Ética na utilização de veículos disseminadores de conhecimento na educação
Por Pablo Raphael de Lacerda Ferreira | 14/10/2010 | EducaçãoÉtica na utilização de veículos disseminadores de conhecimento na educação
1- Introdução
Após inúmeras revoluções criadas e vividas pelos homens, chegamos à era da informação. Deslumbrando a todos que usufruem de suas novas possibilidades, a dependência do ser humano por material intelectual está chegando a níveis biológicos.
Aproveitando essa nova face de transferência de conhecimento, a tecnologia se apropriou muito eficazmente dos processos de disseminação fazendo com que a velocidade de propagação se elevasse exponencialmente.
Contudo problemas surgiram com toda essa informação "à toa" e principalmente com a velocidade com que se propaga. Um dos campos mais afetados com essa revolução silenciosa foi a educação como forma de preparar o indivíduo, que não consegue acompanhar às mudanças geradas continuamente.
Cada vez mais velozes também estão os iniciantes no aprendizado. Esses não suprem suas necessidades com a informação formal e passam a buscá-la onde houver informação muitas vezes sem filtrar o que é "real" da "ficção" por assim dizer.
A ética e a moral foram valores ensinados como princípios de homens para homens, e essas diretivas sempre nortearam a vida comum na sociedade. Hoje parte desse "código de conduta" está sendo distorcido pelas novas formas de comunicação, uma vez que o próprio contato está diminuindo e nesse contexto o que cabe a quem no novo modelo de comunidade que se forma tão autonomamente quanto as informações circulantes.
2- Ética
A ética é a morada do homem, diziam os primeiros filósofos gregos no século VI a.C. Ética vem do grego ethos que significa modo de ser ou caráter. Para eles, o ethos representava o lugar que abrigava os indivíduos-cidadãos, aqueles responsáveis pelos destinos da pólis (cidade). Nessa morada, os homens sentiam-se em segurança. Isso significa que, vivendo de acordo com as leis e os costumes, os indivíduos poderiam tornar a sociedade melhor e encontrar nela sua proteção, seu abrigo seguro. A ética aparece, assim, como resultado das leis determinadas pelos costumes e das virtudes e hábitos gerados pelo caráter dos indivíduos. Os costumes representam, então, o conjunto de normas e regras adquiridas por hábito, enquanto a permanência destes define a caráter virtuoso da ação sujeito. A excelência moral seria não apenas determinada pelas leis da cidade, mas também pelas decisões pessoais que geram as virtudes e os bons hábitos.
O ethos grego corresponde ao latim mos (mores), do qual deriva o termo moral. Ética e moral são palavras que significam, em sua origem, a mesma coisa, pois dizem respeito ao modo como os indivíduos devem agir em relação ao outro no espaço em que vivem. Entretanto, hoje podemos estabelecer uma diferença entre ambas, pois a ética se constitui como uma parte da filosofia que trata da moral em geral, ou da moralidade de cada ser humano, em particular. A ética é por muitos definida como a ciência da moral. Isso significa que a moral aparece atualmente como um objeto de reflexão da ética. Desse modo, enquanto à ética compete estudar os elementos teóricos que nos permitem entender a moralidade do sujeito, a moral diz respeito à esfera da conduta, do agir concreto de cada um. Pode-se resumir tais diferenças da seguinte forma: a ética revela-se como reflexão (theoria), já a moral diz respeito à ação (práxis). (Pequeno, M., Ética, Educação e Cidadania ? Universidade Federal da Paraíba)
3- Educação
Observando o trecho que se refere à proposta de educação clássica também elaborada pelos gregos pode-se ter melhor embasamento para seguir na compreensão da proposta deste trabalho.
A proposta de educação do homem como membro de uma cultura foi apresentada primeiramente pelos gregos como paidéia (formação). ?Os gregos viram pela primeira vez que a educação tem de ser também um processo de construção consciente. ?Constituído de modo correto e sem falhas, nas mãos, nos pés e no espírito? (...). Só a este tipo de educação se pode aplicar com propriedade a palavra formação, tal como a usou Platão pela primeira vez em sentido metafórico, aplicando-a à ação educadora?. (Jaeger, 1986: 09-10). ?A educação grega não é uma soma de técnicas e organizações privadas, orientadas para a formação de uma individualidade perfeita e independente? (idem:12). Era a coletividade que visava e nela que se constituía como uma formação integral do homem e não como um mero adestramento. Por isso, para os gregos, a Paidéia buscava imprimir nos membros da sociedade a areté (a palavra grega para virtude) de modo que pudessem se reconhecer como responsáveis e realizadores dos valores de sua sociedade.
Ao longo da filosofia clássica, sempre esteve presente a pergunta sobre como formar os jovens, o que lhes deveria ser ensinado para alcançarem a virtude. Portanto, paidéia e areté, educação e virtude, não poderiam ser pensadas separadamente. Toda a sociedade e a cultura estavam presentes na formação do homem e do cidadão. Era este ideal de excelência e perfeição que os gregos buscavam através da educação: a excelência do homem, das instituições, das cidades. Entretanto, não era apenas como fim que este ideal se fazia presente na educação grega, ele era meio, princípio, forma e ação. Ou seja, o homem grego devia ser educado para a virtude, de modo virtuoso, por pessoas virtuosas, praticando ações virtuosas e fazendo sua cidade virtuosa. (SANTOS, G. A. Ética, formação, cidadania. A educação e as nossas ilusões. In: Gislene Aparecida dos Santos. (Org.). Universidade, Formação, Cidadania. São Paulo: Cortez, 2001, v. 1, p. 149-167.)
4- Sociedade do Conhecimento
A sociedade do conhecimento é compreendida como aquela na qual o conhecimento é o principal fator estratégico de riqueza e poder, tanto para as organizações quanto para os países. Nessa nova sociedade, a inovação tecnológica ou novo conhecimento, passa a ser um fator importante para a produtividade e para o desenvolvimento econômico dos países (DRUCKER, 1993; LEMOS, 1999; CHAPARRO, 2001; FUKS, 2003; D'AMARAL, 2003).
Para Gorz (2005), o conhecimento se tornou a principal força produtiva, os produtos da atividade social não são mais produtos de trabalho cristalizado, mas de conhecimento cristalizado. O valor de troca das mercadorias não é determinado pela quantidade de trabalho social nelas contidas, mas pelo conteúdo de conhecimento, de informações e de inteligências gerais. Assim, o capital humano passa a fazer parte do capital da empresa, os trabalhadores pós-fordistas entram no processo de produção com toda a sua bagagem cultural. (Dávila Calle, Guillermo Antonio & Da Silva, Edna Lucia, 2008, Inovação no contexto da sociedade do conhecimento, Revista TEXTOS de la CiberSociedad, 8. Temática Variada.)
4.1- O papel do educador na era da informação
Baseado em Pedro Demo em sua palestra "A tecnologia na educação e na aprendizagem", no processo atual de desenvolvimento do capital intelectual individual o educador passou a ter um papel mais específico na educação do indivíduo, nesse momento ele deixa de ser somente facilitador ou difusor de informação e passa a atuar como um "pescador" de conhecimento.
Após serem lançadas as informações, o receptor terá o papel fundamental de transformá-las em conhecimento onde tudo que foi absorvido será convertido em aplicabilidade para sua nova realidade.
O método repetitivo que perdurou por muito tempo tentava impregnar a mente do educando de informações que seriam repetidas posteriormente de forma mecanizada. Não podemos desconsiderar, é claro, a falta de informação que havia outrora, temos que creditar às mentes que na falta de conteúdo suficiente em sua época souberam gerar conhecimento original, que hoje nos serve de informação para que suscitemos nossa base de conhecimento.
O educador contemporâneo instiga o aprendiz a buscar vários dados em sua base de informações e compor conhecimento (naquele momento, para aquele indivíduo) original, onde o mesmo sirva como solução para suas necessidades.
5- A mudança do paradigma comunicacional
A partir dos 1940, inicia-se uma estratégia que vincula o desenvolvimento do mercado informativo e publicitário com a expansão do capital a escala mundial. Surge assim à doutrina do livre fluxo de informação ou ?free flow of information' que significou início da imposição da liberdade do comércio com a informação, completando o intercâmbio já existente de capitais, bens e recursos já existente nessa época (CORTÉS, 2005, p.20). Apesar disso, detecta-se uma falência nesse modelo que terminou sendo favorável para os países com maior desenvolvimento, quebrando a suposta igualdade de oportunidade e igualdade na posição dos países para exercer o seu direito à livre competência em informação (CORTÉS, 2005).
Para Cortés (2005), é neste contexto e no marco das relações do capital privado com o estado, que surge a tendência a desenvolver redes mundiais de telecomunicações para dar assistência técnica aos países em desenvolvimento. Cria-se assim a teoria da modernização, que tem como principal referente o livro de Daniel Lerner chamado ?The Passing of Traditional Society: Modernizing the Middle East', publicado no ano de 1958. Beltrán (2005) afirma que nesse livro Lerner verificou a existência de uma relação positiva entre o desenvolvimento nacional com a comunicação social. Segundo Beltrán (2005), o livro de Lerner também identificou funções diversas da comunicação no processo de modernização, como criar aspirações, fomentar o nascimento de lideranças para a mudança social, fomentar a participação da cidadania no âmbito social, e fomentar a empatia, entendida como atitude para se colocar no lugar da outra pessoa.
Mattelart (1997, p.49) afirma que na década dos 50 e 60 apareceram numerosos estudos que operacionalizam essa teoria, citando autores como Schramm e Pool. Tais autores entendem a saída do subdesenvolvimento como a passagem da "sociedade tradicional" para a "sociedade moderna".
No contexto da modernização, a doutrina do livre fluxo de informação foi complementada pela "teoria da difusão de inovações" (MATTERLAT, 1997; CORTÉS, 2005). Assim, a mídia passou a ter um papel importante, sendo que a modernização significava uma mudança evolutiva e gradual originada pela transferência de características modernas dos países ocidentais para os países subdesenvolvidos, especialmente para América Latina e Ásia.
Cortés (2005) afirma que em função da difusão de inovações, a única via solução para os problemas dos países subdesenvolvidos era a adoção dos modelos de desenvolvimento ocidentais. O desenvolvimento se identificava com a modernização na perspectiva evolucionista e diferenciadora o que produzia conflitos entre o considerado moderno e o tradicional, sendo que o tradicional era visto como um obstáculo que tinha que ser superado para alcançar o desenvolvimento.
Vistos sempre como conceitos opostos, a modernidade e tradição nem sempre são excludentes no processo de inovação, quando são consideradas as margens de manobra que as mudanças trazem consigo. É importante considerar que num processo inovador, muitas vezes (ou quase sempre) a tradição e os elementos particulares são mais um componente, além da modernidade e tecnologias novas, para a produção de inovações. Esta idéia é defendida por Callon (2004), quando afirma que a inovação não destrói a tradição, pelo contrário se nutre da mesma. Ressalta que existem margens de manobra na competição econômica, na produção dos conhecimentos científicos e na produção de inovações. Tais margens de manobra são capazes de preservar e até enriquecer a identidade das tradições.
Já na sociedade do conhecimento, Bauman (1999, p.26) indica que a informação flui de um modo mais rápido independentemente dos seus portadores, fenômeno que ele chama de "liberação dos corpos". Este fenômeno produz tanto emancipação nos países desenvolvidos com capacidades tecnológicas adequadas, quanto confinamento nos países pobres. Com a mudança no modo de comunicação, que a sociedade do conhecimento trouxe consigo e que constitui uma mudança de paradigma, desenvolveram-se novas formas de se comunicar, de disseminar informação, de criar conhecimento, e inclusive houve um grande impacto sobre outras áreas.
A mudança é explicada desta forma. Os meios de comunicação tradicionais como o rádio, a televisão e a imprensa, funcionam conforme um modelo de comunicação de "um para muitos", tendo com uma hierarquia bem definida de emissor-receptor. A Internet surge e por meio dela um novo modelo de comunicação, de "muitos para muitos", no qual os atores do processo de comunicação não têm um papel fixo, podendo ser ao mesmo tempo produtores e receptores de informação (LÉVY, 2000, p.207; VAZ, 2004). Para Lévy (2000, p.208), "a comunicação interativa e coletiva é a principal atração do ciberespaço", mas evidentemente, segundo ao autor, o ciberespaço também pode ser usado para comunicações ponto a ponto, ou que reproduzam o modo mídia com a emissão de informações a partir de um centro.
Para Levy (2000) quanto maior a interconexão de computadores, maior será o potencial de inteligência coletiva a disposição em tempo real. Assim, considerando a mudança do paradigma de comunicação e a capacidade de colocar na Internet todos os documentos / informações digitalizadas do planeta, a world wide web, constitui segundo Lévy (20007), a maior revolução na história da escrita depois da invenção imprensa.
Com relação às conseqüências desse nesse novo meta-meio comunicacional, Lévy (2000, p.207) afirma que a Internet ao possibilitar o entrelaçamento de múltiplos fluxos, torna-se um centro virtual e um poderoso instrumento de poder. Outra conseqüência fundamental da internet é a eliminação dos limites geográficos no acesso/produção/disseminação da informação (VAZ, 2004, LEVY, 2000). Para Vaz (2004), os novos limites agora são impostos pelo excesso de informação. Dentro do âmbito social, observa-se que a exclusão é o grande risco do ciberespaço (LÉVY, 2000), sendo que as pessoas com menor capacidade de acesso às novas tecnologias vão ter uma menor capacidade de se desenvolver e de produzir conhecimento e riqueza.
No âmbito social pode-se ressaltar mais uma vantagem importante: o fim do processo de intermediação (LÉVY, 2000; VAZ, 2004). Agora o espaço público de comunicação está livre de intermediários institucionais ou políticos, para se publicar um texto na internet não é preciso ter o aval de um editor ou de um processo a priori de avaliação. As conseqüências políticas e culturais dessa desintermediação ainda não se podem avaliar (LÉVY, 2000).
A publicação na Internet possibilita que o compartilhamento da informação seja imediato e, ainda, proporciona maior disponibilidade em termos geográficos e temporais, significando que a informação pode ser acessada de qualquer ponto da rede e em qualquer momento.
Por outro lado, já no âmbito empresarial, as informações colocadas na Internet, devidamente filtradas, constituem uma das fontes de informação para processos empresariais de inteligência competitiva, criação de conhecimento e tomada de decisões, cujas saídas são conhecimento e compromisso para ação (CHOO, 2003).
Conseqüentemente, demonstra-se que a mudança no paradigma comunicacional e as novas tecnologias, favorecem a publicação e o compartilhamento da informação, assim como a criação e o compartilhamento do conhecimento nas suas diferentes formas, o conhecimento criado por meio da interação social para ser um insumo fundamental na geração de inovações. (Dávila Calle, Guillermo Antonio & Da Silva, Edna Lucia, 2008, Inovação no contexto da sociedade do conhecimento, Revista TEXTOS de la CiberSociedad, 8. Temática Variada.)
6- Considerações
Assegurado que toda informação processada até aqui tenha sido entendida, pode-se levantar um panorama geral sobre a possibilidade do aprendizado errôneo do ponto de vista acadêmico ou mesmo na formação primária do indivíduo.
Atestada a falta de programação adequada para os veículos de exibição em massa aliada à falta de controle de material produzido e "jogado" nos meios modernos de difusão de informação, aquilata-se as proporções alcançadas pela informação descompromissada e de fácil acesso ao domínio público.
Por outro lado, a difusão de conhecimento, mesmo que sem formatação, acaba por gerar novas possibilidades de conhecimento e formação de material intelectual, o empirismo "sai" do aspecto individual e sofre influência dos demais, analogamente podemos comparar esta situação à elaboração de softwares e material de código aberto ou mesmo ao novo padrão de internet que se estabelece a Internet 2.0, onde a formação de conteúdo é dilatada através do conhecimento de seus usuários.
Com tanta informação pairando e a lenta adaptação do sistema educacional, como se pode adaptar o ensino a essa fase que se considera transitória, mas que não se distingue o fim?
8- Referências
Pequeno, M. Ética, Educação e Cidadania ? Universidade Federal da Paraíba.
SANTOS, G. A. Ética, formação, cidadania. A educação e as nossas ilusões. In: Gislene Aparecida dos Santos. (Org.). Universidade, Formação, Cidadania. São Paulo: Cortez, 2001, v. 1, p. 149-167.
Dávila Calle, Guillermo Antonio & Da Silva, Edna Lucia, 2008, Inovação no contexto da sociedade do conhecimento, Revista TEXTOS de la CiberSociedad, 8. Temática Variada.