ETOLOGIA NA PRODUÇÃO ANIMAL -PARTE II-
Por Romão Miranda Vidal | 02/01/2010 | Sociedade
Etologia na produção animal ( ParteII )
Bases fisiológicas do comportamento
Uma vez entendido: o comportamento é uma atividade a qual necessariamente compreende funções fisiológicas. Qualquer tipo de comportamento envolve a recepção do estímulo através dos órgãos dos sentidos, a transformação deste estímulo em atividade neural, a ação integrada do sistema nervoso, e, finalmente, a atividade de vários órgãos motores, externos e internos. Para estes mecanismos fisiológicos, cada padrão especial de comportamento pode ser ativado por estímulos externos particulares, os quais são transformados e transmitidos através de uma via neural particular, de modo que resulta em uma ação integrada.
Mudanças evolutivas no comportamento
Todos os animais vertebrados nascem com um estado imaturo, mostrando primeiro padrões de comportamento adequados somente para sua nova forma de vida, ou seja, não mais uterina ou embrionária. Muitos mamíferos domésticos e aves são bastante precoces, mas animais como ovinos, bovinos e frangos de corte não completam seu desenvolvimento até, digamos, o final da sua vida normal. Os animas jovens se introduzem no mundo com poucos padrões de comportamento bem desenvolvidos, como o ato de picar e selecionar grãos nas aves ou mamar, mas a maioria de outros comportamentos se desenvolve mediante influência de estimulações ambientais pós-natal e são intensamente afetados por aprendizados posteriores (Cruikshank,1954). Em algumas espécies o desenvolvimento adequado dos padrões de comportamento depende da oportunidade de participar de jogos e do contato social com outros animais da sua classe e espécie. O comportamento do jogo consiste usualmente em formas imaturas de padrões de comportamento dos adultos. Uma das funções que cumpre é a de desenvolver a força muscular através do exercício. Os animais exclusivamente confinados nunca mostram o desenvolvimento muscular e a habilidade motora, em relação aos outros animais que vivem em condições de maior liberdade.
Faz-se necessário recordar que o não comportamento é herdado como tal, ou seja, é uma herança genética. As únicas coisas, ou os únicos fatores, que podem ser biologicamente herdados são o núcleo a partir das células germinativas parenterais e o citoplasma presente no ovo. A capacidade para se adequar ao comportamento se desenvolve através do processo de crescimento e é organizada por fatores hereditários, mais o processo de aprendizagem. Assim a velha questão de que o comportamento é adquirido ou herdado se torna insignificante. O comportamento se desenvolve e é diferenciado sob a influência de fatores genéticos e ambientais: nunca, nenhum dos dois pode atuar independentemente do outro.
Entendendo o comportamento animal
Muitos pecuaristas entendem seus animais - bovinos ou frangos - do modo como estes antecipam suas reações ante alguns estímulos. Este entendimento ajuda quando se manejam animais, se desenham e projetam instalações, se manejam as pastagens, durante o período de desenvolvimento dos animais ou outros componentes dos sistemas de produção. O simples fato de reconhecer que um animal pode assustar-se ou espantar-se pode impedir danos para o animal e para o homem, quando não danos econômicos. Muitas pessoas tratam os animais como se fossem seres humanos e são surpreendidas quando o animal não responde aos estímulos da mesma forma como deseja o ser humano. Por exemplo: muitos animais não apreciam uma carícia em sua cabeça ou um simples afago em regiões outras, como na região ventral ou até nas orelhas. A maneira de se colocar as mãos sobre a cabeça de um animal, com a intenção de afagá-lo, pode representar um tipo de ameaça. O ato de coçar entre os olhos de um bovino pode ser entendido como um ato de desafio, fato este que pode gerar uma reação de movimentos bruscos com a cabeça, dirigindo os chifres contra a pessoa. Os animais também tendem a tratar as pessoas de maneira semelhante como tratam os da sua espécie. Dois animas da mesma espécie raramente mantêm contato visual por longo período de tempo. Os animais se mostram e se tornam intranqüilos quando os humanos fixam o olhar em seus olhos.
Muitos problemas de manejo do gado bovino e de frangos de corte, e a forma com se projetam as instalações para estes animais, podem ser evitados se o produtor ou o projetista possuir um elevado grau de empatia com os animais, isto é, se estes proprietários e projetistas puderem se imaginar no mesmo lugar, como sendo membro desta espécie. Esta afirmação é um pouco difícil de ser aceita e absorvida, exceto entre pessoas mais observadoras, atentas e reflexivas. Tudo isto requer conhecimento do repertório do comportamento animal e de como os animais percebem as coisas. Por exemplo, uma pessoa pode se "imaginar" como sendo um novilho andando através do brete de uma central de manejo para sentir quais as razões pelas quais um novilho não avança em direção ao tronco ou a balança, ou seja, tentar descobrir quais as razões por este não avançar. Mas seria necessário imaginar que este (o ser humano) tivesse 360º de visão, pouca profundidade de percepção, sua cabeça voltada para baixo olhando o piso e que houvesse hipersensibilidade aos estímulos devido ao medo (choques elétricos, batidas com as guiadas, uso de chicotes, pancadas com guiadas, vacinações, marcação com ferro em brasa, castração). São alguns dos instintos de medo que o animal mantém como lembrança.
Diferenças genéticas no comportamento
Diante do fato de que o comportamento animal é freqüentemente relacionado com ajustes às mudanças nas condições ambientais, uma ampla parte da variação comportamental é causada por diferenças relacionados com as condições ambientais.
(*) O fator luminosidade é de fundamental importância no desenvolvimento ovariano das aves de postura e com repercussões na sua produção. À medida que diminui a luz natural, existe a necessidade de se proporcionar luminosidade artificial, ou ainda, as aves de postura necessitam de um determinado fornecimento de luminosidade, digamos, constante em função direta da estação do ano. Sem dúvida, ainda quando a estimulação ambiental é uniforme, os indivíduos sempre reagem de maneira diferente dos outros. Os machos atuam de maneira diferente das fêmeas, e várias raças e linhagens de animais freqüentemente diferem uns dos outros (Fuller e Thompson, 1960 e Scott e Fuller, 1965).
Além da variação entre os indivíduos e raças dentro das espécies, existem amplas diferenças no comportamento entre espécies, e estas são usualmente proporcionais a posição taxonômica dos animais como um todo. As aves são, por razões sabidas, muito diferentes das outras espécies animais, e muitas destas diferenças estão relacionadas aos métodos primitivos de adaptação, com poucas exceções. A classe Aves está adaptada para o vôo e isto se reflete em seus órgãos dos sentidos, seu corpo coberto de penas e seu pequeno tamanho e peso. Seus padrões de comportamento são igualmente relacionados ao vôo, e isto está representado no rápido desenvolvimento no seu comportamento, o de voar. As aves geralmente se desenvolvem mais rápido do que todos os demais animais e conseqüentemente tem menos tempo para adquirir determinados procedimentos, como é o caso dos cães, cavalos, gatos, elefantes e outros animais, que por sua longevidade e capacidade de aprendizado continuado se diferenciam das aves. Mas esta posição não se radicaliza. Temos os casos de aves, como o falcão, que aprende a arte esportiva de caçar quando treinando pelo homem e pode o falcão viver por muitos anos. Ou o pombo correio, que já traz na sua genética a peculiaridade de sempre voltar ao lugar inicial de onde partiu.
Conclusão
Ao que até agora expusemos, via tradução e com pouquíssimas intervenções, podemos concluir que o mundo animal representado pela classificação - doméstico e selvagem - sempre estará sendo focado pelo ser humano como um elemento de extrema necessidade para sua convivência, seja ela produtiva, de guarda, de companhia, de esporte, de locomoção, de trabalho, de terapia, de promotor do equilíbrio, e outras tantas finalidades e funções.
Para a Classe Médica Veterinária, o estudo do comportamento animal ainda carece de maior interesse, em especial na parte relacionada com a Psicologia Animal, assunto este que poucas instituições de ensino superior se empenham em colocar na grade curricular. A vida prática do consultório, do hospital veterinário, do haras, da granja de aves ou de suínos, da cabanha, do canil, da fazenda de gado de corte ou de leite, da criação de ovinos ou de caprinos, do zoológico, da reserva natural, dará aos Profissionais de Medicina Veterinária boas oportunidades para um aprendizado prático. E neste ganho prático de contato diário não só com os animais, mas também com o meio e com tudo que faz parte do mundo deste animal, o ou a Profissional de Medicina Veterinária terá condições de exercer suas atividades com maior segurança, habilidade e sucesso.
É comum nos dias atuais a prática de Eqüinoterapia, direcionada para pessoas com algumas limitações. Ao se conhecer o comportamento do animal, tem-se a segurança e a certeza de que não ocorrerão acidentes e nem situações que possam estressar o cliente (ser humano com limitações), o que favorece o desenvolvimento comportamental do cliente, a tal ponto que em poucas sessões já existe uma interação intensa entre o ser humano e o animal. Mas este tipo de ação está na dependência direta e acima de tudo na responsabilidade dos Profissionais de Medicina Veterinária, que além de se responsabilizarem pela saúde dos animais, também o são na escolha e na orientação do animal certo para o caso apresentado. Temos ainda a parte relacionada com os animais de companhia - cães e gatos - que exercem papel fundamental nas várias faixas etárias do ser humano.
A Etologia é, sem dúvida, uma ciência que caminha a passos largos no melhor entendimento do ser animal pelo ser humano.
Médico Veterinário Romão Miranda Vidal.
CRMV-PR-0039