eSOCIAL E SAÚDE E SEGURANÇA NO TRABALHO (SST): (MAIS) UMA CRISE ANUNCIADA

Por Airton Kwitko | 01/03/2016 | Adm

eSOCIAL E SAÚDE E SEGURANÇA NO TRABALHO (SST):

(MAIS) UMA CRISE ANUNCIADA

Dr. Airton Kwitko: kwitko@sigoweb.com.br

 

É possível que as maiores complexidades existente nos eventos do eSocial sejam aquelas que abordam aspectos de SST (1). 

Apesar da legislação que disciplina essa área existir desde 1994, ano da criação de PCMSOs e PPRAs, alguns conceitos e exigências básicas de ambos jamais foram implantados.

Explicação para isso pode existir pelo fato de que SST é um item “menor” nas organizações, quando comparado com compras, produção, vendas, faturamento, etc. E se considerarmos sob esse prisma, realmente o é: a finalidade da empresa é comprar, produzir, vender, faturar. Tratar com SST é atualmente um aspecto acessório e se inexistissem legislações sobre isso, ações nessas áreas talvez ocorressem com menor frequência.  

Entretanto, a atual cultura de valorar de forma distinta atividades nas organizações será substituída por uma cultura na qual todas requerem idêntica atenção para fins de envio de dados ao Governo.

Com isso, aspectos de SST que até o momento não recebem atenção especial ou mesmo que não cumprem os expressos requisitos legais, terão que se adequar à nova realidade.  

Exemplifico com a audiometria, exame mais comumente realizado: excetuando-se o SIGOWeb – nosso Sistema de controle de ações de SST – nenhum outro sistema oferece soluções de interpretações conforme os padrões definidos pela Norma Regulamentadora Nº 7. Os critérios estão no § 4º dessa Norma e são datados de 1998.

Mesmo desconsiderando-se sistemas, nenhum fonoaudiólogo informa ao seu cliente se a audição do testado, avaliada pela audiometria, está estável ou há agravamento. E isso é informação a ser entregue ao Governo, expressa pelo Evento 2220 (Monitoramento da Saúde do Trabalhador) na “tag” 33.

Quem desconhece os meandros dos exames audiométricos pode supor que o fonoaudiólogo possa efetuar interpretações legais com facilidade: não pode e é tarefa hercúlea na vigência de 3 ou mais exames. O tempo despendido é significativo para uma única tarefa interpretativa e nenhum profissional da área consegue apresentar resultados consistentes.  

E mais: é informação a ser enviada de forma eletrônica, sistêmica. Observe-se que trato apenas de um item: audiometria.

E quanto aos demais exames, dos quais igualmente o eSocial espera resultados como referencial sequencial, estável ou agravamento?

Temos aí uma crise: com todo o tempo disponível desde a implantação de PCMSOs e PPRAs (1994 = 22 anos agora) e o transcorrido desde o “lançamento” das bases para interpretações audiométricas (1998 = 18 anos nesse momento) pouca coisa é feita para atender às demandas inerentes aos primeiros e quase nada quanto a segunda.

Então: informar o quê?     

E agora surge mais uma crise anunciada pois sistemas de controle de SST são falhos para efetuar automaticamente as interpretações requeridas pelo eSocial.

E assim: como informar o que não se têm?

Descrevo um episódio emblemático: Há pouco tempo tivemos oportunidade de avaliar quatro sistemas de ERP que duas empresas, nossas clientes, desejavam apreciar. Por cautela, queriam confirmar pela observação de outros sistemas, se o SIGOWeb poderia lhes fornecer todas as respostas necessárias na área de SST, requeridas pelo eSocial.

De forma bem transparente, participamos das avaliações junto com médicos, fonoaudiólogos, engenheiros e técnicos de segurança dessas empresas. A conclusão geral é de que as soluções fornecidas pelas empresas de ERP eram completamente insatisfatórias.

A reação das quatro avaliadas foi idêntica: surpresa pelos achados e adoção de uma postura defensiva e até intransigente em sequer considerar a possibilidade de alterar o que apresentavam.  “Dispomos de tudo que é necessário”, diziam.

Não dispunham! Honestamente creiam que sim, mas a realidade era outra.

De certa forma, isso não é uma surpresa, visto que gestão sistêmica de SST envolve tanto aplicar aspectos legais – muitos deles desconsiderados pelos ERPs avaliados – como adoção de práticas e processos que possibilitem o uso amigável. E principalmente, dispor de “travas” internas que evitem equívocos na geração da informação, ou seja: uma inteligência que “pense” para o usuário e lhe indique as soluções em cada passo.

Isto os sistemas que ERPs disponibilizam não possuem pois são desenvolvidos por pessoas não especializadas na área de SST. Se constituem em sistemas para atender minimamente o que hoje se requer em termos de PCMSOs e PPRAs e, claramente falando, para os quais a exigência de compliance é mínima, e até muitas vezes inexistente.   

Aí se configura mais essa crise anunciada: a crença de que um ERP possa oferecer adequada solução em ações de SST para o eSocial originará decepções em curto tempo. Recorda-se que para algumas empresas o envio de informações de SST começa em janeiro de 2017.

Como o Sistema do ERP não atende e o fornecedor não tem condições de oferecer algo apropriado, o ônus disso recairá sobre a empresa. Afinal, é ela que terá que enviar dados ao Governo e como irá fazer isso?

Medidas terão que ser adotadas para trocar de fornecedor e, como em tudo que é efetuado às pressas, há aí um grande risco de não se encontrar a tempo solução adequada.

O que se pode fazer agora?

Basicamente existem dois níveis de busca da solução mais adequada:

1º Nível: Empresas de ERP precisam reconhecer a nova cultura que afeta as necessidades do eSocial para a SST, exigente em termos de que e como usuários irão imputar dados, e oferecer adequados processos a serem adotados pelo pessoal dessas áreas para desempenhar adequada e rapidamente suas atividades. A prática de disponibilizar complexas planilhas eletrônicas para que sejam digitados dados através de manualidades e processos artesanais não encontra amparo pelas exigências do eSocial.

Se o sistema disponibilizado não aportar “inteligência” para facilitar o uso e até mesmo impedir que equívocos sejam efetuados, dados poderão não ser enviados de forma tempestiva, ou se o forem, é possível que apresentem diversas inconsistências, com o que não serão aceitos. O resultado final disso é previsível: estresse e multas.    

Com isso, empresas de ERPs necessitam ou alterar profundamente o que oferecem para atender seus clientes nas demandas de SST, se puderem e se contarem com conhecimento suficiente para isso, ou buscar soluções terceiras que ofereçam o necessário e integrar as mesmas ao seu sistema.      

2º Nível: Empresas que irão enviar dados ao Governo, terão que analisar a ferramenta disponibilizada pelo seu ERP, e para isso envolver todos os profissionais que a irão utilizar ou mesmo já a utilizam. Estes são os usuários que conhecem as reais necessidades e podem avaliar as ferramentas que lhes são fornecidas. É imperativo testar antecipadamente as mesmas com vistas às exigências do eSocial, pelos quatro eventos de SST: Tabela de ambientes de trabalho, Comunicação de acidente de trabalho, Monitoramento da saúde do trabalhador e Condições ambientais do trabalho.

Se a conclusão for idêntica à observada pelas empresas que adotaram essa prática, ou seja, de que as atuais soluções oferecidas pelas empresas de ERPs são inconsistentes, muitas vezes equivocadas em conceitos básicos e até mesmo primárias para os fins que irão se destinar (SST no eSocial) ainda há algum tempo para adequar-se corretamente (artigo escrito em final de fevereiro/2016).

Com isso a nova crise agora anunciada poderá não ocorrer. Caso contrário, será observada em breve.

(1)   Recomenda-se ouvir o que diz a respeito de eSocial e SST o Dr.  Paulo Roberto Magarotto, Auditor da Receita Federal: http://tinyurl.com/zzcvnzt

Artigo completo: