na mobilização de reserva. Como consequência, haverá decréscimo na velocidade de emergência e o sistemático aumento da sensibilidade das sementes aos fatores adversos do ambiente, mais especificamente com relação aos microrganismos patogênicos, que impedirão o estabelecimento de plântulas.

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É evidente que nesta concisa revisão não houve pretensão de reunir informações detalhadas e eficazmente profundas oriundas das diversificadas fontes bibliográficas que retratam o comportamento das principais variáveis climáticas indutoras de processos metabólicos cruciais no ciclo de vida das plantas, que, basicamente, encontra-se estratificado em três fases: jovem ou pré-reprodutiva, caracterizada pelo crescimento e desenvolvimento vegetativo; reprodutiva ou adulta, expressa pela consolidação da capacidade da planta em produzir estruturas que viabilizam a sua manutenção no ecossistema; e pós-reprodutiva ou senescente, indicadora da redução gradativa e perda total da capacidade de perfilhamento da planta.

Na realidade, o foco deste levantamento bibliográfico teve por viés ratificar que, além da radiação solar, a água e temperatura são componentes climáticos fundamentais e, portanto, indissociáveis quando se analisa a coparticipação dessas variáveis no contexto da germinação de unidades reprodutivas dos vegetais, em particular daqueles que se distribuem geograficamente nas regiões tropicais do globo terrestre.

  1. REFERÊNCIAS

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[1] Professor do Curso de Engenharia Florestal da Universidade Federal Rural de Pernambuco.

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