ESTUDO DE CASO DA DECRETAÇÃO DE FALÊNCIA DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: Banco Santos
Por Thaís Abdalla Bastos | 30/09/2015 | DireitoESTUDO DE CASO DA DECRETAÇÃO DE FALÊNCIA DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: Banco Santos[1]
Luane India do Brasil e Thaís Abdalla Bastos[2]
Humberto Oliveira[3]
RESUMO
O presente artigo versa sobre o instituto da falência e sua aplicação no caso de instituições financeiras. Assim, num primeiro momento abordar-se-á o surgimento do direito de falência e como este foi se aprimorando com o tempo. Logo após, far-se-á uma análise da falência das instituições financeiras, especificamente, e seus efeitos. Por fim, prentende-se analisar um caso concreto (falência do Banco Santos) a fim de consubstanciar os estudos referentes ao tema da falência.
PALAVRAS-CHAVE
INTRODUÇÃO
Neste estudo sobre o instituto da falência bancária demonstrar-se-á a sua constituição no decorrer do tempo, passando por várias fases desde o Direito Romano até a codificação atual. Parte-se elucidando os pressupostos da decretação da falência e outros aspectos relacionados a formação da base teórica para compreender o estudo de caso da falência do Banco Santos.
No primeiro capítulo será feita uma análise evolutiva do instituto falimentar e da legislação que a envolve desde o Direito Romano, passando pela Idade Média, Código Napoleônico, Direito Português até chegar a Lei 6.024/74. Será ressaltado o diálogo e a subsidiariedade entre a Lei que regula a falência de Bancos e a que rege a falência do empresário individual e a sociedade empresária.
No segundo capítulo elucidará a crise financeira global e a implicância desta na possível aplicação da lei de falência bancária. Menciona-se os procedimentos necessários a decretação da falência e sua formas.
Já no terceiro capítulo será analisada a demonstração da atuação da legislação de falência no caso do Banco Santos e os transtornos drásticos de uma má administração.
1 O INSTITUTO DA FALÊNCIA E SUA EVOLUÇÃO
O instituto da falência é conhecido desde há muito tempo, mais precisamente originário do Direito Romano quando as execuções eram feitas na própria pessoa do devedor e não no seu patrimônio. Neste momento, mais ou menos no ano 450 a. C., na vigência da lei das XII tábuas, a execução por dívidas era instaurada contra a própria pessoa do devedor, deste modo, os credores poderiam vendê-lo, matá-lo ou prendê-lo (PERIN JUNIOR, 2006, p.29).
Na Idade Média há o deslocamento da iniciativa da execução do credor para o Estado, deste modo, não se permitia a execução de mão própria. Neste momento o instituto da falência tinha um caráter predominantemente repressivo, o seu propósito era punir o devedor que enganava, iludia o credor. Nesta linha, Ecio Perin Júnior (2006, p.32) fala: “A defesa dos interesses dos credores, a ideia de uma proveitosa liquidação, era secundária. Temia-se a falência do mesmo modo que se fugia do crime”.
Já no século XVIII, com a edição do Código Napoleônico, fez-se uma diferença entre insolvência civil e comercial. Mas o devedor faltoso ainda era tido como um criminoso. Na modernidade as regras se aperfeiçoam, é criado o instituto da concordata preventiva, que era um acordo feito com os credores para se evitar a falência. No Brasil, o processo de execução por dívidas era feito todo baseado no direito português, somente depois de 1822, com a independência do Brasil, é que aos poucos as leis do sistema anterior vão sendo adaptadas a nova ordem que se estabelecia.
Atualmente a falência é entendida como a “a organização legal e processual de defesa coletiva dos credores em face da insolvência do empresário no tocante ao estado patrimonial de um indivíduo que não consegue fazer frente aos débitos que pesam sobre ele”. (PERIN JÚNIOR, 2006, p.51)
O instituto da falência, no Brasil, é regido pela lei 11.101/2005, e traz no seu art. 1º as pessoas que estão sujeitas a falência, quais sejam, o empresário individual de responsabilidade ilimitada ou limitada e a sociedade empresária. Deste modo, as sociedades simples, pessoas físicas não empresárias não podem ser submetidas ao processo de falência.
Segundo a maioria da doutrina os pressupostos caracterizadores da falência são divididos em pressuposto material subjetivo, consistente na qualidade de empresário do
devedor; pressuposto material objetivo, que significa a insolvência do devedor; e pressuposto formal; que nada mais é do que a sentença que a decreta, totalizando, portanto, três pressupostos (RAMOS, 2008, p.532).
Dito isto, é importante expor que o processo de falência das instituições financeiras é regido pela lei 6.024/74 e que por isso a nova lei de falência (lei 11.101/05) será aplicada subsidiariamente no que couber. Para as Instituições Financeiras o legislador entende que, por serem atividades específicas, cabe ao Conselho Monetário Nacional e ao Banco Central intervir diretamente quando estas instituições apresentarem dificuldades (FILHO, 2011, p.63)
2 AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS E A DECRETAÇÃO DE FALÊNCIA
O sistema financeiro mundial é cheio de altos e baixos fazendo com que algumas atividades econômicas tenham um risco maior que outras, como a atividade bancária e das demais instituições financeiras equiparadas. Este risco foi majorado a partir do momento em que passou-se de um Estado intervencionista para um Estado mais liberal e mais agressivo, em que se caracteriza pelo crescimento econômico acelerado e pelo grande número de empreendimentos emergindo todos os dias no mercado. Neste compasso, viu-se a necessidade de se adotar instrumentos de prevenção de crises no sistema financeiro a fim de evitar prejuízos para outros setores da sociedade (SIQUEIRA, p.3).
O sistema para a decretação de falência das instituições financeiras obedece a um regime próprio regulado pela lei 6.024/74 e são a intervenção e a liquidação extrajudicial. Em último caso pode ser decretado a falência de uma instituição financeira, hipótese esta prevista na alínea “b” do artigo 21 da mesma lei.
A intervenção e a liquidação extrajudicial são espécies de procedimento extrajudicial que visam a recuperar a instituição financeira em crise. Essas medidas somente podem ser iniciadas pelo Banco Central do Brasil já que este é responsável pela manutenção de um sistema financeiro sadio. A intervenção pode ser feita ex officio pelo Banco Central ou a requerimento dos administradores da instituição, caso o estatuto lhe confira essa competência.
O artigo 2º da lei 6.024/74 elenca as hipóteses em que pode ser decretada a intervenção. Se a intervenção não for suficiente ter-se-á a liquidação extrajudicial, conforme estabelece o artigo 15 da lei susomencionada. Logo após, o artigo 18 discorre sobre os efeitos que serão produzidos com a liquidação extrajudicial. O que importa mencionar é que não havendo a possibilidade de ser aplicado todos esses institutos previstos pela lei, a opção será a decretação da falência. Nessa linha, Cristiano Gomes de Brito (p.10) diz que “as instituições financeiras, quando se encontram no exercício regular da atividade financeira, sujeitam-se à decretação da falência como qualquer outro empresário. Mas, se o Banco Central decreta a intervenção ou liquidação extrajudicial de certa instituição, esta não pode mais falir a pedido do credor”.
Dessa forma, decretado a falência de uma instituição financeira os efeitos da sentença declaratória serão os mesmos aplicados à falência do empresário individual e das sociedades empresárias. Assim, quanto aos direitos dos credores haverá o vencimento antecipado de todas as dívidas do falido, conforme prevê o artigo 77 da lei 11.101/05, suspensão da fluência de juros, multa fiscal, suspensão das ações ou execuções movidas contra o falido, suspensão da prescrição.
Já quanto ao falido e seus bens haverá a sua inabilitação empresarial (art. 102), perda do direito de administração de seus bens e da disponibilidade sobre eles (art. 103) e sujeição a prisão caso haja crime falimentar. Bem, além desses há outros efeitos, mas estes são considerados mais importantes, assim a partir da análise do caso do Banco Santos poderá ser percebido a incidência destes ao caso concreto.
3 ANÁLISE DE CASO: FALÊNCIA DO BANCO SANTOS
Tendo em vista a formação de um conhecimento prévio feita nos tópicos anteriores sobre a Lei de Falência, parte-se para um estudo casuístico da falência do Banco Santos.
A corretora de valores Santos foi fundada em 1969 e após 20 anos foi fundado o Banco Santos, seu início foi marcado por crescimento exponencial e bonanças e, após uma gestão fraudulenta, um desfecho marcado por crimes falimentares e uma enorme dívida.
Apenas seis anos depois de seu início, em 1995, seu lucro já atingia US$ 8,16 milhões, com o patrimônio chegando à US$ 37 milhões e entrando na categoria de banco de médio porte. Em 1997 o Banco atingiu R$ 1,5 bilhão de ativos alcançando lucro de R$ 20,19 milhões, com rentabilidade de 19%. Em 1998 a Price Waterhouse Coopers, empresa de auditoria, emite seu parecer sem nenhuma ressalva. O Balanço Social mostrava investimento de R$ 2,7 milhões com patrocínios em diversos eventos em São Paulo. ( MOURA, 2007, p. 86)
No começo de 2004, o Banco com dados invejáveis, mostrava outra face. O Banco Central já começava a suspeitar pela falta de ativos no Banco Santos, mas pela falta de
patrimônio líquido negativo, não foi possível ser tomado nenhuma medida mais enérgica. Após a divulgação contábil da auditoria Trevisan & Associados ficou evidente os problemas de liquidez do Banco, após este não cumprir exigência do Banco Central, foi autorizado a intervenção por intermédio do ato-presidencial nº 1.082, com base no artigo 1º, combinado com os artigos 15, inciso I, alíneas "a" e "b", § 1º, e 5º da Lei nº 6.024, de 13 mar. 1974. (citação indireta http://www.newton.freitas.nom.br/artigos.asp?cod=90)
Caio Marcelo, juiz da 2ª Vara de Recuperações e Falências, decretou a falência do Banco Santos. O indicado como administrador judicial da massa falida foi Vânio César Aguiar, o mesmo que atuou como interventor pelo Banco Central neste Banco. O pedido de falência foi feito pelo promotor de Justiça Alberto Camiña Moreira, atendendo pedido do liquidante. O promotor também entrou com uma ação de responsabilidade civil contra Edemar Cid Ferreira e 22 outros ex-administradores, visando o bloqueio de seus bens já que se estipula um desvio de mais de 2,2 bilhões. (citação indireta http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u100569.shtml)
Já no processo de falência, foi votado por uma assembleia geral de credores no sentido de fiscalizar a administração da massa falida, vale ressaltar que 99% dos créditos são formados por quirografários. Então, isto gerou uma confusão, já que reza a Lei de Falência que haverá um comitê de credores de todas as classes e por se ter quase somente credores quirografários, só se teria o comitê de um único representante.
Com o intuito de arrecadar ativos para satisfazer o passivo, o Tribunal de Justiça de São Paulo autorizou a massa falida a renegociar a dívida daqueles que tiraram empréstimos junto ao Banco Santos. Neste interregno, Edemar Cid Ferreira, ex-banqueiro do Banco Santos, perdia a sua casa no Morumbi, já que esta constava como patrimônio do Banco.
O primeiro passo com o fim de realizar o passivo foi “o rateio de R$ 270 milhões entre seus 1.982 credores quirografários - feito raro em processos de falência, que costumam ser concluídos mais de uma década depois sem que sequer as dívidas trabalhistas tenham sido quitadas.” (Cristine Prestes, de São Paulo http://www.bancosantos.com.br/). Pari passu ao pagamento, novos acordos foram fechados no sentido de formar valores para satisfazer o passivo. No final de 2011, o antigo representante da massa falida Jorge Queiroz deu lugar a Rodolfo Guilherme Peano. O levantamento em 2011 aponta que já houve o pagamento do montante de R$ 954 milhões (http://www.conjur.com.br/2011-mar-14/banco-santos-faliu-fraudes-edemar-cid-ferreira)
Tendo em vista o risco que a atividade bancária representa ao direito alheio, por movimentar dinheiro de outrem, o Banco Central tal como o Governo tem a responsabilidade de atuar preventivamente em prol da ordem econômica e social. Vânio César Aguiar, interventor do Banco Central neste caso, fez diligências no sentido de preservação do acervo da empresa, “arrecadando todos os livros da instituição bancária e os interesses da administração, mediante termo; e levantando o balanço geral e o inventário de todos os livros, documentos e outros bens da entidade, ainda que em poder de terceiros” (SIQUEIRA, 200X p. 19).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por tudo que foi exposto, é evidente a necessidade e da utilidade da legislação falimentar nas instituições financeiras como forma de assegurar a segurança nas relações e a própria ordem econômica.
Demonstrou que apesar da crise econômica financeira global, a falência de uma instituição financeira pode estar vinculada a péssima administração dos seus gestores e a crimes falimentares. O Banco Santos partiu do pólo de exemplo de instituição ao pólo de puro sucateamento com um rombo bilionário.
Apesar da quantidade de débito ser enorme, já houve uma parte considerável de satisfação do passivo. Assim, a massa falida caminha no sentido de minimizar as perdas que obteve, sendo para isso necessário a realização de vários acordos.
REFERÊNCIAS
BRITO, Cristiano Gomes de. O Regime de administração especial temporária – RAET. Disponível em: <http://www.cristianobrito.com.br/artigos/RAET%20ARTIGO.PDF>. Acesso em: 10 mai. 12.
FILHO, Manoel Justino Bezerra. Lei de Recuperação de Empresas e Falência: lei 11.101/2005 comentada artigo por artigo. ed. 7. ver. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
PERIN JÚNIOR, Ecio. Curso de Direito Falimentar e Recuperação de Empresa. ed.3 rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, 2006.
RAMOS, André Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial: o novo regime jurídico-empresarial brasileiro. Bahia: Editora Jus Podivm, 2008.
SIQUEIRA, Francisco José de. Instituições Financeiras: regimes especiais no direito brasileiro. Disponível em: < http://www.bcb.gov.br/htms/public/8encjur/06%20-%20francisco%20jos%E9%20de%20siqueira.pdf>. Acesso em: 09 mai. 12.