Ética nas relações de trabalho: seu impacto sobre o clima organizacional

Por Eliana Sfalsin | 01/11/2016 | Adm

O primeiro meio por qual uma organização sinaliza o tipo de clima organizacional que ela quer estabelecer na empresa, é através dos elementos do planejamento estratégico. Principalmente quando define sua missão e valores. Através da sua missão e de seus valores, a organização sinaliza o tipo de comportamento moral e ético que ela prioriza em suas relações de trabalho. Estabelece a base para criação de um conjunto de normas que devem contribuir para formar a moral, a ética e a consciência profissional de seus funcionários, pois estabelece diretrizes com o objetivo de fortalecer a credibilidade da organização entre seus stakeholders. Além disso, essas diretrizes, promovem o bem-estar dos funcionários com relação ao comportamento que deve ser adotado no exercício de suas atividades dentro ou fora do espaço físico da organização.

Por moral entende-se conjunto de valores, individuais ou coletivos, considerados universalmente como norteadores das relações sociais e da conduta dos homens, impelindo-nos a segui-lo para nos tornarmos membros de um determinado grupo social. Ética é uma postura pessoal que pressupõe uma liberdade de escolha. Já a consciência profissional verte sobre os princípios morais e deveres que regem cada atividade profissional. A ética e a moral que fazem parte do nosso convívio em sociedade são indissociáveis da vida no trabalho. A moral pode ser assimilada conforme costumes e valores num determinado período da história, ou de uma região. A ética, por sua vez, questiona a validade do comportamento moral naquele período, ou naquela região. Tanto a ética quanto a moral são bases para a formação da consciência profissional. E da mesma forma que a ética estabelece as leis que determinam a conduta moral da vida pessoal e coletiva, a ética empresarial determina a conduta moral de uma empresa, seja ela pública ou privada, através do conjunto de normas éticas reunido num Código de Ética Empresarial. Já uma categoria de profissionais pode estabelecer regras de conduta a partir de um Código de Conduta Ética Profissional. Esses instrumentos de formalização de diretrizes comportamentais não possuem hierarquia entre si. São ramificações da necessidade social de parametrizar o que é ou não aceitável como comportamento na sociedade, através do que passamos a chamar de Código de Ética.

Código de ética é um acordo que estabelece os direitos e deveres de uma empresa, instituição, categoria profissional, ONG e etc, a partir da sua missão, cultura e posicionamento social, e que deve ser seguido pelos funcionários no exercício de suas funções profissionais. Esse é um documento que dita e regula as normas que gerem o funcionamento de determinada empresa ou organização, e o comportamento dos seus funcionários e membros. Basicamente, os códigos de ética são divididos em direitos e deveres: os direitos destinados a constituir a imagem, identidade e perfil da empresa, por exemplo; e os deveres são as obrigações e condutas que o profissional deve adotar para desempenhar os seus serviços, visando sempre o cumprimento das condutas morais e éticas. Existem alguns princípios básicos que estão presentes em quase todos os códigos, como: a proteção do patrimônio da empresa, a necessidade da transparência nas comunicações internas e externas, respeito entre chefes e subordinados e a denúncia da prática do suborno ou corrupção. Também é alvo do código de ética os fatores externos ao grupo, como o tratamento e relação que desempenham com os consumidores, por exemplo. A partir deste ponto de vista, o código prevê as ações que norteiam as práticas de marketing, propaganda e comunicação da empresa, assim como a qualidade do atendimento. As normas estabelecidas no código de ética podem (ou não) estar atreladas às normas civis. Neste caso, o descumprimento de alguns pontos cruciais do código pode ser motivo para punição perante leis previstas nas legislações penais e trabalhistas.

Uma grande rede de lanchonetes nos Estados Unidos sofreu boicote nos anos 90 por ato de discriminação racial contra uma cliente. A notícia se espalhou e a rede de lanchonetes chegou a fechar filiais. Muitos dos filiados remanescentes avaliavam deixar a rede por conta do ocorrido. Apenas quando a alta direção introduziu uma política de atendimento, amplamente divulgada e planejada, considerada ética e moral pelos clientes, foi que conseguiu retomar seu crescimento.

No final de 2015 uma construtora do Rio de Janeiro foi condenada a pagar aos funcionários uma indenização milionária em virtude de assédio moral praticado pelo gerente jurídico da empresa. Além do montante, a construtora também foi condenada a realizar palestras de conscientização, a cada seis meses, para a manutenção de um ambiente de trabalho moralmente sadio. Para isso foi necessário que a organização estabelecesse regras de conduta que servissem como diretrizes ao comportamento ético de seus funcionários.

Em pleno século XXI, a decisão do Tribunal de Justiça Trabalhista chamou a atenção não apenas pela cifra, mas pela questão ética que envolvia o acontecimento. A decisão de rever seu planejamento estratégico através da mudança dos valores defendidos pela rede de lanchonetes representou o renascimento de um grande negócio. O comportamento dessas duas empresas podia ser considerado normal no período da escravidão, em que os escravos eram tratados sem a menor dignidade. Até que membros de diversas áreas da sociedade passaram a questionar e combater esse hábito desumano. O enfrentamento de opiniões e comportamento que contribuíu para resolução desse conflito social, só foi possível porque algumas pessoas conseguiram fazer valer seu comportamento ético por meio das ações que culminaram na abolição da escravatura. O papel da justiça, nesses dois episódios, representa os abolicionistas do período escravocrata impondo uma conduta ética considerada adequada pela maioria da sociedade.

Vários são os fatores que colaboraram para que a necessidade de criação dos diversos códigos de ética evoluíssem das discussões de pensadores filosóficos para uma ciência a ser desenvolvida, praticada e documentada, através das ciências sociais. Entre eles, a expansão do mercado, dificultando que as regras de conduta, antes passadas de geração para geração de forma mais direta, agora não mais sustentáveis em virtude do distanciamento das pessoas. Outro fator muito importante são os interesses econômicos cada vez mais fortes, desconsiderando questões antes julgadas como mais dignas. A briga por posições de prestígio, por fundos destinados a pesquisas científicas, pela própria necessidade de ser portador de um know-how único e diferenciado e obter vantagens particulares com isso. Todos esses novos desafios da humanidade fizeram com que os códigos precisassem ser elaborados e a ética precisasse, cientifica e objetivamente, ajustar os fatos morais até então adequados, subjetivamente, ao longo das últimas décadas. Pois a ética nas relações de trabalho concerne não apenas ao comportamento que é ou não admissível nos limites de abrangência da organização em que atua, mas também ao impacto que as ações de um funcionário podem causar com atos, gestos e palavras para os stakeholders da organização.

Portanto, a adoção de princípios éticos e comportamentais reflete o tipo de organização da qual fazemos parte e o tipo de pessoa que somos. A ética nas relações de trabalho não é apenas uma política, é uma necessidade. É preciso haver ética para que haja um bom clima organizacional e para que a imagem positiva que os funcionários criam na organização possa transcender seus espaços físicos, valorizando sua imagem no mercado. Organizações que são notadas e positivamente avaliadas pelos funcionários, trazem várias vantagens para os acionistas: motivam bons profissionais a terem vontade de trabalhar nelas trazendo valorização no capital intelectual, despertam o interesse dos investidores, valorizam suas ações e, portanto, expandem seus negócios. Consequentemente, tornou-se imperativo para qualquer tipo de organização o estabelecimento de diretrizes que não apenas vão dar segurança aos funcionários no exercício de suas funções, mas também assegurarão que as ações desses serão norteadas pelos mesmos princípios e valores adotados pela organização como adequados.