Escolhas

Por Claudio Francisco Nunes | 04/05/2016 | Crônicas

O estampido varou o céu, cujo silêncio parecia equilibrado, monótono. O corpo ainda quente, dava trêmulos espasmos...o sangue escorria pela calçada; o homem estava entre os mortos.

A polícia tarda a chegar, avisada por algum passante anônimo. Logo depois, uma ambulância rasga a rua em alta velocidade, tentando fazer parecer que aquela ex- vida fosse importante demais e o tempo lhe fosse precioso.

Figuras noturnas se aproximam do cadáver, algumas mulheres que se vendem ao prazer alheio chegam a murmurar alguma coisa sobre conhecerem o infeliz. Mendigos, viciados, trabalhadores da noite deixam seus afazeres e aproximam do trágica cena, tentando ver melhor a má sorte do homem.

- Alvo de bandidos? Resmunga um policial, com um bloco de notas aberto em uma das mãos e uma caneta velha quase e sem tinta na outra. Dava ares de costumeiro e tedioso trabalho, que anula todo senso de justiça ou de sensibilidade humana. A pergunta, entre tantas outras, ficaria sem resposta. Não deveria haver respostas, não se importavam com as respostas. Mais um corpo, apenas mais um corpo. Ajuda a vender notícia, espalha-se boatos, engrossam a estatísticas de assassinatos.

No outro lado da rua, um homem acende um cigarro e, em meio a uma tragada e outra, com os olhos quase imóveis, tira um aparelho telefônico do bolso do casaco. Faz uma ligação. A voz é fraca, apenas uma palavra: "Vem!"

Após alguns curtos minutos, surge uma mulher, magra, com ar sério, aparentando uns 30 anos, leva uma pequena bolsa numa das mãos, atravessa a rua, ainda apinhada de gente, pede para as pessoas afastarem. Olha para o corpo, volta-se para o policial, que nem notara nela nada de anormal. De repente, tira da sua bolsa uma arma. Todos se afastam. O policial pede para ela jogar a arma. Sem ouví-lo, a mulher põe a arma na própria cabeça e dispara. Gritos de horror...

Do outro lado da rua, uma sombra ainda marca a calçada. Em passos lentos e pesarosos, o homem sai, levando consigo uma fotografia em que posa abraçado com a agora defunta.

O adultério mata!