ESCRIVÃO OSNELITO SOUSA NA POLÍCIA CIVIL DE SANTA CATARINA
Por Felipe Genovez | 20/05/2015 | HistóriaEscrivão de Polícia Osnelito Sousa
(Felipe Genovez)
Também, no campo da quase onomatopeia, chamado de “Lito”, “Litão”, “Nelito” e “Litoviski”, mais de trinta anos de serviço prestado à Polícia Civil – Escrivão de Polícia final de carreira – formado em Direito pela Univalli (Itajaí) e Ex-Gerente de Serviços Gerais na Delegacia Geral, durante o governo Paulo Afonso. Filiado ao PMDB foi nomeado por intervenção dos Deputados Andrino e Blasi, mesmo contra a vontade da cúpula da Polícia Civil. Uma das maiores resistências ao seu nome era justamente Lúcia Stefanovich que parece jamais esqueceu uma “desfeita” passada. Tinha esperança que fosse lhe dado oportunidade de ingressar na carreira de Delegado de Polícia – seu mais antigo sonho. Ao que tudo indica, ainda não descobriu o segredo, mesmo após fazer mais de uma dezena de concursos na Acadepol. No último certame realizado para provimento de cargos de Delegado de Polícia (segundo semestre/98) viu ruir mais uma vez esse seu ideal. Depois de exonerado do cargo solicitou diretamente ao Delegado-Geral Evaldo Moretto para que fosse lotado na Segunda Delegacia do Saco dos Limões, no que foi atendido. No governo Pedro Ivo Campos, tendo como padrinho o Deputado Andrino e o Secretário de Justiça (João Henrique Blasi) foi nomeado Consultor Jurídico junto à Procuradoria-Geral do Estado, cargo com tanto prestígio à época que o de Superintendente da Polícia Civil (na época ocupado pela Delegada Lúcia Stefanovich).
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Sr. Diretor, |
Osnelito não conseguiu realizar seu velho sonho de ser "Delegado" (apesar de talvez mais de uma dezena de concursos), uma revolta que acompanhou até o final dos seus tempos. Como forma de lhe homenagear, transcrevo uma de nossas conversas, justamente no dia do seu aniversário:
Dia 17.10.2003, por volta de dezesseis horas Osnelito apareceu de mansinho na “Assistência Jurídica”, abrindo a porta no momento em que eu estava de costas, custando a me virar para me inteirar acerca de quem era a "visita" sorrateira. Quando percebi que era ele, depois de me refazer do "inesperado" convidei-o para chegar. Osnelito não era mais a mesma pessoa de antigamente, parecia estar sempre amargo não só com a instituição, mas também com a própria vida. De certa forma eu também estava, porém, com a diferença de que conseguia melhor que ele disfarçar e tolerar certos ambientes e pessoas. Lembrei que no dia anterior tinha conversado com o Comissário Arno Vieira e ele mais uma vez disse que há uns tempos atrás Osnelito havia falado mal de mim (sempre achou que eu tinha força política e influência para ajudá-lo no concurso...) e que ele não gostou e mais uma vez saiu em minha defesa. Procurei deixá-lo à vontade e enquanto minha visita se ajeitava numa cadeira, peguei minha câmera fotográfica e fui o fotografando para a posteridade (foto que estampa este artigo).
Depois fui verificar se ficaram boas as duas tomadas e ele disse ao ver a sua foto na tela:
- “Bacana esse ‘tréquinho’, gostei!”
No início a impressão era que não conseguiríamos conversar muito bem..., de minha parte porque estava preocupado em salvar as tais fotos e fui dizendo:
- “Ficaram boas, né? Vais entrar para a história com essas fotos...”.
Osnelito não se surpreendeu muito e disse com aquele seu jeito mané e bronco:
- “Eu não quero saber muito de história. Não quero falar dos outros. Quero é ficar na minha...”.
Pensei comigo mesmo: “Mas falar mais o quê, depois de tudo que ele já disse, mas nem vou dizer isso para ele”. Tomei coragem e perguntei:
- “Foi até bom tu vires aqui. Faz tempo que queria falar contigo. Eu notei que nos últimos tempos tu ficastes diferente comigo. Não conversas mais direito. Antigamente, quando eu estava ali 'abandonado' no ‘salão vermelho’ (um castigo imposto pela administração da Delegada Lúcia - SSP/1995-1998 e do Delegado-Geral Trilha/1997/1998) tu sempre me visitavas, lembras? O Arno conversou comigo ontem e disse que tu andasses falando mal de mim. Que tu dissestes que eu tinha a prova do concurso e não te dei...”.
Osnelito interrompeu para dizer:
- “Isso eu disse. É verdade”.
Continuei:
- “É o Arno, sabe como ele é meu amigo, defende a gente e sofreu do nosso lado...”.
Osnelito novamente interrompeu para dizer:
- “Mas ele não te defendeu, não. Enquanto eu falava ele ficava quieto...”.
Interrompi para dizer:
“Sim, mas é porque ele não quis polemizar...”.
Osnlito começou a abrir o verbo como nos velhos tempos:
- “...Há uns tempos atrás eu encontrei a Lúcia, o Lorival e o Trilha e eles estavam conversando sobre ti. Eles estavam falando mal de ti e como sabem da nossa amizade eles também não gostam de mim. Então é isso Felipe, por eu ter amizade contigo eles também não gostam de mim. Esse pessoal só me prejudicou. Aí vem o Ademar... dizer que eu precisava estudar mais...”.
Interrompi para dizer:
- “A gente sabe que passaram um monte de gente nos concursos que não tinham a mínima condição. Mas eu não acho que eles quiseram te prejudicar. Veja, Lito, não prejudicaram o Marquinhos, o Arno, o Ademir, a Rita, o Aguiar...”.
Osnelito interrompeu:
- “...Eu quase que não entrei aqui. Fiquei evitando de abrir aquela porta. Eu nem queria entrar aqui, já me arrependi. Tu até parece que pensa que eu sou criança, Felipe. Parece que estais subestimando a minha inteligência. Vais querer me comparar a um Marquinhos, a um Aguiar? Nunca! Eu sou político queria ser Delegado. Estava fazendo o concurso. O que significaria um Marquinhos para a Lúcia? Eu não, trabalhei na política para o PMDB? Lembra que eu te disse que esse pessoal só me prejudicou, justamente eu que era do PMDB. Começou com um parecer que eu fiz...”.
Interrompi Osnelito para dizer:
“Sim, eu lembro do parecer. Nunca esqueço quando a Lúcia assumiu a Superintendência (no ano de 1989 - atual Delegacia-Geral). Ela me chamou e me mostrou o teu parecer. Sabe o que ela me disse: ‘olha aqui Felipe o que o Osnelito fez contra a nossa instituição. Olha só, ele assinou um parecer dizendo que a Polícia Militar pode fazer laudos periciais em acidentes de trânsito sem vítimas (fato corriqueiro nos dias de hoje...). Como é que pode esse Escrivão assumir um cargo de Consultor Jurídico na Procuradoria (PGE/SC) e estar no mesmo nível que eu...’ (o cargo de Consultor Jurídico da PGE tinha o mesmo nível do Superintendente da Polícia Civil). Olha Lito ela estava agitada, nervosa contigo e porque também naquela época tu eras da diretoria da Federação (Federação Catarinense dos Policiais Civis, depois Sintrasp e, atualmente, "Assesp")”.
Osnelito argumentou:
- “...Pois é, por causa da nossa amizade é que eles fizeram de tudo para me prejudicar...”.
Contraditei dizendo:
- “Tudo bem Lito, tu podes até ter razão. Mas tu sabes que a luta classista traz desgastes. Quanto a isso eu não posso fazer nada. Tu entrasse para a Federação e o desgaste foi natural...”.
Osnelito argumentou:
- “Eu nunca me arrependi de ter entrado para a Federação. Nunca vou me arrepender disso...”.
Acabei dizendo para Osenlito que havia tomado conhecimento da tese da redação do concurso na véspera, à noite... e mesmo que tivesse conseguido passar o título, argumentei que isso não significaria que eles fariam uma boa prova ou passariam. Osnelito interrompeu:
- “Sabes quanto é que foi a minha média no último concurso para Delegado feito pela Udesc? Foi sete e meio. A minha média foi sete meio...”.
Perguntei:
- “Sim, e não passastes?”
Osnelito respondeu:
“Não. Tive média, mas não fui chamado”.
Fiz um relato do que aconteceu com meu irmão (médico) teve que se exonerar do cargo na Polícia Civil por causa de um parecer que fiz “contra” a Administração passada em defesa da Polícia Civil e do Delegado Regional de Criciúma (parecer pedia a instauração de sindicância contra "Peritos", inclusive contra o Diretor de Polícia Científica (Perito Criminalístico), pois naquela época/2001 já ensaiavam deixar a Polícia Civil levando consigo serviços estratégicos que se constituíam patrimônio da instituição e criar o "IGP", para tanto, passaram a afrontar Delegados, sendo que para isso contavam com a simpatia e apoio do Secretário da Segurança Pública, porém, como não puderam me atingir, passaram a atacar meu irmão que respondia pelo "Ambulatório Médico da Delegacia-Geral (foi a primeira e única vez que derramar lágrimas por ter que deixar seu cargo na Polícia Civil que tanto amava e pelas mentiras que foram assacadas a sua pessoa justamente - sua secretaria era a esposa do Diretor de Polícia Científica).
Acabei fazendo um questionamento:
- “Pois é Lito, agora eu pergunto: ‘durante todo o governo passado o Amin sentou o pau no governo Paulo Afonso (especialmente em razão do legado que recebeu...) e onde é que andava a (...), onde é que andava o (...), heim? Estavam bem quietinhos, não é? Que tipo de políticos são esses, heim? Foram supersecretários na época do Paulo Afonso e enquanto Amin sentava o pau no governo deles sabe o que eles fizeram? Se esconderam. Aí é fácil, né Osnelito? Eu conheço bem a história de todo esse pessoal. Não tenho nada pessoalmente contra eles (....). Eu sei que tentaram me fazer mal, procuraram me prejudicar. Não posso dizer o mesmo do (...), acho que nunca quis me prejudicar. Mas eu te faço outra pergunta: ‘O Dirceu assumiu a Chefia da Polícia Civil, não é? No governo Amin ele foi o Diretor do Deic. Então por quê (...) não bateram nele? Nunca vi os dois escreverem uma linha sequer na imprensa criticando governos, muito pelo contrário, ficaram quietinhos e agiram às escondidas (...). Mas sabe quem é que criou a (...)?” Escrevi num papel: “Álvaro Pille” e fui dizendo que antes do Álvaro Pille a (...) era uma ilustre desconhecida, que não era ninguém dentro do MDB e do PMDB, nunca teve história de lutas e participação na defesa de nossas questões institucionais, mas quando o Álvaro Pille deu uma oportunidade para ela...". *
Osnelito se levantou e disse que estava com o horário estourado e veio me apertar a mão dizendo:
- “Dia vinte e três tu estais de aniversário, parabéns! Eu estou hoje”.
Corrigi:
- “Não, dia vinte e dois...”.
Acompanhei Osnelito até a escada quando ambos parecíamos estar um pouco mais à vontade um com o outro como nos velhos tempos de Fecapoc e de viagens pelo interior buscando recursos principalmente para construção da sede balneária do Campeche....
Osnelito morreu ainda trabalhando na 2ª DP/Capital, sem nunca ter conseguido realizar o seu velho sonho de ser "Delegado". Por ter vínculos de amizade comigo acreditava piamente que eu teria/deveria influenciar junto à direção da Polícia Civil para que passasse no concurso, o que jamais fiz e poderia fazê-lo, deixando-o muito revoltado com minha pessoa. Todavia, durante quase dois anos o convoquei para trabalhar comigo (1993/1994) na "Assistência Jurídica" (DGPC) onde lhe franqueei tempo para que estudasse, além de ter lhe dado algumas aulas preparatórias para o concurso, entretanto sua cabeça já não o ajudava, talvez pelos desgastes ocorridos durante a sua vida como policial civil....
Acredito que Osnelito deva servir de inspiração para que se trave uma luta sem tréguas por mudanças no sistema de promoções e concursos na Polícia Civil, de maneira a criar mecanismos de valorização dos nossos profissionais que trabalham nos cartórios, nas investigações e nas repartições policiais, com excesso de trabalho e estresse (tipo o "Escravão"), sem reconhecimento e valorização profissional, sem condições de concorrer com pessoas de fora da instituição ou que somente estudam e se preparam para concursos enquanto nossos profissionais definham mergulhados em investigações e nos cartórios, sob o crivo da tibieza do nosso poder hierárquico e do regime disciplinar claudicante.
*Os diálogos e críticas devem ser contextualizados no seu devido espaço e tempo. A bem da verdade, os governos (e as pessoas passam..., a instituição permanece).