Euro - Má Ideia ou História de Sucesso

Por Pedro Santos Pereira | 02/01/2013 | Economia

Euro – Má Ideia ou História de Sucesso?

Ensaio

Pedro Manuel Garcia Mateus Santos Pereira

Junho 2012

Em rigor é um falso problema considerar a alternativa Euro como “uma história de sucesso” ou “má ideia desde o início”. Na realidade, nem o Euro é uma história de sucesso como argumentam os seus defensores, nem o argumento de que ele nunca devia ter visto a luz do dia está correcto como anunciam os seus detractores.

Nas razões que motivaram a União Económica e Monetária podem considerar-se as  políticas e económicas, sendo que as primeiras fertilizaram com Jean Monnet e Robert Schuman quando propuseram a criação dos Estados Unidos da Europa, para assim evitar, na Europa, o ressurgimento de guerras como as três últimas[1]. Uma Europa Unida, com mais de 300 milhões de consumidores e uma política externa e de defesa comuns, seria um player extraordinário no balanço mundial de poderes. Daí ter-se iniciado um mecanismo imparável cujo primeiro passo foi a criação da European Coal and Steel Community (ECSC/CECA)[2], transformada posteriormente no Mercado Comum Europeu[3], depois na formação das Comunidades Europeias em 1967, no Sistema Monetário Europeu (SME) em 1979, no Mercado Único em 1992 e na União Europeia em 1993, e na sequência da proposta de Helmut Kohl ser criada a União Económica e Monetária.

Motivos Políticos

Os interesses políticos foram dominantes e convergiram no desiderato da União Monetária (UM). A França viu-a como uma oportunidade de co-liderar a Europa em pé de igualdade com a Alemanha e assim evitar o predomínio desta, com uma população 50% mais numerosa e uma força anímica e capacidade de organização e militarização francamente superiores. Na vertente económica o domínio monetário europeu pelo Bundesbank seria substituído por um Banco Central Europeu onde ambos os países teriam assento e igual poder de voto e com a Itália e Espanha como aliados naturais, a França teria uma real e significativa influência no concerto Europeu. A Alemanha viu a UM como uma forma de assegurar e reforçar a sua liderança a nível Europeu, afastar os fantasmas da Segunda Guerra, e assegurar a sua hegemonia numa Europa que em breve seria mais Central com a integração da Polónia, República Checa e Hungria. A localização do ECB em Frankfurt e a exigência do Pacto de Estabilidade assegurariam as linhas de força da política monetária e europeia. A Itália e a Espanha pretendiam assegurar capacidade de influência na Nova Ordem Europeia e a última pretendia também demarcar-se do passado isolacionista da era franquista. Todos os outros pequenos países queriam também assegurar uma voz nas decisões Europeias que se poderiam deslocar paulatinamente para Leste.

O argumento político da união para evitar a guerra é fraco pois a Europa, com a configuração de estados nações e a cooperação militar no âmbito da NATO, conseguiu evitá-la durante mais de 50 anos. Por outro lado, a existência de uma união política na Europa não é per se garantia de paz como demonstrou a Guerra Civil Americana ou a Guerra da ex-Jugoslávia, enquanto a separação da República Checa da Eslováquia mostrara que os caminhos de separação podem ser mais úteis que os de unificação, no evitamento de conflitos. Entretanto, os detractores nacionalistas da União Monetária argumentaram que a perda política do símbolo soberano que é a moeda própria era algo de inconcebível, para o que tiveram um forte apoio popular nas recusas e quase-recusas de adesão ao projecto da moeda única.

É nos argumentos económicos que encontramos a maior parte das contestações ao projecto de moeda única e, neste domínio, a avaliação da introdução do Euro é simples: Deriva do resultado entre os potenciais ganhos comerciais contra as perdas macroeconómicas.

Desvalorização da Moeda

Os que consideram a moeda única “má ideia desde o início” argumentam com a perda da possibilidade de desvalorização da moeda e a perda de controlo sobre a taxa de câmbio e taxas de juro, como instrumentos autónomos da política económica, mas não explicam claramente porque é ela necessária e se é necessária. A desvalorização é utilizada como instrumento de política económica quando se torna necessário repor relações de competitividade e as relações de competitividade erodem devido a pressões inflacionistas que aumentam os preços e salários, num dado país, fazendo com que os seus produtos sejam mais caros nos mercados internacionais e mais caros que os produtos estrangeiros também nos mercados internos, desincentivando a produção local. Como a única razão para se verificarem pressões inflacionistas é o excesso de moeda em circulação, que desestabiliza o equilíbrio da procura e oferta agregadas de produtos e serviços, exercendo pressões sobre os produtores no sentido de estes aumentarem o output e, não conseguindo, ou enquanto o não conseguem, os preços sobem e os salários também. O que está aqui em causa não é verdadeiramente a perda do instrumento de política económica e sim que a necessidade de o utilizar deriva de uma má escolha, anterior, a qual no caso de países com moeda soberana consiste em emitir maior quantidade de dinheiro real[4] ou escritural.

Neutralidade Monetária

Ora o princípio da neutralidade monetária estabelece que o stock de moeda não afecta as variáveis reais do crescimento, emprego, produtividade ou competitividade e os aumentos no valor nominal da oferta de moeda são absorvidos por um aumento proporcional do nível de preços, pelo que as diferenças entre inflações de dois quaisquer países reflectem as diferenças entre os respectivos rácios de crescimento da moeda que acabam por se traduzir em diferenças cambiais as quais ajustam novamente os preços[5]. Numa área de moeda única não se pode fazer a correcção cambial e esta privação poderá perturbar o controlo das variáveis macroeconómicas, designadamente as taxas de desemprego, o défice e o financiamento externo da economia. Mas o que daqui extraímos é que, no longo prazo, a taxa de inflação e a política monetária não poderão ser decididas domesticamente[6] e não será por isso que uma união monetária se torna indesejável havendo vantagens na adopção de uma moeda única.

Incremento das Trocas Comerciais

Segundo os defensores da União Económica e Monetária, as vantagens da adopção de uma única moeda são sobretudo de natureza comercial na redução dos custos das transacções entre os vários países, que por sua vez fomentam um aumento de trocas comerciais, as quais produzem aumentos de actividade económica com todas as consequências daí decorrentes. Uma outra vantagem põe-se ainda na diminuição do risco, designadamente no associado ao investimento, entre países da mesma união, que fica assim facilitado e vai estimular a actividade económica[7]. A Comissão Europeia, no relatório “One Market, One Money”, advogou que a integração dos mercados de produtos e factores exigia a introdução de uma moeda única, asserção que não tem base teórica ou experimental aceitável, e a união monetária provocaria i) eficiência microeconómica, na produtividade, e no crescimento e ganhos financeiros internacionais, ii) estabilidade macroeconómica, no controlo de preços (inflação) e na estabilidade da produção e iii) promoveria a convergência entre países e regiões, incluindo as mais atrasadas e afectadas por choques externos[8]; o que, como hoje verificamos, não adere à realidade, apesar de se ter verificado um indubitável e significativo aumento das trocas comerciais. De referir ainda que uma área monetária única alargada permite ao Banco Central concentrar-se exclusivamente no controlo da inflação[9].

Aumento da Concorrência e Concentração Industrial

Voltando aos argumentos detractores da moeda única, o aumento de concorrência entre as empresas e sectores, resultante da maior integração dos mercados e da transparência e nivelamento dos preços, privilegiará naturalmente as grandes empresas liquidando paulatinamente as mais pequenas, tendendo a especializar os grandes sectores industriais de cada país na concentração nas suas vantagens competitivas. Contudo as evidências sugerem que a diversificação tem aumentado com a integração pelo que cada país produzirá uma maior variedade de bens e haverá, inter-países, um aumento de comércio intra-sectores, investimentos, fusões e aquisições[10]. Porém este argumento não exclui, a priori, a criação de uma moeda única, até porque a maior parte dos países Europeus tinham à data da sua introdução, e têm hoje, produções e exportações amplamente diversificadas e com estruturas de produção semelhantes, qualificando-se no critério de Kenen como passíveis de integração numa Área Monetária Óptima[11].

Sobre-Dimensionamento

O argumento do sobre-dimensionamento da Área Monetária Comum tem algum fundamento dado haver uma dimensão ideal, porque a utilidade aumenta marginalmente com o incremento de participantes mas a partir de um determinado ponto diminui o benefício marginal de introduzir cada país suplementar. Uma área maior apresenta maior diversidade nos níveis de vida e desenvolvimento pelo que a dimensão da área monetária óptima corresponderá à situação em que se verifica um equilíbrio entre os custos e benefícios marginais de partilha de uma mesma moeda. O sobre-dimensionamento da área monetária tem como reflexo o aumento da diversidade entre regiões e países e esta é um custo dificilmente controlável pelo Banco Central Europeu incapaz de reagir a cada particularidade local, o que exponencia a assimetria dos choques[12]. Fazendo os países parte de uma área monetária única, não têm a possibilidade de manipular a taxa de câmbio e a alternativa é arrefecer a economia com a profundidade e durabilidade necessárias, tema politicamente incorrecto e indesejável, até porque o resultado é tão doloroso quanto mais rígidos forem os preços e salários, pelo que um sistema de câmbios fixos[13], combinado com preços e salários rígidos torna uma situação má numa outra ainda pior. Esta problemática da assimetria dos choques coloca-se face à diversidade dos países dentro da área Monetária Única, decorrente do sobre-dimensionamento, porque fossem os choques simétricos (baixa diversidade e proximidade), a União Monetária limitar-se-ia a ajustar a sua taxa de câmbio externa[14].

 

 

Área Monetária Óptima[15]

Um terceiro argumento apresentado pelos detractores da moeda única prende-se com a observação dos critérios para constituição de uma Área Monetária Óptima, um dos quais o da mobilidade do trabalho[16], também conhecido pelo critério de Mundell, a não confundir com a liberdade de circulação de pessoas do perímetro Schengen. Com efeito, mesmo que os salários e preços apresentem rigidez, um declínio da procura agregada não produz desemprego se os trabalhadores, tendo mobilidade geográfica, se deslocarem para regiões onde exista oferta de trabalho. Contudo, a circunstância de a Europa falar dez diferentes línguas e conter barreiras culturais e institucionais que radicam, por exemplo, em diferentes tipos de preços e vínculos à habitação[17], tornam a mobilidade bastante reduzida até dentro de cada país.

O segundo critério, o da Diversificação da Produção (Kenen), estabelece que os países mais afectados por choques são os especializados numa gama estreita de produções, porque nos países onde a produção e exportações sejam amplamente diversificadas e com estruturas produtivas semelhantes encontram-se condições para integração numa área monetária óptima, o que é o caso da maior parte das economias da União Monetária. O critério da Abertura (McKinnon), estabelece que sendo os países muito abertos ao comércio e exportando fortemente uns com outros[18], portanto habituados a forte concorrência, tendem a ter preços semelhantes, o que é o caso da maior parte das economias Europeias. Em conclusão, a não verificação de um dos critérios económicos, o de Mundell, levaria à rejeição da união monetária a não ser que se tomassem medidas concretas e difíceis de implementar tendo em vista a sua superação.

Quanto aos critérios políticos, o primeiro é o das Transferências Fiscais, que obriga os países a compensarem-se mutuamente mitigando as recessões que surjam e aqui a maior parte das economias Europeias não se qualifica para uma UM porque não foi previsto nem há nenhum sistema automático de transferências. O segundo critério político, o da Homogeneidade das Preferências, exige um amplo e uniforme consenso sobre a receita para os choques e aqui, como sabemos, existem fortes divergências quanto à preferência entre inflação e desemprego, ou privilegiar exportadores, que preferem taxas de câmbio mais baixas[19], ou consumidores, que preferem taxas mais elevadas[20]. Esta elevada heterogeneidade nas preferências nacionais, não qualificava, nem qualifica, os europeus para uma União Monetária. Por fim, o critério da Solidariedade vs. Nacionalismo estabelece que os países deverão estar dispostos a aceitar os custos de outros em nome de um destino comum e, portanto, sendo o crescimento per capita do PIB menor em alguns dos países, deverá haver lugar a algum tipo de compensações, dos países mais ricos para os mais pobres não serem forçados a reduzir a sua inflação ou o seu sobreaquecimento económico através de uma demorada e dolorosa contracção[21]. Como sabemos na Europa esta solidariedade é relativa e não a qualifica plenamente para uma União Monetária.

Dos seis critérios para uma Área Monetária Óptima os europeus apenas verificavam e verificam dois económicos e um político pelo que só haveria condições para a realização de uma área monetária se estivessem acautelados, desde início, a continuidade dos ajustamentos. Previamente à União Monetária e introdução do Euro, o Bundesbank alertou que a não haver maior solidariedade e disciplina política e económica entre os estados fracos e fortes, a União Monetária poderia estar condenada ab initio, Kohl alertou que uma união monetária sem uma união política seria um castelo no ar, a Alemanha e a Holanda avisaram que os países do Sul, sem ferramenta de desvalorização, corriam risco de futuras roturas financeiras[22], e por último, o Reino Unido, baseado num estudo magistral do HM Treasury, em 2003[23], nunca viabilizou a sua adesão por causa das condicionantes e riscos económicos atrás citados. Então, porque foi a União Económica e Monetária efectuada nestas condições? Pelos motivos estritamente políticos que aduzi no início.

História de Sucesso

Na realidade, na primeira década da introdução do Euro, verificou-se, em termos médios Europeus, uma estabilidade de preços na casa dos 2,2%, verificou-se igualmente uma redução das taxas de juro para valores na órbita dos 4,4% quando antes gravitavam nos 8,1%, abrindo caminho ao crédito fácil sustentador de políticas expansionistas, criaram-se milhões de postos de trabalho e reduziu-se o desemprego médio Europeu de 9% para 7%, aumentaram significativamente as trocas comerciais, nivelaram-se os preços dentro da União, aumentou o investimento externo estrangeiro de 20% para 33%, reduziram-se os défices orçamentais de 4,3% médios na anterior década para 1,7%, houve uma maior integração dos mercados de capitais, verificou-se um aumento das reservas cambiais em Euros de 18% para 27% contra as do Dólar de 71% para 62,5% e finalmente a nota de 500€ é de longe a mais valiosa em circulação na ecúmena. É efectivamente uma história estatística de sucesso em que o sucesso não foi para todos.

Soluções

Dado que a realização da Zona Monetária Única foi um acto político à revelia das considerações económicas e que a continuidade dos países nesta zona é apodada de “Hotel Califórnia – you can always check out but you can’t ever leave”, a solução terá de ser política, o que não é agradável porque em política o inevitável nunca acontece e o improvável está sempre a acontecer.

Em termos gerais temos dois grandes tipos de soluções. i) Manutenção da Zona Euro com maior integração e centralização política, a qual permitirá rectificar os critérios por observar, designadamente a mobilidade do trabalho, as transferências fiscais e a solidariedade; ii) desagregação da Zona Euro, que poderá tomar três distintos aspectos: a) a saída dos países do Norte (já anunciada por alguns finlandeses, holandeses e alemães e depois rejeitada), adoptando outra moeda próxima do DM, ficando o Euro nos países do Sul, que no fundo seria a famosa Europa a duas velocidades e de geometria variável; b) a saída de países periféricos, incapazes de pagar as suas dívidas e viver os rigores da disciplina fiscal e ajustamento macroeconómico, adoptam uma outra moeda comum ou regressam às suas anteriores divisas[24]; ou c) a implosão generalizada de toda a Zona Euro.

Nestes cenários, o que tem maiores vantagens económicas é o da manutenção da Zona Euro, a qual, mesmo à custa da saída teórica da Irlanda, Portugal e Grécia, não teria custos superiores a 1.000€ por contribuinte europeu. De seguida, o cenário economicamente mais interessante seria o da saída da Alemanha ou países do Bloco Germânico. Os outros dois cenários são de longe os mais trágicos pois apontam para quedas do PIB superiores a 50% no Sul e a 20% na zona Norte. Em qualquer dos cenários, que não o primeiro, a História ensina-nos que será inevitável a adopção de regimes totalitários e sobre eles paira inexorável o espectro da Guerra[25] e dado que a solução terá de ser política tenho fortes dúvidas que seja considerada a utilidade das variáveis económicas quando ela surgir.

Conclusão

Se os salários e preços fossem flexíveis, a imposição de uma contracção na procura agregada de um país causaria o seu imediato ajustamento. Como os salários e preços na União Europeia e particularmente no Sul, são significativamente rígidos e não podem ser diminuídos ainda que indirectamente pela manipulação das taxas de câmbio, podemos assegurar que a União Europeia da moeda única não estava preparada para suportar choques externos com incidência sobre a procura doméstica agregada de certos países, a não ser que: i) estes mesmos países tivessem continuado as reformas estruturais imediatamente após a adesão, no sentido de flexibilizarem os mercados de trabalho, mas, pelo contrário, para não suportarem diminuições da procura, esses países procederam à oferta suplementar de dinheiro pela via do crédito à economia, aos particulares e aos Estados para a realização de investimentos públicos; ii) a mobilidade dos trabalhadores dentro da União fosse assegurada, tarefa mais difícil esta, pois apesar da circulação Schengen estar prevista não assegura a mobilidade do trabalho devido às resistências culturais, familiares, linguísticas e até económicas e iii) tivesse sido consagrados os princípios das transferências fiscais e solidariedade, à semelhanças de outros estados federais[26], o que poderia e teria implicado uma governação económica e fiscal mais centralizada.

Assim, no final, ainda que a União Monetária tenha sido interpretada como uma medida suplementar para evitar conflitos na Europa ela pode, precisamente, vir a criar conflitos devido às pressões opostas entre defensores da estabilidade monetária e os defensores de políticas inflacionistas bem como pelo papel que os representantes nacionais no ECOFIN e ECB possam vir a desempenhar na defesa das perspectivas nacionais. Também, o facto do Tratado de Maastricht não conter quaisquer provisões para a circunstância de algum país ter de sair do Euro depois da adesão, obrigando à sua permanência definitiva, será outra fonte de conflitualidade entre Estados, porque os efeitos nefastos dos choques e ajustamentos macroeconómicos a nível do emprego e relações de poder poderá convidar alguns países à saída.

Em suma, a ideia não era má desde início se tivessem sido tomadas medidas de controlo dinâmicas e a história não foi de sucesso para todos por não se terem verificado essas mesmas medidas, e estamos assim numa bifurcação onde um dos caminhos nos pode levar à concretização de uma “boa ideia” e o outro, alternativamente, a uma “história de epílogo trágico”.

Referências

Allington, N. et all, One Market, One Money, One Price? Price Dispersion in the European Union (Cambridge: Judge Institute of Management, 2005)

Baldwin, R., Wyplosz, C., The Economics of European Integration (Maidenhead: McGraw-Hill, 2009)

Baldwin, R. et all, Study on the Impact of the Euro on Trade and Foreign Direct Investment, in “Economic Papers 321”, European Comission (2008)

European Comission, One Market, One Money, (Brussels: Study of Directorate-General for Economic and Financial Affairs, Nº 44, October 1990 )

Feldstein, M., The Political Economy of the European Economic and Monetary Union: Political Sources of an Economic Liability (Cambridge: National Bureau of Economic Research, 1997)

HM Treasury, UK Membership of the Single Currency – An Assessment of the Five Economic Tests, (Norwich: HMSO, 2003)

Rose, A., One Money, One Market: The Effects of Common Currencies on Trade in Economic Policy 30 (2000)

Samuelson, P., Nordhaus, W., Economia (New York: McGraw-Hill, 1985)

UBS Global Economic Perspectives, Euro Break-up – The Consequences (Genève, 2011)



[1] Desde a Franco-Prussiana de 1870 à 2ª Grande Guerra

[2] Foi também a forma discreta aceite pelos franceses de proceder ao rearmamento da Alemanha

[3] Tratado de Roma de 1957

[4] Currrency em anglo-saxónico, i.e. notas e moedas

[5] A variação da taxa de câmbio depende da diferença entre os níveis de inflação externa e o nível de inflação doméstica

[6] É o princípio da trindade impossível: com a adopção de câmbios fixos e liberdade total de capitais, não se pode verificar a autonomia da política monetária.

[7] O governo Inglês, num estudo de 2003, avaliou que o comércio intra-europeu terá crescido entre 3% a 20% como resultado da UM e que a Inglaterra poderia registar um aumento de 50% do comércio com a zona Euro no período de 30 anos e um aumento de 9% no rendimento nacional por um período superior a 30 anos e mesmo assim, embora por outros motivos, continuou a não recomendar a adesão do Reino Unido, in UK Membership of the Single Currency – An assessment of the five economic tests, pp 225

[8]  One Market, One Money, pp 12, 137, 140

[9] Eventualmente, a expensas das regiões afectadas por depressão, recessão ou choques externos com necessidades macroeconómicas distintas e conflituais.

[10] Rose pp. 27

[11] Baldwin, pp 333-334

[12] Rectificáveis através da manipulação das taxas de câmbio para assim tornar as exportações mais competitivas

[13] Que é o caso de uma união monetária

[14] One Market, One Money, One Price? Price Dispersion in the European Union

[15] Optimum Currency Area no original.

[16] Refiro-me ao critério de Mundell como condição para uma Área Monetária Óptima

[17] A circunstância dos Europeus, particularmente os do Sul, optarem pela compra de casa própria e os bancos não facilitarem a libertação das hipotecas ou permitirem o aluguer sem aumentos de spread e outras penalizações, em caso de mudança do local de trabalho, são fortes dissuasores da mobilidade do factor trabalho.

[18] Também é definido o critério da abertura como a quota de actividade económica no comércio internacional

[19] Para aumentarem a competitividade

[20] Para protegerem o seu poder de compra,

[21] Ou como argumentam os alemães: investimento para posterior crescimento

[22] Baldwin in The Economics of European Integration

[23] UK Membership of the Single Currency – An Assessment of the Five Economic Tests, (Norwich: HMSO, 2003)

[24] Veja-se que a Península Ibérica contem todos os critérios para uma Área Monetária Única, que os países mediterrâneos têm maior homogeneidade entre si que com os do Norte da Europa e que uma AMU entre a França, Itália, Espanha, Malta e Portugal tem mais valor económico que qualquer opção anterior à excepção da Península Ibérica

[25] UBS Global Economic Perspectives, Euro Break-up – The Consequences (2011)

[26] Como os Estados Unidos, a Alemanha e a Suíça 

 

 

 

 

Euro – Má Ideia ou História de Sucesso?

 

 

 

 

Ensaio

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Pedro Manuel Garcia Mateus Santos Pereira

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Em rigor é um falso problema considerar a alternativa Euro como “uma história de sucesso” ou “má ideia desde o início”. Na realidade, nem o Euro é uma história de sucesso como argumentam os seus defensores, nem o argumento de que ele nunca devia ter visto a luz do dia está correcto como anunciam os seus detractores.

Nas razões que motivaram a União Económica e Monetária podem considerar-se as  políticas e económicas, sendo que as primeiras fertilizaram com Jean Monnet e Robert Schuman quando propuseram a criação dos Estados Unidos da Europa, para assim evitar, na Europa, o ressurgimento de guerras como as três últimas[1]. Uma Europa Unida, com mais de 300 milhões de consumidores e uma política externa e de defesa comuns, seria um player extraordinário no balanço mundial de poderes. Daí ter-se iniciado um mecanismo imparável cujo primeiro passo foi a criação da European Coal and Steel Community (ECSC/CECA)[2], transformada posteriormente no Mercado Comum Europeu[3], depois na formação das Comunidades Europeias em 1967, no Sistema Monetário Europeu (SME) em 1979, no Mercado Único em 1992 e na União Europeia em 1993, e na sequência da proposta de Helmut Kohl ser criada a União Económica e Monetária.

Motivos Políticos

Os interesses políticos foram dominantes e convergiram no desiderato da União Monetária (UM). A França viu-a como uma oportunidade de co-liderar a Europa em pé de igualdade com a Alemanha e assim evitar o predomínio desta, com uma população 50% mais numerosa e uma força anímica e capacidade de organização e militarização francamente superiores. Na vertente económica o domínio monetário europeu pelo Bundesbank seria substituído por um Banco Central Europeu onde ambos os países teriam assento e igual poder de voto e com a Itália e Espanha como aliados naturais, a França teria uma real e significativa influência no concerto Europeu. A Alemanha viu a UM como uma forma de assegurar e reforçar a sua liderança a nível Europeu, afastar os fantasmas da Segunda Guerra, e assegurar a sua hegemonia numa Europa que em breve seria mais Central com a integração da Polónia, República Checa e Hungria. A localização do ECB em Frankfurt e a exigência do Pacto de Estabilidade assegurariam as linhas de força da política monetária e europeia. A Itália e a Espanha pretendiam assegurar capacidade de influência na Nova Ordem Europeia e a última pretendia também demarcar-se do passado isolacionista da era franquista. Todos os outros pequenos países queriam também assegurar uma voz nas decisões Europeias que se poderiam deslocar paulatinamente para Leste.

O argumento político da união para evitar a guerra é fraco pois a Europa, com a configuração de estados nações e a cooperação militar no âmbito da NATO, conseguiu evitá-la durante mais de 50 anos. Por outro lado, a existência de uma união política na Europa não é per se garantia de paz como demonstrou a Guerra Civil Americana ou a Guerra da ex-Jugoslávia, enquanto a separação da República Checa da Eslováquia mostrara que os caminhos de separação podem ser mais úteis que os de unificação, no evitamento de conflitos. Entretanto, os detractores nacionalistas da União Monetária argumentaram que a perda política do símbolo soberano que é a moeda própria era algo de inconcebível, para o que tiveram um forte apoio popular nas recusas e quase-recusas de adesão ao projecto da moeda única.

É nos argumentos económicos que encontramos a maior parte das contestações ao projecto de moeda única e, neste domínio, a avaliação da introdução do Euro é simples: Deriva do resultado entre os potenciais ganhos comerciais contra as perdas macroeconómicas.

Desvalorização da Moeda

Os que consideram a moeda única “má ideia desde o início” argumentam com a perda da possibilidade de desvalorização da moeda e a perda de controlo sobre a taxa de câmbio e taxas de juro, como instrumentos autónomos da política económica, mas não explicam claramente porque é ela necessária e se é necessária. A desvalorização é utilizada como instrumento de política económica quando se torna necessário repor relações de competitividade e as relações de competitividade erodem devido a pressões inflacionistas que aumentam os preços e salários, num dado país, fazendo com que os seus produtos sejam mais caros nos mercados internacionais e mais caros que os produtos estrangeiros também nos mercados internos, desincentivando a produção local. Como a única razão para se verificarem pressões inflacionistas é o excesso de moeda em circulação, que desestabiliza o equilíbrio da procura e oferta agregadas de produtos e serviços, exercendo pressões sobre os produtores no sentido de estes aumentarem o output e, não conseguindo, ou enquanto o não conseguem, os preços sobem e os salários também. O que está aqui em causa não é verdadeiramente a perda do instrumento de política económica e sim que a necessidade de o utilizar deriva de uma má escolha, anterior, a qual no caso de países com moeda soberana consiste em emitir maior quantidade de dinheiro real[4] ou escritural.

Neutralidade Monetária

Ora o princípio da neutralidade monetária estabelece que o stock de moeda não afecta as variáveis reais do crescimento, emprego, produtividade ou competitividade e os aumentos no valor nominal da oferta de moeda são absorvidos por um aumento proporcional do nível de preços, pelo que as diferenças entre inflações de dois quaisquer países reflectem as diferenças entre os respectivos rácios de crescimento da moeda que acabam por se traduzir em diferenças cambiais as quais ajustam novamente os preços[5]. Numa área de moeda única não se pode fazer a correcção cambial e esta privação poderá perturbar o controlo das variáveis macroeconómicas, designadamente as taxas de desemprego, o défice e o financiamento externo da economia. Mas o que daqui extraímos é que, no longo prazo, a taxa de inflação e a política monetária não poderão ser decididas domesticamente[6] e não será por isso que uma união monetária se torna indesejável havendo vantagens na adopção de uma moeda única.

Incremento das Trocas Comerciais

Segundo os defensores da União Económica e Monetária, as vantagens da adopção de uma única moeda são sobretudo de natureza comercial na redução dos custos das transacções entre os vários países, que por sua vez fomentam um aumento de trocas comerciais, as quais produzem aumentos de actividade económica com todas as consequências daí decorrentes. Uma outra vantagem põe-se ainda na diminuição do risco, designadamente no associado ao investimento, entre países da mesma união, que fica assim facilitado e vai estimular a actividade económica[7]. A Comissão Europeia, no relatório “One Market, One Money”, advogou que a integração dos mercados de produtos e factores exigia a introdução de uma moeda única, asserção que não tem base teórica ou experimental aceitável, e a união monetária provocaria i) eficiência microeconómica, na produtividade, e no crescimento e ganhos financeiros internacionais, ii) estabilidade macroeconómica, no controlo de preços (inflação) e na estabilidade da produção e iii) promoveria a convergência entre países e regiões, incluindo as mais atrasadas e afectadas por choques externos[8]; o que, como hoje verificamos, não adere à realidade, apesar de se ter verificado um indubitável e significativo aumento das trocas comerciais. De referir ainda que uma área monetária única alargada permite ao Banco Central concentrar-se exclusivamente no controlo da inflação[9].

Aumento da Concorrência e Concentração Industrial

Voltando aos argumentos detractores da moeda única, o aumento de concorrência entre as empresas e sectores, resultante da maior integração dos mercados e da transparência e nivelamento dos preços, privilegiará naturalmente as grandes empresas liquidando paulatinamente as mais pequenas, tendendo a especializar os grandes sectores industriais de cada país na concentração nas suas vantagens competitivas. Contudo as evidências sugerem que a diversificação tem aumentado com a integração pelo que cada país produzirá uma maior variedade de bens e haverá, inter-países, um aumento de comércio intra-sectores, investimentos, fusões e aquisições[10]. Porém este argumento não exclui, a priori, a criação de uma moeda única, até porque a maior parte dos países Europeus tinham à data da sua introdução, e têm hoje, produções e exportações amplamente diversificadas e com estruturas de produção semelhantes, qualificando-se no critério de Kenen como passíveis de integração numa Área Monetária Óptima[11].

Sobre-Dimensionamento

O argumento do sobre-dimensionamento da Área Monetária Comum tem algum fundamento dado haver uma dimensão ideal, porque a utilidade aumenta marginalmente com o incremento de participantes mas a partir de um determinado ponto diminui o benefício marginal de introduzir cada país suplementar. Uma área maior apresenta maior diversidade nos níveis de vida e desenvolvimento pelo que a dimensão da área monetária óptima corresponderá à situação em que se verifica um equilíbrio entre os custos e benefícios marginais de partilha de uma mesma moeda. O sobre-dimensionamento da área monetária tem como reflexo o aumento da diversidade entre regiões e países e esta é um custo dificilmente controlável pelo Banco Central Europeu incapaz de reagir a cada particularidade local, o que exponencia a assimetria dos choques[12]. Fazendo os países parte de uma área monetária única, não têm a possibilidade de manipular a taxa de câmbio e a alternativa é arrefecer a economia com a profundidade e durabilidade necessárias, tema politicamente incorrecto e indesejável, até porque o resultado é tão doloroso quanto mais rígidos forem os preços e salários, pelo que um sistema de câmbios fixos[13], combinado com preços e salários rígidos torna uma situação má numa outra ainda pior. Esta problemática da assimetria dos choques coloca-se face à diversidade dos países dentro da área Monetária Única, decorrente do sobre-dimensionamento, porque fossem os choques simétricos (baixa diversidade e proximidade), a União Monetária limitar-se-ia a ajustar a sua taxa de câmbio externa[14].

 

 

Área Monetária Óptima[15]

Um terceiro argumento apresentado pelos detractores da moeda única prende-se com a observação dos critérios para constituição de uma Área Monetária Óptima, um dos quais o da mobilidade do trabalho[16], também conhecido pelo critério de Mundell, a não confundir com a liberdade de circulação de pessoas do perímetro Schengen. Com efeito, mesmo que os salários e preços apresentem rigidez, um declínio da procura agregada não produz desemprego se os trabalhadores, tendo mobilidade geográfica, se deslocarem para regiões onde exista oferta de trabalho. Contudo, a circunstância de a Europa falar dez diferentes línguas e conter barreiras culturais e institucionais que radicam, por exemplo, em diferentes tipos de preços e vínculos à habitação[17], tornam a mobilidade bastante reduzida até dentro de cada país.

O segundo critério, o da Diversificação da Produção (Kenen), estabelece que os países mais afectados por choques são os especializados numa gama estreita de produções, porque nos países onde a produção e exportações sejam amplamente diversificadas e com estruturas produtivas semelhantes encontram-se condições para integração numa área monetária óptima, o que é o caso da maior parte das economias da União Monetária. O critério da Abertura (McKinnon), estabelece que sendo os países muito abertos ao comércio e exportando fortemente uns com outros[18], portanto habituados a forte concorrência, tendem a ter preços semelhantes, o que é o caso da maior parte das economias Europeias. Em conclusão, a não verificação de um dos critérios económicos, o de Mundell, levaria à rejeição da união monetária a não ser que se tomassem medidas concretas e difíceis de implementar tendo em vista a sua superação.

Quanto aos critérios políticos, o primeiro é o das Transferências Fiscais, que obriga os países a compensarem-se mutuamente mitigando as recessões que surjam e aqui a maior parte das economias Europeias não se qualifica para uma UM porque não foi previsto nem há nenhum sistema automático de transferências. O segundo critério político, o da Homogeneidade das Preferências, exige um amplo e uniforme consenso sobre a receita para os choques e aqui, como sabemos, existem fortes divergências quanto à preferência entre inflação e desemprego, ou privilegiar exportadores, que preferem taxas de câmbio mais baixas[19], ou consumidores, que preferem taxas mais elevadas[20]. Esta elevada heterogeneidade nas preferências nacionais, não qualificava, nem qualifica, os europeus para uma União Monetária. Por fim, o critério da Solidariedade vs. Nacionalismo estabelece que os países deverão estar dispostos a aceitar os custos de outros em nome de um destino comum e, portanto, sendo o crescimento per capita do PIB menor em alguns dos países, deverá haver lugar a algum tipo de compensações, dos países mais ricos para os mais pobres não serem forçados a reduzir a sua inflação ou o seu sobreaquecimento económico através de uma demorada e dolorosa contracção[21]. Como sabemos na Europa esta solidariedade é relativa e não a qualifica plenamente para uma União Monetária.

Dos seis critérios para uma Área Monetária Óptima os europeus apenas verificavam e verificam dois económicos e um político pelo que só haveria condições para a realização de uma área monetária se estivessem acautelados, desde início, a continuidade dos ajustamentos. Previamente à União Monetária e introdução do Euro, o Bundesbank alertou que a não haver maior solidariedade e disciplina política e económica entre os estados fracos e fortes, a União Monetária poderia estar condenada ab initio, Kohl alertou que uma união monetária sem uma união política seria um castelo no ar, a Alemanha e a Holanda avisaram que os países do Sul, sem ferramenta de desvalorização, corriam risco de futuras roturas financeiras[22], e por último, o Reino Unido, baseado num estudo magistral do HM Treasury, em 2003[23], nunca viabilizou a sua adesão por causa das condicionantes e riscos económicos atrás citados. Então, porque foi a União Económica e Monetária efectuada nestas condições? Pelos motivos estritamente políticos que aduzi no início.

História de Sucesso

Na realidade, na primeira década da introdução do Euro, verificou-se, em termos médios Europeus, uma estabilidade de preços na casa dos 2,2%, verificou-se igualmente uma redução das taxas de juro para valores na órbita dos 4,4% quando antes gravitavam nos 8,1%, abrindo caminho ao crédito fácil sustentador de políticas expansionistas, criaram-se milhões de postos de trabalho e reduziu-se o desemprego médio Europeu de 9% para 7%, aumentaram significativamente as trocas comerciais, nivelaram-se os preços dentro da União, aumentou o investimento externo estrangeiro de 20% para 33%, reduziram-se os défices orçamentais de 4,3% médios na anterior década para 1,7%, houve uma maior integração dos mercados de capitais, verificou-se um aumento das reservas cambiais em Euros de 18% para 27% contra as do Dólar de 71% para 62,5% e finalmente a nota de 500€ é de longe a mais valiosa em circulação na ecúmena. É efectivamente uma história estatística de sucesso em que o sucesso não foi para todos.

Soluções

Dado que a realização da Zona Monetária Única foi um acto político à revelia das considerações económicas e que a continuidade dos países nesta zona é apodada de “Hotel Califórnia – you can always check out but you can’t ever leave”, a solução terá de ser política, o que não é agradável porque em política o inevitável nunca acontece e o improvável está sempre a acontecer.

Em termos gerais temos dois grandes tipos de soluções. i) Manutenção da Zona Euro com maior integração e centralização política, a qual permitirá rectificar os critérios por observar, designadamente a mobilidade do trabalho, as transferências fiscais e a solidariedade; ii) desagregação da Zona Euro, que poderá tomar três distintos aspectos: a) a saída dos países do Norte (já anunciada por alguns finlandeses, holandeses e alemães e depois rejeitada), adoptando outra moeda próxima do DM, ficando o Euro nos países do Sul, que no fundo seria a famosa Europa a duas velocidades e de geometria variável; b) a saída de países periféricos, incapazes de pagar as suas dívidas e viver os rigores da disciplina fiscal e ajustamento macroeconómico, adoptam uma outra moeda comum ou regressam às suas anteriores divisas[24]; ou c) a implosão generalizada de toda a Zona Euro.

Nestes cenários, o que tem maiores vantagens económicas é o da manutenção da Zona Euro, a qual, mesmo à custa da saída teórica da Irlanda, Portugal e Grécia, não teria custos superiores a 1.000€ por contribuinte europeu. De seguida, o cenário economicamente mais interessante seria o da saída da Alemanha ou países do Bloco Germânico. Os outros dois cenários são de longe os mais trágicos pois apontam para quedas do PIB superiores a 50% no Sul e a 20% na zona Norte. Em qualquer dos cenários, que não o primeiro, a História ensina-nos que será inevitável a adopção de regimes totalitários e sobre eles paira inexorável o espectro da Guerra[25] e dado que a solução terá de ser política tenho fortes dúvidas que seja considerada a utilidade das variáveis económicas quando ela surgir.

Conclusão

Se os salários e preços fossem flexíveis, a imposição de uma contracção na procura agregada de um país causaria o seu imediato ajustamento. Como os salários e preços na União Europeia e particularmente no Sul, são significativamente rígidos e não podem ser diminuídos ainda que indirectamente pela manipulação das taxas de câmbio, podemos assegurar que a União Europeia da moeda única não estava preparada para suportar choques externos com incidência sobre a procura doméstica agregada de certos países, a não ser que: i) estes mesmos países tivessem continuado as reformas estruturais imediatamente após a adesão, no sentido de flexibilizarem os mercados de trabalho, mas, pelo contrário, para não suportarem diminuições da procura, esses países procederam à oferta suplementar de dinheiro pela via do crédito à economia, aos particulares e aos Estados para a realização de investimentos públicos; ii) a mobilidade dos trabalhadores dentro da União fosse assegurada, tarefa mais difícil esta, pois apesar da circulação Schengen estar prevista não assegura a mobilidade do trabalho devido às resistências culturais, familiares, linguísticas e até económicas e iii) tivesse sido consagrados os princípios das transferências fiscais e solidariedade, à semelhanças de outros estados federais[26], o que poderia e teria implicado uma governação económica e fiscal mais centralizada.

Assim, no final, ainda que a União Monetária tenha sido interpretada como uma medida suplementar para evitar conflitos na Europa ela pode, precisamente, vir a criar conflitos devido às pressões opostas entre defensores da estabilidade monetária e os defensores de políticas inflacionistas bem como pelo papel que os representantes nacionais no ECOFIN e ECB possam vir a desempenhar na defesa das perspectivas nacionais. Também, o facto do Tratado de Maastricht não conter quaisquer provisões para a circunstância de algum país ter de sair do Euro depois da adesão, obrigando à sua permanência definitiva, será outra fonte de conflitualidade entre Estados, porque os efeitos nefastos dos choques e ajustamentos macroeconómicos a nível do emprego e relações de poder poderá convidar alguns países à saída.

Em suma, a ideia não era má desde início se tivessem sido tomadas medidas de controlo dinâmicas e a história não foi de sucesso para todos por não se terem verificado essas mesmas medidas, e estamos assim numa bifurcação onde um dos caminhos nos pode levar à concretização de uma “boa ideia” e o outro, alternativamente, a uma “história de epílogo trágico”.


Referências

Allington, N. et all, One Market, One Money, One Price? Price Dispersion in the European Union (Cambridge: Judge Institute of Management, 2005)

Baldwin, R., Wyplosz, C., The Economics of European Integration (Maidenhead: McGraw-Hill, 2009)

Baldwin, R. et all, Study on the Impact of the Euro on Trade and Foreign Direct Investment, in “Economic Papers 321”, European Comission (2008)

European Comission, One Market, One Money, (Brussels: Study of Directorate-General for Economic and Financial Affairs, Nº 44, October 1990 )

Feldstein, M., The Political Economy of the European Economic and Monetary Union: Political Sources of an Economic Liability (Cambridge: National Bureau of Economic Research, 1997)

HM Treasury, UK Membership of the Single Currency – An Assessment of the Five Economic Tests, (Norwich: HMSO, 2003)

Rose, A., One Money, One Market: The Effects of Common Currencies on Trade in Economic Policy 30 (2000)

Samuelson, P., Nordhaus, W., Economia (New York: McGraw-Hill, 1985)

UBS Global Economic Perspectives, Euro Break-up – The Consequences (Genève, 2011)



[1] Desde a Franco-Prussiana de 1870 à 2ª Grande Guerra

[2] Foi também a forma discreta aceite pelos franceses de proceder ao rearmamento da Alemanha

[3] Tratado de Roma de 1957

[4] Currrency em anglo-saxónico, i.e. notas e moedas

[5] A variação da taxa de câmbio depende da diferença entre os níveis de inflação externa e o nível de inflação doméstica

[6] É o princípio da trindade impossível: com a adopção de câmbios fixos e liberdade total de capitais, não se pode verificar a autonomia da política monetária.

[7] O governo Inglês, num estudo de 2003, avaliou que o comércio intra-europeu terá crescido entre 3% a 20% como resultado da UM e que a Inglaterra poderia registar um aumento de 50% do comércio com a zona Euro no período de 30 anos e um aumento de 9% no rendimento nacional por um período superior a 30 anos e mesmo assim, embora por outros motivos, continuou a não recomendar a adesão do Reino Unido, in UK Membership of the Single Currency – An assessment of the five economic tests, pp 225

[8]  One Market, One Money, pp 12, 137, 140

[9] Eventualmente, a expensas das regiões afectadas por depressão, recessão ou choques externos com necessidades macroeconómicas distintas e conflituais.

[10] Rose pp. 27

[11] Baldwin, pp 333-334

[12] Rectificáveis através da manipulação das taxas de câmbio para assim tornar as exportações mais competitivas

[13] Que é o caso de uma união monetária

[14] One Market, One Money, One Price? Price Dispersion in the European Union

[15] Optimum Currency Area no original.

[16] Refiro-me ao critério de Mundell como condição para uma Área Monetária Óptima

[17] A circunstância dos Europeus, particularmente os do Sul, optarem pela compra de casa própria e os bancos não facilitarem a libertação das hipotecas ou permitirem o aluguer sem aumentos de spread e outras penalizações, em caso de mudança do local de trabalho, são fortes dissuasores da mobilidade do factor trabalho.

[18] Também é definido o critério da abertura como a quota de actividade económica no comércio internacional

[19] Para aumentarem a competitividade

[20] Para protegerem o seu poder de compra,

[21] Ou como argumentam os alemães: investimento para posterior crescimento

[22] Baldwin in The Economics of European Integration

[23] UK Membership of the Single Currency – An Assessment of the Five Economic Tests, (Norwich: HMSO, 2003)

[24] Veja-se que a Península Ibérica contem todos os critérios para uma Área Monetária Única, que os países mediterrâneos têm maior homogeneidade entre si que com os do Norte da Europa e que uma AMU entre a França, Itália, Espanha, Malta e Portugal tem mais valor económico que qualquer opção anterior à excepção da Península Ibérica

[25] UBS Global Economic Perspectives, Euro Break-up – The Consequences (2011)

[26] Como os Estados Unidos, a Alemanha e a Suíça