ARTIGO: Execução Provisória da Pena

Por Lucas Brito Ferreira Sousa | 21/06/2018 | Direito

ARTIGO: Execução Provisória da Pena

 

Lucas Brito Ferreira Sousa

 

1 DESCRIÇÃO DO CASO

 

Ao negar o Habeas Corpus (HC) 126292 na sessão desta quarta-feira (17), por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que a possibilidade de início da execução da pena condenatória após a confirmação da sentença em segundo grau não ofende o princípio constitucional da presunção da inocência. Para o relator do caso, ministro Teori Zavascki, a manutenção da sentença penal pela segunda instância encerra a análise de fatos e provas que assentaram a culpa do condenado, o que autoriza o início da execução da pena.

A ministra Rosa Weber e os ministros Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski, presidente da Corte, ficaram vencidos. Eles votaram pela manutenção da jurisprudência do Tribunal que exige o trânsito em julgado para cumprimento de pena e concluíram pela concessão do habeas corpus. (descrição retirada da proposta do case).

 

2QUESTÃO PRINCIPAL

No caso em debate, na colisão princípios como a Proibição de Excesso e Proibição de Defesa Deficiente qual deveprevalecer ?

 

De acordo com Ingo Sarlet (2012) a lei deve se relacionar a regra da proporcionalidade, não podendo exceder os limites para a tutela do que é desejado pela norma constitucional. Porque ao excedê-los, a lei estará ferindo tais direitos. Quando há dois modos para dar proteção ao direito constitucional, considera-se ilegítima a lei que não traz a menor restrição sobre o direito. Assim, se a lei vai além do necessário, existe uma negação da cláusula de vedação de excesso.

É válido ressaltar que o princípio da proibição de excesso referido anteriormente está em consonância com a característica de ultima ratio do Direito Penal. Não é conveniente a sua utilização em excesso e "portanto, interferir o menos possível na vida em sociedade, devendo ser solicitado somente quando os demais ramos do Direito, comprovadamente, não forem capazes de proteger" (GRECO, 2015, p.97).

Há por outro lado, porém, no principio da proporcionalidade a faceta que está alarmada com insuficiência do estado em proteger direitos fundamentais, ao que surge a proibição da proteção deficiente. Ressalta LenioStreck:

Há que se ter claro, portanto, que a estrutura do princípio da proporcionalidade não aponta apenas para a perspectiva de um garantismo negativo (proteção contra os excessos do Estado), e, sim, também para uma espécie de garantismo positivo, momento em que a preocupação do sistema jurídicoserá com o fato de o Estado não proteger suficientemente determinado direito fundamental, caso em que estar-se-á em face do que, a partir da doutrina alemã, passou-se a denominar de “proibição de proteção deficiente” (STRECK, 2011).

 

Diante de ambas as circunstancias ocorre uma colisão entre princípios. Sobre tal assunto, Robert Alexy versa brilhantemente:

"Se dois princípios colidem - o que ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com o outro, permitido -, um dos princípios terá que ceder. Isso não significa, contudo, nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido, nem que nele deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que ocorre é que um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas condições. [...] Isso é o que se quer dizer quando se afirma que, nos casos concretos, os princípios têm pesos diferentes e que os princípios com o maior peso têm precedência." (ALEXY, 2015, p. 93-94)

 

No referido caso em questão, o princípio da proibição de excesso deverá prevalecer sobre a proibição de proteção deficiente. Tendo em vista que possibilitar a prisão após segunda instancia só reafirma a prisão como regra no Direito Penal, o que deturpa todo conceito constitucional e principiológico. Michel Foucault (1999) afirma que os delinquentes são vistos como loucos ou pessoas anormais perante as instituições sociais (hospitais, prisões, escolas etc), sendo a polícia de extrema iniciativa repressiva, assim como a justiça.

É claro o texto da constituição ao impor a presunção de inocência aqueles que não sofrerem transito em julgado de sentença penal condenatória. A medida torna-se excessiva.

 

  1. QUESTÕES SECUNDÁRIAS
  1. As regras e o respeito aos diretos de cada um devem flexibilizados em prol do interesse coletivo?

Princípios são apenas aquelas normas que podem ser utilizadas como razões para direitos individuais. Normas que se refiram a interesses coletivos são por ele denominadas como "políticas". A diferenciação entre direitos individuais e interesses coletivos é, sem dúvida, importante. (ALEXY, 2015, p. 116).

Regras e normas de interesses coletivos não significam superioridade aos direitos de cada cidadão. Cada caso em questão deverá ser analisado em prol de realizar com eficiência a melhor decisão. Em determinadas situações um direito individual irá sobressair perante o interesse coletivo, em outros o direito individual será relativizado para a assegurar um interesse coletivo.

 

  1. O judiciário deve ouvir o clamor público?

De acordo com Vera Regina de Andrade (2003) O Estado é sempre falho no que se refere as funções do Direito Penal. Combater a criminalidade, assegurar bens jurídicos e promover a paz. Para a mesma, o sistema penal constrói e selecionam criminosos e promove a desigualdade, intitulando de função real de eficácia invertida. O Estado não busca proteger e solucionar determinadas situações, porém, visa unicamente punir determinado individuo, já que toda estrutura do sistema penal é voltada para violação de direitos. E para realização de determinadas condutas, é necessário uma construção social a cerca das suas ações. A mídia e o clamor público tem papel fundamental para essa propagação de etiquetamento e transformação de determinadas condutas em crimes. Assim como a extinção e relativização de direitos.

 

  1. Houve afronta ao art. 283 do CPP e art. 5°, inciso LVII da Constituição Federal?

Não há duvidas que há violação do art. 283 do CPP e do art. 5°, LVII da CF.  Afirma Ministro do STF, Celso de Mello:

O princípio constitucional da presunção de inocência, em nosso sistema jurídico, consagra, além de outras relevantes consequências, uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário. ”(HC 96.095/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO).

 

Tal princípio da presunção de inocência é consagrado constitucionalmente e na jurisprudência. Logo, a nova possibilidade de prisão viola tais mecanismos.

 

  1. A demora nos julgamentos e o sistema recursal do CPP geram sensação de impunidade?

Sim. Não há duvidas que a demora nos julgamentos e o sistema recursal resulta em postergação temporal que definitivamente traz a sensação de impunidade. Mais pela morosidade do processo, do que a crença de que as leis são brandas. Porém, tal sensação de impunidade não poderá ser motivo de restrição de uma garantia de suma importância, que é a presunção de inocência.

 

  1. Haverá impacto no sistema carcerário?

Perante Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias - INFOPEN (2014) afirma que a população prisional no Brasil em 2014 era de 622.202 pessoas, com possibilidade de 371.884, resultando assim um déficit de 250.318 vagas.

O Poder Judiciário foi omisso ao não observar esses dados. Ora, a ocupação de determinadas vagas já seria desastrosa devido o total descaso prisional caso não houvesse déficit, devido as mais variadas violações as garantias e direitos do homem. Com a referida medida, ocorrerá um salto na população carcerário que piorará e muito a drástica situação atual.

 

  1. Qual a melhor política criminal a ser adotada pelo Estado brasileiro para solucionar esse impasse?

A prisão não deve ser adotada como regra. É necessário que o principio da presunção de inocência seja assegurado, com a possibilidade de utilização das prisões cautelares e outras medidas, sempre observando os requisitos intrínsecos em cada situação. A adoção do determinado mecanismo de relativização da presunção de inocência se demonstra uma violação a tal garantia. É valido ressaltar que o "esqueleto" do Poder Judiciário deverá ser melhorado com a finalidade de evitar a morosidade como característica intrínseca a sua atual estrutura, assim garantias e direitos não mais estarão em pauta para serem violados.

 

REFERÊNCIAS

 

ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais / Tradução: Virgílio Afonso da Silva - 2. ed. 4. tir. São Paulo: Malheiros Editores LTDA, 2015.

 

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Sistema Penal Máximo x Cidadania Mínima: códigos da violência na era da globalização. — Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2003.

 

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Editora Vozes, 1999.

 

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal - 17. ed. Rio de Janeiro: lmpetus, 2015.

 

INFOPEN. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias - Dezembro 2014. Departamento Penitenciario Nacional, 2014. Disponivel em Acesso em: out, 2016.

 

Rel. Min. CELSO DE MELLO. HC 96.095/SP, 2011.

 

SARLET, Ingo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais LTDA, 2012.

 

STRECK, Lenio Luiz. Bem jurídico e Constituição: da proibição de excesso (übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais. Disponível em . Acesso em out 2016.

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