Eutanásia: Uma ponderação sobre sua ilegalidade

Por Débora Brito | 18/07/2009 | Direito

Título: Eutanásia

Autora: Débora Brito de Oliveira

Atividades exercidas: Bacharel em Direito, pós graduanda em Ciências Penais

"Eutanásia (do grego ευθανασία - ευ "bom", θάνατος thanatos -"morte") é a prática pela qual se abrevia a vida de um enfermo incurável de maneira controlada e assistida por um especialista."[1] (WIKIPÉDIA). Da definição literal da palavra temos que eutanásia é a boa morte.

Existem várias classificações para eutanásia, a que achei mais abrangente e que me ajudou a chegar a uma conclusão sobre o assunto é a dada por GOLDIM[2]:

Quanto ao tipo de ação:

* Eutanásia ativa: o ato deliberado de provocar a morte sem sofrimento do paciente, por fins misericordiosos.

* Eutanásia passiva ou indireta: a morte do paciente ocorre, dentro de uma situação de terminalidade, ou porque não se inicia uma ação médica ou pela interrupção de uma medida extraordinária, com o objetivo de minorar o sofrimento.

* Eutanásia de duplo efeito: quando a morte é acelerada como uma conseqüencia indireta das ações médicas que são executadas visando o alívio do sofrimento de um paciente terminal.

Quanto ao consentimento do paciente:

* Eutanásia voluntária: quando a morte é provocada atendendo a uma vontade do paciente.

* Eutanásia involuntária: quando a morte é provocada contra a vontade do paciente.

* Eutanásia não voluntária: quando a morte é provocada sem que o paciente tivesse manifestado sua posição em relação a ela.

Há ainda a diferenciação em 3 modalidades: libertadora, piedosa e a morte econômica ou eugênica[3].

A eutanásia é muito discutida pelo biodireito e bioética, causa ainda muitas divergências de opinião e é um assunto muito polêmico, tanto no âmbito do Direito quanto da sociedade. O desfecho ocorrido no caso da americana Terri Schiavo em que o marido entrou com um pedido judicial para desligar os aparelhos da esposa que estava há 15 anos em estado vegetativo, contra a família dela que esperava uma remota recuperação, reascendeu no mundo as discussões acerca do tema.

Para as pessoas que estão a favor da prática, a justificativa é aliviar a dor e o sofrimento de pessoas que não possuem chances reais de recuperação, em um estado em que a melhora não é vislumbrada pelos médicos, dando à pessoa a possibilidade de dar fim à sua vida. Para aqueles que são contra a prática, a eutanásia é dar direito à pessoa para cometer suicídio, já que ela poderia autorizar o fim de sua vida.

Depois do exposto acima, posso dizer que sou a favor apenas da eutanásia voluntária, mas não de uma forma geral.

Acredito que quando a pessoa, enferma, ainda possui consciência suficiente para expressar sua vontade de terminar com seu sofrimento, ela deve ser ouvida, cabendo ai a análise dos médicos para verificar se realmente foram feitos todos procedimentos possíveis e existentes para se chegar à cura. Sou a favor portanto, da eutanásia ativa e voluntária, libertadora, quando o indivíduo opta pelo fim de sua vida se libertando do sofrimento em que está vivendo. Sou a favor também da eutanásia passiva voluntária, que consiste naquela em que o indivíduo expressa sua vontade de não iniciar um tratamento ou interrompê-lo, pois este ao invés de prolongar sua vida, apenas adiaria a hora de sua morte, uma vez que não existe cura ou tratamento eficaz para a sua doença.

Não considero nenhuma dessas práticas como sendo suicídio. Na minha análise o suicídio é uma decisão tomada voluntariamente para dar fim à sua vida, mas sem o motivo da doença grave incurável. Portanto, acredito que esse fator seja determinante para analisar se a eutanásia é suicídio ou não.

Nas palavras de DURKHEIM[4], sobre o suicídio egoísta:

"O egoísmo é um estado onde os laços entre o indivíduo e os outros na sociedade são fracos. Uma vez que o indivíduo está fracamente ligado à sociedade, terminar sua vida terá pouco impacto no resto da sociedade. Em outras palavras, existem poucos laços sociais para impedir que o indivíduo se mate

Durkheim ainda analisa a existência de outros tipos de suicídio, mas nenhum deles demonstram o sofrimento real e irreparável devido a uma doença que está consumindo poucoapouco o indivíduo.

Além do enfermo existem outras pessoas envolvidas na realização da eutanásia, e também para as modalidades que apresentei como sendo a favor, não considero que eles estejam cometendo crime. Não acho que o médico que auxilia o paciente a esses tipos de eutanásia esteja auxiliando o suicídio porque sequer considero que haja suicídio. Tampouco considero que esteja cometendo homicídio.

Entendo que a vida é um bem indisponível, porém também acredito que nosso ordenamento não visa à crueldade e manter uma pessoa viva, ligada a aparelhos ou sem chance de recuperação, não sendo essa sua vontade, é um ato de crueldade. A pessoa deve ter o livre arbítrio de decidir o que para ela é melhor naquele momento. Além disso, nesse aspecto, não acredito que eutanásia seja adiantar a morte, mas apenas não prolongar uma vida com agonia e dor.

Por outro lado, não admito como coerente a eutanásia involuntária ou não voluntária. Considero esse um ato egoísta da família que não visa minimizar a dor do paciente, mas sim a sua própria dor, se livrando do fardo que acredita estar carregando. É a chamada modalidade piedosa que para mim não há nada de piedoso, mas apenas covardia dos familiares.

Para citar a última modalidade de eutanásia a que me referi, a modalidade eugênica é a eliminação de "seres apsíquicos e associais absolutos, disgenéticos, monstros de nascimento, idiotas graves, loucos incuráveis e outros." Modalidade cruel que foi muito utilizada durante o nazismo.

No Brasil a eutanásia é crime, homicídio doloso ou auxílio ao suicídio. Dependendo da motivação pode ser homicídio privilegiado, de acordo com o § 1º do artigo 121 Código Penal Brasileiro, alcançando apenas a redução da pena. De acordo com LUIZ FLAVIO BORGES D´URSO[5] a legalização da eutanásia no Brasil apenas teria a função de tornar legal o crime de auxílio ao suicídio pela modalidade libertadora, no caso do homicídio, pela modalidade piedosa e, por fim, tornar possível o crime de aborto e infanticídio na modalidade eugênica.

Um fato bastante interessante ocorrido no Brasil, foi uma decisão através de liminar que suspendeu a resolução do Conselho Federal de Medicina - CFM, nº1805, de 9 de novembro de 2006, que autorizava a ortotanásia. Esse tipo de eutanásia é involuntária, pois a decisão é tomada pelo médico para não prolongar a vida e o tratamento do paciente, desde que com consentimento do enfermo ou de seus familiares. É também um assunto muito controverso principalmente quanto à possibilidade do CFM de emitir uma resolução como essa. Mas mostra a necessidade cada vez maior de estudos nessa área.

A ortotanásia não é considerada crime, ela é considerada uma suspensão do tratamento para que a morte chegue em seu tempo certo, ou seja, não há uma antecipação da morte. Não há nesse caso expectativas reais de que o paciente possa se recuperar, a morte já se instaurou no paciente e o tratamento não resultaria qualquer efeito relevante. Além disso, o tratamento, quando o paciente não puder mais se recuperar, seria considerado tortura, ferindo o princípio da dignidade humana. Ainda sobre a ortotanásia:

"Nas hipóteses em que não existem reais expectativas de devolver a consciência ao paciente, toda terapêutica se converte num processo de prolongamento artificial da vida que entra em conflito com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e com a proibição de submissão à tortura e a tratamentos desumanos ou degradantes (arts.1º, III, e 5º, III, CF). Do ponto de vista jurídico-penal, não subsiste o dever de assistência do médico que, como todo dever de agir, encontra-se condicionado à presença de perspectivas reais e objetivas de atuação". (CARVALHO, Gisele Mendes de)[6]

O anteprojeto de Reforma do Código Penal Brasileiro, prevê em seu artigo 121, § 4º, prevê: "Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se previamente atestada por dois médicos, a morte como iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente, ou na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão". Dessa forma, a ortotanásia descrita acima, é a morte natural, em seu tempo correto, excluindo a ilicitude.

Tendo feito essas análises, apenas pondero que no Brasil a eutanásia é crime e que eu apenas sou a favor de determinadas modalidades e tipos, e que se for para descriminalizar a eutanásia de uma forma geral, concordo com o professor Luiz Flavio Borges D´Urso, entendendo que esta apenas cobriria com uma peneira muito fina a possibilidade de se cometer determinados crimes. Além disso, com tantos avanços da medicina há que se ter a esperança de que determinadas doenças consideradas irreversíveis um dia possam ser apenas mais uma doença tratável.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GOLDIM JOSÉ ROBERTO Eutanásia. Núcleo Internacional de Bioética [ site na Internet]. Disponível em: URL: http//www.bioetica.ufrgs.br. Acesso: 21 de agosto de 2003.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Eutan%C3%A1sia

http://www.ufrgs.br/bioetica/eutantip.htm

COLLUCCI, Claudia. SILVEIRA, Julliane. Juiz obriga médicos a tentar prolongar vida de doentes terminais. Da Assessoria de Comunicação do Cremepe. Folha de São Paulo de 27.11.2007. Disponível em: <http://portal.cremepe.org.br/publicacoes_noticias_ler.php?cd_nocia=1704>. Material da 1ª aula da Disciplina Tutela Penal dos Bens Jurídicos Individuais, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Ciências Penais – UNIDERP – IPAN - REDE LFG.

Proposta caracteriza eutanásia como crime hediondo. Material da 1ª aula da Disciplina Tutela Penal dos Bens Jurídicos Individuais, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Ciências Penais – UNIDERP – IPAN - REDE LFG.

http://www.oabsp.org.br/palavra_presidente/2005/81/

http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Suic%C3%ADdio

Resolução CFM nº 1.805, de 9 de novembro de 2006. Material da 1ª aula da Disciplina Tutela Penal dos Bens Jurídicos Individuais, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Ciências Penais – UNIDERP – IPAN - REDE LFG.

CARVALHO, Gisele Mendes de. Ortotanásia é eutanásia, mas não é crime (Considerações a respeito da Resolução nº 1.805/2006 do CFM e sua compatibilidade com o Código Penal). Disponível em: www.ibccrim.org.br. Acesso em: 20.03.2008. Material da 1ª aula da Disciplina Tutela penal dos bens jurídicos individuais, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Ciências Penais – UNIDERP – IPAN - REDE LFG.



[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Eutan%C3%A1sia

[2] http://www.ufrgs.br/bioetica/eutantip.htm

[3]http://www.oabsp.org.br/palavra_presidente/2005/81/

[4] http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Suic%C3%ADdio

[5] http://www.oabsp.org.br/palavra_presidente/2005/81/

[6] CARVALHO, Gisele Mendes de. Ortotanásia é eutanásia, mas não é crime (Considerações a respeito da Resolução nº 1.805/2006 do CFM e sua compatibilidade com o Código Penal). Disponível em: www.ibccrim.org.br. Acesso em: 20.03.2008. Material da 1ª aula da Disciplina Tutela penal dos bens jurídicos individuais, ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Ciências Penais – UNIDERP – IPAN - REDE LFG.