Exegese de Romanos 1:1
Por Jorge Schemes | 17/12/2008 | BíbliaEXEGESE DE ROMANOS 1:1
O Significado da Expressão: Servo de Jesus Cristo
(Grego: Doulos Cristou Iesou)
Por: Jorge Schemes
O texto original em grego diz: “PAULOS DOULOS CRISTOU IESOU KLETOS APOSTOLOS APHORISMENOS EIS EUANGELION THEOU”. (Paulo, um escravo de Jesus Cristo, chamado apóstolo que foi separado para o evangelho de Deus). A Bíblia de Jerusalém traduz o texto assim: “Paulo, servo de Jesus Cristo. Apóstolo por vocação, escolhido para o evangelho de Deus”. Contudo, temos que notar a ausência do artigo definido antes da palavra Apóstolo no original grego. Paulo começa sua carta assinando no começo pois este é o costume da sua época, isto é, indica o nome e dá certa informação do autor no começo e não no final como geralmente fazemos hoje.
Quem Foi Paulo?
A carta aos Romanos começa com um nome pessoal, Paulo. Não é por acaso que ele começou assim, pois um nome não é uma mera palavra de rotina, e principalmente no caso de Paulo que era um dirigente religioso.. Ao iniciar a carta de Romanos com o seu nome Paulo assume sua responsabilidade pois seu nome o colocava em evidência. Sem dúvidas que a mensagem do seu Senhor começa com o nome, a humanidade do profeta sob a inspiração do espírito Santo de Deus (Cf. II Pedro 1:21).
Vamos considerar algumas características da vida pessoal de Paulo. Nascido em tarso da Cilicia por volta do ano 10 de nossa era, de uma família judia da tribo de benjamim, mas ao mesmo tempo cidadão romano. Havia um pacto entre Roma e Tarso de que quem nascia em Roma era Tarsiano e quem nascia em Tarso era Romano. Logo, Paulo era com certeza cidadão Romano por nascimento.
Podemos concluir também que Paulo foi também Hebreu por nascimento, educação e sentimentos pois foi capaz de denominar-se “hebreu dos hebreus” (Cf. Filipenses 3:5). Em Romanos 11:1 lemos que era da tribo de Benjamim. Siegfried Horn sugere que talvez colocaram seu primeiro nome como Saul, o primeiro rei de Israel, o qual também era da tribo de Benjamim.
As Escrituras Sagradas não dizem quase nada acerca de seus pais. Há apenas uma menção passageira a sua mãe (Cf. Gálatas 1:15). Segundo Atos 23:16 Paulo não era filho único, pois neste texto é mencionado o filho da irmã de Paulo. Mas, pouco se sabe de sua família. Atos 22:28 faz menção ao seu pai como um cidadão romano e talvez fariseu (Cf. Atos 23:6); Se foi assim podemos supor que Paulo procedia de uma família de certa importância na sociedade judaica. Jerônimo, historiador judeu, afirma que os pais de Paulo viveram originariamente na região da Galiléia e que por volta do ano 04 antes de Cristo foram levados como escravos a Tarso, onde obtiveram sua liberdade, prosperaram e se tornaram cidadãos romanos.
Assim, a vida de Paulo começou em tarso, e como todo judeu foi circuncidado ao oitavo dia. O mundo na época de Paulo era culturalmente heterogêneo e era um mundo poliglota. Sem dúvida havia uma multidão de idiomas diferentes, sendo o grego a língua franca do império e o latim além da língua vernácula de cada grupo.
Os comentaristas estão de acordo ao afirmarem que Paulo recebeu dois nomes por ocasião de seu nascimento. Devido ao contexto poliglota e multicultural no qual nasceu Paulo ou Saulo, ele tinha dois nomes. Pode Ter acontecido o seguinte: quando foi circuncidado recebeu um nome judeu: Saulo, mas como vivia numa comunidade gentil foi lhe dado também um nome latino: Paulus, cujo significado eqüivale em grego a Pauros, que significa “pequeno garoto”.
Talvez como hebreu Paulo se identificaria ou se apresentaria assim: sou Saulo, o fariseu de Jerusalém; e talvez como cidadão romano assim: sou Paulo cidadão de Tarso. Portanto, a suposta modificação ou mudança de seu nome não tem fundamento, e certamente não está relacionada com sua conversão no caminho de damasco. Mas o que pode Ter acontecido foi uma transição do uso de um nome para outro, mas por quê? Segundo James Dunn, Paulo como cidadão romano gozava de privilégios, então desde que Paulo se converteu no apóstolo dos gentios desejava desfrutar de mais liberdade para levar o evangelho ao mundo da época. Desde que Saulo era um nome pouco familiar fora dos círculos judaicos, a transição do uso do seu nome foi um feito natural; assim, Paulo refletia seu compromisso e sua responsabilidade como apóstolo dos gentios.
O Doutor Siegfried Horn afirma que Paulo (Gr. Paulos) é mencionado até Atos 13:9 com o nome de Saulo (Gr. Saulos, do Hebraico Shaul = pedido [a Deus]; Cf. Atos 7:58); e dali em diante só é mencionado como Paulo, exceto no relato que ele mesmo faz de sua conversão (Cf. Atos 22:7,13; 26:14). Horn também sugere que o apóstolo tem dois nomes e que em seus contatos com os judeus talvez usasse o nome hebreu Saulo, e por outro lado usava seu nome greco-romano, Paulus, em contato com os gentios, aos quais desejava evangelizar.
Ma há muita especulação com respeito a isto, e a mais possível talvez seja a que esteja relacionada com o contexto histórico de seu nascimento. Por tanto é claro perceber que Paulo expressa seu nome como cidadão romano numa carta para os fiéis cristãos da capital do império, uma igreja de cristãos judeus e gentios. Uma coisa é certa, que sua conversão foi decisiva para que ele mudasse o uso do seu primeiro nome para o segundo, ou seja, Saulo estava relacionado a sua vida farisaica (judia) e Paulo era um nome mais próprio para aproximar-se dos gentios como ele mesmo escreveu; “Me faço fraco para com os fracos...” então eu creio que Paulo estava fazendo-se gentil para ganhar os gentios, com relação ao uso de seu nome num mundo gentílico. Paulo desejava Ter uma nova visão de si mesmo, não mais como Saulo, o fariseu, mas como Paulo, o apóstolo (aquele que foi enviado com uma missão) para os gentios.
Paulo, desde sua juventude recebeu uma educação profundamente religiosa segundo as doutrinas farisaicas. Saulo tinha um orgulho especial por ser fariseu, vivia como um fariseu “conforme a mais rigorosa seita da religião judaica” (Cf. Atos 26:5; Filp. 3:5). Saulo recebeu duas fortes influencias para ser um fariseu: a primeira foi a de seu pai, que segundo a indicação do próprio Paulo era talvez um fariseu; a outra por meio da educação que recebeu sob a tutela de Gamaliel I (Cf. Atos 5:34; Atos 23:6). O certo é que Saulo chegou a ser o partidário mais fanático de sua seita (Cf. Atos 5:34), e desta maneira colocou o fundamento para sua futura e enérgica cruzada contra Jesus representado em sua igreja militante (Cf. Atos 9:4). Além de estar envolvido na morte de Estevão (Cf. Atos 7-8:1-3), Paulo foi um feroz perseguidor da nascente igreja cristã.
Como fariseu Paulo considerava Jesus como um impostor, uma vez que acreditava na salvação pelas obras, em recompensa por méritos, no sofrimento purificatório e na graça acrescentada ao méritos próprios, ou seja, a salvação era obra humana ajudada pela graça de Deus quando faltavam ações meritórias.
Entretanto Saulo foi tocado bruscamente no caminho de Damasco, pela aparição de Jesus Cristo, que revelou a ele a verdade da fé cristã e lhe fez conhecer sua missão especial de apóstolo dos gentios (Cf. Atos 9:1-22). É neste ponto que Paulo ou Saulo começa a se transformar em “Servo de Jesus Cristo”.
Servo de Jesus Cristo (Gr. Doulos Cristou Iesou)
Paulo não inicia sua carta aos Romanos com orgulho, ele jogou fora toda exaltação própria ao declarar que era um servo de Jesus Cristo (Gr. Cristou Iesou = Salvador Ungido). Paulo teve toda sua mente e filosofia farisaica de salvação mudada quando encontrou ao seu Senhor. E agora começa escrevendo que é servo, escravo do Senhor dos senhores, Jesus Cristo.
O que Paulo tinha em mente ao escrever a palavra “servo” (Gr. Doulos = escravo)? Estava dizendo que sua personalidade e sua liberdade estavam anuladas? Não tinha mais liberdade para fazer sua própria vontade?
A palavra servo que Paulo usa é no original grego Doulos, que significa escravo; mas Paulo não usa a palavra Doulos como algo comum simplesmente. O que ele deseja dizer é que ele não é mais escravo do farisaísmo cheio de justiça própria, mas agora é escravo do “Senhor Justiça Nossa”. O apóstolo dos gentios se denomina a si mesmo como Doulos de cristo Jesus.
Granfield sugere que o contexto para sua própria designação como escravo está embasado no Antigo Testamento. Para a tradição grega a palavra Doulos tem uma conotação muito negativa. Por outro lado, no Antigo Testamento a palavra é usada com ois sentidos ou significados: revela as relações entre reis e servos, mas também é empregada para mostrar o relacionamento entre o ser humano e Deus. Talvez Paulo esteja tirando a expressão Servo de Jesus Cristo de sua herança judia, uma vez que no Antigo Testamento os judeus se consideravam em geral como servos de Deus, sendo que a aplicação de servo de Deus também é usada em relação a grandes pessoas ou profetas, como por exemplo Moisés.
James Dunn sugere que o uso da palavra servo pelo povo de Israel lhe dava um sentido peculiar e exclusivo de que eles pertenciam somente a Jeová. Ao usar a mesma expressão, não significa que Paulo estivesse pretendendo a mesma posição dos antigos profetas, mas ele talvez estivesse chamando a atenção da igreja em Roma de que ele não pertencia mais a si mesmo e que era tão exclusivo para Deus como pessoa como foi o povo de Israel. Paulo estava dizendo que ele pertencia e dependia do seu Senhor.
Paulo freqüentemente usa a palavra Doulos em seus escritos. Colin Brown afirma que o título Servo de Jesus Cristo é usado por Paulo para referir-se a um de seus colegas, Epafras (Cf. Col. 4:12). Brown sugere que a palavra Doulos tem uma ligação próxima com a palavra Diáconos (aquele que serve ou servo). Mas, a palavra Doulos é distinta pois revela um sentido de subordinação, obrigação e responsabilidade para com o seu Senhor.
O conceito Paulino de escravidão está intimamente relacionado ao conceito de liberdade, ao mesmo tempo em que todos somos chamados para a liberdade, somos chamados também para ser servos uns dos outros em amor (CF. Gal. 5:13). O próprio Paulo se faz a si mesmo servo de todos por meio do evangelho (Cf. I Cor. 9:19).
É interessante notar que a frase servo de Jesus cristo é amplamente usada no vocabulário cristão primitivo. Para os apóstolos na liderança da igreja, mas também para a comunidade cristã em geral (Atos 4:29; I Cor. 7:22).
É importante perguntar: Por que Paulo é um escravo? Que status ocupa como Doulos?
Em seu livro “Slavery as Salvation”, Dale Martin informa que na sociedade romana os escravos não ocupavam posições comuns como escravos apenas, mas muitos deles serviam em casas particulares e alguns como escravos livres. Desta maneira podemos imaginar que havia diferentes graus de escravatura e diferentes senhores. Sendo assim, os próprios escravos viviam e estavam em diferentes status.
Quando um escravo era mudado de lugar, mudava também sua situação, a qual podia ser menos ou mais importante. Por exemplo: um escravo no palácio do imperador e um escravo numa casa mais pobre. Resumindo, a situação de um escravo estava relacionada com a autoridade e grandeza de seu senhor. Logo, ser um escravo de Jesus Cristo não é para Paulo uma vergonha ou um status baixo, mas é simplesmente o mais alto lugar de serviço. Seu valor como escravo está ligado a posição de seu senhor. Paulo é um exclusivo escravo de Jesus Cristo (Gr. Iesous Cristou). O que significa ser servo do Senhor? O nome do Senhor é importante nesta relação, “Iesous”, segundo Mouton é a forma grega para o nome Joshua em Hebraico, e foi amplamente usado pelos judeus tanto antes como depois da era cristã. Então era um nome comum, simples, mas Paulo não está falando de um personagem comum, pois este Iesous é o Cristou que segundo Smith é o Mesias, ou seja, o Ungido do Senhor YHWH. A escravidão de Paulo está intimamente relacionada com o senhorio de Cristo, pois Ele é o Kurios, aquele que tem poder, autoridade, é mestre, é Senhor, Kurios é um título divino para Jesus e usado depois de sua ressurreição, Ele é o vitorioso Senhor, Eterno Senhor, Rei dos reis e poderoso Deus. Todavia o Kurios também vestiu a posição de servo quando assumiu a natureza humana (Cf. Filip. 2:7).
A palavra servo (Gr. Doulos) na luz da cultura greco-romana e dos costumes gregos é mais tarde contrastada com o título familiar usado para os súditos do imperador, como sendo seus escravos, mas Paulo o relaciona não com o imperador, mas sim com Jesus Cristo. Doulos descreve uma absoluta dependência e um total compromisso com o Kurios e ao mesmo tempo revela a total soberania do Kurios acima do Doulos. Todavia Paulo não é um servo ou escravo por temor, porque seu serviço está baseado no amor do seu senhor, o qual foi provado e escrito com sangue (CF. Romanos 5:6-8).
Paulo era um escravo de Cristo por amor, se considerava propriedade de Cristo e completamente sob seu controle. No império romano havia uma lei que obrigava ao escravo a estar a mercê absoluta de seu amo, para a vida ou para a morte, estava sujeito ao menor capricho de seu dono. Assim era com Paulo, não havia separação entre ele e Jesus, os dois eram um, a personalidade, o caráter de seu senhor estavam gravados (Gr. Tupos) em Paulo. Uma vez que Jesus o havia comprado com seu sangue e o havia redimido da escravidão do pecado e de seu farisaísmo, agora livre do poder do pecado era um escravo da justiça (Cf. Romanos 6:18). Isso não o conduzia a uma vida independente, pelo contrário, sua liberdade o levava à obediência pela fé em Cristo, Paulo se apresentava ao seu senhor como seu servo (Cf. Romanos 12:11). Por essa razão Kittel afirma que a frase Doulos Iesou Cristou não pode ser separada do entendimento de relacionamento dos cristãos com Cristo.
Paulo não é meramente aliado de Jesus Cristo, ou seu súdito, ou seu amigo, pois como escreveu Handley Moule: “a liberdade do evangelho é a cara de prata do mesmo escudo cuja cara de ouro é a vassalagem incondicional ao senhor libertador”. Ser um escravo é terrível no abstrato; ser escravo de Jesus Cristo é o paraíso no concreto. A rendição de si mesmo, efetuada em solidão, é lançar-se ao frio vazio. Mas quando se trata da rendição ao Filho de Deus que nos amou e se entregou a si mesmo por nós (Cf. Gálatas 2:20), é o iluminado volver da alma ao lar, ao centro e à esfera da vida e do poder.
Paulo como Doulos não se relacionava com Cristo numa base legal, jurídica, forense ou meritória como havia feito no farisaísmo. Ele é escravo de Jesus Cristo, um nome pessoal e oficial, ou seja, nosso senhor, nosso profeta, nosso sumo sacerdote e rei, sob o qual Paulo está servindo e seu serviço é baseado em um relacionamento pessoal, em uma fusão de personalidades (Cf. Gálatas 2:20). Com certeza Paulo não estava se declarando independente de Jesus Cristo, e tão pouco superdependente dele, mas sim seu servo particular, seu tesouro particular, herança exclusiva de Deus e sua propriedade definitiva; Paulo estava comprometendo-se com seu Senhor (Kurios) para sempre como um escravo livre.
Nos tempos de Paulo muitos escravos obtinham sua liberdade e havia várias maneiras de obtê-la, mas os escravos escolhiam ficar com seus senhores e donos pois era mais vantajoso e seguro, ainda eram escravos, mas livres. Outros escolhiam permanecer porque haviam se identificado tão completamente com seus senhores que já não desejavam ir adiante. Paulo desejou ficar com Jesus como seu servo porque também foi chamado; James Edwards sugere que Paulo tirou a expressão “servo” do livro de Isaías capítulo 49 versos 3 e 6, onde Deus fala a respeito de seu servo ao qual Ele enviaria aos gentios para levar sua mensagem de salvação. A própria vida de Paulo foi um comentário deste verso, ele se considerou a si mesmo como o apóstolo dos gentios (Cf. Gálatas 2:9), e seu desejo e aspiração era pregar ao judeus e gentios como “servidor do Messias Jesus”.
Bibliografia:
MOULE, C. G. Handley. Exposición de la Epistola de San Pablo a los Romanos. Buenos Aires: 1924.
EDWARDS, James R. New International Biblical Comentary on the Epistle to the Romans. Massachusetts: Hendrickson Publishers, Vol. 6, 1992.
SIMPSON, A. B. La Epistola a los Romanos. Chile: Imprenta y editorial alianza, 1997.
HORN, Siegfried H. Diccionario Biblico Adventista del Séptimo Dia. Argentina: ACES, Vol. 8, 1995.
DUNN, James D. G. Word Biblical Commentary. Texas: Word Books Publisher, Vol. 38, 1988
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A carta aos Romanos começa com um nome pessoal, Paulo. Não é por acaso que ele começou assim, pois um nome não é uma mera palavra de rotina, e principalmente no caso de Paulo que era um dirigente religioso.. Ao iniciar a carta de Romanos com o seu nome Paulo assume sua responsabilidade pois seu nome o colocava em evidência. Sem dúvidas que a mensagem do seu Senhor começa com o nome, a humanidade do profeta sob a inspiração do espírito Santo de Deus (Cf. II Pedro 1:21).
Vamos considerar algumas características da vida pessoal de Paulo. Nascido em tarso da Cilicia por volta do ano 10 de nossa era, de uma família judia da tribo de benjamim, mas ao mesmo tempo cidadão romano. Havia um pacto entre Roma e Tarso de que quem nascia em Roma era Tarsiano e quem nascia em Tarso era Romano. Logo, Paulo era com certeza cidadão Romano por nascimento.
Podemos concluir também que Paulo foi também Hebreu por nascimento, educação e sentimentos pois foi capaz de denominar-se “hebreu dos hebreus” (Cf. Filipenses 3:5). Em Romanos 11:1 lemos que era da tribo de Benjamim. Siegfried Horn sugere que talvez colocaram seu primeiro nome como Saul, o primeiro rei de Israel, o qual também era da tribo de Benjamim.
As Escrituras Sagradas não dizem quase nada acerca de seus pais. Há apenas uma menção passageira a sua mãe (Cf. Gálatas 1:15). Segundo Atos 23:16 Paulo não era filho único, pois neste texto é mencionado o filho da irmã de Paulo. Mas, pouco se sabe de sua família. Atos 22:28 faz menção ao seu pai como um cidadão romano e talvez fariseu (Cf. Atos 23:6); Se foi assim podemos supor que Paulo procedia de uma família de certa importância na sociedade judaica. Jerônimo, historiador judeu, afirma que os pais de Paulo viveram originariamente na região da Galiléia e que por volta do ano 04 antes de Cristo foram levados como escravos a Tarso, onde obtiveram sua liberdade, prosperaram e se tornaram cidadãos romanos.
Assim, a vida de Paulo começou em tarso, e como todo judeu foi circuncidado ao oitavo dia. O mundo na época de Paulo era culturalmente heterogêneo e era um mundo poliglota. Sem dúvida havia uma multidão de idiomas diferentes, sendo o grego a língua franca do império e o latim além da língua vernácula de cada grupo.
Os comentaristas estão de acordo ao afirmarem que Paulo recebeu dois nomes por ocasião de seu nascimento. Devido ao contexto poliglota e multicultural no qual nasceu Paulo ou Saulo, ele tinha dois nomes. Pode Ter acontecido o seguinte: quando foi circuncidado recebeu um nome judeu: Saulo, mas como vivia numa comunidade gentil foi lhe dado também um nome latino: Paulus, cujo significado eqüivale em grego a Pauros, que significa “pequeno garoto”.
Talvez como hebreu Paulo se identificaria ou se apresentaria assim: sou Saulo, o fariseu de Jerusalém; e talvez como cidadão romano assim: sou Paulo cidadão de Tarso. Portanto, a suposta modificação ou mudança de seu nome não tem fundamento, e certamente não está relacionada com sua conversão no caminho de damasco. Mas o que pode Ter acontecido foi uma transição do uso de um nome para outro, mas por quê? Segundo James Dunn, Paulo como cidadão romano gozava de privilégios, então desde que Paulo se converteu no apóstolo dos gentios desejava desfrutar de mais liberdade para levar o evangelho ao mundo da época. Desde que Saulo era um nome pouco familiar fora dos círculos judaicos, a transição do uso do seu nome foi um feito natural; assim, Paulo refletia seu compromisso e sua responsabilidade como apóstolo dos gentios.
O Doutor Siegfried Horn afirma que Paulo (Gr. Paulos) é mencionado até Atos 13:9 com o nome de Saulo (Gr. Saulos, do Hebraico Shaul = pedido [a Deus]; Cf. Atos 7:58); e dali em diante só é mencionado como Paulo, exceto no relato que ele mesmo faz de sua conversão (Cf. Atos 22:7,13; 26:14). Horn também sugere que o apóstolo tem dois nomes e que em seus contatos com os judeus talvez usasse o nome hebreu Saulo, e por outro lado usava seu nome greco-romano, Paulus, em contato com os gentios, aos quais desejava evangelizar.
Ma há muita especulação com respeito a isto, e a mais possível talvez seja a que esteja relacionada com o contexto histórico de seu nascimento. Por tanto é claro perceber que Paulo expressa seu nome como cidadão romano numa carta para os fiéis cristãos da capital do império, uma igreja de cristãos judeus e gentios. Uma coisa é certa, que sua conversão foi decisiva para que ele mudasse o uso do seu primeiro nome para o segundo, ou seja, Saulo estava relacionado a sua vida farisaica (judia) e Paulo era um nome mais próprio para aproximar-se dos gentios como ele mesmo escreveu; “Me faço fraco para com os fracos...” então eu creio que Paulo estava fazendo-se gentil para ganhar os gentios, com relação ao uso de seu nome num mundo gentílico. Paulo desejava Ter uma nova visão de si mesmo, não mais como Saulo, o fariseu, mas como Paulo, o apóstolo (aquele que foi enviado com uma missão) para os gentios.
Paulo, desde sua juventude recebeu uma educação profundamente religiosa segundo as doutrinas farisaicas. Saulo tinha um orgulho especial por ser fariseu, vivia como um fariseu “conforme a mais rigorosa seita da religião judaica” (Cf. Atos 26:5; Filp. 3:5). Saulo recebeu duas fortes influencias para ser um fariseu: a primeira foi a de seu pai, que segundo a indicação do próprio Paulo era talvez um fariseu; a outra por meio da educação que recebeu sob a tutela de Gamaliel I (Cf. Atos 5:34; Atos 23:6). O certo é que Saulo chegou a ser o partidário mais fanático de sua seita (Cf. Atos 5:34), e desta maneira colocou o fundamento para sua futura e enérgica cruzada contra Jesus representado em sua igreja militante (Cf. Atos 9:4). Além de estar envolvido na morte de Estevão (Cf. Atos 7-8:1-3), Paulo foi um feroz perseguidor da nascente igreja cristã.
Como fariseu Paulo considerava Jesus como um impostor, uma vez que acreditava na salvação pelas obras, em recompensa por méritos, no sofrimento purificatório e na graça acrescentada ao méritos próprios, ou seja, a salvação era obra humana ajudada pela graça de Deus quando faltavam ações meritórias.
Entretanto Saulo foi tocado bruscamente no caminho de Damasco, pela aparição de Jesus Cristo, que revelou a ele a verdade da fé cristã e lhe fez conhecer sua missão especial de apóstolo dos gentios (Cf. Atos 9:1-22). É neste ponto que Paulo ou Saulo começa a se transformar em “Servo de Jesus Cristo”.
Servo de Jesus Cristo (Gr. Doulos Cristou Iesou)
Paulo não inicia sua carta aos Romanos com orgulho, ele jogou fora toda exaltação própria ao declarar que era um servo de Jesus Cristo (Gr. Cristou Iesou = Salvador Ungido). Paulo teve toda sua mente e filosofia farisaica de salvação mudada quando encontrou ao seu Senhor. E agora começa escrevendo que é servo, escravo do Senhor dos senhores, Jesus Cristo.
O que Paulo tinha em mente ao escrever a palavra “servo” (Gr. Doulos = escravo)? Estava dizendo que sua personalidade e sua liberdade estavam anuladas? Não tinha mais liberdade para fazer sua própria vontade?
A palavra servo que Paulo usa é no original grego Doulos, que significa escravo; mas Paulo não usa a palavra Doulos como algo comum simplesmente. O que ele deseja dizer é que ele não é mais escravo do farisaísmo cheio de justiça própria, mas agora é escravo do “Senhor Justiça Nossa”. O apóstolo dos gentios se denomina a si mesmo como Doulos de cristo Jesus.
Granfield sugere que o contexto para sua própria designação como escravo está embasado no Antigo Testamento. Para a tradição grega a palavra Doulos tem uma conotação muito negativa. Por outro lado, no Antigo Testamento a palavra é usada com ois sentidos ou significados: revela as relações entre reis e servos, mas também é empregada para mostrar o relacionamento entre o ser humano e Deus. Talvez Paulo esteja tirando a expressão Servo de Jesus Cristo de sua herança judia, uma vez que no Antigo Testamento os judeus se consideravam em geral como servos de Deus, sendo que a aplicação de servo de Deus também é usada em relação a grandes pessoas ou profetas, como por exemplo Moisés.
James Dunn sugere que o uso da palavra servo pelo povo de Israel lhe dava um sentido peculiar e exclusivo de que eles pertenciam somente a Jeová. Ao usar a mesma expressão, não significa que Paulo estivesse pretendendo a mesma posição dos antigos profetas, mas ele talvez estivesse chamando a atenção da igreja em Roma de que ele não pertencia mais a si mesmo e que era tão exclusivo para Deus como pessoa como foi o povo de Israel. Paulo estava dizendo que ele pertencia e dependia do seu Senhor.
Paulo freqüentemente usa a palavra Doulos em seus escritos. Colin Brown afirma que o título Servo de Jesus Cristo é usado por Paulo para referir-se a um de seus colegas, Epafras (Cf. Col. 4:12). Brown sugere que a palavra Doulos tem uma ligação próxima com a palavra Diáconos (aquele que serve ou servo). Mas, a palavra Doulos é distinta pois revela um sentido de subordinação, obrigação e responsabilidade para com o seu Senhor.
O conceito Paulino de escravidão está intimamente relacionado ao conceito de liberdade, ao mesmo tempo em que todos somos chamados para a liberdade, somos chamados também para ser servos uns dos outros em amor (CF. Gal. 5:13). O próprio Paulo se faz a si mesmo servo de todos por meio do evangelho (Cf. I Cor. 9:19).
É interessante notar que a frase servo de Jesus cristo é amplamente usada no vocabulário cristão primitivo. Para os apóstolos na liderança da igreja, mas também para a comunidade cristã em geral (Atos 4:29; I Cor. 7:22).
É importante perguntar: Por que Paulo é um escravo? Que status ocupa como Doulos?
Em seu livro “Slavery as Salvation”, Dale Martin informa que na sociedade romana os escravos não ocupavam posições comuns como escravos apenas, mas muitos deles serviam em casas particulares e alguns como escravos livres. Desta maneira podemos imaginar que havia diferentes graus de escravatura e diferentes senhores. Sendo assim, os próprios escravos viviam e estavam em diferentes status.
Quando um escravo era mudado de lugar, mudava também sua situação, a qual podia ser menos ou mais importante. Por exemplo: um escravo no palácio do imperador e um escravo numa casa mais pobre. Resumindo, a situação de um escravo estava relacionada com a autoridade e grandeza de seu senhor. Logo, ser um escravo de Jesus Cristo não é para Paulo uma vergonha ou um status baixo, mas é simplesmente o mais alto lugar de serviço. Seu valor como escravo está ligado a posição de seu senhor. Paulo é um exclusivo escravo de Jesus Cristo (Gr. Iesous Cristou). O que significa ser servo do Senhor? O nome do Senhor é importante nesta relação, “Iesous”, segundo Mouton é a forma grega para o nome Joshua em Hebraico, e foi amplamente usado pelos judeus tanto antes como depois da era cristã. Então era um nome comum, simples, mas Paulo não está falando de um personagem comum, pois este Iesous é o Cristou que segundo Smith é o Mesias, ou seja, o Ungido do Senhor YHWH. A escravidão de Paulo está intimamente relacionada com o senhorio de Cristo, pois Ele é o Kurios, aquele que tem poder, autoridade, é mestre, é Senhor, Kurios é um título divino para Jesus e usado depois de sua ressurreição, Ele é o vitorioso Senhor, Eterno Senhor, Rei dos reis e poderoso Deus. Todavia o Kurios também vestiu a posição de servo quando assumiu a natureza humana (Cf. Filip. 2:7).
A palavra servo (Gr. Doulos) na luz da cultura greco-romana e dos costumes gregos é mais tarde contrastada com o título familiar usado para os súditos do imperador, como sendo seus escravos, mas Paulo o relaciona não com o imperador, mas sim com Jesus Cristo. Doulos descreve uma absoluta dependência e um total compromisso com o Kurios e ao mesmo tempo revela a total soberania do Kurios acima do Doulos. Todavia Paulo não é um servo ou escravo por temor, porque seu serviço está baseado no amor do seu senhor, o qual foi provado e escrito com sangue (CF. Romanos 5:6-8).
Paulo era um escravo de Cristo por amor, se considerava propriedade de Cristo e completamente sob seu controle. No império romano havia uma lei que obrigava ao escravo a estar a mercê absoluta de seu amo, para a vida ou para a morte, estava sujeito ao menor capricho de seu dono. Assim era com Paulo, não havia separação entre ele e Jesus, os dois eram um, a personalidade, o caráter de seu senhor estavam gravados (Gr. Tupos) em Paulo. Uma vez que Jesus o havia comprado com seu sangue e o havia redimido da escravidão do pecado e de seu farisaísmo, agora livre do poder do pecado era um escravo da justiça (Cf. Romanos 6:18). Isso não o conduzia a uma vida independente, pelo contrário, sua liberdade o levava à obediência pela fé em Cristo, Paulo se apresentava ao seu senhor como seu servo (Cf. Romanos 12:11). Por essa razão Kittel afirma que a frase Doulos Iesou Cristou não pode ser separada do entendimento de relacionamento dos cristãos com Cristo.
Paulo não é meramente aliado de Jesus Cristo, ou seu súdito, ou seu amigo, pois como escreveu Handley Moule: “a liberdade do evangelho é a cara de prata do mesmo escudo cuja cara de ouro é a vassalagem incondicional ao senhor libertador”. Ser um escravo é terrível no abstrato; ser escravo de Jesus Cristo é o paraíso no concreto. A rendição de si mesmo, efetuada em solidão, é lançar-se ao frio vazio. Mas quando se trata da rendição ao Filho de Deus que nos amou e se entregou a si mesmo por nós (Cf. Gálatas 2:20), é o iluminado volver da alma ao lar, ao centro e à esfera da vida e do poder.
Paulo como Doulos não se relacionava com Cristo numa base legal, jurídica, forense ou meritória como havia feito no farisaísmo. Ele é escravo de Jesus Cristo, um nome pessoal e oficial, ou seja, nosso senhor, nosso profeta, nosso sumo sacerdote e rei, sob o qual Paulo está servindo e seu serviço é baseado em um relacionamento pessoal, em uma fusão de personalidades (Cf. Gálatas 2:20). Com certeza Paulo não estava se declarando independente de Jesus Cristo, e tão pouco superdependente dele, mas sim seu servo particular, seu tesouro particular, herança exclusiva de Deus e sua propriedade definitiva; Paulo estava comprometendo-se com seu Senhor (Kurios) para sempre como um escravo livre.
Nos tempos de Paulo muitos escravos obtinham sua liberdade e havia várias maneiras de obtê-la, mas os escravos escolhiam ficar com seus senhores e donos pois era mais vantajoso e seguro, ainda eram escravos, mas livres. Outros escolhiam permanecer porque haviam se identificado tão completamente com seus senhores que já não desejavam ir adiante. Paulo desejou ficar com Jesus como seu servo porque também foi chamado; James Edwards sugere que Paulo tirou a expressão “servo” do livro de Isaías capítulo 49 versos 3 e 6, onde Deus fala a respeito de seu servo ao qual Ele enviaria aos gentios para levar sua mensagem de salvação. A própria vida de Paulo foi um comentário deste verso, ele se considerou a si mesmo como o apóstolo dos gentios (Cf. Gálatas 2:9), e seu desejo e aspiração era pregar ao judeus e gentios como “servidor do Messias Jesus”.
Bibliografia:
MOULE, C. G. Handley. Exposición de la Epistola de San Pablo a los Romanos. Buenos Aires: 1924.
EDWARDS, James R. New International Biblical Comentary on the Epistle to the Romans. Massachusetts: Hendrickson Publishers, Vol. 6, 1992.
SIMPSON, A. B. La Epistola a los Romanos. Chile: Imprenta y editorial alianza, 1997.
HORN, Siegfried H. Diccionario Biblico Adventista del Séptimo Dia. Argentina: ACES, Vol. 8, 1995.
DUNN, James D. G. Word Biblical Commentary. Texas: Word Books Publisher, Vol. 38, 1988
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