Excludente de ilicitude: Estado de necessidade

Por sthefany dourado leal | 13/08/2018 | Direito

O estado de necessidade

O estado de necessidade é uma excludente da ilicitude presente no código penal brasileiro artigo 24:

Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Conforme os doutrinadores do Estado de necessidade configura-se por duas teorias principais :a Unitária (exclui a ilicitude mas não a culpabilidade do agente) e a  teoria diferenciadora dividida em: justificante( exclui a ilicitude em detrimento de um bem maior sobre um bem menor),  exemplo a vida em relação ao patrimônio e a relação ao patrimônio. E a exculpante (além de excluir a ilicitude,também excluí a culpabilidade).

Essa teoria diferenciadora teve origem na Alemanha em 1927, adotando tanto a ilicitude quanto à culpabilidade exclusão no estado de necessidade. O código penal brasileiro adotou a teoria unitária após a reforma Penal de 1984, porém em 1969 a legislação penal admitia a teoria diferenciadora. Dessa forma, Eugênio Raúl Zaffaroni argumenta: “(...) Para evitar contradições decorrentes da irracionalidade, impõe-se uma distinção doutrinária entre hipóteses de estado de necessidade que se deve considerar como justificação, e outras que só se pode considerar como causa de ausência de culpabilidade. Esta distinção de modo algum viola o texto legal porque, em ambos os casos, devem estar reunidos os requisitos do art. 24 do Código Penal, só que a causa com que se exime a responsabilidade penal, num caso será de justificação (não haverá injusto), e, em outro, haverá injusto, mas o agente não será penalmente responsável em razão da ausência de culpabilidade.”

Dessa forma, Zaffaroni defendeu a teoria diferenciadora apresentando  que a exclusão da antijuridicidade automaticamente exclui a culpabilidade. mas contrapondo o pensamento de Zaffaroni, Fernando Capez discorre que no estado de necessidade jamais atuará como causa supralegal de exclusão da culpabilidade, pois o agente pratica o fato típico exclui sua ilicitude podem continuar sendo culpado pelo fato de sua conduta está prescrita no código e tem as suas responsabilidades no âmbito civil ,ou seja, Capez adota a teoria unitária por motivo de que a exclusão da ilicitude não afasta a culpa do indivíduo.

No parágrafo 1º do artigo 24 "Não Pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo".  Com isso nota-se que aquele que  sua profissão exige enfrentar um perigo,  ele tem o dever legal de cumprir. Exemplo: o bombeiro e o policial. Isto pode ser relacionado com a razoabilidade do sacrifício outra teoria do Estado de necessidade onde não é estado de necessidade uma ação que põe em risco outra pessoa apenas para lhe salvar. Para entendermos melhor um exemplo uma pessoa para não ser lesionada por um trem coloca outra na sua frente levando à morte. Nesse contexto o dever legal de enfrentar o perigo está interligado com o princípio da razoabilidade em que um indivíduo do estado de necessidade prejudicando o outro sabendo que pode evitar pois o perigo provocado pelo agente não é estado de necessidade conforme o parágrafo 2º do artigo 24. Só se Pode alegar estado de necessidade quando pratica-se o fato para salvar de perigo atual ou seja, o fato futuro ou posterior não seria mais estado de necessidade. Dentro desta excludente a doutrina classifica de duas formas a defensiva que é quando a conduta é dirigida ao causador do perigo,  como exemplo o cachorro que vai atacar alguém e é morto. E a segunda classificação é agressiva com a conduta é dirigida ao bem de que não provocou o perigo. Exemplo: um motorista joga seu carro para o acostamento atingindo outros por causa de um caminhão desgovernado que vinha atrás. Com isso nota-se que o estado de necessidade depende da conduta e suas circunstâncias para que seja aprovado o que a ação foi praticada por uma necessidade. em síntese Damásio de Jesus explica: "Entendemos que somente o perigo causado dolosamente impede que seu autor alegue encontrar-se em fato necessitado. Além da consideração de ordem humana, temos apoio no próprio Código Penal, que define a tentativa empregando a expressão ‘vontade’, que é indicativa de dolo. Assim, por meio de interpretação sistemática, analisando a expressão ‘vontade’ contida nos dois dispositivos (arts. 14, II, e 24), e sendo a primeira indicadora de dolo, chegamos à conclusão de que só o perigo causado dolosamente tem força de excluir a alegação justificadora do agente. Mas, se o provocou culposamente, é lícito invocar a descriminante."

Em uma situação hipotética: Jonas e Tenório, que exercem a mesma função, estão trabalhando dentro de um armazém localizado no Porto de Salvador, quando se inicia um incêndio no local em razão de problemas na fiação elétrica. Existe apenas uma pequena porta que permite a saída dos trabalhadores do armazém, mas em razão da rapidez com que o fogo se espalha, apenas  dá tempo para que um dos trabalhadores saia sem se queimar. Quando Jonas, que estava mais próximo da porta, vai sair, Tenório, desesperado por ver que se queimaria se esperasse a saída do companheiro, dá um soco na cabeça do colega de trabalho e passa à sua frente, deixando o armazém. Jonas sofre uma queda, tem parte do corpo queimada, mas também consegue sair vivo do local. Em razão do ocorrido, Jonas ficou com debilidade permanente de membro. Dos fatos narrados, Tenório restou denunciado em processo-crime pela conduta de crime de lesão corporal grave, sendo o fato típico, ilícito e culpável (art.129, §1º, III, do Código Penal). (Questão de Concurso Público -MODIFICADO). Ante o exposto Tenório não ser acusado por que agiu em estado de necessidade. A antijuridicidade será excluída devido ao perigo iminente que os dois passavam e provavelmente um dos dois acabaram sendo acionadas pelo fogo, já que ele se alastrava existe apenas uma porta para que passasse os dois e na luta da sobrevivência Tenório fez algo necessário para que sobrevivesse antes de que o fogo tomasse conta do local.

Com base no código penal brasileiro os requisitos para que seja enquadrado o estado de necessidade são:  ameaça a direito próprio ou alheio, a existência de perigo atual e inevitável, a inexorabilidade do sacrifício do bem ameaçado, uma situação não provocada voluntariamente pelo agente e o conhecimento da situação de fato justificante.

O estado de necessidade pode ser enquadrada no seguinte caso: hipoteticamente em sua residência a filha vê sua mãe passando mal precisando urgentemente levá-la para o hospital a filha liga para ambulância e em resposta sua previsão de chegada de 40 minutos mas antes da chegada da ambulância a filha pega o carro da mãe sendo que ela não possui carteira de habilitação, mas até a ambulância chegar a sua mãe poderia ter piores consequências levando a morte e na localidade não possui a pessoas e também para pedir socorro de algum parente, demoraria para a chegada da mesma. Com isso a filha pega o carro e vai a caminho do hospital no meio do trajeto ela é parada por uma blitz e quando um policial rodoviário perde a carteira de habilitação ela anuncia que não possui e que sua mãe passa mal no banco de trás do carro. O policial encaminha a mãe para o hospital pela viatura e a filha é liberada. Conforme o caso nota-se que a filha agiu em estado de necessidade em detrimento da vida de sua mãe sendo que o perigo não foi causado por ela e também foi inevitável a cometer um ato ilícito já que não tinha alguém que pudesse ajudá-la,  sendo que a ambulância demoraria muito para chegar ao local portanto a filha não foi punida pois o seu ato configura-se como estado de necessidade e excluindo a culpa e a ilicitude desfigurando o crime.

O estado de necessidade pode ser enquadrado em alguns casos de dificuldade econômica, dependerá muito das circunstâncias que foi o motivo causador. Nesse caso, o furto famélico se adequaria se fossem extremamente necessário para inviabilizar a sobrevivência sendo que o furto famélico poderia se enquadrar no princípio da insignificância porém o que entra em pauta é a sobrevivência de um prejudicando o outro por motivo necessário que é a sua vida e integridade.

Contudo, o estado de necessidade previsto no artigo 23 inciso 1 e no artigo 24 do CP. Essa excludente se dá com a conduta praticada por um perigo atual e que não tem a possibilidade alguma de evitar o delito. Todavia a doutrina discutir sobre a exclusão da culpabilidade no estado de necessidade já que para alguns é certo que não está previsto na lei o estado necessidade como excludente de culpa pela inexibilidade de outra conduta, mas não significa que esteja vedado o seu conhecimento por outro lado outros doutrinadores argumentam que a exclusão da ilicitude não afasta a culpa pois o agente terá que ser responsável pelo dano causado na ordem civil reparando o dano a outrem possuindo essa linha doutrinária o código penal brasileiro. Enfim o estado de necessidade retira o caráter antijurídico de um fato tipificado como crime.

Referência:

Código Penal

https://raullica.jusbrasil.com.br/artigos/177527010/estado-de-necessidade-justificante-e-estado-de-necessidade-exculpante-teoria-unitaria-e-teoria-diferenciada

https://www.passeidireto.com/arquivo/29965534/casos-concretos-penal

https://canalcienciascriminais.com.br/estado-de-necessidade/